Direito Civil: Propriedade, Usucapião e Condomínio
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Definição de Propriedade e Seus Elementos
O art. 1.228 do Código Civil não oferece uma definição de propriedade, entretanto, considerando os seus elementos essenciais enunciados, pode-se dizer que propriedade é o direito real que dá a uma pessoa, denominada então "proprietário", a posse de um bem, em todas as suas relações. É também o direito de usar, gozar e dispor da coisa, além do direito de reavê-la de quem injustamente a possua ou detenha.
Elementos Constitutivos da Propriedade
- Direito de usar (jus utendi): faculdade de o dono servir-se da coisa e de utilizá-la da maneira que entender mais conveniente.
- Direito de gozar ou usufruir (jus fruendi): poder de perceber os frutos naturais e civis da coisa e de aproveitar economicamente os seus produtos.
- Direito de dispor da coisa (jus abutendi): poder de transferir a coisa, de gravá-la de ônus e de aliená-la a outrem a qualquer título.
- Direito de reaver a coisa (rei vindicatio): direito de reivindicá-la das mãos de quem injustamente a possua ou detenha. É possível que em algum momento, o proprietário esteja privado dos poderes de uso e gozo, pelo fato de terceiro injustamente obter a posse da coisa.
Aquisição da Propriedade Imóvel
Formas de Aquisição
- Originária: Desvinculada de qualquer relação com titular anterior, não existindo relação jurídica de transmissão. A maioria da doutrina entende também como originária a aquisição por usucapião e acessão natural.
- Derivada: Ocorre quando há relação jurídica com o antecessor. Existe transmissão da propriedade de um sujeito a outro. A regra fundamental dessa modalidade é que ninguém pode transferir mais direitos do que tem “nemo plus iuris ad alium transferre potest, quam ipse haberet”. Existe transmissão derivada tanto por inter vivos como mortis causa. Nesta última, o fato da morte faz com que o patrimônio do falecido transfira-se a herdeiros.
Aquisição da Propriedade Móvel
As formas principais são: ocupação, especificação, confusão, comistão, adjunção e tradição.
Formas de Aquisição da Propriedade Móvel
Da Ocupação
Carlos Roberto Gonçalves, em sua doutrina de Direitos Reais "Direito Civil Brasileiro – Direito das Coisas", 3ª Edição, Vol. 5, São Paulo, Ed. Saraiva, define ocupação como sendo o modo originário de aquisição de bem móvel que consiste na tomada de posse de uma coisa sem dono, com a intenção de se tornar seu proprietário.
Coisas sem dono são as coisas de ninguém (res nullius) ou as abandonadas (res derelicta). O abandono não se presume, devendo resultar claramente da vontade do proprietário de se despojar do que lhe pertence.
As modalidades mais comuns de ocupação são a caça e a pesca.
Da Especificação
Especificação constitui forma de aquisição da propriedade móvel, que ocorre mediante atividade de uma pessoa em determinada matéria-prima, obtendo, por seu trabalho, espécie nova. Esta será do especificador, se a matéria era sua, ainda que só em parte, e não se puder restituir à forma anterior.
Artigo 1.269 do Código Civil: “Aquele que, trabalhando em matéria-prima em parte alheia, obtiver espécie nova, desta será proprietário, se não se puder restituir à forma anterior.”
Artigo 1270 do Código Civil: “...se toda a matéria for alheia, e não se puder reduzir à forma procedente, será do especificador de boa-fé a espécie nova”. Porém “se a espécie nova se obteve de má-fé, pertencerá ao dono da matéria prima” (§1º).
Quando a coisa exceder consideravelmente o valor da matéria-prima, ainda que de má-fé, a propriedade pertencerá ao especificador, que deverá indenizar o valor da matéria-prima e pagar eventuais perdas e danos.
Da Confusão, da Comistão e da Adjunção
Maria Helena Diniz, em sua obra “Curso de Direito Civil Brasileiro – Direito das Coisas”, 22ª edição, São Paulo: Ed. Saraiva, 2007, p.315, discorre que “quando as coisas pertencentes a pessoas diversas se mesclarem de tal forma que seria impossível separá-las, tem-se: a confusão, se a mistura se der entre coisas líquidas (p.ex., gasolina e álcool, vinho e guaraná); a comistão, se der entre coisas secas ou sólidas (p.ex., mistura de grãos de café tipo A com os do tipo B ou de trigo com glúten). Quando, tão-somente, houver uma justaposição de uma coisa à outra (p.ex., vaso contendo decalque alheio; peça de roupa de um com estampa de outrem) que não mais se torne possível destacar a acessória da principal, sem deterioração, dá-se adjunção.”
Resumo: confusão é a mistura de coisas líquidas; comistão, a mistura de coisas sólidas ou secas; e adjunção, a justaposição de uma coisa à outra.
A espécie nova pertencerá aos donos da matéria-prima, cada qual com sua parte proporcional ao valor do seu material.
Quando uma das coisas puder ser considerada principal em relação à outra, a propriedade da espécie nova será atribuída ao dono da coisa principal, tendo este a obrigação de indenizar os outros.
Estas disposições vigem na presunção da boa-fé das partes. Se a confusão, a comistão ou a adjunção se derem devido à má-fé de uma das partes, pode a outra escolher entre guardar o todo, pagando a porção que não for sua, ou então renunciar à parte que lhe pertence, mediante indenização completa.
Da Tradição
Para Carlos Roberto Gonçalves, tradição consiste na entrega da coisa do alienante ao adquirente, com a intenção de lhe transferir o domínio, em complementação do contrato. Com essa entrega, torna-se pública a transferência.
De acordo com o art. 1.267 do Código Civil, “a propriedade das coisas não se transfere pelos negócios jurídicos antes da tradição”. Sendo assim, a tradição mostra-se de suma importância na aquisição de bens móveis.
A tradição pode ser real, simbólica ou ficta. Será real quando a coisa for realmente entregue a outra pessoa. Será tradição simbólica quando um ato simbolizar a entrega da coisa. A tradição ficta é aquela que a pessoa que já tinha a posse direta da coisa torna-se proprietário.
Carlos Roberto Gonçalves termina o estudo de tal modalidade lembrando que “sendo a tradição ato complementar do negócio jurídico, para que gere o seu principal efeito, que é a transferência do domínio, necessário se torna que o negócio em tela seja válido. Se este é inválido, a tradição que nele se apoia não pode, tampouco, ganhar eficácia.”
Usucapião: Definição e Pressupostos
Pressupostos da Usucapião: coisa hábil ou suscetível de usucapião, posse, decurso do tempo, justo título e boa-fé.
Os três primeiros são indispensáveis e exigidos em todas as espécies de usucapião. O justo título e a boa-fé somente são reclamados na usucapião ordinária. Primeiramente, é necessário verificar se o bem que se pretender usucapir é suscetível de prescrição aquisitiva, pois nem todos são sujeitos a ela, como os bens fora do comércio e os bens públicos.
Espécies de Usucapião
Usucapião Extraordinária, Ordinária, Especial ou Constitucional.
Usucapião Extraordinária
A usucapião extraordinária é disciplinada pelo Código Civil no art. 1.238 e seus requisitos são: posse de quinze anos (que pode reduzir-se a 10 anos se o possuidor houver estabelecido no imóvel sua moradia habitual ou nele realizado obras ou serviços de caráter produtivo), exercida com ânimo de dono, de forma contínua, mansa e pacífica. Dispensam-se os requisitos do justo título e da boa-fé.
Corresponde essa modalidade à espécie de usucapião mais comum e conhecida. Basta o ânimo de dono e a continuidade e tranquilidade da posse por quinze anos. O usucapiente não necessita de justo título e boa-fé, que sequer são presumidos: simplesmente não são requisitos exigidos. O título, se existir, será apenas reforço de prova.
A propriedade adquirida por usucapião compreende não só aquela dotada de todos os seus atributos componentes, como também as parcelas que dela se destacam, isto é, os direitos reais sobre a coisa alheia, como a servidão, o usufruto, o uso, a habitação etc.
Usucapião Ordinária
A usucapião ordinária é prevista no art. 1.242 do Código Civil de 2002 e apresenta os seguintes requisitos: posse de dez anos, exercida com ânimo de dono, de forma contínua, mansa e pacífica, além de justo título e boa-fé. O prazo será de cinco anos “se o imóvel houver sido adquirido, onerosamente, com base no registro constante do respectivo cartório, cancelada posteriormente, desde que os possuidores nele tiverem estabelecido a sua moradia, ou realizado investimentos de interesse social e econômico” (art. 1.242, parágrafo único).
O art. 2029 das “Disposições Transitórias” preceitua que, “até dois anos após a entrada em vigor deste Código, os prazos estabelecidos no parágrafo único do art. 1.238 e no parágrafo único do art. 1.242 serão acrescidos de dois anos, qualquer que seja o tempo transcorrido na vigência do anterior, Lei 3071/16”. Os parágrafos mencionados referem-se às hipóteses em que o prazo é reduzido porque o possuidor estabeleceu no imóvel sua moradia habitual, ou nele realizou obras e serviços de caráter produtivo. Observa-se que o art. 2030 prescreve o seguinte: “O acréscimo de que trata o artigo antecedente (art. 2029), será feito nos casos a que se refere o § 4º do art. 1.228”.
Usucapião Especial ou Constitucional
Pode ser denominada de usucapião pro moradia ou usucapião pro misero, uma vez que transforma, em propriedade, a posse do possuidor que não tiver qualquer outro imóvel, rural ou urbano, para fins de habitação.
Assim, para que se configure essa modalidade de usucapião deverão ser observados os seguintes requisitos: imóvel com extensão de, no máximo, 250 metros quadrados; posse mansa e pacífica por um lapso temporal de 5 (cinco) anos ininterruptos; não ser o possuidor proprietário de qualquer outro imóvel rural ou urbano, e que o possuidor utilize esse imóvel para fins de moradia sua ou de sua família. Nesse sentido dispõe o art. 183 da CR/88 e art. 1.240 do CC:
Art. 183 - Aquele que possuir como sua área urbana de até duzentos e cinquenta metros quadrados, por cinco anos, ininterruptamente e sem oposição, utilizando-a para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural.
Art. 1.240. Aquele que possuir, como sua, área urbana de até duzentos e cinquenta metros quadrados, por cinco anos ininterruptamente e sem oposição, utilizando-a para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural.
Não se avalia nessa modalidade de usucapião se o possuidor age de boa-fé ou a existência do justo título, mas apenas se os requisitos citados estão presentes no caso concreto.
Condomínio Voluntário
Em regra, a propriedade de qualquer coisa pertence a uma só pessoa. Pode-se dizer que a noção tradicional de propriedade está ligada à ideia de assenhoramento de um bem, com exclusão de qualquer outro sujeito, assim preceitua Gonçalves. O Código Civil disciplina a matéria na parte do Condomínio Geral que se subdivide em: voluntário, necessário ou edilício. Disciplinado nos artigos 1.314 e seguintes do Código Civil, condomínio voluntário é o que se origina da vontade dos condôminos, ou seja, quando duas ou mais pessoas adquirem o mesmo bem.
Espécies de Condomínio
Quanto à origem: o condomínio pode ser convencional ou voluntário, eventual ou legal (este resultante da vontade de terceiros, p.ex. doador ou testador), ainda, legal ou necessário (este imposto por lei, p. ex. paredes, muros).
Quanto à forma: o condomínio pode ser pro diviso ou pro indiviso, transitório ou permanente.
Quanto ao objeto: condomínio pode ser universal, quando abrange todos os bens, inclusive frutos e rendimentos, como na comunhão hereditária, e singular, incidente sobre coisa determinada (muro divisório, p. ex.).
Condomínio Edilício
Segundo Gonçalves, caracteriza-se o condomínio edilício pela apresentação de uma propriedade comum ao lado de uma propriedade privativa. Cada condômino é titular, com exclusividade, da unidade autônoma (apartamento, escritório, loja, sobreloja, garagem) e titular de partes ideais das áreas comuns (terreno, estrutura do prédio, telhado, rede geral de distribuição de água, esgoto, gás e eletricidade, calefação e refrigeração centrais, corredores de acesso às unidades autônomas e ao logradouro público etc.). O Código Civil de 1916 nada trazia a respeito da matéria. Logo, o novo diploma legal preceitua a matéria no artigo 1.331.
Natureza Jurídica do Condomínio Edilício
Várias teorias tentam explicar a natureza jurídica do condomínio em edificações, o qual não se aplica os princípios do condomínio em geral. Dentre várias teorias – as quais não se podem definir uma com exatidão – uma coisa é incontroversa: o condomínio não tem personalidade jurídica. Entretanto, está legitimado a atuar em juízo, ativa e passivamente, representado pelo síndico (CPC, art. 12, IX), em situação similar à do espólio e da massa falida. Nesse sentido, parece-nos que o doutrinador ficou omisso ao indicar uma teoria, todavia, ironicamente aduz que o principal argumento em favor da teoria da personalização do condomínio edilício encontra-se no fato de o art. 63, parágrafo 3º, da Lei n.º 4.591/64, não revogado pelo Código Civil de 2002, conceder preferência, após a realização do leilão final, ao condomínio, ao qual serão adjudicados os bens.
Estrutura Interna do Condomínio Edilício
Segundo o artigo 1331, caput, o condomínio é composto de unidades autônomas e áreas comuns.
A unidade autônoma pode consistir em apartamentos, escritórios, salas, lojas, sobrelojas, abrigos para veículos ou casas em vilas particulares, não se reclamando número mínimo de peças nem metragem mínima. Nenhuma unidade autônoma pode ser privada de saída para a via pública. Exige a lei n.º 4.591/64 que cada uma tenha designação especial, numérica ou alfabética. Ainda segundo a mencionada lei, cada condômino poderá alugá-la, cedê-la, gravá-la, sem que necessite de autorização dos outros condôminos.
Depois com a entrada em vigor da lei n.º 12.607/2012 protegeu os abrigos para veículos (garagens) que não poderão ser alugados ou alienados a pessoas estranhas ao condomínio, salvo convenção do condomínio em assembleia.
É válido ressaltar que os condôminos não têm direito à preferência, exceto garagens, ao contrário que acontece no condomínio em comum, previsto no art. 504 do Código Civil.
Para efeitos tributários, cada unidade autônoma será tratada como prédio isolado.
Os arts. 1331, parágrafo 2º, do CC/2002 e 3º da Lei n.º 4.591/64 elencam as áreas comuns do condomínio, usada por todos, quais sejam: o solo, a estrutura do prédio, o telhado, a rede geral de distribuição de água, esgoto, gás e eletricidade, a calefação e refrigeração centrais, e as demais partes comuns, inclusive o acesso ao logradouro público, são utilizados em comum pelos condôminos, não podendo ser alienados separadamente, ou divididos. O art. 19 da Lei especial ainda aduz que cada consorte poderá usar as partes e coisas comuns, da maneira a não causar dano ou incômodo aos demais condôminos ou moradores, nem obstáculo ou embaraço ao bom uso das mesmas partes por todos.
Deveres dos Condôminos
A vida em uma comunidade restrita como a existente no condomínio edilício exige, para que se tenha uma convivência harmoniosa, a observância de diversas normas, às quais não sem elas não seria possível a convivência.
Os deveres dos condôminos estão elencados em rol taxativo no art. 1335 a 1338, parágrafo 2º do art. 1339 e nos arts. 1345 e 1346 do Código Civil.
Art. 1336 – São deveres do Condômino:
I – contribuir para as despesas do condomínio, na proporção de suas frações ideais, salvo disposição em contrário na convenção;
II – não realizar obras que comprometam a segurança da edificação;
III – não alterar a forma e a cor da fachada, das partes e esquadrias externas;
IV – dar às suas partes a mesma destinação que tem a edificação, e não as utilizar de maneira prejudicial ao sossego, salubridade e segurança dos possuidores, ou aos bons costumes.
Direitos dos Condôminos
Os principais direitos dos condôminos estão elencados no artigo 1.335 do Código Civil, senão vejamos:
Art. 1.335 – São direitos do condômino:
I – usar, fruir e livremente dispor de suas unidades;
II – Usar das partes comuns, conforme a sua destinação, e contanto que não exclua a utilização dos demais compossuidores;
III – votar nas deliberações da assembleia e delas participar, estando quite.
Além desses, outros direitos estão previstos nos artigos 1338 e 1339, parágrafo 2º do aludido diploma.