Alegações Finais: Defesa de Felipe - Erro de Tipo

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EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA XX VARA CRIMINAL DE VITÓRIA – ESTADO DO ESPÍRITO SANTO.

Autos nº ...

Autor: Ministério Público

Réu: Felipe

FELIPE, já qualificado nos autos, por intermédio de seu advogado que ao final assina, vem, respeitosamente, à presença de Vossa Excelência, nos autos do processo-crime acima mencionado, movido pelo Ministério Público Estadual, com fulcro no art. 403, §3º, do Código de Processo Penal, apresentar:

Alegações Finais

Pelos motivos de fato e de direito a seguir expostos.

Dos Fatos

O Réu foi denunciado pelo Ministério Público Estadual pela suposta prática do crime de estupro de vulnerável, previsto no art. 217-A, em concurso material (art. 69), ambos do Código Penal. Narra a denúncia que o Réu, com 18 anos de idade, manteve relações sexuais orais e vaginais, de forma espontânea e voluntária, com a menor Ana, que na época dos fatos tinha 13 anos de idade.

Ocorre que o Réu conheceu a suposta vítima em um bar que, em tese, somente permitiria a presença de maiores de 18 anos. Salienta-se que o Réu tomou conhecimento de que a suposta vítima era menor apenas no dia seguinte, ao acessar a página da rede social da mesma e constatar o fato, ficando em choque com a descoberta.

Na audiência de instrução e julgamento, a menor afirmou que tinha o hábito de fugir de casa com as amigas para frequentar bares de adultos. As testemunhas de acusação nada sabiam acerca dos fatos, e as testemunhas da defesa afirmaram que o comportamento e as vestimentas da menor eram incompatíveis com sua idade, induzindo a erro qualquer pessoa. Afirmaram, também, que o Réu não estava embriagado quando conheceu a menor. Frisa-se que a perícia foi realizada muitos meses após o ato sexual.

Em suas alegações finais, o Ministério Público pede a condenação do Réu nos termos propostos na exordial. Contudo, essa tese não deve prevalecer, conforme será exposto a seguir.

Do Direito

Do Erro de Tipo Essencial

Conforme afirmam o Réu e as testemunhas, o comportamento, as vestimentas e a aparência da menor eram incompatíveis com uma menina de 13 anos, levando qualquer pessoa a erro. Ademais, o fato de o bar ser frequentado pelas partes leva à presunção de que os frequentadores são maiores de 18 anos.

O tipo penal do art. 217-A do Código Penal exige, para sua configuração, que o agente tenha conhecimento de que a pessoa com quem mantém conjunção carnal ou pratica ato libidinoso seja menor de 14 anos. Todavia, conforme demonstrado, o Réu não tinha conhecimento de que a suposta vítima era menor de 14 anos. Desta forma, incide a figura do erro de tipo essencial, prevista no art. 20, caput, do Código Penal: “Art. 20 – O erro sobre elemento constitutivo do tipo legal de crime exclui o dolo, mas permite a punição por crime culposo, se previsto em lei”. Observa-se que o crime do art. 217-A do Código Penal não admite modalidade culposa. Sendo assim, a conduta do Réu é atípica, impondo-se sua absolvição como medida de justiça.

Do Reconhecimento de Crime Único

O Ministério Público denunciou o Réu pela prática do crime previsto no art. 217-A, em concurso material (art. 69), ambos do Código Penal, ou seja, pelo cometimento de dois crimes de estupro de vulnerável devido à prática de sexo oral e vaginal.

Ocorre que, com o advento da Lei nº 12.015/2009, as figuras típicas do atentado violento ao pudor e do estupro foram unificadas. Desse modo, praticar sexo oral e vaginal no mesmo contexto fático contra a mesma vítima configura crime único, pois o tipo penal é classificado como misto alternativo (a realização de mais de um núcleo verbal no mesmo contexto configura um só crime). Assim, impõe-se o reconhecimento de crime único.

Da Embriaguez Preordenada e Menoridade Relativa

A agravante prevista no art. 61, inciso II, alínea 'l', do Código Penal (crime cometido “em estado de embriaguez preordenada”) deve ser afastada, pois não há provas de que o Réu tenha se embriagado com o intuito de praticar o crime. Ademais, as testemunhas ouvidas em juízo afirmaram que o Réu não estava embriagado na ocasião.

Por outro lado, na data do fato, o Réu tinha 18 anos, incidindo a atenuante da menoridade relativa, prevista no art. 65, inciso I, do Código Penal (“I – ser o agente menor de 21 (vinte e um), na data do fato (...)”).

Do Regime de Cumprimento da Pena

Embora o crime do art. 217-A do Código Penal seja classificado como hediondo (art. 1º, inciso VI, da Lei nº 8.072/90), e a lei previsse inicialmente o cumprimento da pena em regime fechado (art. 2º, §1º), é importante ressaltar que o Supremo Tribunal Federal (STF), por meio da Súmula Vinculante nº 26, declarou a inconstitucionalidade do art. 2º, §1º, da Lei nº 8.072/90, que obrigava o início do cumprimento da pena em regime fechado. Dessa forma, o Magistrado deve analisar o caso concreto para fixar o regime inicial. Considerando a eventualidade de condenação por um único crime, a ausência de agravantes, a presença da atenuante da menoridade relativa, a primariedade, os bons antecedentes e a residência fixa do Réu, a pena-base deve ser fixada no mínimo legal, sendo cabível o regime semiaberto, nos termos do art. 33, §2º, alíneas 'b' e 'c', do Código Penal.

Dos Requerimentos

Diante do exposto, requer-se:

  • A absolvição do acusado, com fundamento no art. 386, inciso III, do Código de Processo Penal (não constituir o fato infração penal), dada a atipicidade da conduta por erro de tipo essencial;

Subsidiariamente, caso Vossa Excelência entenda pela condenação, requer-se:

  • O reconhecimento de crime único, afastando-se o concurso material;
  • A fixação da pena-base no mínimo legal;
  • O afastamento da agravante da embriaguez preordenada;
  • O reconhecimento da atenuante da menoridade relativa (art. 65, I, CP);
  • A fixação do regime inicial semiaberto para cumprimento da pena (art. 33, §2º, 'b' e 'c', CP e Súmula Vinculante nº 26 do STF).

Nestes termos,

Pede deferimento.

Cidade, 25 de maio de 2015.

Advogado

OAB

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