Citação e Intimação no Processo Penal Brasileiro: Análise Completa
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O presente trabalho destina-se, inicialmente, a apresentar as várias formas de citação no processo penal brasileiro, normatizadas entre os artigos 351 e 369 do Código de Processo Penal e, sucintamente, abordar as consequências da contumácia do réu citado por edital com a redação dada ao artigo 366 do CPP, após a vigência da Lei nº 9.271/1996.
Em princípio, tem-se a dizer que a citação é o ato judicial pelo qual a parte acusada formalmente conhece da demanda judicial, ou seja, toma a devida noção da demanda pleiteada em face da sua pessoa.[01] Devido à sua importância, a citação deve ser cumprida em seus estritos termos formais para que, de nenhuma forma, seja prejudicado o direito à defesa, assim, eivando o ato de vício, o que pode gerar sua nulidade.
O ato citatório no processo penal é uno e único. Diferentemente do processo civil, não há nova citação na fase de execução da sentença[02], salvo na hipótese de condenação em pena de multa conforme dispõe o art. 164 da Lei de Execuções Penais. A execução é uma outra fase do processo ou, como diz Vicente Greco, "um procedimento complementar à sentença, com incidentes próprios".[03]
Quando se tratar de pessoa jurídica, a citação da parte ré será dada, exclusivamente, na pessoa do seu representante legal.[04]
Por se tratar de ato pessoal, a citação no processo penal não admite ser executada em pessoa diversa do réu. Outra hipótese vedada é a citação por hora certa, admissível no processo civil. No entanto, quando se tratar de réu doente mental, admite-se a citação na pessoa do seu curador especial. Se a doença já for do conhecimento do juízo, a citação será feita na pessoa do curador. Se a enfermidade for notada pelo oficial de justiça, este descreverá o fato em certidão no mandado, devolvendo-o ao juízo. De ofício, ou a requerimento do Ministério Público, cônjuge, irmão ou parentes, o juiz procederá ao exame mental. Sendo declarado deficiente mental, ser-lhe-á nomeado curador e promovida a citação.[05]
No que diz respeito à redação dada ao artigo 366, caput, do CPP, após a Lei nº 9.271/96, vê-se, apesar do tempo transcorrido, calorosas discussões doutrinárias, ensejando três vertentes interpretativas quanto à aplicação intertemporal desta lei. Diga-se de passagem que, infelizmente, ante a morosidade da justiça brasileira, vários são os processos que ainda tramitam, mas que foram iniciados antes da nova redação. Esse é um dos motivos pelos quais este tema é tratado neste trabalho.[06]
Espécies de Citação
Ditas as primeiras palavras sobre a citação, distinguimos suas modalidades. A primeira diferenciação é feita entre a citação pessoal (ou real) e a ficta (ou presumida). A primeira é a regra geral no processo penal, enquanto a segunda só é realizada por edital, vedada a modalidade de citação por hora certa. Mais um comentário deve ser feito. Mesmo já estando ciente da denúncia que lhe é proposta, o indiciado, mesmo assim, deve ser citado. Isso porque, muitas vezes, o réu já tem conhecimento do processo antes mesmo de ser formalmente citado.[07]
Por Mandado
É a espécie de citação mais utilizada. Será citado por mandado, cumprido por oficial de justiça, o réu que residir na comarca do juízo processante. É uma ordem escrita do juízo para que o oficial cumpra a determinação expressa no mandado. Se, mesmo na comarca do juízo, o réu for militar, a citação far-se-á conforme o art. 358 do CPP, por intermédio do chefe de serviço. Outros detalhes serão analisados mais adiante.
O mandado deve ser cumprido de acordo com as formalidades legais para que alcance o seu máximo e importante objetivo, dar conhecimento ao réu da propositura de uma ação contra sua pessoa. Essas formalidades estão previstas no art. 352 do CPP, também chamadas pela doutrina de requisitos intrínsecos ao mandado[08], são eles:
- o nome do juiz;
- o nome do querelante nas ações iniciadas por queixa;
- o nome do réu, ou, se for desconhecido, seus sinais característicos;
- a residência do réu, se for conhecida;
- o fim para que é feita a citação;
- o juízo e o lugar, o dia e a hora em que o réu deverá comparecer;
- a subscrição do escrivão e a rubrica do juiz.
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Além desses, o CPP traz expressos os requisitos de execução (ou extrínsecos) do mandado, no seu art. 357, a saber:
- a leitura do mandado ao citando pelo oficial e entrega da contrafé, na qual se mencionarão dia e hora da citação;
- declaração do oficial, na certidão, da entrega da contrafé, e sua aceitação ou recusa.
Sobre a formalidade da citação, o Tribunal de Alçada Criminal de São Paulo já proferiu o seguinte: "A citação do réu, por se tratar de requisito essencial e um dos mais importantes atos processuais, em homenagem aos princípios constitucionais da justiça penal, deve conter as rigorosas e indeclináveis formalidades, porque de sua eficácia resultam, como corolários, a plenitude da defesa e o contraditório".[09]
O mandado de citação pode ser cumprido em qualquer dia da semana, finais de semana, e nos feriados. De manhã ou à noite.[10]
Por Carta
1. Precatória
Ocorre na hipótese de o réu não se encontrar na comarca do juízo. A carta respeitará os requisitos do artigo 354 do CPP e, ao chegar ao juízo deprecado, este fará o "cumpra-se" para que seu escrivão expeça o mandado e o oficial da comarca realize a citação. Se o oficial observar que o réu se oculta para não receber a citação, a carta será devolvida ao deprecante para que se determine a citação por edital, conforme o art. 362 do CPP.
De imediato, cabe aqui um comentário: os requisitos intrínsecos do mandado estão dispostos no Capítulo I do Título X do CPP, antes mesmo da carta precatória e dos requisitos de execução do mandado, por se tratarem de requisitos genéricos à citação. Ou seja, os requisitos do art. 352 daquele código também devem ser obedecidos em requisições e ofícios.[11]
Quanto aos requisitos da precatória, especificamente, estes estão dispostos no art. 354 do CPP. São eles:
- o juiz deprecante e o juiz deprecado;
- a sede da jurisdição de um e de outro;
- o fim para que é feita a citação com todas as especificações;
- o juízo do lugar, o dia e a hora em que o réu deverá comparecer.
Tratando-se do cumprimento da precatória, se o oficial do juízo deprecado verificar que o réu reside em outra comarca, havendo tempo hábil entre a citação e a data da ordem expressa no mandado, o juízo deprecado pode enviar a carta a outra comarca. É a técnica do § 1º do art. 355 do CPP, conhecida como "precatória itinerante".
Em regra o mandado é expedido pelo escrivão do juízo deprecado para ser cumprido por oficial lotado naquela comarca. No entanto, em caso de urgência, a carta pode ser expedida por telegrama ou por telefone, nesta hipótese, desde que haja firma reconhecida do juiz deprecante. A regra quanto ao uso de telefone é baseada no comando do art. 207 do CPC. Este dispositivo admite a citação por telefone, em casos de urgência, respeitando-se os requisitos ali contidos, segundo a regra de aplicação analógica das leis no processo penal (art. 3º do CPP).
Uma questão trazida por Fernando da Costa Tourinho Filho, em seu "Processo Penal", é quanto à possibilidade de o réu ser interrogado no juízo deprecado, e em quais circunstâncias. Parte da doutrina, à qual o referido autor se filia, sob o argumento de que o juiz que interroga, em vários casos, não é o que julga; e o que julga, geralmente, não é o que executa; e, ainda, defendendo inexistir, no processo penal, o princípio da identidade física do juiz, admite que o juiz deprecado possa interrogar o réu, desde que esteja em posse de cópias das peças instrutórias do processo (inquérito e documentos). Deve-se atentar ao fato de que é sempre recomendável ao juiz verificar, no interrogado, sua fisionomia, seus aspectos visuais e psicológicos, condutas e comportamentos nos momentos do interrogatório. Porém, nos dias atuais, é corriqueira a alternância de juízes criminais nas titularidades das Varas. Assim, segundo Tourinho, ressente-se de argumentos sérios a impossibilidade de o juiz deprecado fazer o interrogatório.[12]
2. De Ordem
A carta de ordem é a determinação de um órgão de grau superior para que um órgão jurisdicional inferior, a ele jurisdicionalmente vinculado, cumpra a citação em seu âmbito de competência. Em casos de competência por foro especial, em razão do cargo que exerce o réu, se ele for processado, por exemplo, por um Tribunal Superior em Brasília, mas reside em Recife, o STJ ordenará que o Tribunal de Justiça de Pernambuco cumpra a determinação. Em regra, são ordens expedidas pelo STF, STJ, TSE, TREs, TRFs ou Tribunais de Justiça estaduais, nos processos de sua competência originária.
3. Rogatória
A carta rogatória é o instrumento pelo qual o juízo competente no Brasil solicita ao Itamaraty as vias diplomáticas para que se efetue a citação de indiciado residente no exterior (art. 368 do CPP) e em legações estrangeiras (art. 369 do CPP). Pode ocorrer de o sistema normativo de outro país não admitir esse tipo de expediente e, consequentemente, não realizar a citação do réu. Existindo esse fato, sendo impossível a citação por rogatória, a doutrina e a jurisprudência entendem que a citação deve ser realizada por edital, com base no art. 363, I, do CPP.
Por Edital
Conhecida como citação ficta, citatio edictalis. Diferentemente do CPC, esta é a única citação presumida aceita no processo penal. Naquele, há a citação por hora certa. A citação por edital é o último meio de que o juízo deve lançar mão para que se efetue a citação. Antes dela, devem ser procedidas buscas no endereço dado pelo réu, quando prestou depoimento à autoridade policial, ou verificações nos cadastros junto à Justiça Eleitoral e demais órgãos.
Geralmente a certidão dos oficiais no mandado vem com a seguinte expressão, quando não cumpridos: "e, pelo que pude apurar, está ele em lugar incerto e não sabido."
Quando efetuada a citação editalícia e decorrido o prazo para resposta, entende-se que o réu é ignorante quanto à tramitação de um processo contra sua pessoa. Assim, o processo fica suspenso até que o acusado tome conhecimento. No entanto, este expediente não será usado para premiar a astúcia do réu que consegue ficar foragido por muito tempo, esperando a prescrição do crime. Assim como o processo, a prescrição também é suspensa, na hipótese de citação por edital (art. 366 do CPP). Esse assunto será mais bem analisado adiante.
Outra situação que leva à citação por edital é a regra do art. 362 do CPP. Se o oficial tiver segurança de que o réu, propositadamente, oculta-se para não receber a citação, certificará o fato no mandado para que o juízo expeça edital de citação com prazo de 5 dias.
Já nos casos do artigo 363 do Código de Processo Penal, os prazos para o edital serão dados de acordo com o fato e a prudente análise do juiz. Na primeira hipótese, se, em casos de "epidemia, de guerra, ou outro motivo de força maior", o local ficar inacessível, o juiz estabelecerá prazo de 15 a 90 dias para a resposta ao edital. Na segunda hipótese, em casos de pessoa incerta, o prazo será de 30 dias.
É certo que não se pode promover ação penal contra pessoa que não se sabe quem seja. Assim, a expressão contida no art. 363, II, do CPP, "incerta a pessoa", obviamente, não pode se referir à pessoa absolutamente desconhecida. É necessária, ao menos, a qualificação do acusado ou esclarecimentos pelos quais possa ser identificado: marcas no rosto, cicatrizes, tatuagens, queimaduras...
Atente-se para o fato de que o prazo para a revelia começa a contar da data da publicação do edital em jornal oficial ou em jornal de grande circulação, se houver. Em ambas as hipóteses do art. 363, caso o réu não se manifeste nem constitua advogado, o processo e a prescrição ficam suspensos.
Cumpridas as formalidades previstas no art. 365 do CPP, o edital será afixado no local usual do fórum, onde se expõem os editais de citação. Caso na comarca exista jornal de grande circulação ou jornal oficial, o escrivão providenciará a publicação de uma via. Se não existir ou não houver verba destinada para tanto, a fixação do edital no átrio do fórum já é o bastante. A jurisprudência vem admitindo a necessidade de publicação de edital em jornal apenas quando ele exista na comarca e, se existir, quando o Poder Judiciário mantiver verba destinada a esse fim.[14] Evidentemente, o serventuário deverá certificar tudo nos autos: a fixação do edital no átrio do fórum e a publicação no jornal, caso haja.
Em todas as hipóteses em que o réu não se apresenta, quando citado por edital, e o processo e a prescrição ficam suspensos, o juiz poderá nomear defensor dativo para que fiscalize, junto com o Ministério Público, a antecipação da produção de provas, quando necessárias e urgentes. Esta é a regra do art. 366, caput, do CPP, que ainda prevê a possibilidade de decretação de prisão preventiva, "nos termos do disposto no art. 312" (do Código de Processo Penal).[15]
Espécies de Citação Quanto à Natureza e à Localidade do Citando
Militar
Ocorre esta modalidade de citação apenas quando o militar está na ativa. A citação será feita por meio de requisição ao chefe do serviço em que atua o militar. O serviço prestado deve ser na comarca do juízo. A requisição é feita por expediente de ofício. Assim, recebido o ofício, a autoridade militar certificará o juízo e encaminhará a citação ao subordinado. Se este residir ou estiver prestando serviço temporariamente fora da comarca, caberá ao juiz expedir carta precatória para que o juízo deprecado oficie a autoridade militar daquela comarca para a realização da citação. É prevista no artigo 358 do Código de Processo Penal.
Funcionário Público
A citação de funcionário público tem apenas uma peculiaridade. Será feita mediante mandado, cumprido por oficial de justiça, que também encaminhará notificação ao chefe da repartição do funcionário, comunicando a citação e a obrigação de comparecimento em juízo. A notificação tem o fim de preservar o bom andamento do serviço público, sem interrupções, possibilitando ao chefe da repartição tomar as medidas cabíveis quanto à ausência de um serventuário, cumprindo o princípio administrativo da continuidade do serviço público. É prevista no artigo 359 do CPP.
Se o funcionário trabalha em outra comarca, caberá ao juízo deprecado expedir o mandado e a notificação cumpridos por oficial de justiça de sua jurisdição.
Preso
A citação é feita pessoalmente ao preso, por mandado. É a nova redação dada pela Lei nº 10.792/2003 ao art. 360 do CPP. Porém, o oficial também leva requisição ao diretor do presídio para que o acusado compareça em juízo no dia e hora marcados. Objetiva-se dar margem para o diretor poder organizar as visitas dos acusados ao fórum. Se preso em outra comarca, o juízo deprecado encaminhará mandado e requisição ao réu e ao diretor do presídio naquela comarca, respectivamente, procedendo-se, então, conforme a regra do art. 360 do CPP.
Réu no Estrangeiro
Se conhecido o lugar onde o acusado esteja, a citação far-se-á mediante carta rogatória, independentemente da infração penal ser afiançável ou não. Cabe ressalvar a suspensão do prazo prescricional enquanto a rogatória não for devidamente cumprida. Ocorre apenas na hipótese de o réu estar em local certo (cidade) e sabido (bairro, rua, número) fora do país, pois, caso se encontre em local incerto, a citação é por edital.
Legações Estrangeiras
Ocorre quando a citação deve ser cumprida em embaixada ou consulado estrangeiro. O procedimento a ser adotado pelo juiz é o seguinte: envia-se, acompanhando a citação na carta rogatória, um ofício dirigido ao Ministro da Justiça, que por sua vez dará ciência da citação ao Ministro das Relações Exteriores. A este caberá tomar as vias diplomáticas para que se providencie, junto às legações, a citação do acusado. Tratam-se de pessoas que trabalham ou residem nas embaixadas e consulados, mas que não têm nenhuma imunidade material ou formal. Estes locais são considerados território estrangeiro.[16]
O referido procedimento deve ser cumprido em homenagem à soberania dos países representados. Para Tourinho, a citação nestes casos não suspende o curso da prescrição, uma vez que a maioria das embaixadas e consulados estrangeiros encontram-se localizados em Brasília.[17]
Efeitos da Citação e Revelia
No processo civil, o recebimento da petição inicial e a citação válida do réu "torna o juízo prevento, induz litispendência e faz litigiosa a coisa; e, ainda, quando ordenada por juiz incompetente, constitui em mora o devedor e interrompe a prescrição".[18] De outro modo, com a citação penal realizada, seu efeito é a instauração da instância processante. Os deveres e ônus processuais também só serão aplicáveis com a citação válida, com a qual "estabelece-se a angularidade da relação processual".[19] A prevenção do juízo no processo penal já ocorre antes da citação, com a prática de um ato processual mesmo anterior à denúncia ou queixa. Quanto à prescrição, a citação também não é termo interruptivo, uma vez que o recebimento da ação penal (art. 117, I, CP) já a interrompe.
Nos termos do art. 570 do CPP, a falta ou nulidade de citação é sanada com a presença do réu, pessoalmente, desde que antes do término do prazo para o qual foi citado ou intimado. Assim procedendo, o juiz poderá suspender ou adiar o ato para o qual o réu foi chamado, caso note que a falta ou nulidade ocasionou prejuízo à defesa.
Outrossim, com a perfeita citação do indiciado, e este não cumprindo a determinação judicial, decreta-se sua revelia. O art. 367 do CPP trata das hipóteses de revelia. De três maneiras o réu será revel:
- se não comparecer em juízo para responder a denúncia no prazo legal;
- se estiver ausente de sua residência por mais de 8 dias sem comunicar ao juiz processante;
- se mudar de residência, na mesma hipótese anterior.
Réu Contumaz Citado por Edital: Lei 9.271/96, Natureza Jurídica e Correntes Doutrinárias. Prazo de Suspensão do Processo
O Código de Processo Penal não pune severamente o réu revel, prejudicando assim o direito de defesa. Isso porque ele estabeleceu regra segundo a qual, mesmo sendo revel, o acusado nunca será condenado sem antes ser ouvido. Com a regra do art. 366 do estatuto referido, alterado pela Lei nº 9.271/96, assim como na prescrição, o processo estará suspenso enquanto não encontrado o agente do crime. Todavia, este dispositivo não é isento de crítica, uma vez que, por exemplo, pode ocorrer a reabertura de um processo por crime ínfimo, após passados dezenas de anos, sem que este crime surta mais alarde e repulsa social, tenha caído no esquecimento e ainda podendo ocorrer o perecimento das provas. Um ponto específico deve ser frisado. Na hipótese do réu estar afiançado, e este ser declarado revel, as consequências podem ser ainda mais severas. Nessa hipótese, como preveem os artigos 327, 328 e 343, todos do CPP, a fiança será dada como quebrada e o réu obrigado a recolher-se à prisão.
Observam-se na doutrina três correntes doutrinárias no que diz respeito à aplicação intertemporal da Lei 9.271/96. A que confere aplicação retroativa de todo o conteúdo da lei, mesmo aos processos anteriores à sua vigência; a que confere aplicabilidade parcial, ou seja, aos processos iniciados antes da vigência da lei, aplica-se a suspensão do processo, mas não a suspensão da prescrição; e a mais defendida no direito pretoriano, de que a lei é irretroativa, não se aplicando qualquer comando dela aos processos anteriores à sua vigência.
A vertente que se posiciona pela retroatividade total da lei entende que o legislador, ao mesmo tempo em que concedeu norma mais benéfica ao réu (suspensão do processo), também concedeu norma de segurança à coletividade (suspensão da prescrição), garantindo a punibilidade do crime. Logo, para os que defendem tal corrente, a aplicação parcial da lei, além de cingi-la (finalidade que não foi objetivo do legislador), conferiria desequilíbrio entre as partes.[20]
Para a corrente que defende a irretroatividade da Lei 9.271/96, os dispositivos da referida lei também não podem ser aplicados separadamente, e como também tratam de matérias mais severas ao réu, segundo a previsão constitucional do art. 5º, XL, não retroagirão, salvo em benefício do réu. Mesma regra do art. 2º, parágrafo único, do Código Penal.[21]
Em razão do princípio da irretroatividade da lei penal mais severa, o STJ vem adotando posicionamento no sentido de impossibilitar a aplicação da redação do artigo 366 do CPP, com a redação dada pela Lei 9.271/96 aos crimes ocorridos antes de sua vigência:
EMENTA: RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. PROCESSUAL PENAL. IMPETRAÇÃO DO MANDAMUS CONTRA ATO JUDICIAL. EXISTÊNCIA DE ILEGALIDADE. CABIMENTO. HOMICÍDIO OCORRIDO ANTES DA VIGÊNCIA DA LEI N.º 9.271/96, QUE ALTEROU A REDAÇÃO DO ART. 366 DO CPP. NORMA DE CARÁTER DÚPLICE: PENAL E PROCESSUAL PENAL. INADMISSIBILIDADE DECISÃO. IRRETROATIVIDADE. PRECEDENTES. [...] 2. Esta Corte tem entendimento pacificado no sentido da irretroatividade do art. 366 do Código de Processo Penal, com a nova redação dada pela Lei n.º 9.271/96, aos réus revéis que tenham praticado o delito antes da sua entrada em vigor, uma vez que não se admite a cisão da referida norma que dispõe a respeito de regra de direito processual – suspensão do processo – e de direito material – suspensão da prescrição –, já que a aplicação desta importaria em prejuízo ao réu. [...]4. Recurso provido para, cassando o despacho do Juízo de primeiro grau, determinar o regular prosseguimento do processo e do prazo prescricional, afastada a incidência retroativa do art. 366 do Código de Processo Penal, com a redação dada pela Lei n.º 9.271/96. (Grifos no original)[22]
Ante este entendimento, aos processos em curso antes de 17 de junho de 1996, data em que entrou em vigor a modificação, não seriam aplicáveis as regras do art. 366 do CPP, com a nova redação, pois a lei anterior era mais benéfica. Assim, com relação à sua aplicação, o STF se posicionou no sentido de que esta norma, mesmo sendo híbrida (processual e penal), deve ser considerada como se fosse uma regra penal para sua aplicabilidade, ou seja, não se aplica retroativamente, pois se trata de reformatio in pejus do legislador.[23]
Damásio de Jesus é o maior expoente dessa corrente. Defende ele que a possibilidade de se suspender o processo, mas não o prazo prescricional, faz a balança da justiça se desequilibrar. É como se estivesse "dando à defesa, como arma, uma metralhadora e, à acusação, um revólver calibre 32 sem balas. É como colocar os autos do processo no armário aguardando a prescrição".[24]
Por último, há os que entendem ser retroativos os comandos relativos à suspensão do processo, mas não da prescrição.[25] Conforme salienta Adilson de Oliveira Nascimento, no choque que se dá entre o devido processo legal e a ampla defesa e o contraditório, estes últimos devem prevalecer. "Ressai mais vigoroso o espírito de se garantir o exercício do direito de defesa" ante o fato de o Brasil ser signatário do Pacto de São José da Costa Rica, o qual foi recepcionado pelo Decreto nº 978/92 e este determinar a citação pessoal do acusado no processo penal.[26]
Em outras palavras, esta corrente defende que a suspensão processual contida na redação dada ao art. 366 do estatuto processual penal pela Lei 9.271/96 é aplicável aos processos iniciados antes da vigência deste diploma. Mesmo os processos com trânsito em julgado são passíveis dessa interpretação, o que denotaria a propositura de revisão criminal com a consequente colheita de novas provas, agora, com a presença do acusado.[27]
Ainda em atenção às questões suscitadas pelo art. 366 do CPP, Fernando Capez defende a tese de que a suspensão do prazo prescricional não é eterna.[28] O prazo é apenas aquele máximo estabelecido em correlação com a pena cominada em tese, ou seja, é a regra do art. 109 do CP. Assim, se o réu é dado como revel em citação por edital, acusado de crime de lesão corporal leve, a prescrição será suspensa pelo prazo máximo fixado no art. 109, V, do CP (4 anos). Ademais, também serve de argumento à tese defendida pelo ilustre penalista o fato de que a Constituição da República de 1988, expressamente, prevê os casos de crimes imprescritíveis. Art. 5º, XLII (racismo) e XLIV (ação de grupos armados contra a ordem democrática). Desse modo, não cabe à lei infraconstitucional instituir outros tipos imprescritíveis.[29]
Em obra específica e já tratada neste trabalho, Adilson de Oliveira Nascimento refere-se a um possível conflito de princípios (direitos) fundamentais onde, de um lado, colidem a isonomia e o devido processo legal e, do outro, a ampla defesa e o contraditório, indagando-se, ao término, se existiria a prevalência de um deles.[30] Pensamos que a resposta deve ser dada positivamente. Dadas as peculiaridades de cada caso em concreto e aplicando-se interpretativamente o princípio da proporcionalidade, tende-se a prevalecer a ampla defesa e o contraditório, mesmo porque os princípios norteadores do processo penal são os mesmos do direito penal: in dubio pro reo e favor rei. Assim, por meio dessa orientação, é digna a corrente que admite a aplicação retroativa da suspensão do processo e a irretroatividade da suspensão da prescrição.
Também é tema de debate na doutrina a fixação do prazo de suspensão da prescrição da pretensão punitiva. Fato que deságua na confrontação com dois elementos: a aplicação do tempo abstratamente cominado à pena (art. 109 do Código Penal) e se pelo máximo ou mínimo previsto.
Apesar da previsão de Damásio de Jesus, o qual reportava a possibilidade de existirem seis correntes interpretativas quanto à fixação do prazo de suspensão da prescrição, prevaleceu na doutrina a aplicação do tempo de prescrição segundo a pena em abstrato para se computar o tempo de suspensão do processo, conforme o art. 366 do CPP.
O que pode gerar alguma resistência doutrinária é o cálculo da suspensão sob o mínimo ou o máximo virtualmente cominado. Pensamos, com base nos preceitos constitucionais da ampla defesa e do contraditório, que a solução mais consentânea com a política criminal é a da aplicação do máximo da pena prevista abstratamente.
Desse modo conclui Adilson de Oliveira Nascimento:
Embora não se disponha o lapso de suspensão do prazo prescricional, tal omissão pode ser suprida pela interpretação teleológica, razão pela qual não se vislumbra inconstitucionalidade. É vedado ao legislador infraconstitucional estabelecer novos crimes imprescritíveis. A única disposição que se apresenta aplicável, pois, é a do art. 109 do Código Penal vigente, observando-se a pena abstrata para o delito a ser calculada tendo em vista a sanção máxima, como estabelece o citado artigo, por possibilitar um prazo maior para a satisfação do contraditório.[32]
Citação e Intimação
Em decorrência do princípio da ampla defesa, assegurado pela CF, é imprescindível que os acusados sejam cientificados da existência do processo e de todo o seu desenvolvimento.
Essa ciência é feita através da citação, em que se cientifica o acusado da imputação, e das intimações e notificações, em que se lhe comunicam os atos do processo passados e futuros.
A citação é o chamado a juízo para que o acusado se defenda na ação. É o ato processual com que se dá conhecimento ao réu da acusação contra ele intentada a fim de que possa defender-se e integrar a relação processual. (F. Marques)
No ingresso da ação penal, só o acusado, por ser o único sujeito passivo da pretensão punitiva, pode ser citado.
A citação é ato essencial do processo, imposição categórica de garantia constitucional, e sua falta é causa de nulidade absoluta do processo.
Quando não se trata de falta de citação, mas de citação incompleta, há omissão de formalidade que constitui elemento essencial do ato.
A falta ou nulidade da citação, porém, estará sanada, desde que o interessado compareça antes de o ato consumar-se, embora declare que o faz para o único fim de arguí-la.
Classificação e Efeitos
A citação pode ser real (ou pessoal, in faciem) ou ficta (presumida).
Dá-se a real quando realizada na pessoa do próprio acusado, tendo ele conhecimento de fato de seu chamamento por mandado, requisição, precatória, rogatória ou carta de ordem.
A ficta, que ocorre quando se presume que o acusado tenha tido conhecimento da imputação, é a realizada através de editais.
A citação, no Processo Penal, tem como efeito completar a instância, ou seja, a relação jurídica processual, com o surgimento da figura do réu.
Pode ainda causar a revelia se o acusado mudar de residência ou dela ausentar-se por mais de 8 dias, sem comunicar à autoridade processante o lugar onde será encontrado, ou se não comparecer ao interrogatório ou a qualquer ato do processo a que deva estar presente.
Ao contrário do que ocorre no Processo Civil, porém, não previne a jurisdição, que ocorre com a distribuição, nem interrompe a prescrição, o que ocorre com o recebimento da denúncia ou queixa e, depois disso, com a pronúncia ou sentença condenatória recorrível.
Citação por Mandado
A regra, no Processo Penal, é a citação por mandado.
A citação inicial far-se-á por mandado, quando o réu estiver no território sujeito à jurisdição do juiz que a houver ordenado. Excetuam-se dessa regra a citação do militar e aquela a ser realizada em legação estrangeira.
Os requisitos intrínsecos do mandado de citação são: o nome do juiz; o nome do querelante nas ações iniciadas por queixa (o que se exige, na verdade, são os sinais característicos do acusado quando se desconhece seu nome e qualificação); a residência do réu, se for conhecida; o fim para que é feita a citação; o juízo e o lugar, o dia e a hora em que o réu deve comparecer e a subscrição do escrivão e a rubrica do juiz. Art. 352.
Prevê o art. 357 os requisitos extrínsecos da citação, que devem ser realizados pelo oficial de justiça (a citação não pode ser efetuada pelo escrivão), são: leitura do mandado ao citando pelo oficial e a entrega da contrafé, no qual se mencionarão dia e hora da citação; certificar a entrega da contrafé e sua aceitação ou recusa. Mas a fé dessa certidão abrange apenas os fatos consignados expressamente pelo meirinho e não aqueles em cuja menção se houver omitido, a despeito da clara exigência contida no art. 357, II. Assim, se o mandado for omisso quanto à leitura do mandado ou à entrega da contrafé e sua aceitação ou recusa, formalidades essenciais à citação, há nulidade do ato de chamamento.
A citação pode ser feita em qualquer dia e a qualquer hora. Caso o oficial de justiça não encontre o citando em sua residência ou em qualquer outro endereço constante no mandado, mas obtenha informações sobre seu paradeiro, deverá procurá-lo nos limites do território da circunscrição do juiz processante e, se o encontrar, realizar a citação, fazendo constar da certidão que exarar tal circunstância. Não encontrado o citado em nenhum dos endereços, terá que consignar tal fato na certidão, declarando o acusado em lugar “incerto e não sabido”. Não se tem admitido a citação no mesmo dia marcado para o interrogatório. De outro lado, já se tem considerado válida a citação efetuada mais de 24 horas antes da data designada.
Citação por Precatória
Quando o réu estiver fora do território de jurisdição do juiz processante, deve ser citado por precatória.
Os requisitos intrínsecos da carta precatória de citação são: o juiz deprecado e o juiz deprecante (o juiz que deve receber a precatória e expedir o mandado e o juiz que a expede).
É bastante, portanto, a indicação do cargo e da comarca à qual o instrumento é enviado, como determina o inc. II, ao se referir à sede da jurisdição de um e de outro (deprecado e deprecante); o fim para que é feita a citação, com todas as especificações; e o juízo do lugar, o dia e a hora em que o réu deverá comparecer.
Evidentemente, embora não expresso em lei, da precatória deve constar o endereço do citando situado no território do juiz deprecado, ou, na ausência deste, as indicações pelas quais possa ser ele encontrado.
Recebida a precatória, o juiz deprecado exara o "cumpra-se", expedindo-se então competente mandado, a ser cumprido com todos os requisitos inerentes a essa forma de citação.
Cumprida a precatória, ela é devolvida ao juiz de origem, independentemente de traslado.
Verificado, portanto, que o réu se encontra em território sujeito à jurisdição de outro, a este remeterá o juiz deprecado os autos para a efetivação da diligência, desde que haja tempo para fazer-se a citação (precatória itinerante).
Se o acusado retornou ao território do juiz deprecante, a precatória será devolvida a este, com a certidão em que conste tal informação.
Certificado pelo oficial de justiça que o réu se oculta para não ser citado, a precatória deve ser devolvida para o fim previsto no art. 362.
A lei permite a expedição de carta precatória telegráfica.
Poderá ser expedida por via telegráfica, depois de reconhecida a firma do juiz, o que a estação expedidora mencionará.
Outras Formas de Citação
Militar:
Far-se-á por intermédio do chefe do respectivo serviço. Neste caso, o juiz não manda expedir um mandado, mas apenas um ofício em que constem todas as indicações indispensáveis ao mandado de citação. A execução compete ao chefe do serviço, que dará ao subordinado ciência de todos os termos da citação. Se por acaso o militar se encontrar fora da comarca do juiz processante, deverá ser expedida carta precatória, cabendo ao juiz deprecado proceder à sua requisição. Se o militar não comparecer ao interrogatório, embora autorizado por seu superior, deverá ser decretada a revelia. Comprovado não ter havido tal autorização, a citação não é válida, devendo ser determinada a expedição de outro ofício.
Preso:
A citação do acusado preso se faz por requisição, evidentemente, por não lhe ser possível o comparecimento sem a autorização do diretor do estabelecimento prisional. Se o réu estiver preso, será requisitada sua apresentação em juízo, no dia e hora designados. Tal disposição não exclui que ele seja cientificado da acusação por mandado.
Funcionário Público:
É citado por mandado, mas no dia designado para comparecer em juízo, como acusado, será notificado também o chefe de sua repartição. Não é, por isso, necessária tal comunicação se o funcionário estiver afastado do cargo temporariamente ou em definitivo. O disposto no art. 359 não é aplicável ao juiz de direito, visto que não se trata de “funcionário público” em sentido estrito, mas de membro do Poder Judiciário, cabendo ao citando solicitar licença ao Presidente do Tribunal para afastar-se de sua comarca.
Réu no Estrangeiro:
Estando o réu no estrangeiro, mas em lugar sabido, deve ser ele citado mediante carta rogatória.
Em obediência aos princípios da ampla defesa e do nemo inauditus damnari potest, não se permite mais a citação por edital no segundo caso. Pelo mesmo dispositivo, determina-se, no caso de citação por rogatória, a suspensão do curso do prazo da prescrição até o cumprimento da carta. Para o cumprimento da carta rogatória, são usadas as vias diplomáticas. Encontrando-se o citando em legação estrangeira, a citação também deve ser feita por rogatória, já que não se pode realizá-la por mandado.
A citação é feita por carta de ordem, ou seja, determinada pelos Tribunais nos processos de sua competência originária. É ela realizada em primeira instância pelo magistrado do local da residência do acusado que goza da prerrogativa de foro.
A citação em matéria criminal só pode ser validamente realizada pelas formas constantes no CPP.
Citação por Edital
A citação por edital (ficta) é realizada quando não é possível localizar o citando a fim de se integrar à relação processual. Foi ela instituída para impedir que, pela ação do autor da infração de mudar de residência ou ocultar-se ao meirinho encarregado da citação, a ação repressiva do Estado ficasse impedida. Haveria então uma presunção de que o acusado passasse a ter conhecimento do processo com a publicação do edital. Entretanto, por força do art. 366 do CPP, desfez-se essa presunção, impedindo-se o desenvolvimento do processo se o citado por edital não comparecer ao seu interrogatório nem constituir advogado para defendê-lo.
Como a citação é uma das mais importantes garantias processuais, porque é através dela que o acusado toma conhecimento da imputação que lhe é feita, deve ser realizada por edital apenas quando baldados todos os esforços e esgotados os meios para a efetivação do chamamento pessoal do imputado. Nos termos da lei ela só pode ocorrer quando:
- o réu não é encontrado;
- o acusado se oculta para não ser citado;
- quando é inacessível o lugar onde se encontra;
- quando é incerta a pessoa que tiver de ser citada;
- quando o citando estiver no estrangeiro em lugar não sabido, ou, se o for, a infração é afiançável.
A prova de que o acusado não foi encontrado é a certidão lavrada pelo oficial de justiça encarregado da execução do mandado de citação pessoal que o considera “em lugar incerto e não sabido”. O oficial de justiça deve haver-se com zelo no cumprimento do mandado, só lavrando a certidão negativa quando não houver possibilidade de dar-lhe cumprimento e informando com clareza por que certifica que o acusado está em local ignorado.
É evidente a necessidade de que o citado seja procurado em todos os endereços indicados nos autos e que devem constar do mandado. É pacífico que nula é a citação por edital se o oficial de justiça não diligenciou para a localização do citando em todos os endereços constantes nos autos. Também é nula a citação por edital fundada em certidão inverídica de oficial de justiça, que dá o réu como em Lins. O Código só autoriza a citação por edital quando o réu não é encontrado para ser citado pessoalmente.
É nula a citação por edital de réu preso na mesma unidade da Federação em que o juiz exerce a jurisdição (Súmula 351 STF). Não se justifica que o acusado que está preso seja citado por edital, no mesmo Estado da Federação em que cumpre pena ou prisão provisória por outro processo. Não se pode obrigar a Justiça do Estado a diligenciar em todos os estabelecimentos penais das demais unidades da Federação a fim de localizar o citando.
A certidão do oficial de justiça de que o citando se encontra em Lins merece fé pública e, por isso, não pode ser afastada, para ser declarada a nulidade da citação por edital, por simples atestado policial.
O prazo do edital no caso de não ter sido localizado o citando é de 15 dias. A citação por edital só se completa com a fruição do prazo de 15 dias a contar da publicação. Sob pena de nulidade, se o acusado comparece ou é preso após a citação, mas antes do término do prazo da convocação, deve ser providenciada a citação por mandado. O prazo é processual, segundo o qual não se computa o dia do começo, incluindo-se, porém, o do vencimento.
A citação por edital tem também cabimento quando haja fundadas suspeitas de que o acusado esteja se ocultando à citação pessoal. O prazo é de 5 dias.
A citação ainda será feita por edital quando inacessível, em virtude de epidemia, de guerra ou por outro motivo de força maior, o lugar em que estiver o réu. Outras hipóteses de citação por edital são:
- o perigo para o oficial ser atacado;
- a recusa pelo juiz estrangeiro quando o acusado se encontra em outro território (força maior).
O edital é o meio utilizado para citação quando incerta a pessoa que tiver de ser citada. O que se quer dizer é que não há certeza quanto à sua real identidade. Quando não se conhece a identidade por inteiro ou a qualificação do acusado, o edital deve ser publicado com os esclarecimentos pelos quais possa ser ele identificado. O prazo será de 30 dias.
Estando o réu no estrangeiro, em lugar sabido ou não, mas sendo a infração afiançável, a citação será feita mediante editais. É o que determinava o art. 367, por que as convenções internacionais não admitem a extradição nessa espécie de infrações, de menor gravidade, o que justificava a publicação do édito. Determina-se, agora, citação por carta rogatória (art. 368).
Requisitos do Edital
O edital deve indicar, em primeiro lugar, o nome do juiz que a determinar; o nome do réu, ou, se não for conhecido, seus sinais característicos, bem como sua residência e profissão, se constarem no processo. Quanto ao endereço, como não foi ele útil para a localização do acusado, a omissão não traduz nulidade.
É necessário também o fim para que é feita a citação. Não é nula a citação por edital que indica o dispositivo da lei penal, embora não transcreva a denúncia ou queixa ou não resuma os fatos em que se baseia (Súmula 366 STF). A contrario sensu, é nula a citação por edital em que se omite o fim para que se fez o chamamento, não se mencionando o dispositivo da legislação penal em que é dado como incurso o acusado nem se resumindo os fatos a ele imputados.
O edital deve indicar também o juízo e o dia, a hora e o lugar em que o réu deverá comparecer;
O edital deve conter o prazo, que será contado do dia da publicação do edital na imprensa, se houver, ou de sua afixação. Dispõe o art. 365, parágrafo único: “O edital será fixado à porta do edifício onde funcionar o juízo e será publicado pela imprensa, onde houver, devendo a afixação ser certificada pelo oficial que a tiver feito e a publicação provada por exemplar do jornal ou certidão do escrivão, da qual conste a página do jornal com a data de publicação.
A prova da publicação em jornal é feita pela juntada da página onde ela se acha aos autos, ou pela certidão do escrivão em que constará a página e a data da publicação.
Dispõe a lei também que o edital seja fixado à porta do edifício onde funcionar o juízo. A falta de afixação do edital no lugar de costume acarreta nulidade. O vocábulo "oficial", inserido no parágrafo único do art. 365, não significa necessariamente oficial de justiça, mas diz respeito ao escrivão e também, por via de compreensão, ao escrevente.
Fora das hipóteses mencionadas acima, a falta ou defeito da citação é causa de nulidade absoluta, que não pode ser convalidada e, assim, independe de alegação ou prova de prejuízo, que é presumido. É nula qualquer citação que contém vício insanável por haver induzido o citando a erro que culmine em sua revelia. O ato pelo qual se julga nula ou de nenhuma eficácia a citação é chamado de circulação. Quando anulada, diz-se que há citação circunduta.
Intimações e Notificações
Intimação é a ciência dada à parte, no processo, da prática de um ato, despacho ou sentença. Refere-se ela, portanto, ao passado, ao ato já praticado. Notificação é a comunicação à parte ou a outra pessoa, do lugar, dia e hora de um ato processual a que deve comparecer (arts. 366, 370 e 570).
A falta de intimação para atos processuais constitui nulidade por cerceamento de defesa, passível de ser corrigida por meio de habeas corpus.
Formas de Intimações e Notificações
Dispõe o art. 370, caput, que nas intimações dos acusados, das testemunhas e demais pessoas que devem tomar conhecimento de qualquer ato, será observado, no que for aplicável, o disposto no capítulo anterior. Entende-se, porém, que não há nulidade na falta de requisição do militar, se o ato atingiu o fim, que é seu comparecimento.
Quanto ao advogado constituído, ao advogado do querelante e do assistente, prevê o art. 379, § 1º, que devem ser eles intimados para os atos do processo pela imprensa, especificamente pelo órgão incumbido da publicação dos atos judiciais da comarca, e que conste também o nome do acusado. A publicação pela imprensa deve conter o número da ação penal, o nome completo das partes e de seus procuradores, não bastando a citação do prenome ou número de inscrição na OAB, e a finalidade da intimação de modo que o destinatário tenha ciência exata do despacho do juiz.
Na ausência de órgão incumbido de publicações judiciais, a intimação desses procuradores será efetuada na forma dos §§ 2º e 3º do art. 379. Podem ser eles intimados diretamente pelo escrivão. Como se trata, no caso de intimação pessoal, pode também o escrivão intimar o acusado, o MP, o defensor público ou equivalente, as testemunhas, os peritos etc.
A intimação também pode ser feita por mandado e por via postal com comprovante de recebimento (carta ou telegrama). Assim, o defensor constituído, o advogado do querelante e do assistente podem ser cientificados por carta que deve ser entregue pessoalmente, colhendo o entregador dos Correios a assinatura do destinatário. Prevê ainda a lei que a intimação se faça por qualquer outro meio idôneo. É possível, pois, que a cientificação seja realizada por telegrama, telex, fax etc., meios não aceitos pela jurisprudência quanto à legislação anterior.
A intimação do MP e do defensor nomeado será pessoal. Quanto ao MP, aliás, exige-se a intimação pessoal em qualquer processo e grau de jurisdição, através da entrega dos autos com vista.
A referência ao defensor nomeado alcança o defensor público, o procurador da assistência judiciária e o defensor dativo, pois todos só podem oficiar nos processados quando nomeados pelo juiz.
A notificação ou intimação pode ser feita também no próprio requerimento em que foi pedida. Será admissível a intimação por despacho na petição em que for requerida, observando o art. 357 (art. 371).
Dispõe ainda a lei que, adiada por qualquer motivo a instrução criminal, o juiz marcará desde logo, na presença das partes e testemunhas, dia e hora para seu prosseguimento, do que se lavrará termo nos autos (art. 372).
Regras Especiais
Exige-se a intimação da expedição da carta precatória, sob pena de nulidade relativa (art. 222, caput). A intimação dos acórdãos é feita pela imprensa oficial, exceto quanto ao MP, que deve ser intimado pessoalmente. Existe também notificação especial dos jurados sorteados para a sessão do Tribunal do Júri (art. 429, § 2º).
Tratando-se de réu preso, a notificação deve ser feita através de requisição, como na citação, para sua apresentação em juízo no dia e hora designados. Evidentemente, como no chamamento a juízo, não há nulidade se o réu está preso em outra unidade da Federação e o juiz desconhece sua prisão. Quanto à notificação, porém, também não se considera como nulidade a ausência de requisição de réu preso em outro Estado da Federação, mesmo que conhecido seu recolhimento pelo juiz, se for ele revel. Também não há nulidade quando não é apresentado o réu em audiência sem qualquer objeção ou com pedido de dispensa da própria defesa.
Nada obsta que as notificações e intimações sejam feitas no curso de férias forenses (art. 797). Em geral, os prazos correm da data da intimação, no processo penal (art. 798, § 5º, a). Mas, nos termos da Súmula 310 do STF, quando a intimação tiver lugar na sexta-feira, ou a publicação, com efeito de intimação, for feita nesse dia, o prazo judicial terá início na segunda-feira imediata, salvo se não houver expediente, caso em que começará no primeiro dia útil que se seguir.
Suspensão do Processo
Prevê a lei a possibilidade de decretação da revelia do réu que não comparecer a ato do processo a que deva estar presente quando para tal foi citado, notificado ou intimado regularmente. A contumácia (ausência injustificada a ato do processo) acarreta a decretação da revelia, diante da qual o processo se desenvolve sem que ele seja mais intimado ou notificado quanto aos atos do processo.
O acusado que for citado por edital e não comparecer para o interrogatório nem constituir advogado nos autos, o processo ficará suspenso. Considerando que é raríssimo o caso de o réu tomar conhecimento da imputação em caso de citação por edital, preferiu-se a orientação doutrinária de que não lhe restaria assegurado o direito à ampla defesa com o prosseguimento do processo e da decretação da revelia. Procurou-se, assim, dar inteiro cumprimento ao princípio nemo inauditus damnari potest (ninguém pode ser julgado sem ser ouvido), evitando-se o perigoso expediente da decretação da revelia em caso de não comparecimento do réu para responder ao processo com a simples presunção de que tomou conhecimento da imputação.
Comparecendo o réu em juízo para ser interrogado ou constituindo advogado nos autos para defendê-lo, torna-se evidente que ele tomou conhecimento da imputação no processo, que deve prosseguir normalmente. Na segunda hipótese, de constituir o réu advogado, será decretada a revelia, prosseguindo-se o processo sem a presença do acusado, após a intimação pessoal, se ele deixar de comparecer, sem motivo justificado, a qualquer ato do processo. Também se prosseguirá no trâmite processual se, após a data para o interrogatório não realizado pela ausência do acusado citado por edital, ele comparecer a juízo para defender-se, demonstrando assim ter conhecimento do processo.
A suspensão condicional do processo refere-se apenas ao processo penal comum, não ao militar, que tem regras especiais no CPPM. Depende ela, também, de pronunciamento judicial, mesmo porque é a data deste o termo inicial do prazo de suspensão da prescrição. Do mesmo modo, é necessário o pronunciamento do magistrado quando cessa a suspensão pelo comparecimento do acusado ou a constituição de seu defensor nos autos.
No caso de concurso de agentes, em que se suspende o processo para um dos corréus, prosseguindo-se quanto a outro, proferida a favor deste sentença absolutória com fundamento na prova de inexistência do fato ou por não constituir o fato infração penal (art. 386, I e III), a decisão deve ser estendida ao ausente, por analogia com o art. 580 do CPP, desde que a sentença transite em julgado.
Da decisão que determina a suspensão do processo e do prazo prescricional, cabe recurso em sentido estrito, com fundamento, por interpretação extensiva e aplicação analógica, no art. 581, XVI, do CPP, que ordena a suspensão do processo por questão prejudicial.
Suspensão por Prazo Prescricional
No caso de ser aplicada a suspensão do processo, fica também suspenso o curso do prazo prescricional. A lei não fixa o prazo máximo do art. 366. Entretanto, pacificou-se o entendimento de que não há inconstitucionalidade do dispositivo, pois com ele ficam asseguradas as garantias constitucionais do contraditório e da ampla defesa.
A fixação do limite do prazo de suspensão da prescrição é, porém, indispensável.
Produção Antecipada da Prova
Suspenso o processo, a lei permite a produção antecipada de qualquer prova considerada urgente. A produção da prova pode ser determinada de ofício ou a requerimento do acusador e somente pode ser produzida com a participação do MP e do defensor dativo nomeado pelo juiz, ou do defensor público, em consonância com os princípios do contraditório e da ampla defesa.
Prisão Preventiva
Dispõe-se expressamente na lei nova que, apesar de suspenso o processo, o juiz pode decretar a prisão preventiva nos termos do art. 312.
Revelia
A revelia pode ser decretada durante o processo. O processo seguirá sem a presença do acusado que, citado ou intimado pessoalmente para qualquer ato, deixar de comparecer sem motivo justificado, ou, no caso de mudança de residência, não comunicar o novo endereço ao juízo (art. 367).
É caso de decretação de revelia a do apenado com sanção privativa de liberdade a quem é concedida a possibilidade de apelar em liberdade, caso mude de residência sem prévia comunicação ao juízo depois de materializado o apelo, não cabendo no caso a deserção, prevista no art. 595.
O prosseguimento do processo à revelia do acusado é uma penalidade processual imposta ao réu que descumpre suas obrigações para com o processo. Também ocorre a revelia quando o réu, devidamente intimado, não comparece a ato processual a que deveria estar presente sem formular uma justificativa plausível.
A revelia, no processo penal, não implica confissão ficta, podendo, contudo, influir contra os interesses do réu na hora do julgamento da causa. A única hipótese em que o réu não pode ser julgado à revelia, no processo penal, é a daquele que deve ser submetido a julgamento pelo Tribunal do Júri por crime inafiançável (art. 451, § 1º).
Evidentemente, a revelia não causa outros efeitos senão os que a lei prevê, não impedindo o direito de defesa, como deixam claro os arts. 261/396, parágrafo único, nem a constituição de defensor. Em princípio também não pode impedir, por si, a concessão de suspensão condicional da pena e que lhe seja facultado apelar em liberdade contra a sentença condenatória.
A revelia não impede a presença física do réu revel aos atos de instrução se ele comparecer mesmo não tendo sido notificado. Apesar de revel, o réu será sempre intimado da sentença, na forma especial prevista para a espécie.