A Dinâmica da Transferência em Psicanálise

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A Dinâmica da Transferência

Transferência, em psicanálise, designa o processo pelo qual os desejos inconscientes se atualizam sobre determinados objetos em um certo tipo de relação, eminentemente na relação analítica. É uma repetição de protótipos infantis, vivida com sensação de atualidade.
A transferência no tratamento é o que os psicanalistas geralmente chamam de transferência. É o terreno onde se joga a problemática do tratamento psicanalítico: sua instalação, modalidades, interpretação e resolução o caracterizam (Laplanche e Pontalis, 1983).
Freud aborda a dinâmica da transferência sob dois ângulos: a transferência como problema geral e suas causas, e a transferência no processo psicanalítico e as causas de sua intensidade.

Causas Gerais da Transferência

  • Toda pessoa adquire, na infância, características de sua vida afetiva, resultando em um clichê (ou vários) repetido ao longo da vida.
  • A insatisfação libidinosa (devido a fixações inconscientes) cria necessidade e expectativas libidinosas dirigidas a novas pessoas.
O papel especial da transferência no processo psicanalítico se explica, segundo Freud, por sua relação com a resistência. A transferência se torna intensa e duradoura porque serve à resistência; o paciente reproduz e repete para não relembrar seus impulsos inconscientes.

Transferência Positiva e Negativa

Freud distingue transferência positiva e negativa. Essa distinção surgiu quando ele constatou que a transferência poderia se tornar a maior resistência ao tratamento.
A transferência positiva é composta de sentimentos conscientes amigáveis e ternos, e outros com prolongamentos inconscientes e fundamento erótico.
Em "A Dinâmica da Transferência" (1912), Freud afirma que a transferência sobre o analista só é resistência quando é negativa ou positiva composta de elementos eróticos recalcados.
A transferência positiva, pela confiança do paciente, facilita a abordagem de temas difíceis. Contudo, toda transferência é constituída de elementos positivos e negativos.

Transferência e Resistência

A transferência é uma arma de dois gumes: permite que o paciente confie e queira falar, mas também pode ser o local de resistências ao progresso da análise. O paciente atribui aos afetos revividos um caráter de atualidade e realidade, contra a razão.
Em "A Dinâmica da Transferência", Freud diz que os fenômenos de transferência prestam o melhor serviço ao trazer à luz as emoções amorosas secretas e esquecidas dos pacientes, conferindo-lhes atualidade.
A transferência é um fragmento de repetição, a transferência do passado esquecido, não apenas pela pessoa do médico, mas por todas as áreas da situação presente.
Quanto maior a resistência à lembrança, maior a compulsão à repetição. O manejo da transferência transforma essa compulsão em razão para lembrar, permitindo que o paciente se reaproprie de sua história.

Transferência e Contratransferência

A contratransferência do analista para com seu paciente é um elemento indissociável da transferência. Consiste em determinar quais afetos o paciente suscita no analista e como isso influencia sua interpretação da transferência.
O analista deve analisar a contratransferência para que ela não interfira na análise do paciente, mas permita que ele se situe convenientemente no tratamento.

Análise Terminável e Interminável (1937)

Quanto tempo dura uma análise? Essa pergunta é recorrente. O tempo de uma análise tem se mostrado cada vez maior, contrariando a lógica de "obter mais resultado em menos tempo com menor custo".
Não é possível estabelecer um tempo médio. Uma análise é longa.
O tempo da análise está associado à concepção do final do tratamento. Terapia, remoção do mal-estar, identificação com o analista, travessia do fantasma, *savoir-faire* com o sintoma, etc., são ideias que divergem quanto ao objetivo e tempo implicados.
O problema atual do tempo da análise também se refere ao número de análises que uma pessoa faz, frequentemente três ou quatro.
Este artigo destaca a "re-análise". As re-análises cresceram em número, tornando-se um fenômeno associado ao surgimento de Escolas, na concepção lacaniana.
Embora a re-análise pareça nova, a retomada da análise já foi descrita por Freud. Verificaremos a evolução dessa questão desde Freud até nós, passando por Lacan.

Em Freud

Em "Análise Finita e Infinita" ("Análise Terminável e Interminável"), Freud afirma que todo analista deveria periodicamente (a cada cinco anos) submeter-se novamente à análise. O termo "periodicamente" sugere uma sequência repetitiva. O "não ter vergonha" lembra o aspecto infinito da análise.
O infinito, por ser estrutural, não deve ser visto como defeito, mas como um impossível próprio à experiência analítica.
Por que a cada cinco anos? Talvez porque Freud pensasse que esse era o tempo que uma pessoa se manteria sujeita ao inconsciente antes de se reacomodar em novas formações sintomáticas.
Há uma diferença importante com Lacan: a instituição proposta por Freud (Sociedade) é acomodativa, enquanto a de Lacan (Escola) é incomodativa.
Uma Sociedade seria sintética, uma Escola, analítica. Os membros da Sociedade retomariam a análise para acordar, enquanto a Escola prolongaria os efeitos da clínica, mantendo os sujeitos despertos ao inconsciente. O final da análise em Freud é edipiano, e sua sociedade, paternal. Lacan leva a análise para além do Édipo, orientando sua Escola não por um pai ou ideal, mas por uma falta radical.
Desde sua carta a Fliess (1897), onde colocou o Édipo como axioma das ficções neuróticas, até 1937, em "Análise Terminável e Interminável", Freud manteve esse eixo. As últimas páginas desse texto mostram que a análise encontrará resistência no homem com o protesto masculino e na mulher com a inveja do pênis. Freud espera que as reações posteriores à análise sejam diferentes das iniciais.
Essa concepção clínica refletiu em sua proposta institucional, mantendo o pai (ele mesmo) como pilar, às custas do adormecimento dos analistas. Isso conservou Freud até a releitura lacaniana, que rompeu com a Sociedade para retomar a verdade freudiana.

Em Lacan

"Ter a experiência de uma psicanálise marca uma passagem, com a condição de ser minha análise do inconsciente, enquanto fundando a função do simbólico, completamente admissível. De fato, aparentemente, eu posso confirmá-lo realmente, o fato de haver transposto uma psicanálise, não poderia ser reconduzido ao estado anterior, exceto praticando um outro corte que seria equivalente a uma contrapsicanálise.
É justamente por isso que Freud insistia que os psicanalistas refizessem o que comumente se chama uma fatia, isto é, que eles façam uma segunda vez um corte, restaurando assim o nó borromeu em sua forma original". (Lacan, Seminário "L’insu que sait de l’une-bévue", 14 de dezembro de 1976).
O que chamamos de re-análise é chamado por Lacan de "contrapsicanálise". Lacan substitui o caráter ritualesco de retomar a análise a cada cinco anos por algo mais objetivo: "fazer uma segunda vez o corte, restaurando assim o nó borromeu em sua forma original".
Após uma primeira análise que levaria à superioridade do Simbólico sobre o Imaginário e o Real, seria necessária uma segunda para articular os três registros sem hierarquia.
Essa apresentação topológica está presente desde o início dos anos 70, no seminário sobre o Avesso da Psicanálise e em "L’Étourdit". Lacan já se preocupava em esclarecer que a análise deve ultrapassar o Édipo como referência última da significação do sujeito.
O Édipo, como mito, serviu a Freud para ordenar a clínica. Ultrapassá-lo não significa desprezá-lo, mas ir além na condução do tratamento. Lacan diz: "ir além do pai com a condição de sabermos dele nos servir".
Manter o Édipo no horizonte da análise é correlato a uma concepção idealística do tratamento. A virada da psicanálise seria o deslocamento da função do ideal para a função da causa. Se o ideal fosse conservado, a psicanálise seria uma correção de rumo, um "Discurso do Mestre".
O que se pretende não é acabar com o engano, mas possibilitar a cada analisando a experiência de se orientar pela causa de seu desejo, uma vez que o ideal universal está furado. É preciso ser tolo frente ao significante para não se perder.
A proposta institucional de Lacan (Escola) é solidária a seus avanços clínicos. A primeira Escola, após a dissolução, chamou-se Escola da Causa Freudiana.

Escola e Re-análise

Verificamos um fenômeno no Campo Freudiano: retomada de análise associada à criação de Escolas. A re-análise é coerente com a passagem do grupo à Escola.
O grupo segue a norma do ideal, do pai, enquanto a Escola se refere à causa. A criação de uma Escola abre a possibilidade de levar a análise mais além, onde o Simbólico (relativo ao pai) não engloba o Imaginário e o Real.
Não existe indicador definitivo do término da análise, mas critérios que podem ser questionados:
  1. Qualidade do analista: muitos ex-pacientes de Freud e Lacan retomaram ou continuaram a análise após a morte deles.
  2. Ter feito o passe: alguns colegas que se submeteram a esse procedimento, nomeados ou não A.E. (Analista da Escola), retomaram a análise.
  3. Ser A.M.E. (Analista Membro da Escola): esse título deveria dar mais responsabilidade que dignidade, podendo favorecer a retomada da análise.
  4. Tempo de divã: não significa muito, pois não se trata de envelhecer o paciente.
A série é inconclusa. Um índice provisório: a implicação no trabalho da Escola deve se seguir ao final da análise. Nem todos os analistas devem fazer re-análise, por sua implicação na lógica da Escola. A Escola não é para os não tolos, nem para os espertos, nem para os cínicos.
Quanto ao tempo total de uma análise, a retificação atual da "cultura analítica", incidência da Escola, deverá demonstrá-lo fora dos critérios do mercado.

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