Efeitos da Sentença e Tutela Jurisdicional no Processo

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495 - Efeitos da Sentença. A tutela jurisdicional concedida pela sentença guarda relação com o pedido formulado na petição inicial, ou mesmo pelo réu, quando este apresentar reconvenção ou pedido contraposto, ou quando se tratar de ação dúplice. No processo de conhecimento, a sentença será sempre declaratória, seja para conferir certeza à relação jurídica afirmada pelas partes ou negar a existência dessa relação.
A meramente declaratória se restringe à declaração de certeza da existência ou inexistência de relação jurídica, ou da autenticidade ou falsidade de documento. A condenatória, além da declaração de certeza do direito afirmado pela parte, impõe uma condenação ao devedor. A constitutiva, além da declaração da situação jurídica preexistente, cria, modifica ou extingue a relação jurídica. Tais efeitos são denominados principais porque visados pelos litigantes, tanto que se manifestam em razão do pedido; também denominados formais, porquanto constam expressamente do dispositivo da sentença; finalmente, denominam-se efeitos materiais em razão da influência que podem criar sobre a situação jurídica dos litigantes.
Afora os efeitos principais (declaratório, condenatório ou constitutivo), há efeitos que se manifestam automaticamente, em decorrência de previsão legal, independentemente de qualquer pronunciamento judicial. Tais efeitos, denominados secundários ou acessórios, surgem do simples ingresso da sentença no mundo jurídico.
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A sentença que decreta a separação judicial ou divórcio, bem como a que anula o casamento, além do efeito constitutivo ou declaratório visado pelas partes e deferido pelo juiz, automaticamente, põe fim ao regime de comunhão de bens (arts. 1.571, II, III e IV, e 1.576 do CC).
Hipoteca Judiciária. A hipoteca judiciária, conforme previsto no art. 495, constitui efeito secundário de toda sentença que condenar o réu ao pagamento de prestação em dinheiro e que determinar a conversão de prestação de fazer, não fazer ou dar coisa certa em prestação pecuniária. Nessas últimas hipóteses, a conversão da obrigação em prestação pecuniária se dá porque as obrigações originárias não puderam ser cumpridas da forma como ajustadas. Por exemplo: se um cantor é contratado para fazer um show e não comparece, injustificadamente, ao evento, causando prejuízos ao contratante, a obrigação que era de fazer deve se converter em pecúnia, já que não haverá mais utilidade no cumprimento da obrigação original.
Decisão Pendente e de Recurso. O CPC/2015 segue o entendimento jurisprudencial ao definir que a decisão submetida a recurso ainda não julgado é passível de hipoteca, ainda que este tenha sido recebido sob efeito suspensivo. Isso se dá porque se entende que a hipoteca judicial “constitui efeito natural e imediato da sentença condenatória, de modo que pode ser deferida a requerimento do credor independentemente de outros requisitos, não previstos em lei”.
Direito de Preferência. No CPC/1973, a hipoteca judiciária não assegura ao credor qualquer direito de preferência quanto ao recebimento dos créditos estabelecidos na sentença. Ela apenas figura como meio preventivo para se evitar a alienação dos bens em fraude à execução. A preferência leva em consideração apenas o registro da penhora ou do arresto, segundo posição dominante do STJ. Conforme redação do § 4º, “a hipoteca judiciária, uma vez constituída, implicará, para o credor hipotecário, o direito de preferência quanto ao pagamento, em relação a outros credores, observada a prioridade no registro”. Isso quer dizer que, nas hipóteses em que houver mais de um credor, o crédito daquele que fizer o registro da sentença perante o cartório de registro imobiliário terá preferência em relação aos demais. Ressalte-se que essa regra é processual e, portanto, não se sobrepõe às preferências estabelecidas nas regras de direito material.
Responsabilidade Objetiva. O § 5º estatui responsabilidade objetiva no caso de dano resultante de hipoteca judicial requerida com lastro em título de natureza provisória, isto é, que poderia sofrer alteração, uma vez que não transitou em julgado. Trata-se de um risco que o requerente pode ou não correr. Deve-se entender que o dispositivo se aplica à hipoteca fundamentada em tutela antecipada que tenha sido estabilizada (art. 304), pois a adoção desse efeito não implica imutabilidade e indiscutibilidade da crise de direito material.


496 - Duplo Grau de Jurisdição e Remessa Necessária. O princípio do duplo grau de jurisdição consiste na possibilidade assegurada às partes de submeterem matéria já apreciada e decidida pelo juízo originário a novo julgamento por órgão hierarquicamente superior. Embora se trate de princípio ínsito ao sistema recursal, o duplo grau de jurisdição também encontra seu fundamento nas hipóteses em que, vencida a Fazenda Pública, a sentença precisa ser submetida ao tribunal, para fins de confirmação, mesmo que não haja recurso por parte do ente público vencido.
Trata-se do reexame necessário – ou remessa necessária –, que não deve ser considerado recurso, seja por lhe faltar tipicidade, seja por não deter diversos dos requisitos básicos exigidos para caracterização dos recursos, tais como a necessidade de fundamentação, o interesse em recorrer, a tempestividade, o preparo, entre outros. Por esse motivo, entende-se que a remessa necessária tem natureza jurídica de condição de eficácia da sentença, não se relacionando, portanto, com os recursos previstos na legislação processual.
No anteprojeto do CPC/2015, uma das propostas era a extinção da remessa necessária (reexame necessário ou duplo grau de jurisdição obrigatório). Apesar de não ter havido adesão de parte da bancada legislativa, o atual art. 496 restringiu, ainda mais, as hipóteses de aplicação do instituto.
Novos Parâmetros de Valor para a Aplicação do Reexame Necessário. O CPC/2015 estabelece valores diferenciados de acordo com o ente envolvido. De fato, os entes mais bem aparelhados são os que menos precisam desse privilégio, sendo plenamente justificável a diferenciação. Ressalte-se que tal ideia já havia sido proposta em diversos projetos de lei, entre os quais cito o PL nº 3.533/2004, que previa a remessa necessária apenas nos casos em que a sentença fosse desfavorável aos Municípios com população igual ou inferior a um milhão de habitantes.
O parâmetro “valor da condenação” somente se aplica às hipóteses em que a sentença contiver valor certo e líquido. Assim, para os casos em que for necessária a liquidação, a remessa continua sendo obrigatória. Esse já era, inclusive, o entendimento do STJ.
A redação do § 4º ampliou as hipóteses nas quais deverá prevalecer o entendimento jurisprudencial em detrimento da remessa necessária. A premissa nesses casos é: se a sentença está de acordo com o entendimento dos tribunais superiores, não há razões para submetê-la a reexame para simples confirmação do fundamento utilizado pelo julgador na sentença originária.


497 - O art. 461 do CPC/1973, com a redação que lhe foi dada pela Lei nº 8.952/1994 e as alterações da Lei nº 10.444/2002, instituiu meios que permitiram ao aplicador do direito assegurar a tutela específica ou o resultado prático que deveria ter sido produzido com o cumprimento da obrigação pactuada. O caput do art. 461 do CPC/1973 foi praticamente reproduzido no novo Código.
Tutela Específica das Obrigações de Fazer e de Não Fazer. De acordo com o caput, poderá o juiz, na sentença, se procedente o pedido, conceder a tutela específica da obrigação de fazer ou não fazer, ou determinar providências que assegurem o resultado prático equivalente ao do adimplemento da obrigação originária. Exemplo: o Ministério Público, em ação civil pública, pleiteia seja o réu condenado a não lançar poluentes no ar. Poderá o juiz, na sentença, condenar o réu à tutela específica, consistente no abster-se de lançar poluentes, ou determinar providências que assegurem o mesmo resultado prático, ou seja, a preservação do meio ambiente, que pode ser alcançada com a instalação de filtros (tutela equivalente).
O referido dispositivo permite-nos extrair duas conclusões a propósito do momento para concessão da tutela equivalente. Pode ser concedida na própria sentença, em acolhimento a pedido alternativo do autor, ou de ofício, ante a impossibilidade de concessão da tutela específica. Pode também a tutela equivalente ser concedida após a sentença, de ofício, como consequência do descumprimento do preceito fixado no provimento judicial.
Dispensabilidade do Dano. O parágrafo único do art. 497 é novidade no ordenamento, mas evidencia regra que já tinha aplicação na prática. Para surtir efeitos, a sentença de procedência pode ser complementada por comandos imperativos, que são acompanhados de medidas de pressão para que o próprio devedor adote a conduta devida e produza o resultado específico. A ação ou omissão prejudicial à efetivação da tutela correspondente deve ser “barrada”, mesmo que a parte contrária não esteja agindo com dolo ou com culpa. Em termos práticos, ao autor deve ser garantida a satisfação do direito que já foi confirmado na sentença.
Astreintes. Independentemente da providência a ser adotada pelo magistrado para efetivar a tutela concedida na sentença, é possível a aplicação concomitante de multa com o intuito de desestimular o réu a descumprir a determinação judicial (art. 500). A multa poderá ser fixada por tempo de atraso, de forma a coagir o devedor a adimplir a obrigação na sua especificidade. Até mesmo nos casos em que a obrigação tenha se convertido em perdas e danos, permanece possível a aplicação da multa.
Além da multa, não se descarta a aplicação das medidas de apoio, tais como busca e apreensão, remoção de pessoas e coisas, desfazimento de obras, intervenção em empresas e impedimento de atividade nociva, se necessário com requisição de força policial (art. 536, § 1º).
Ao credor não é facultado optar pelo pagamento da multa ou pelo cumprimento do preceito fixado na sentença. Assim, se a multa não foi capaz de compelir o devedor a adimplir a obrigação específica, deverá o juiz determinar providências que assegurem o resultado prático equivalente ao adimplemento. Mesmo adimplindo a obrigação, poderá o credor, após o trânsito em julgado da sentença, promover a execução da multa (execução por quantia certa). A conversão da obrigação em perdas e danos ocupa o último lugar no rol de alternativas postas à disposição do credor, figurando como medida substitutiva do objeto da obrigação original, caso não tenha a multa o poder de coação almejado e não seja possível obter a tutela equivalente (art. 499). Entretanto, poderá o autor desprezar as tutelas que o legislador lhe facultou e requerer, já na petição inicial, a substituição da obrigação específica por perdas e danos.


498 - Tutela Específica das Obrigações de Entregar Coisa. Quando a sentença ou acórdão contiver obrigação de entrega de coisa, a efetivação da tutela far-se-á segundo o art. 498.
Na petição inicial, o autor requererá a providência judicial almejada, consistente numa ordem, mandamento ou determinação para que o réu entregue a coisa (certa) descrita no título que representa a obrigação (contrato de compra e venda, por exemplo). Quando se tratar de coisa incerta, ou seja, determinada apenas pelo gênero e quantidade (um boi zebu dentre aqueles que se encontravam na Exposição de Uberaba), o autor a individualizará na petição inicial, se lhe couber a escolha; cabendo ao devedor escolher, a ordem judicial será no sentido de que entregue a coisa individualizada no prazo fixado pelo juiz (art. 498, parágrafo único). A ordem visada pelo autor poderá ser pleiteada a título de tutela antecipada ou final.
Em resposta ao pedido do autor, poderá o juiz, na decisão, final ou antecipatória, conceder a tutela específica, ou seja, determinar a entrega da coisa ou determinar providências que assegurem o mesmo resultado prático. Exemplo: a concessionária se obrigou a entregar o automóvel modelo Marea ELX. Ocorre que o modelo ELX não é mais fabricado, mas a concessionária tem em seu pátio o modelo ELP, similar ao que consta do contrato. Pode o juiz, a requerimento do autor, determinar a entrega do modelo similar, assegurando, assim, resultado prático equivalente.
Como meio de compelir o réu a cumprir a determinação judicial, também poderá o juiz, de ofício ou a requerimento da parte, impor multa (astreintes) ao devedor da obrigação, fixando-lhe prazo razoável para entrega da coisa. Para evitar repetição, fazemos remissão ao que afirmamos a propósito da multa relativa ao cumprimento das obrigações de fazer e não fazer, perfeitamente aplicável à efetivação da tutela das obrigações de entregar coisa.
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Não sendo a multa eficaz para vencer a resistência do réu a entregar a coisa no prazo estabelecido, “será expedido mandado de busca e apreensão ou de imissão na posse em favor do credor, conforme se tratar de coisa móvel ou imóvel” (art. 538).
A efetivação da tutela, como podemos verificar, é feita por coerção ou por atos do Estado-juízo sobre a própria coisa (busca e apreensão). Somente na hipótese extrema de perda da coisa ou de absoluta impossibilidade de apreendê-la, a obrigação converter-se-á em perdas e danos.


499 - Conferir Comentários aos Dispositivos Anteriores


500 - Perdas e Danos. Independentemente de a providência a ser adotada pelo magistrado para satisfação do direito confirmado na sentença, é possível a aplicação concomitante de multa com o intuito de desestimular o réu a descumprir a determinação judicial. A multa poderá ser fixada por tempo de atraso, de forma a coagir o devedor a adimplir a obrigação na sua especificidade. Entretanto, mesmo nos casos em que a obrigação tenha se convertido em perdas e danos, permanece possível a aplicação da multa.
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A multa (ou astreintes) pelo descumprimento de obrigação de fazer ou não fazer poderá ser aplicada pelo juiz de ofício, ou seja, sem que haja prévio requerimento da parte (art. 536, § 1º). Como o Código prevê que terá que ser concedido prazo razoável para o cumprimento do preceito, deve-se intimar o devedor antes de se aplicar a multa. A intimação, ao contrário do que estava previsto no Código anterior e do entendimento do próprio STJ, não necessita ser pessoal, podendo se dar através do advogado constituído nos autos (art. 513, § 2º).
Por não haver vedação expressa no CPC/2015, a multa para coagir o devedor ao cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer também é aplicável à Fazenda Pública. Esse entendimento já foi pacificado no âmbito do STJ. Ressalte-se que a inserção do texto na parte final do novo art. 500 não modificou a aplicação da multa coercitiva (astreintes), mas apenas apresentou a sua motivação específica, qual seja compelir ao cumprimento específico da obrigação. Diferencia-se, por exemplo, de eventual multa aplicada ao esbulhador em caso de novo ato atentatório à posse (art. 555, parágrafo único, I, correspondente ao art. 921, II, do CPC/1973).

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