Doenças Gastrointestinais e Hepáticas: Guia Completo
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Condições da Cavidade Oral e Esôfago
Monilíase Oral
- Lesões esbranquiçadas que não se desprendem facilmente (popularmente conhecido como "sapinho").
Estomatite
- Lesões ulcerosas na cavidade oral, chamadas "aftas".
Glossite
- Lesão não ulcerada na área central do terço médio da língua, com sintomatologia discreta e considerada benigna.
Fenda Palatina
- Regurgitação de leite para a cavidade nasal, com risco de aspiração pulmonar e podendo desencadear processos inflamatórios. Sucção ineficiente.
Disfagia
Qualquer interferência na precisão e sincronia dos movimentos de músculos e estruturas associadas à deglutição.
- Debilidade no controle pelo sistema nervoso central ou disfunção mecânica.
- Envelhecimento: diminuição da secreção salivar, prejuízo na peristalse faríngea e na abertura do esfíncter esofágico.
Causas da Disfagia
- Relacionadas ao sistema nervoso central: derrame, doença de Parkinson, esclerose múltipla, neoplasias.
- Distúrbios neuromusculares: miastenia grave, poliomielite bulbar, neuropatia periférica (secundária à diabetes).
- Lesões estruturais locais: abscessos, divertículo de Zenker.
Esofagite
Refluxo: retorno para o esôfago do conteúdo ácido-péptico gástrico, resultando em inflamação da mucosa esofágica e esofagite.
Causa da Esofagite
- Queda na pressão do esfíncter esofágico inferior, que não se contrai adequadamente após a passagem dos alimentos para o estômago, levando ao retorno do conteúdo gástrico.
Condições Gástricas
Células Gástricas e Suas Funções
- Células Mucosas: secretam muco.
- Células Parietais: secretam HCl e fator intrínseco.
- Células Principais: secretam pró-enzimas proteolíticas, como pepsinogênio I e II.
- Células Endócrinas: presentes no fundo, corpo e antro, como a gastrina.
Gastrite
É a inflamação da mucosa gástrica, podendo ser crônica ou aguda.
Etiologia da Gastrite
- Idiopática, possivelmente devido a defeitos nos mecanismos protetores gástricos.
- AINEs (Anti-inflamatórios Não Esteroides).
- Álcool e Tabagismo.
- Quimioterápicos.
- Trauma Nasogástrico (sondas).
- Estresse intenso (ex: em pacientes queimados).
Helicobacter pylori (H. pylori)
- Graças à capacidade de converter a ureia presente no suco gástrico em amônia e gás carbônico.
Úlcera Gástrica Aguda
- Pacientes queimados, sepse e traumas graves.
Síndrome de Dumping
Resposta fisiológica complexa à presença de quantidades maiores que o habitual de alimentos sólidos ou líquidos na porção proximal do intestino delgado.
- Resultado da perda de regulação normal do esvaziamento gástrico.
- Sintomas: plenitude intestinal e náuseas (dentro de 10 a 20 minutos após a refeição), rubor em face, taquicardia, sensação de desmaio, sudorese. Após 3 horas, pode ocorrer uma hipoglicemia reacional (hipoglicemia alimentar), manifestada por ansiedade, fraqueza e tremores.
Condições Intestinais Comuns
Constipação Intestinal
- Fezes duras, evacuação incompleta, esforço para defecar e movimentos intestinais infrequentes.
Causas Sistêmicas da Constipação
- Uso crônico de laxantes.
- Anormalidades metabólicas e endócrinas, como hipotireoidismo.
- Falta de exercício físico.
- Ignorar o estímulo de defecar.
- Doença neuromuscular sistêmica.
- Dieta pobre em fibras.
- Gravidez.
- Baixa ingestão de água.
Tratamento da Constipação
- Exercício físico regular.
- Atenção ao estímulo de defecar.
- Retirada gradual de laxantes.
- Tratamento da doença de base com medicamentos específicos.
Tipos de Diarreia
Diarreias Osmóticas
- Causadas pela presença no trato intestinal de solutos osmoticamente ativos que são pouco absorvidos.
- Exemplos: diarreias que acompanham a síndrome do esvaziamento rápido e após a ingestão de lactose na presença de deficiência de lactase.
Diarreias Secretórias
- Resultado da secreção ativa de eletrólitos e água pelo epitélio intestinal.
- Causadas por toxinas bacterianas.
- Não são aliviadas pelo jejum.
Diarreias Exsudativas
- Estão sempre associadas à lesão na mucosa, levando ao extravasamento de muco, sangue e proteínas plasmáticas, com acúmulo de líquido, eletrólitos e água no intestino.
- Associadas à colite ulcerativa crônica.
Diarreias por Contato Mucoso Limitado
- Destruição ou diminuição da mucosa, consequentemente, redução da área absortiva.
- Ocorre na Doença de Crohn ou após ressecção intestinal extensa.
Esteatorreia
Consequência da má absorção, na qual a gordura não absorvida permanece nas fezes.
Causas da Esteatorreia
- Insuficiência biliar secundária à hepatopatia, obstrução biliar ou ressecção ileal.
- Insuficiência pancreática.
- Falha de absorção normal devido a dano na mucosa, como na doença celíaca ou doença de Crohn.
Doenças Intestinais Específicas
Doença Celíaca
Fisiopatologia da Doença Celíaca
- Doença autoimune.
- Reação ao glúten (frações proteicas: gliadina do trigo, secalina do centeio, hordeína da cevada e avenina da aveia).
- O dano na mucosa intestinal resulta em má absorção.
- Ocorre atrofia e achatamento das vilosidades, limitando a área disponível para absorção.
- Deficiência de dissacaridases e lactases.
- Má absorção e desnutrição.
Sintomas da Doença Celíaca
- Diarreia (até 10 evacuações/dia).
- Atraso no crescimento.
- Vômitos.
- Abdome distendido.
- Fezes com aparência e odor anormais.
- Perda de peso.
- Fadiga.
- Anemia.
- Doença óssea.
Intolerância à Lactose
- Atinge todos os grupos etários.
- A lactose não hidrolisada em galactose e glicose permanece no intestino e atua osmoticamente, atraindo água para o lúmen intestinal.
- Bactérias colônicas fermentam a lactose não digerida, gerando ácidos graxos de cadeia curta (AGCC), dióxido de carbono e gás hidrogênio.
Sintomas da Intolerância à Lactose
- Inchaço abdominal.
- Flatulência.
- Cólicas.
- Diarreia.
Doenças Inflamatórias Intestinais (DIIs)
- A etiologia e a patogênese não foram totalmente esclarecidas.
- Inflamação crônica no trato digestivo.
- Evidências sugerem que a imunorregulação anormal da mucosa constitui o ponto central para o início e a perpetuação da inflamação.
- Há predisposição genética; história familiar positiva constitui o fator de risco mais importante conhecido para o desenvolvimento de DII.
Colite Ulcerativa
- Envolve apenas o cólon, e a doença sempre se estende ao reto.
- A mucosa apresenta pequenas úlceras.
- A doença abrange áreas contínuas.
- Presença de sangramento retal ou diarreia sanguinolenta.
- Ocorre mais frequentemente em pessoas jovens, entre 15 e 30 anos.
- Na doença grave e de longa duração, há risco aumentado de câncer, portanto recomenda-se a remoção completa do cólon, com a criação de ileostomia.
Doença de Crohn
- Pode envolver qualquer segmento do trato digestivo, desde a boca até o ânus, e frequentemente se apresenta com lesões multifocais separadas por segmentos normais.
- O intestino delgado, especialmente o íleo terminal, está envolvido em cerca de 75% dos casos, e apenas 15 a 25% dos casos envolvem apenas o cólon.
- Tem natureza transmural e pode acometer a parede intestinal, o mesentério e os gânglios linfáticos.
- Os sintomas são influenciados pelo local e pelo tipo das lesões inflamatórias.
Complicações e Tratamento Cirúrgico na Doença de Crohn
- Além da inflamação, pode ocorrer ulceração, abscesso, fístulas e espessamento submucoso, levando a segmentos estreitados do intestino e obstrução parcial ou completa do lúmen intestinal.
- A cirurgia pode ser necessária para reparar obstruções ou remover porções do intestino quando o tratamento clínico falha.
- 50 a 70% das pessoas são submetidas à cirurgia, que não cura a doença.
Problemas Nutricionais nas DIIs
- Anemias (devido à perda de sangue e baixa ingestão alimentar).
- Estreitamento intestinal: náuseas, crescimento bacteriano excessivo e diarreia.
- Inflamações e ressecções cirúrgicas: diarreia e má absorção de macro e micronutrientes.
- Trânsito intestinal aumentado: diarreia e má absorção.
- Medo de comer (sitiofobia).
- Atraso no crescimento, perda de peso, deficiências de micronutrientes e desnutrição proteico-calórica.
Cuidado Nutricional nas DIIs
- Nutrição parenteral: em casos de ressecções extensas.
- Nutrição enteral: via ideal (oral ou por sonda), utilizando fórmulas elementares ou oligoméricas, dependendo da localização e extensão da doença.
- VET (Valor Energético Total): aumentado.
- PTN (Proteína): Dieta hiperproteica.
- Vitaminas e Minerais: Suplementação.
- Dieta com baixo resíduo, isenta de lactose e sacarose.
- LIP (Lipídios): Uso de TCM (Triglicerídeos de Cadeia Média) e ômega-3 (W3), que diminui a resposta inflamatória (3-5g/dia); dieta hipolipídica (menor que 20% do VET).
Outras Condições Intestinais
Síndrome do Intestino Irritável (SII)
- Sintomas: dor abdominal (aliviada por defecação), inchaço, movimentos intestinais anormais, diarreia alternando com constipação, dor retal, muco nas fezes.
- Causas e Fatores Desencadeantes: agentes estressantes (como divórcio, mudanças de emprego, viagem, nova localização ou situação social), excesso de uso de laxantes, antibióticos, cafeína, ausência de regularidade no sono e descanso. Podem disparar o início ou piorar os sintomas.
Diverticulose
Refere-se a herniações semelhantes a sacos na parede colônica.
- Provavelmente resultado de pressões colônicas aumentadas a longo prazo.
- Causa provável: ingestão reduzida de fibras e constipação.
- É relativamente rara em países com alta ingestão de fibras.
- Aumenta com a idade: 30% em indivíduos com mais de 50 anos, 50% com mais de 70 anos e 66% com mais de 80 anos.
- Complicações: variam de sangramento suave e indolor, hábitos intestinais alterados e inflamação (diverticulite).
Cuidado Nutricional na Diverticulose
- Dieta rica em fibras.
- Aumento da ingestão hídrica.
- Maior consumo de verduras e frutas.
- Menor consumo de alimentos industrializados.
Diverticulite
É a inflamação do divertículo, podendo levar à formação de abscessos, perfuração aguda, sangramento e sepse.
- 10 a 25% dos pacientes com diverticulose desenvolvem inflamação.
- Um terço dos pacientes internados necessitam de cirurgia.
Cuidado Nutricional na Diverticulite
- Dieta com baixo resíduo (sem fibras e lactose).
- Dieta elementar ou Nutrição Parenteral Total (NPT), dependendo da gravidade.
- Retorno gradual a uma dieta com fibras.
- Baixo teor de gorduras.
- Em casos de perfuração, evitar sementes, nozes, cascas e pedaços grandes de alimentos.
Síndrome do Intestino Curto (SIC)
Refere-se a um conjunto de sinais e sintomas usados para descrever as consequências nutricionais e metabólicas de grandes ressecções do intestino delgado.
- Ressecções de 40 a 50% podem levar a algumas das consequências da SIC.
- Ressecção de 70% ou mais do intestino delgado deixa o paciente com 70-100 cm de intestino remanescente.
- Pacientes com menos de 100 cm de intestino delgado que não apresentam cólon em continuidade necessitam de Nutrição Parenteral (NP).
- Com o tempo, o intestino remanescente sofre alterações estruturais e funcionais que aumentam a absorção de nutrientes e fluidos.
Causas da Síndrome do Intestino Curto
- Ressecção cirúrgica do intestino delgado (como, por exemplo, em casos de Doença de Crohn ou tumores).
- Derivações do trânsito intestinal (como no caso de fístulas e cirurgia bariátrica).
- Em raros casos, decorrente de uma disfunção completa de grande parte do intestino delgado (devido a infecções, isquemia, quimioterapia e/ou radioterapia).
Ressecções Extensas do Íleo
As razões comuns para ressecção extensa são:
- Doença de Crohn.
- Infarto mesentérico.
- Enterite por irradiação.
- Câncer.
- Vólvulo.
- Anormalidades congênitas.
Ostomias
- Jejunostomia: abertura dentro do jejuno, quando todo o íleo, cólon, reto e ânus são removidos.
- Ileostomia: abertura dentro do íleo, quando todo o cólon, reto e ânus são removidos.
- Colostomia: abertura no cólon, quando apenas o reto e ânus são removidos.
Condições Hepáticas
Fígado: Funções Essenciais
O fígado é responsável por:
- Produzir bile.
- Manter a glicemia.
- Produzir proteínas.
- Metabolizar colesterol, álcool e medicamentos.
Células de Kupffer
- São células que revestem as placas hepatocelulares.
Icterícia
É a coloração amarelada da pele e das escleras (o branco dos olhos) causada por concentrações anormalmente elevadas de bilirrubina no sangue.
Metabolismo da Bilirrubina
- Captação: a bilirrubina indireta é removida da albumina.
- Conjugação: a bilirrubina é conjugada ao ácido glicurônico, formando a bilirrubina conjugada.
- Secreção: ocorre nos canalículos biliares; normalmente, toda bilirrubina excretada na bile está na forma conjugada.
Hipertensão Portal
- É definida como uma pressão sanguínea anormalmente elevada na veia porta, uma veia de grande calibre que transporta o sangue do intestino para o fígado.
- A veia porta recebe o sangue oriundo de todo o intestino, do baço, do pâncreas e da vesícula biliar.
- A causa mais comum é o aumento da resistência ao fluxo sanguíneo causado pela cirrose.
Ascite
É o acúmulo de líquido no interior da cavidade abdominal.
- Tende a ocorrer em distúrbios crônicos (de longa duração).
- Ocorre mais comumente na cirrose, especialmente na cirrose alcoólica.
Tratamento da Ascite
- Repouso ao leito.
- Dieta sem sal.
- Drogas diuréticas.
Cirrose Hepática
É uma condição ocasionada por certas doenças crônicas do fígado que provocam a formação de tecido cicatricial e dano permanente ao fígado.
- Fibrose e formação de nódulos: bloqueio da circulação sanguínea e necrose hepatocelular.
Consequências e Causas da Cirrose
- Cirrose: tecido de cicatrização no lugar das células saudáveis, que morrem.
- O fígado deixa de desempenhar suas funções normais: produzir bile, manter a glicemia, produzir proteínas, metabolizar colesterol, álcool e medicamentos.
Causas da Cirrose
- Uso excessivo de álcool.
- Infecção pelos vírus da hepatite B ou C.
- Algumas doenças genéticas.
- Hepatite autoimune.
Tratamento da Cirrose
- Eliminar o agente agressor (álcool, drogas, vírus da hepatite).
- Transplante pode ser a única solução para a cura definitiva da doença.
Encefalopatia Hepática
- Ocorre deterioração da função cerebral devido ao acúmulo de substâncias tóxicas no sangue.
- Excesso de produtos tóxicos provenientes da alimentação e do próprio fígado, que deveria eliminá-los.
- A encefalopatia surge quando o fígado torna-se incapaz de eliminar ou transformar esses produtos tóxicos, devido à destruição de suas células.
Insuficiência Hepática
- Deterioração grave da função hepática.
- Para que ocorra, deve haver uma lesão de grande porção do fígado.
Tipos de Hepatite Viral
Hepatite A
- Vírus: HAV (RNA).
- Transmissão: fecal-oral (água e alimentos contaminados).
- Endêmica em regiões com condições sanitárias inadequadas (viagens).
- Nessas regiões, é mais comum na infância, com manifestações leves ou assintomáticas.
- Produz apenas doença aguda.
- Pode evoluir com a forma fulminante.
- Não gera estado de portador ou hepatite crônica.
- Período de incubação: 15 a 45 dias.
- A vacinação não faz parte do calendário vacinal universal, mas é recomendada em situações específicas (2 doses).
Hepatite B
- Vírus: HBV (DNA).
- Transmissão: parenteral, vertical, sexual.
- Período de incubação: 30 a 180 dias.
- Vacina: 3 doses, com cerca de 95% dos vacinados desenvolvendo anticorpos e proteção próxima de 100%.
- A infecção por HBV pode produzir:
- Hepatite aguda.
- Hepatite fulminante com necrose hepática maciça.
- Portador assintomático.
- Doença crônica progressiva com evolução para cirrose e/ou carcinoma hepatocelular.
Hepatite C
- Vírus: HCV (RNA).
- Transmissão: parenteral, vertical e sexual.
- Período de incubação: 20 a 90 dias.
- Fase aguda em geral assintomática.
- Não apresenta forma fulminante.
- Alta taxa de progressão para doença crônica e cirrose. Pode evoluir para um carcinoma hepatocelular.
Hepatite D
- Vírus: HDV (molécula única de RNA).
- Vírus defectível que exige a presença obrigatória do HBV.
- Transmissão: semelhante ao HBV (parenteral, sexual e vertical).
- Padrões de infecção:
- Co-infecção.
- Superinfecção.
- Piora o prognóstico da Hepatite B.
Hepatite E
- Vírus: HEV (RNA).
- Transmissão: fecal-oral.
- Predomina em adultos.
- Autolimitada.
- Não cronifica.
- Alta letalidade em gestantes (20%).
- Baixa prevalência no Brasil.
Co-infecção e Superinfecção (Hepatites)
- Na co-infecção, a hepatite pode ser grave e mesmo fulminante, mas raramente evolui para uma forma crônica.
- Nos casos de superinfecção, o VHD provoca uma hepatite aguda grave e evolui para hepatite crônica, podendo causar lesões hepáticas graves e contribuir para o desenvolvimento de cirrose.