Ação Popular: Guia Completo de Conceito e Processo

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1. Conceito

É o meio constitucional posto à disposição de qualquer cidadão para obter a invalidação de atos ou contratos administrativos – ou a estes equiparados – ilegais e lesivos do patrimônio federal, estadual e municipal, ou de suas autarquias, fundações, entidades paraestatais e pessoas jurídicas subvencionadas com dinheiros públicos.

2. Requisitos

  • Cidadão brasileiro:
    • Pessoa humana no gozo dos direitos cívicos e políticos.
    • Prova-se pela condição de eleitor.
    • Somente pessoa física.
    • Os inalistáveis, os partidos políticos, entidades de classe, ou qualquer outra pessoa jurídica não têm qualidade para propor ação popular.
  • Ilegalidade ou ilegitimidade do ato:
    • O ato deve ser contrário ao Direito:
      • Infringiu normas específicas do Direito;
      • Desviou dos princípios gerais da Administração Pública.
  • Lesividade do patrimônio público:
    • Lesivo é a ação ou omissão que desfalca o erário ou prejudica a Administração, e os que ofendem bens, valores artísticos, cívicos, culturais, ambientais ou históricos da comunidade.
    • Lesão efetiva ou presumida (art. 4º, Lei nº 4.717/65).
    • A lesividade abrange o patrimônio material, moral, estético, espiritual e histórico.

OBS: A ação popular não autoriza o Judiciário a invalidar opções administrativas ou substituir critérios técnicos (exercício do poder discricionário).

OS 3 REQUISITOS DEVEM COEXISTIR SIMULTANEAMENTE – STJ REsp 111.527-DF.

3. Fins da Ação

  • É a obtenção da correção nos atos administrativos ou nas atividades delegadas ou subvencionadas pelo Poder Público.
  • É a possibilidade de qualquer do povo intervir na Administração para invalidar atos que lesam o patrimônio econômico, administrativo, artístico, ambiental ou histórico da comunidade.
  • Preventivos:
    • Antes da consumação dos efeitos lesivos do ato.
  • Repressivos:
    • Depois da lesão, para a reparação do dano.

O ato é: a lei, o decreto, a resolução, a portaria, o contrato e demais manifestações gerais ou especiais.

4. Objeto da Ação

  • O objeto da ação é o ato ilegal e lesivo ao patrimônio público.
  • Vícios do ato administrativo – requisitos COFIFOMO e princípios constitucionais.

5. Fontes Legais

  • Art. 141, § 38, CF 1946.
  • Lei nº 4.717/65.
  • Art. 5º, LXXIII, CF 1988.

6. Partes

  • Sujeito ativo: Cidadão no gozo dos direitos políticos (eleitor).
  • Sujeito passivo: Diversos:
    • Praticante do ato;
    • Demais outros que tiverem autorizado, aprovado, ratificado;
    • Os omissos que tiverem dado oportunidade à lesão;
    • Beneficiários diretos do ato ou contrato (art. 6º).
  • Pessoa jurídica de direito público ou privado – art. 6º, § 3º:
    • Assumir polo passivo da ação;
    • Abster-se de contestar.
  • Ministério Público: Parte pública autônoma, incumbida de apresentar a produção da prova e promover a responsabilidade (civil/criminal) dos culpados.
    • Tem liberdade para se manifestar, ao final, a favor ou contra a procedência da ação.
    • A lei proíbe (art. 6º, § 4º) que o MP assuma a defesa do ato impugnado ou dos réus.
    • ABANDONO: Se o autor popular abandonar a ação, o MP promoverá o seu prosseguimento, se reputar de interesse público seu julgamento (art. 9º).
    • DESISTÊNCIA: Em caso de desistência da ação por parte do autor popular, o juiz somente homologará se houver concordância do MP e do(s) réu(s).
    • Também é possível a extinção do processo em relação a um ou alguns réus e o prosseguimento em relação a outro(s). – STJ. REsp 556.386-SP.
    • Do autor popular – previsão legal (art. 6º, § 5º).
  • Litisconsortes e assistentes:
    • Do réu(s) – por analogia – desde que haja legítimo interesse a defender (pessoas que podem ser atingidas com a procedência da ação).
    • Devido processo legal – art. 5º, LIV, CF.
    • TJPR, ACi 1.314/75.
    • STJ, REsp 480.712-SP.

7. Competência

  • Para conhecer e julgar a ação:
    • Federal: Ato advém de autoridade federal ou privada subvencionada por órgão federal.
    • Sempre 1ª instância.
    • Estadual: Ato advém de autoridade estadual ou municipal ou privada subvencionada por órgão estadual ou municipal – Vara da Fazenda Pública, onde houver (Lei nº 4.717/65, art. 5º e Lei nº 5.010/96, arts. 10/15).

OBS: Mesmo que o ato impugnado seja do Presidente da República, do Governador ou do Prefeito.

  • Sempre o do local da consumação do ato - (ratione loci).
  • Se presente interesse da União, prevalece a competência da Justiça Federal.
  • Interesses de mais de uma Fazenda Pública:
  • Se a entidade maior interessada for o Estado, prevalece a competência da Justiça Estadual do local da expedição do ato.
  • Prevenção: A propositura da ação previnirá o juízo para todas as ações que forem posteriormente propostas contra as mesmas partes e sob os mesmos fundamentos (art. 5º, § 3º).
  • STJ – CC 19.686-DF; CC 22.123-MG; CC 36.439-SC; Recl 2.259-PA.

8. Processo e Liminar

  • Processo: Rito ordinário com as seguintes modificações:
    • No despacho inicial, o juiz ordenará a citação de todos os responsáveis pelo ato impugnado e a intimação do MP;
    • Requisitará documentos, marcando prazo de 15 a 30 dias para apresentação;
    • Ordenará a citação pessoal dos que praticaram o ato e a citação edital e nominal dos beneficiários, se o autor assim requerer;
    • Decidirá sobre a suspensão liminar do ato impugnado, se pedida (art. 5º, § 4º);
    • Aos citados por edital, se revéis, dar-se-á curador especial.
    • Citada, a pessoa jurídica poderá adotar uma das 3 posições (polo ativo, polo passivo contestando a ação, abster-se de contestar).
    • O prazo para contestar é de 20 dias, prorrogável por mais 20, a requerimento dos interessados. O prazo é comum (art. 7º, IV).
  • Reconvenção – inadmissível – porque o autor não pleiteia direito próprio, mas sim coletivo. STJ, REsp 72.065-RS.
  • Se até o saneador não houver requerimento de prova pericial ou testemunhal, o juiz proferirá o saneador e concederá vistas sucessivas de 10 dias ao autor e réu para alegações finais;
  • Depois, os autos serão conclusos nas 48 horas seguintes;
  • Se houver prova oral a ser produzida, o processo seguirá o curso ordinário (art. 7º, V);
  • A CF isentou de custas e de honorários advocatícios o autor popular, salvo comprovada má-fé (art. 7º, V).
  • A ação “corre” nas férias? NÃO. Porque possui rito ordinário (art. 7º). Mas, o pedido de suspensão liminar do ato impugnado deve ser apreciado nas férias (art. 5º, § 4º), para a preservação de direitos.
  • Liminar: Medida liminar é provimento de urgência admitido pela própria lei de ação popular: “na defesa do patrimônio público caberá a suspensão liminar do ato lesivo impugnado.”
  • Previsão: Lei nº 4.717/65, art. 5º, § 4º e Lei nº 6.513/77, art. 34.
  • Requisitos:
    • fumus boni iuris
    • periculum in mora
  • Instrumentos para combater a liminar:
    1. Suspensão de Liminar – SL – art. 4º, Lei nº 8.437/92 (TJ ou TRF).
      • Agravo Regimental – AR (que pode ter efeito suspensivo) da decisão que concede ou nega a SL – art. 4º, § 3º, Lei nº 8.437/92 (TJ ou TRF).
      • Nova Suspensão de Liminar – da decisão que nega a SL e nega o AR:
        • Ao STF – competente para apreciar futuro REx;
        • Ao STJ – competente para apreciar futuro REsp.

      Art. 4º, § 4º, Lei nº 8.437/92.

    2. Agravo de Instrumento – AI – art. 522, CPC (Lei nº 9.139/95).
      • Quem interpõe?
        • A Administração, ou
        • Os réus.
      • Quando a Administração interpõe?
        • Quando a liminar possa colocar as atividades em risco (princípio da continuidade dos serviços públicos).
      • Nova Suspensão de Liminar – da decisão que nega provimento ao AI interposto contra decisão deferida no primeiro grau:
        • Ao STF – competente para apreciar futuro REx;
        • Ao STJ – competente para apreciar futuro REsp.

      Art. 4º, § 5º, Lei nº 8.437/92.

OBS: Liminar do STF na ADI 2.251-DF suspendeu os efeitos do § 8º, do art. 4º, da Lei nº 8.437/92.

9. Sentença

É a prestação da tutela jurisdicional. É a decisão pela qual se põe fim ao processo.

  • Procedente: O juiz decreta:
    • A invalidade do ato impugnado;
    • As restituições devidas;
    • A condenação ao pagamento de perdas e danos aos responsáveis pela sua prática e aos beneficiários de seus efeitos, ressalvado à Administração o regresso contra os servidores responsáveis que não integraram a ação (art. 11);
    • SOLIDARIEDADE DOS CORRÉUS.
    • Custas processuais (art. 12);
    • Honorários advocatícios do advogado do autor (art. 12);
    • A sentença em ação popular não comporta condenações políticas, administrativas ou criminais (suspensão de direitos políticos, perda da função pública, multa, etc.).
  • Improcedente: O juiz:
    • Isenta o autor de custas;
    • Isenta o autor de honorários de sucumbência.

Exceto se comprovada má-fé (art. 5º, LXXIII, CF).

  • Prazo para proferir a sentença: 15 dias a contar da conclusão, sob pena de impedimento ao juiz, por 2 anos, de promoção por antiguidade e descontos financeiros de tantos dias quantos forem os de atraso.
  • Sentença contrária ao interesse do Poder Público pode ser suspensa pelo Presidente do Tribunal.

10. Recursos

  • Recurso de Ofício:
    • O juiz submete a sentença que proferiu ao Tribunal a que pertença para reexame.
    • Cabimento:
      1. IMPROCEDÊNCIA da ação;
      2. CARÊNCIA da ação.
    • Inversão da posição em relação a outros tipos de processos – interesse público (a rejeição da ação pode causar prejuízo ao patrimônio público).
    • Se dá pela simples manifestação do juiz no dispositivo da sentença quando diz: “havendo ou não recurso voluntário, recorro de ofício da presente decisão”.
  • Apelação Voluntária (com efeito suspensivo) – Art. 19, § 2º:
    • Trata-se de recurso apresentado por qualquer das partes ou interessados, sobre a parte em que sucumbiu na ação.
    • Ação julgada totalmente procedente – requerido(s) pode recorrer. NÃO SE ADMITE RECURSO DO MP NEM DA FAZENDA.
    • Ação julgada totalmente improcedente – requerente e interessado(s) ou o MP.
    • Ação julgada parcialmente procedente – todos podem recorrer da parte em que sucumbiram.
    • Prazo – art. 7º, Lei nº 4.717/65 c.c. art. 511 CPC – 15 dias.
    • Quando houver mais de um requerido = dobrado (STJ REsp 230.142-RJ interpretando o art. 191, CPC).

11. Coisa Julgada

  • É a decisão que se tornou imutável pelo esgotamento dos recursos cabíveis.
  • É oponível contra todos = “erga omnes”.
  • EXCETO: Quando a improcedência resultar de deficiência de prova.
  • Neste caso, a ação poderá ser renovada (reproposta), pelo mesmo ou outro autor.

OBS: É possível o controle difuso de constitucionalidade em sede de ação popular? NÃO.

Como a decisão na ação popular, a exemplo da ação civil pública, tem efeito “erga omnes”, elas não podem ser utilizadas como sucedâneo da ADI – pena de usurpação de legitimidade, competência, etc.

Nesse sentido: NULIDADE DO PROCESSO – STF Rcl 434-1, Min. Francisco Rezek.

12. Execução

  • Pessoas legitimadas:
    1. O autor;
    2. Qualquer outro cidadão;
    3. O MP (em caso de inércia do autor, desinteresse de qualquer outro cidadão e após decorridos 60 dias da decisão condenatória em segunda instância (§ 4º, art. 6º));
    4. A entidade pública – ainda que tenha contestado a ação.
  • A execução pode ser:
    1. Por quantia certa quando a condenação impuser perdas e danos (art. 14, §§ 1º e 2º);
    2. Para a entrega de coisa certa quando a condenação versar sobre a devolução de bens (art. 14, § 4º).
  • Quando o requerido condenado receber dos cofres públicos, a execução far-se-á por desconto em folha (art. 14, § 3º).
  • Sujeitos passivos da execução: Todos os requeridos, exceto as entidades que porventura tenham contestado a ação.
  • Rito da execução: CPC.

13. Prescrição

  • Prescrição da ação: 5 anos – art. 21, Lei nº 4.717/65.
  • Prescrição da execução: Súmula 150 STF.

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