A Ascensão das Revistas no Brasil: De Manchete a Veja (1950-1970)

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Os anos de 1950 marcaram um período de surgimento de muitas revistas de qualidade.

O Império Bloch e o Sucesso da Revista Manchete

Uma família de gráficos fugidos da Rússia revolucionária em 1922, os Bloch, chefiados pelo patriarca Joseph e seus nove filhos, chegam ao Rio de Janeiro onde se estabelecem e, no mesmo ano, fundam a Joseph Bloch & Filhos.

O caçula, Adolpho, uniu-se ao ex-cronista de O Cruzeiro, Henrique Pongetti, que conhecia a família das areias de Copacabana, para montar sua própria revista. Aproveitando-se indiretamente dos benefícios dados por Getúlio Vargas que, ao patrocinar a fundação do jornal Última Hora, permitiu que se importasse maquinário gráfico sem custos alfandegários e com subsídios, ele importou rotativas em grande quantidade, passando a imprimir os gibis de Roberto Marinho, que depois pediu seu auxílio para montar a Rio Gráfica.

Para montar a redação, Pongetti convidou Raimundo Magalhães Júnior, o designer Wilson Passos e Dirceu Torres Nascimento para a publicidade. Como colaboradores, havia estrelas do jornalismo da época, como:

  • Rubem Braga
  • Otto Maria Carpeaux
  • Antonio Callado
  • Joel Silveira
  • Orígenes Lessa
  • Marques Rebelo
  • Manuel Bandeira
  • Cyro dos Anjos
  • Lygia Fagundes Telles
  • Carlos Drummond de Andrade
  • Fernando Sabino
  • Paulo Mendes Campos
  • Otto Lara Resende

Em 26 de abril de 1952, a revista Manchete chegava às bancas. Também influenciada pela Match e a Life, no editorial afirmava-se que a revista estaria a serviço da beleza do Brasil e das manifestações de seu progresso, ou seja, apresentaria uma versão do paraíso com todas as páginas em cores.

No início, a revista era mais famosa pelas brigas violentas entre os irmãos Bloch em sua redação do que por sua presença em banca. Turrão como os russos da plebe, Adolpho decidiu fazer da revista um sucesso a qualquer custo, depois de receber duas propostas de compra ridículas feitas por Roberto Marinho e Samuel Wainer quando tentou vendê-la.

Para isso, quebrou a regra de ouro de O Cruzeiro, que colocava apenas mulheres na capa, para alternar as suas com figuras variadas, diminuiu o espaço das reportagens para, no máximo, três páginas, e abusou do apelo fotográfico.

As matérias deixaram o tom paradisíaco para o jornalismo mais sério, como críticas à saúde e, principalmente, a Carlos Lacerda, que na época imprimia uma campanha contra Samuel Wainer chamando-o de estrangeiro, o que irritou os Bloch cuja metade da família tinha a mesma situação de Wainer: judeus nascidos no Brasil que prosperavam na área gráfica.

Essa estratégia deu tão certo que a Manchete seria a ponta de lança para uma enorme gama de outras revistas, que montariam o império Bloch. Surgiram revistas como:

  • Jóia (1957-1969)
  • Sétimo Céu (1958-1992)
  • Fatos & Fotos (1961-1985, depois Fatos & Fotos Gente)
  • Revista Geográfica Universal (1974-1999)
  • Manchete Rural (1987-1998)
  • Manchete Esportiva (1955-1959)
  • Mulher de Hoje
  • Desfile
  • Ele Ela (1969)
  • Pais & Filhos (1969)
  • Amiga (1970)

A Inovadora Revista Senhor: Um Novo Patamar Editorial

Foi em 1959 que surgiu uma revista que estabeleceria um novo patamar gráfico e editorial no Brasil: tratava-se da revista Senhor.

Ela foi criada pelos editores da enciclopédia Delta Larousse, Abrahão Koogan e Pedro Lorsch, além de Sérgio e Simão Waissman, tendo como diretor Nahum Sirotscky e apoiada por Paulo Francis, Luiz Lobo e Jaguar. Com projeto gráfico do artista plástico Carlos Scliar, a revista se inspirava na edição cinematográfica para compor páginas que eram verdadeiros cenários para os textos literários que abrigava, de escritores como Clarice Lispector, por exemplo. Ela foi o melhor exemplo da nova influência europeia do desenho de revistas, como a Harper's Bazaar de Alex Brodovitch.

Revolucionária, desbravou o segmento do jornalismo masculino mais de duas décadas antes da revista Playboy, vendendo a imagem do viver bem e o viver com prazer, isso através da produção de grandes matérias culturais e da introdução de ensaios com mulheres sensuais (para a época), impressas em um papel de qualidade e alta gramatura.

A revista retratava o surto de modernidade pelo qual o Brasil passava no final dos anos 50, culminando em uma revista sem rótulos. Era uma revista masculina, intelectualizada e hedonista.

Ela passou pelas mãos de três proprietários; na segunda direção, a partir de 1962, foi chefiada por Odylo Costa Filho. Afetada pelo fim do protecionismo do papel-jornal em 1962, definhou até acabar em janeiro de 1964, quando os últimos gestores não conseguiram sustentá-la por um ano. Mesmo assim, tornou-se uma escola de influência para outras revistas que seriam lançadas em seguida.

A Editora Abril e o Jornalismo de Impacto: Realidade e Veja

A Editora Abril iniciou suas atividades publicando o gibi do Pato Donald, em 1950, capitaneada por Victor Civita, apenas um ano após ter chegado no Brasil. Lançou Capricho, em 1953, e Quatro Rodas, em 1960, quando o Brasil tinha apenas 500 km de estradas asfaltadas. Apoiada inicialmente pela Volkswagen, que injetava muita publicidade na revista, ela quase acabou meses depois quando a revista publicou em matéria de capa um novo carro da montadora, até então secreto, perdendo seus anúncios.

Mas o grande crescimento da editora aconteceu em 1958, quando seu filho, Roberto Civita, retornou ao país depois de uma série de estágios em empresas jornalísticas no exterior. Ele aportou com o objetivo de fundar três revistas a partir de exemplos bem-sucedidos no exterior: Playboy (revista masculina), Fortune (economia) e Time (semanário de informação).

Outros projetos, no entanto, seriam criados primeiro, como Manequim e, principalmente, a revista Realidade.

A revista foi lançada em 1966 e tinha como objetivo editorial abordar todos os tabus que estavam sendo postos à prova nos anos 60 e, segundo a versão oficial da Abril, durou o tempo em que esses tabus foram superados, em 1976. Na verdade, porém, a publicação, que desde o primeiro número se tornou a estrela do jornalismo brasileiro, precisava morrer, já que os esforços da editora seriam direcionados à Veja. Recentemente, em um caderno especial de uma republicação da revista proibida em 1967, a editora considera que a decadência da Realidade se deveu, além da Veja, ao AI-5.

A revista, cujo projeto gráfico editorial foi desenvolvido por Paulo Patarra, contava com um grande grupo de jornalistas, dentre os quais se destacava José Hamilton Ribeiro, repórter que perdeu a perna ao pisar em uma mina no Vietnã e escreveu uma das mais memoráveis reportagens da história brasileira. A revista também trouxe ao Brasil o estilo jornalístico mais importante surgido no século XX: o Jornalismo Literário, ou Jornalismo de Autor, conhecido no exterior como New Journalism.

Esse tipo de texto caracterizava-se pela reintrodução da narração e pela reaproximação com o trabalho literário, como a crônica, mas com a valorização da figura do repórter que, ao contrário do cronista, escrevia suas matérias totalmente focado na realidade.

Embora originária dos anos 60, tinha como base o realismo social do século XIX, com Charles Dickens e Honoré Balzac, quando uma grande pesquisa em relação aos ambientes a serem retratados em uma narrativa ficcional passou a ser empregada na narrativa.

Os jornalistas que, em seguida, aplicaram essas técnicas ao texto jornalístico, apenas mudaram o foco da narrativa da ficção para a própria realidade que servia de pesquisa. Nomes como Ernest Hemingway, John Reed, Lillian Ross, Joseph Mitchell e A. J. Liebling, ou mesmo no Brasil com Joel Silveira, formaram um grupo que realizou matérias que, com o tempo, foram chamadas de jornalismo literário, isso durante os anos 20, 30 e 40.

O New Journalism, dessa forma, atualizou o jornalismo literário, introduzindo técnicas do romance moderno do século XX, como o fluxo de consciência desenvolvido por James Joyce em Ulisses. Mas, acima de tudo, o estilo surgiu como reação do jornalismo ao crescimento da televisão, que obrigou todos os meios a se adaptarem. Assim, a figura do autor, da mesma forma como aconteceu no cinema aplicado à figura do diretor, tornou-se intrínseca aos textos desse estilo, tanto em sua forma estilística quanto mercadológica.

Nomes como Gay Talese, Truman Capote, Gore Vidal e Tom Wolfe inspiraram a geração que produziu a revista Realidade.

Suas matérias ocupavam várias páginas, indo na contramão da tendência de compactação da notícia forçada pelas crises do papel, e, mesmo assim, eram avidamente lidas por seus leitores. Dessa forma, a revista se propunha a fazer um jornalismo opinativo, não só em termos de textos, mas também graficamente, com a produção do maior conjunto de capas de qualidade que qualquer publicação nacional já havia produzido, espelhando-se na revista Senhor que havia encerrado suas atividades dois anos antes de seu lançamento.

A partir de 1968, Roberto Civita iniciou seus planos. O primeiro passo foi a criação da revista Veja. Anos mais tarde, lançaria a Exame, em 1971, e a Playboy brasileira, em 1975.

A revista teve uma tiragem inicial ousada de 700 mil exemplares no primeiro número, sendo que o pico recorde de O Cruzeiro era de 720 mil. Depois, caiu vertiginosamente, permanecendo anos no vermelho. Inicialmente, a revista era de alinhamento mais à esquerda e, em sua primeira fase, que vai até dezembro de 1969, publicou dois números abordando o tema da tortura. Após essa última edição, a de número 66, muitos jornalistas foram afastados e houve uma guinada editorial. Forçada pelas apreensões dos números 15, 65 e 66 e por uma ameaça direta feita por um ministro em Brasília, a revista perdeu seu impacto inicial. Esse fato é relatado por Italo Tronca, jornalista revelado no meio estudantil e então redator de política nacional.

Alguns dias depois, Victor Civita foi chamado a Brasília para falar com o Ministro da Justiça Alfredo Buzaid. Ele recebeu uma ameaça direta de mudar a linha editorial e tomar alguma atitude que de alguma forma compensasse o atrevimento da edição 66. Nós perdemos o nosso editor, que na época era Raimundo Pereira, e quinze dias depois aparecemos com uma matéria de capa com o Sr. Filinto Müller, que na época era senador [torturador da época de Getúlio], cultivando rosas, uma matéria puramente apologética.

A Setorização das Revistas e o Legado dos Anos Dourados

O ciclo que se iniciou nos anos 50 também marcou o início da setorização das revistas, ou seja, títulos específicos voltados a públicos específicos, uma característica que se tornou geral no mundo todo.

Nessa época, surgiram títulos duradouros como:

  • Visão (1952-1993)
  • Você (1956-1959)
  • Cláudia (1961)
  • Placar (1970)
  • Exame (1971)
  • Nova (1973)
  • IstoÉ (1973)

e muitas outras.

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