Dialogismo e Polifonia: Conceitos e Aplicações

Classificado em Língua e literatura

Escrito em em português com um tamanho de 5,03 KB.

Dialogismo

Processo no qual um texto revela a existência de outras obras em seu interior, as quais lhe causam inspiração ou algum influxo.

O dialogismo está presente tanto nas obras impressas como na própria leitura, esferas nas quais o discurso não é observado em um contexto de incomunicabilidade, mas sim em constante ação recíproca com textos semelhantes e/ou imediatos. Este elemento aparece quando se instaura um processo de recepção e percepção de um enunciado, que preenche um espaço pertencente igualmente ao locutor e ao locutário. Assim, os participantes de uma conversação elaboram um fluxo dialógico ao posicionarem o ato da linguagem em uma interação frente a frente. Bakhtin acredita que o diálogo engloba qualquer transmissão oral, de toda espécie. Este conceito é praticamente a alma de sua teoria linguística. Para o estudioso russo, todos os personagens que circulam no âmbito da linguagem constituem elementos sociais e históricos que têm o poder de conferir significados reais e se estruturam regularmente na obra ficcional, expressando seus pontos de vista sobre a realidade concreta.

Bakhtin identifica no romance os diálogos puros, além da inter-relação dialogizada e da hibridização, que pode ser definida como uma miscelânea de duas linguagens, sendo considerada uma das vertentes mais importantes do mecanismo de modificação dos meios de expressão do pensamento.

A hibridização dos diálogos prepondera na análise da obra; ela é compreendida como um processo de aliança que procura elucidar uma linguagem com o auxílio de outra e, assim, estrutura a representação natural e vivaz desta outra forma de expressão. É fundamental que se utilize, neste procedimento, o uso de diversas linguagens, para esclarecer ainda mais o texto original.

O linguista russo salienta também a importância da estilização, um recurso dialógico interior que produz um estilo renovado, com significância e destaque nascentes. Esta linguagem surge com ecos peculiares, pois enquanto alguns de seus aspectos são iluminados, outros são preservados imersos em névoas.

A paródia é outro recurso específico, no qual o dialogismo por ela simbolizado desvela o texto que está sendo figurado. As mais variadas linguagens regidas pelas inter-relações, aspirações orais e racionais que residem nos enunciados estão situadas no espectro que se desenrola entre a estilização e a paródia. O dialogismo não se desenvolve apenas socialmente, mas igualmente na esfera temporal, na dinâmica da vida e da morte. A convivência entre as pessoas e a progressão no tempo se aliam na unicidade consistente de uma multiplicidade paradoxal, a qual se manifesta por meio de variadas linguagens.

Polifonia

Tem como principal propriedade a diversidade de vozes controversas no interior de um texto. Conforme a tese do linguista russo Mikhail Bakhtin, este conceito se caracteriza pela existência de outras obras na organização interna de um discurso, as quais certamente lhe concederam antecipadamente boas doses de ascendência e ideias iluminadas. Este elemento não tem o mesmo significado da heterogeneidade enunciativa, que alude ao potencial desenvolvimento das vozes que já estão presentes na obra, ao passo que a polifonia se refere a variadas falas que intervêm no texto. O pesquisador russo vincula esta noção ao romance polifônico, que se opõe ao monológico.

Ele se baseou principalmente na obra do escritor Fiódor Dostoiévski, seu conterrâneo e autor de clássicos como Crime e Castigo e O Idiota. Nesta modalidade polifônica todo personagem atua livremente, com ponto de vista, voz e postura pessoais, no contexto em que estão inseridos.

Uma única manifestação verbal que submete as outras expressões orais caracteriza o diálogo monofônico, enquanto as controvérsias marcam a polifonia. Alguns estudiosos, como Beth Brait, defendem que a ironia é um recurso inerente ao gênero polifônico; por outro lado, a afirmação de uma opinião traz em si tão somente uma voz predominante, portanto aí não há nenhuma possibilidade de debate.

A ficção romanesca está povoada por distintas expressões verbais de natureza social, as quais embatem entre si, lutam umas com as outras, e assim exibem suas variadas opiniões sobre algo; em contextos assim há definitivamente a presença da polifonia, e o escritor russo é, conforme o modo de ver de Bakhtin, o produtor do romance polifônico por excelência. Em suas obras, porém, os dilemas permanecem, nada é solucionado, e a resolução dialética não comparece em suas tramas.

Neste autor, como afirma o estudioso, as múltiplas vozes e personalidades autônomas constituem a genuína polifonia, e também a virtude essencial de sua obra. Nela a faculdade racional de cada protagonista é revelada através da consciência alheia, mas em momento algum esta esfera do herói se desfaz de seu estado de pura liberdade e, assim, não se torna de fato um objeto da razão do escritor.

Entradas relacionadas: