O Direito à Vida: Análise Constitucional e Proteção
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O direito à vida é o primeiro dos direitos fundamentais constitucionalmente enunciados.
Não se trata, porém, apenas de um prius lógico: o direito à vida é material e valorativamente o bem mais importante do catálogo dos direitos fundamentais e da ordem jurídico-constitucional no seu conjunto. Precisamente por isso é que o direito à vida coloca problemas jurídicos de decisiva relevância nas comunidades humanas. No plano da determinação do bem protegido, justifica e impõe o recorte do conceito constitucional de vida humana, a definição do começo e fim da vida humana e a delimitação do âmbito de proteção.
O conteúdo jurídico objetivo da proteção do bem da vida humana implica, de forma incontornável, o reconhecimento do dever de proteção do direito à vida, quer quanto ao conteúdo e extensão, quer quanto às formas e meios de efetivação desse dever (medidas estaduais, defesa perante perigos e ameaças, conformação de proteção do bem vida nas várias normas desse direito). Este dever de proteção coloca, por sua vez, delicadas questões relacionadas com a autonomia da pessoa (direito ao corpo, suicídio, colocação da vida em perigo, consentimento de tratamentos médicos, liberdade de morrer).
O objeto de proteção deste preceito é a própria vida humana. O direito à vida só pode ser titulado por pessoas. O âmbito pessoal de proteção do direito à vida implica a determinação da titularidade do direito à vida: (1) pessoas vivas; todas as pessoas físicas e não pessoas coletivas; pessoas de todas as nacionalidades, raças e credos.
O sentido geral da garantia e proteção do direito à vida no plano constitucional é, desde logo, a proteção da existência vivente, físico-biológica. Em qualquer destes aspetos, o direito à vida impõe-se contra todos, perante o Estado e perante os outros indivíduos.
Os problemas constitucionais mais controvertidos na atualidade dizem respeito ao começo e fim da vida humana. Quanto ao início da vida, a CRP pressupõe um âmbito normativo garantidor de todos os momentos do ato ou processo de nascer. Quanto à morte, o critério normativo hoje dominante é o da morte cerebral completa e irreversível.
Enquanto bem ou valor constitucionalmente protegido, o conceito constitucional de vida humana abrange não apenas a vida das pessoas, mas também a vida pré-natal, ainda não investida numa pessoa, a vida intra-uterina e a vida de embrião fertilizado.
A proteção da vida humana, enquanto valor em si, independente da sua subjetivação pessoal, levanta ainda o problema de saber se o dever de a proteger se impõe ao próprio indivíduo (dever de viver), negando assim um direito ao suicídio.
O direito à vida significa também direito a viver com dignidade. Neste sentido, o direito à vida articula-se com o princípio da dignidade da pessoa humana e traduz-se no direito a dispor das condições de subsistência, integrando designadamente o direito ao trabalho (ou ao subsídio de desemprego, na falta daquele), à proteção da saúde, à habitação, implicando o dever do Estado contribuir para a realização das prestações existenciais indispensáveis a uma vida minimamente digna.
O nº2 deve ler-se, como é óbvio: «Em nenhum caso haverá pena de morte». A centralidade do direito à vida na «ordem de valores» jurídico-constitucional portuguesa obriga não apenas à proibição da pena de morte no âmbito da soberania portuguesa, mas também à defesa da vida de jurisdições estrangeiras (consagrando-se a não extradição e não entrega de cidadãos para países onde haja pena de morte aplicável ao crime cometido).
Quanto ao âmbito de proteção subjetivo do direito à vida, trata-se obviamente de um direito universal, como sucede com a generalidade dos direitos, liberdades e garantias de natureza pessoal, pelo que não há lugar para o reservar para as pessoas de nacionalidade portuguesa, excluindo os estrangeiros (15º/1). Todas as pessoas, pelo facto de o serem, gozam do direito à vida.