Bactérias Gram-Positivas: Guia de Gêneros e Patologias
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Bactérias Gram-Positivas
Staphylococcus sp.
Descritas por Robert Koch em 1878 e cultivadas por Louis Pasteur em 1880.
Características Gerais (Família Micrococcaceae)
- Forma: Esférica (são cocos), com cerca de 1 micrômetro de diâmetro, agrupados em "cachos de uva".
- Coloração de Gram: Roxos (positivos), devido à sua membrana simples e parede celular de peptidoglicano grossa, constituída por mureína, ácido teicoico e polissacarídeos.
- Metabolismo: Aeróbios, anaeróbios facultativos ou anaeróbios através de fermentação.
- Motilidade: Sem flagelos ou cílios.
- Temperatura: Mesófilos.
- Habitat e Cultivo: Amplamente disseminados e pouco exigentes nutricionalmente, o que facilita o cultivo.
Existem 33 espécies, das quais 11 infectam o homem, sendo a única primariamente patogênica a S. aureus. Das outras 10, as mais conhecidas são S. epidermidis e S. saprophyticus.
O critério para classificação das espécies é o DNA. Dentro das espécies, há subdivisões em sorogrupos (características antigênicas) e biogrupos/biotipos (características bioquímicas/biológicas).
Staphylococcus aureus
Forma colônias amarelas em ágar. Faz parte da flora normal de humanos, encontrado no conduto nasal, pele e mucosas. Causa infecções supurativas (piogênicas) e choques toxêmicos.
Bioquímica
- Fermenta glicose, produzindo ácido lático.
- Fermenta manitol (diferente de S. epidermidis).
- Catalase positiva.
- Coagulase positiva.
Características Especiais
- Virulência: Elevada capacidade de causar doença.
- Diferenciação: Causa doenças diferentes em locais diferentes, por mecanismos e cepas distintas.
- Persistência: Sobrevive no ambiente e em animais.
- Resistência: Resistente a vários antibióticos.
Cerca de 50% das pessoas que não trabalham em hospitais possuem S. aureus em suas mucosas e pele, principalmente na nasal.
Estrutura e Fatores de Virulência
- Parede Celular: Parede espessa de mucopeptídeo, resistente à dessecação.
- Cápsula: Camada de ácido hialurônico (camada mais externa) que impede a fixação de células do sistema imune. Não é antigênico.
- Proteína A: Ligada ao peptidoglicano, é um importante fator de virulência. É a proteína majoritária da parede celular e liga-se fortemente à porção Fc da IgG, evitando a ativação do complemento e funcionando como uma proteína antifagocitária.
Enzimas
- Catalase: Impede a produção de radicais oxidantes e a digestão intracelular.
- Coagulase: Promove a produção de fibrina, envolvendo a bactéria como uma carapaça (ex: furúnculo).
- Fibrinolisina (Estafiloquinase): Lisa depósitos de fibrina, atuando como fator de disseminação e virulência.
Toxinas
A capacidade de produção de toxinas geralmente vem de plasmídeos, e não do cromossomo bacteriano.
- Exotoxina Alfa: É extracelular, leucocida, dermonecrótica e tem efeito citotóxico.
- Enterotoxina: Causa quadros de intoxicação alimentar com vômitos e diarreia líquida sem sangue. Estimula a liberação de IL-1 e IL-2. É termoestável (não desnatura com o calor). Existem 6 tipos sorologicamente diferentes (A a F). A ingestão de alimento cozido contendo a toxina causa intoxicação, não infecção. Os sintomas cessam após a metabolização da toxina.
Outros Fatores de Virulência
- Peptidoglicano: Possui atividade de endotoxina, estimulando febre e vasodilatação excessivas pela produção de citocinas.
- Ácidos Teicoicos: Servem para ancorar a bactéria, impedindo que seja arrastada por fluidos corporais.
Cultivo e Resistência a Antibióticos
Cultivo: Forma colônias grandes e lisas em 24 horas.
Resistência:
- Penicilina: O uso indiscriminado levou à seleção de cepas resistentes (99% em hospitais, 60% fora).
- Meticilina: Uma penicilina resistente à penicilinase, mas a resistência também aumentou com o tempo.
- Vancomicina: Já existem bactérias resistentes.
- Melhor escolha: Cefalosporinas.
Outras Espécies de Staphylococcus
S. saprophyticus
- Segundo agente etiológico mais comum de infecção urinária em mulheres adultas.
- Não é considerado patogênico primário.
- Possui moléculas de adesão para a uretra.
- Faz parte da flora normal da vagina.
S. epidermidis
- Faz parte da flora normal da pele.
- É oportunista, afetando principalmente pacientes com SIDA e imunossuprimidos.
- Pode causar endocardite subaguda em indivíduos com lesão cardíaca.
- Adere a próteses e cateteres plásticos.
Listeria sp.
Espécies
L. monocytogenes, L. ivanovii, L. innocua, L. seeligeri, L. welshimeri, L. gravy.
L. monocytogenes e L. ivanovii causam em humanos e animais: septicemia, aborto e infecções do Sistema Nervoso Central.
Morfologia
- Bastonetes pequenos (redondos) ou cocoides (pequenas cadeias).
- Não esporulados.
- Móveis (flagelos peritríquios) em temperaturas inferiores a 37°C.
- Anaeróbios facultativos.
- Colônias translúcidas e acinzentadas em ágar.
Bioquímica
- Lactose + (sem formação de gás)
- Catalase +
- Oxidase -
- Indol -
- H2S -
- Cresce em pH alcalino (5,5 a 9,6) e temperaturas de 30-37°C.
Listeriose Humana
Ocorre mais no verão e em áreas urbanas. Há relatos de dermatite listérica em veterinários por contato com fetos abortados. A fonte de infecção pode ser leite, queijos e repolhos. O crescimento seletivo ocorre durante a refrigeração de alimentos.
Patogenia
Pode causar meningite, endocardite, dermatite, aborto, infecções perinatais, septicemias e meningoencefalites.
Diagnóstico
Tratamento
- Penicilina
- Ampicilina
- Eritromicina
- Tetraciclinas
- Rifampicina
Combinações como Penicilina + Sulfonamidas + Tetraciclinas no início do tratamento, ou Penicilina + Gentamicina para potencializar o efeito bactericida, podem ser utilizadas.
Corynebacterium spp.
São descritas 101 espécies.
Morfologia e Cultivo
- São pequenos bastonetes (cocoides ou filamentosos).
- No Gram, organizam-se em formato de "letras chinesas".
- Produzem ácido (lático) sem gás e fermentam açúcares como glicose e maltose.
- Não esporulados.
- Catalase positivo e oxidase negativo.
- Anaeróbios facultativos.
- Necessitam de soro ou sangue para cultivo.
- Imóveis.
Corynebacterium diphtheriae e a Difteria
Causa a difteria, doença rara devido à imunização, tendo o homem como único hospedeiro. A difteria é uma doença infecciosa aguda, de notificação compulsória, caracterizada pela presença de uma pseudomembrana na árvore respiratória, que pode produzir sintomas sistêmicos pela ação de uma exotoxina.
Antes da vacina, era uma das maiores causas de morbidade infantil, com letalidade de 5% a 10%. A transmissão ocorre por gotículas de secreção respiratória.
Patogenia
A bactéria multiplica-se localmente no nariz, amígdalas, faringe e laringe. O período de incubação é de 1 a 6 dias. Sem tratamento, a transmissibilidade varia de duas a quatro semanas.
Sintomatologia
- Febre baixa, anorexia e mal-estar.
- Formação de pseudomembranas aderentes, de coloração branco-acinzentada.
- Odor fétido característico, relacionado à necrose.
- Comprometimento acentuado do estado geral (prostração e palidez), devido à toxemia.
Epidemiologia
Em 1990, foram confirmados 640 casos no Brasil; em 2001, apenas 19. A letalidade varia de 5% a 10%. No Estado de São Paulo, observa-se um deslocamento para faixas etárias maiores de 15 anos.
Diagnóstico
O diagnóstico é confirmado por cultura positiva de material coletado de naso e orofaringe. A cultura demanda, em média, sete dias, mas o tratamento não deve aguardar o resultado. Com a cepa isolada, realiza-se a prova de toxigenicidade in vitro (prova de Elek).
Tratamento
O tratamento específico é o soro antidiftérico (SAD), que pode causar complicações como choque anafilático. O uso de antibióticos (Penicilina ou Eritromicina por 14 dias) é uma medida auxiliar para interromper a produção da toxina e diminuir a transmissibilidade.
Actinomyces sp.
Características Gerais
- Forma filamentos em tecidos (semelhante a fungos), mas fragmenta-se em formas de cocos e bacilos.
- Anaeróbias e mesófilas.
- Crescimento lento.
- Habitantes da cavidade oral.
Diagnóstico
Realizado por coloração de Gram em material purulento, culturas anaeróbias (10% CO2) por 2 semanas e histopatologia.
Manifestações Clínicas
- Invasão: Cérvico-facial, abdominal, torácica (inalação) ou disseminada (cérebro).
- Histopatologia: Edema, fístula, esclerose, fibrose e presença de "grânulos de enxofre" no material purulento.
Tratamento e Controle
O tratamento é feito com Penicilina. O controle envolve boa higiene dental e quimioprofilaxia.
Nocardia sp.
Características Gerais
- Formas filamentosas em meios líquidos.
- Aeróbias.
- Fracamente álcool-ácido resistentes.
- Crescem em variações de temperaturas.
- As infecções ocorrem por inalação ou contaminação do solo.
Diagnóstico
Realizado por coloração de Gram, coloração de Ziehl-Neelsen (com ácido fraco) e cultura aeróbia (mínimo 1 semana). A diferenciação de espécies é feita por provas bioquímicas.
Nocardiose: Habitat e Clínica
A nocardiose é uma infecção causada pela bactéria Nocardia asteroides, que se inicia nos pulmões e pode se propagar para a pele e cérebro.
Habitat: Matéria em decomposição (terra). A bactéria penetra nos pulmões ao respirar ar contaminado.
Clínica: A infecção é inicialmente pulmonar (pneumonia), com sintomas como tosse, debilidade, calafrios, dor no peito, febre e perda de peso. Pode se propagar pela corrente sanguínea, provocando abscessos no cérebro, rins e pele.
Prognóstico e Tratamento
A nocardiose pode ser mortal, mesmo com tratamento. O prognóstico é melhor se a infecção estiver localizada apenas nos pulmões e desfavorável para pacientes imunossuprimidos ou com HIV.
Tratamento: A penicilina é eficaz em apenas 40% dos casos. A sulfadiazina pode ser eficaz, mas requer tratamento de vários meses. Para alguns pacientes, apenas a amicacina é benéfica.