Análise de Caso Prático: Jornada de Trabalho e Conflitos de Fontes
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Caso Prático: Jornada de Trabalho
1. Alexandra e Beatriz: Contexto
Alexandra e Beatriz trabalham na empresa X, que subscreveu um acordo de empresa com o sindicato Y. Alexandra, ao contrário de Beatriz, é filiada no referido sindicato.
O período normal de trabalho semanal definido no acordo de empresa é de 35 horas. Os contratos de trabalho, por sua vez, estipulam 42 horas. O artigo 203º do Código do Trabalho (CT) dispõe sobre a matéria, referindo 40 horas.
Questão
Qual o período normal de trabalho semanal que cada uma das trabalhadoras deverá cumprir, fundamentando legalmente a sua resposta?
Análise do Caso
Conflitos entre Fontes
Originalmente, há três conflitos a considerar: Lei/Convenção Coletiva de Trabalho (CCT), Lei/Contrato de Trabalho (CT) e CCT/CT.
O conflito entre fontes surge quando, a uma determinada situação, são aplicáveis fontes diferentes com hierarquias distintas, que estabelecem relações diversas. Cabe então analisar qual o regime jurídico que irá prevalecer.
A legislação laboral, desde sua origem, surgiu com o intuito de proteger o trabalhador, levando à aplicação do princípio da norma mais favorável. Tradicionalmente, até 2003, prevalecia o regime mais favorável ao trabalhador (artigo 13º da Lei de Contrato de Trabalho - LCT). No entanto, a partir da entrada em vigor do Código do Trabalho de 2003, houve uma mudança nesse entendimento.
O artigo 4º do CT de 2003 (atual artigo 3º do CT de 2009) unificou a legislação laboral e passou a regular os conflitos entre a lei e os instrumentos de regulamentação do trabalho, bem como entre a lei e o contrato de trabalho.
Alexandra: Aplicação da Convenção Coletiva
Alexandra, sendo filiada no sindicato Y, através da liberdade sindical positiva (artigo 496º, nº 1 do CT), está abrangida pela convenção coletiva, de acordo com o critério da dupla filiação. Este critério determina que a convenção coletiva só é aplicável a um trabalhador se este estiver sindicalizado na associação vinculada à convenção e se a entidade empregadora também estiver vinculada à mesma convenção.
A convenção prevê 35 horas semanais de trabalho, o que conflita com a lei, que prevê 40 horas semanais. Estamos perante um conflito entre Lei/CCT, cuja solução se encontra no artigo 3º, nº 1 e 3 do CT. A lei pode ser afastada por CCT, desde que não resulte o contrário da lei.
O artigo 203º do CT estabelece apenas um limite máximo de horas de trabalho semanais (“não pode exceder”), tratando-se de uma norma semi-imperativa. O artigo 3º, nº 3, alínea g) do CT confirma a natureza semi-imperativa desta norma, permitindo que seja afastada por convenção coletiva mais favorável.
Sendo o regime da convenção mais favorável, prevalece a convenção, estabelecendo 35 horas semanais de trabalho para Alexandra.
Alexandra: Conflito CT/CCT
Existe também um conflito entre o contrato de trabalho (42 horas semanais) e a convenção coletiva (35 horas semanais). A solução encontra-se no artigo 476º do CT, que determina a prevalência da norma mais favorável, que neste caso é a convenção coletiva.
Beatriz: Não Aplicação da Convenção Coletiva
Beatriz não está sindicalizada no sindicato Y, pelo que, de acordo com o artigo 496º do CT e o critério da dupla filiação, a convenção coletiva não se aplica a ela.
O conflito presente é entre a lei (40 horas semanais) e o contrato de trabalho (42 horas semanais). A solução encontra-se no artigo 3º, nº 4 do CT, que permite que a lei seja afastada por contrato de trabalho, desde que este seja mais favorável ao trabalhador e não contrarie a lei.
Como vimos, o artigo 203º do CT tem natureza semi-imperativa. No entanto, o contrato de trabalho não é mais favorável a Beatriz neste caso. Assim, prevalece a lei, estabelecendo 40 horas semanais de trabalho para Beatriz, com base no artigo 3º, nº 4 do CT.
Conclusão
Em suma, Alexandra deverá cumprir uma jornada de trabalho semanal de 35 horas, de acordo com a convenção coletiva. Beatriz, por sua vez, deverá cumprir uma jornada de 40 horas semanais, conforme previsto na lei.