Classificação dos Bens e Conceitos Fundamentais no Direito Civil
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Conceito de Bens
Bens são as coisas materiais ou imateriais que têm valor econômico e que podem servir de objeto a uma relação jurídica.
Para que o bem seja objeto de uma relação jurídica, é preciso que ele apresente os seguintes caracteres:
- Idoneidade para satisfazer um interesse econômico: Excluem-se da noção de bens os elementos morais da personalidade (vida, honra, nome, liberdade, defesa, etc.). Estes são bens não econômicos, sendo prolongamentos da personalidade.
- Gestão econômica autônoma: O bem deve possuir uma autonomia econômica, constituindo uma entidade econômica distinta. Exemplo: Resulta de sua delimitação no espaço, como no caso da energia. É preciso distinguir a energia inseparável do bem que a produz daquela que, não obstante produzida por certo bem, assume uma autonomia própria que permite uma utilização e um valor econômico.
- Subordinação jurídica ao seu titular: É bem jurídico aquele dotado de uma existência autônoma, capaz de ser subordinado ao domínio do homem. Assim, o ar, as estrelas, o sol e o mar são coisas, mas que estão fora da seara jurídica, por serem insuscetíveis de apropriação.
Bens são coisas, porém nem todas as coisas são bens. As coisas são o gênero do qual os bens são espécies. As coisas abrangem tudo quanto existe na natureza, exceto a pessoa, mas como bens só se consideram as coisas existentes que proporcionam ao homem uma utilidade, sendo suscetível de apropriação.
Classificação Geral dos Bens
- Bens considerados em si mesmos (Arts. 79 a 91 C.C.): Sem qualquer relação com outros bens ou com o seu titular.
- Bens reciprocamente considerados (Arts. 92 a 97 C.C.): Examinados considerando a sua relação com outros bens (principais e acessórios).
- Bens considerados em relação ao titular do domínio (Arts. 98 a 103 C.C.): Distinção entre públicos e particulares.
- Bens quanto à possibilidade de comercialização: Podem ser divididos em coisas no comércio e fora do comércio. Exemplo: A moeda é móvel e consumível; o rio é imóvel, público e fora do comércio.
Bens Considerados em Si Mesmos
1. Bens Corpóreos e Incorpóreos
- Corpóreos: São os que têm existência material (ex.: uma casa, um terreno, um livro); são o objeto do direito.
- Incorpóreos: São os que não têm existência tangível e são relativos aos direitos que as pessoas físicas ou jurídicas têm sobre as coisas, sobre os produtos de seu intelecto ou com outra pessoa, apresentando valor econômico (tais como os direitos reais, obrigacionais e autorais).
2. Bens Móveis e Imóveis
- Móveis: São os que podem ser transportados por movimento próprio ou removidos por força alheia. Exemplos: Semoventes (animais) ou mercadorias, moedas, objetos de uso, etc.
- Imóveis: São os que não podem ser transportados sem alteração de sua substância.
Classificação dos Bens Imóveis
- Bens imóveis por sua natureza: Abrangem o solo com sua superfície, seus acessórios e adjacências naturais, compreendendo as árvores e frutos pendentes, o espaço aéreo e o subsolo.
O espaço aéreo e o subsolo sofrem limitações legais:
- Art. 1.229 C.C.: A propriedade do solo abrange a do espaço aéreo e subsolo correspondentes, em altura e profundidade úteis ao seu exercício, não podendo o proprietário opor-se a atividades que sejam realizadas, por terceiros, a uma altura ou profundidade tais, que não tenham interesse legítimo em impedi-las.
- Decreto n. 24.643/34 (Código de Águas), modificado pelo Decreto-lei n. 852/08, Art. 145: As quedas e outras fontes de energia hidráulica são bens imóveis considerados como coisas distintas do solo em que se encontrem.
- Decreto-lei 227/67, Art. 85, com alteração da Lei 9.314/96: O limite subterrâneo da jazida ou mina é o plano vertical coincidente com o perímetro definidor da área titulada, admitida, em caráter excepcional, a fixação de limites em profundidade por superfície horizontal.
- Constituição Federal, Art. 176, §§ 1º e 4º: As jazidas, minas e demais recursos minerais e os potenciais de energia hidráulica constituem propriedade distinta da do solo, pertencem à União, garantida ao concessionário a propriedade do produto da lavra. É assegurado ao proprietário do solo a participação nos resultados da lavra, na forma e no valor que a lei dispuser.
- Bens imóveis por acessão física artificial: Incluem tudo aquilo que o homem incorporar permanentemente ao solo (ex.: semente lançada à terra, edifícios e construções), de modo que não se possa retirar sem destruição, modificação, fratura ou dano.
Acessão: Designa aumento, justaposição, acréscimo ou aderência de uma coisa a outra. Exemplo: Tijolo, calhas, canos, portas, madeiras, concreto armado, que, incorporados ao solo, passam a ser tidos como bens imóveis.
- Bens imóveis por acessão intelectual: São todas as coisas móveis que o proprietário do imóvel mantiver, intencionalmente, empregadas em sua exploração industrial, aformoseamento ou comodidade. (São bens móveis utilizados no imóvel para produção industrial, embelezamento ou conforto. Exemplos: Um trator na produção agrícola; um vaso, etc.)
- Bens imóveis por determinação legal: São direitos reais sobre imóveis (usufruto, uso, habitação, enfiteuse, anticrese, servidão predial), inclusive o penhor agrícola e as ações que os asseguram; apólices da dívida pública oneradas com a cláusula de inalienabilidade, decorrente de doação ou de testamento; o direito à sucessão aberta, ainda que a herança só seja formada por bens móveis.
- Enfiteuse: Deriva diretamente do arrendamento por prazo longo ou perpétuo de terras públicas a particulares.
- Anticrese: É um instituto civil, espécie de direito real de garantia, no qual o devedor entrega um bem imóvel ao credor, para que os frutos deste bem compensem a dívida.
Classificação dos Bens Móveis
- Bens móveis por natureza: São as coisas corpóreas que se podem remover sem dano, por força própria ou alheia, com exceção das que acedem aos imóveis. Os materiais de construção, enquanto não forem empregados na obra, são bens móveis.
- Semoventes: Bens que se removem de um lugar para o outro por movimento próprio (ex.: animais).
- Força estranha: Coisas inanimadas (ex.: cadeira, relógios, óculos, etc.).
- Bens móveis por antecipação: São bens imóveis que a vontade humana mobiliza em função da finalidade econômica. Exemplos: Árvores, frutos, pedras e metais, aderentes ao imóvel, são imóveis; separados, para fins humanos, tornam-se móveis. São móveis por antecipação árvores convertidas em lenha ou casas vendidas para demolição.
- Bens móveis por determinação de lei: São os direitos reais sobre objetos móveis (penhor, alienação fiduciária em garantia) e as ações correspondentes, os direitos de obrigação e as ações respectivas e os direitos de autor. Exemplo: Um escritor poderá ceder seus direitos autorais sem outorga uxória.
3. Bens Fungíveis e Infungíveis
- Fungíveis: São os bens móveis que podem ser substituídos por outros de mesma espécie, qualidade e quantidade. (Próprio dos bens móveis. Exemplos: Carvão, açúcar, lenha, dinheiro, café, etc.).
- Infungíveis: São os insubstituíveis, por existirem somente se respeitada sua individualidade. (São os que têm um valor especial, não podendo ser substituídos sem que isso acarrete uma alteração de conteúdo, como um quadro de um pintor célebre).
Distinção em Relação às Obrigações de Fazer
- Fungível: A prestação pode ser realizada por outra pessoa que não seja o devedor, por consistir num ato que não requer técnica ou especialização (Ex.: Engraxate).
- Infungível: Quando a obrigação de fazer requer uma atuação personalíssima do devedor, que, devido às suas qualidades pessoais ou habilidade técnica, é insubstituível (Ex.: Um pintor famoso que deixa de cumprir a obrigação, passando para outro).
Importância da Distinção:
- O mútuo é empréstimo de coisas fungíveis (bens móveis) - C.C. Art. 586.
- O comodato é empréstimo de coisas infungíveis (bens imóveis) - C.C. Art. 579.
4. Bens Consumíveis e Inconsumíveis
- Consumíveis: São os que se destroem assim que são usados (ex.: alimentos em geral).
- Inconsumíveis: São os de natureza durável, que podem ser usados continuadamente, possibilitando que se retirem todas as suas utilidades sem atingir a sua integridade (ex.: um livro).
Observações:
- Coisas inconsumíveis que podem se tornar consumíveis se destinadas à alienação. Exemplo: Uma roupa é inconsumível no uso, mas, colocada à venda em lojas, se torna consumível, pois se pretende que ela desapareça do acervo.
- Coisas consumíveis que podem se tornar inconsumíveis. Exemplo: Uma empresa empresta frutas para uma exibição, devendo estas serem devolvidas, permanecendo inconsumíveis até a sua devolução.
5. Bens Divisíveis e Indivisíveis
- Divisíveis: São aqueles que podem ser fracionados em porções reais. Exemplo: Repartir uma saca de café, onde cada metade conservará as qualidades do produto, podendo ter a mesma utilização do todo, sem alterar sua substância.
- Indivisíveis: São aqueles que não podem ser fracionados sem lhes alterar a substância, ou que, mesmo divisíveis, são considerados indivisíveis pela lei ou pela vontade das partes.
Tipos de Indivisibilidade
- Por Natureza: Quando não puderem ser partidas sem alteração na sua substância ou no seu valor. Exemplos: Um cavalo vivo; um imóvel quando sofre uma divisão muito grande, que cada parcela apresenta-se diminuta que se torna inútil; um quadro de algum pintor famoso, partido ao meio, perde sua integridade e seu valor.
- Por Determinação Legal: Até a partilha, o direito dos coerdeiros, quanto à propriedade e posse da herança, será indivisível e regular-se-á pelas normas relativas ao condomínio; as servidões prediais.
- Por Vontade das Partes: Nas obrigações indivisíveis, é o caso em que o bem divisível pode se tornar indivisível. Exemplo: Permuta de um apartamento com duas casas. Se a obrigação era entregar duas casas, ainda que esses bens sejam divisíveis, por conta do acordado, não serão divididos.
Importância da Delimitação:
- Nas obrigações com pluralidade de sujeitos, a indivisibilidade implica que cada codevedor estará obrigado pela dívida toda.
- Na extinção de condomínio: Se indivisível, ante a recusa dos condôminos de adjudicá-lo a um só deles, indenizando os demais, o bem será vendido, e o preço repartido entre eles.
6. Bens Singulares e Coletivos
- Coisas Singulares: São as que, embora reunidas, se consideram de per si, independentemente das demais; são consideradas em sua individualidade (Ex.: Caneta, folha de papel, qualquer objeto).
- Coletivas (Universalidades): São as constituídas por várias coisas singulares, consideradas em conjunto, formando um todo único, que passa a ter individualidade própria, distinta de seus objetos componentes, que conservam sua autonomia funcional. Exemplo: Uma biblioteca, que é uma coisa só, mas constituída de vários livros.
Tipos de Universalidade
- Universalidade de Fato: Conjunto de bens singulares juntados entre si por vontade humana (Ex.: Biblioteca, rebanhos).
- Universalidade de Direito: As coisas são singulares, mas se tornam um bem coletivo por questão de direito (Ex.: Massa falida, bens do espólio, herança).
Bens Reciprocamente Considerados (Arts. 92 a 97 C.C.)
Bens Principais e Acessórios
- Principais: São os que existem por si, abstrata ou concretamente, exercendo sua função e finalidade, independentemente de outra (Ex.: o solo).
- Acessórios: São aqueles cuja existência supõe a existência do principal. Nos imóveis, o solo é o principal, sendo acessório tudo o que nele se incorporar permanentemente (Ex.: Uma árvore plantada ou uma construção).
Bens incorpóreos também se distinguem: Um crédito é coisa principal, o que não ocorre com a cláusula penal, que se subordina a uma obrigação principal.
Classificação de Bens Acessórios
- Naturais: Se originários de fatos da natureza (frutos naturais, produtos orgânicos ou inorgânicos, o subsolo e as coisas que nele se achem sem dono conhecido, ilhas formadas nos rios, etc.).
- Industriais: Se aderirem ao principal por intervenção do engenho humano (construções, plantações, frutos industriais, benfeitorias).
- Civis: Resultantes de uma relação jurídica abstrata, e não de vinculação material, como os juros, no que concerne ao principal.
Bens Considerados em Relação ao Titular do Domínio (Arts. 98 a 103 C.C.)
Bens Particulares e Bens Públicos
São, respectivamente, os que pertencem a pessoas naturais ou jurídicas de direito privado e os que pertencem às pessoas jurídicas de direito público (União, Estados e Municípios).
Espécies de Bens Públicos
O direito positivo conhece três espécies de bens públicos:
- Bens públicos de uso comum do povo: São os que, embora pertencentes às pessoas jurídicas de direito público interno, podem ser utilizados, sem restrição e gratuitamente, por todos, sem necessidade de qualquer permissão especial (Ex.: praças, jardins, ruas, estradas, mar, rios, etc.).
- Bens públicos de uso especial: São utilizados pelo próprio poder público, constituindo-se por imóveis aplicados ao serviço ou estabelecimento federal, estadual ou municipal (Ex.: prédios onde funcionam tribunais, escolas públicas, secretarias, ministérios, etc.); são os que têm uma destinação especial.
- Bens públicos dominicais: São os que compõem o patrimônio da União, dos Estados ou dos Municípios, como objeto do direito pessoal ou real dessas pessoas; abrangem bens móveis ou imóveis.
Bens no Comércio e Fora do Comércio (Alienação)
Os bens alienáveis, disponíveis ou no comércio, são os que se encontram livres de quaisquer restrições que impossibilitem sua transferência ou apropriação, podendo, portanto, passar, gratuita ou onerosamente, de um patrimônio a outro. Os bens inalienáveis ou fora do comércio são os que não podem ser transferidos de um acervo patrimonial a outro ou são insuscetíveis de apropriação.
Tipos de Inalienabilidade
- Bens inalienáveis por sua natureza: São os bens de uso inexaurível, como o ar, o mar, a luz solar. Contudo, a captação, por meio de aparelhagem, do ar atmosférico ou da água do mar para extrair certos elementos com o escopo de atender determinadas finalidades, pode ser objeto de comércio.
- Bens legalmente inalienáveis: São os que, apesar de suscetíveis de apropriação pelo homem, têm sua comercialidade excluída pela lei, para atender aos interesses econômico-sociais, à defesa social e à proteção de determinadas pessoas. Poderão ser alienados, por autorização legal, apenas em certas circunstâncias e mediante determinadas formalidades. Entram nessa categoria: os bens públicos; os dotais; os das fundações; os dos menores; os lotes rurais remanescentes de loteamentos já inscritos; o capital destinado a garantir o pagamento de alimentos pelo autor do fato ilícito; o terreno onde está edificado um edifício de condomínio por andares; o bem de família; os móveis ou imóveis tombados; as terras ocupadas pelos índios.
- Bens inalienáveis pela vontade humana: São os que lhes é imposta cláusula de inalienabilidade, temporária ou vitalícia, nos casos e formas previstos em lei, por ato inter vivos ou causa mortis.
Benfeitorias
São bens acessórios acrescentados ao imóvel (bem principal). Podem ser:
- Necessárias: Imprescindíveis à conservação do imóvel ou para evitar-lhe a deterioração.
- Úteis: Aumentam ou facilitam o uso do imóvel.
- Voluptuárias: Embelezam o imóvel, para mero deleite ou recreio.
Frutos
São bens acessórios que derivam do principal. Podem ser:
- Naturais: Das árvores.
- Industriais: Da cultura ou da atividade.
- Civis: Do capital, como os juros.
Bem de Família
Divide-se em voluntário e legal:
- Voluntário: É um instituto em que o casal, ou um dos cônjuges, destina um imóvel próprio para domicílio da família, com a cláusula de ficar isento de execução por dívidas, salvo as que provierem de impostos relativos ao mesmo imóvel (Art. 70, C.C.). Essa isenção durará enquanto viverem os cônjuges e até que os filhos completem a maioridade, não podendo o imóvel ter outro destino ou ser alienado, sem o consentimento dos interessados e dos seus representantes legais. Também não entra no inventário, nem será partilhado, enquanto continuar a residir nele o cônjuge sobrevivente ou filho menor (Art. 20 do Dec-Lei 3.200/41).
- Legal: É o instituído pela Lei 8.009/90, que estabeleceu a impenhorabilidade geral de todas as moradias familiares próprias, uma para cada família, independentemente de qualquer ato ou providência dos interessados. A impenhorabilidade abrange os seguintes bens, desde que quitados: a casa e seu terreno, os móveis que guarnecem a casa, as plantações, as benfeitorias de qualquer natureza e todos os equipamentos, inclusive os de uso profissional. Se a casa for alugada, aplica-se aos bens móveis que guarnecem a residência. Se for imóvel rural, aplica-se só à sede de moradia e aos bens móveis.