Sistema Eleitoral Chileno e Poderes do Presidente
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Um sistema eleitoral anterior permitiu que alguém se tornasse presidente, mesmo representando apenas um terço do eleitorado. Salvador Allende, uma vez no poder, cumpriu um compromisso e, juntamente com os parlamentares da época, aprovou a Lei Orgânica Constitucional (LOC) 17.398, conhecida como Estatuto de Garantias Constitucionais (1971), que posteriormente não foi respeitado.
Este sistema eleitoral foi considerado inconveniente. Por isso, na Constituição da República Portuguesa (CPR) de 1980, estabeleceu-se um novo sistema, conhecido como sistema eleitoral de dois turnos ou segundo turno.
Características do Sistema Eleitoral de Dois Turnos
- 1. Prazo da Eleição: A eleição deve ser realizada 90 dias após o término do mandato do presidente anterior.
- 2. Critério de Vitória: É eleito Presidente quem obtiver a maioria absoluta dos votos validamente expressos. Não são contabilizados votos brancos nem nulos para facilitar a obtenção da maioria.
- 3. Segundo Turno: Se houver apenas dois candidatos, um certamente obterá a maioria absoluta. Contudo, com mais de dois candidatos, é muito difícil que algum alcance a maioria absoluta. Portanto, neste sistema, quando há três ou mais candidatos e nenhum obtém a maioria, realiza-se um segundo turno (votação popular direta) apenas com os dois candidatos mais votados no primeiro. Para vencer, é necessária a maioria absoluta dos votos (excluindo brancos e nulos).
- 4. Qualificação da Eleição: A qualificação da eleição (de um ou ambos os turnos, se houver) é feita pelo TRICEL (Tribunal Qualificador de Eleições). Este tribunal tem a tarefa de verificar a regularidade do processo eleitoral. Assim, o TRICEL realiza o controlo oficial de todos os votos a nível nacional, analisa ações de anulação e medidas corretivas. Compete-lhe conduzir a contagem geral dos votos, julgar recursos de anulação e proclamar o presidente eleito.
- 5. Realização do Segundo Turno: O segundo turno, de acordo com a CPR, ocorre 30 dias após o primeiro, desde que esse dia seja um domingo; caso contrário, a eleição é realizada no domingo seguinte. A qualificação do primeiro turno ocorre 15 dias após a eleição, e a do segundo turno, 15 dias após este.
- 6. Proclamação e Posse: Noventa dias após o primeiro ou segundo turno, o Congresso Pleno reúne-se para tomar conhecimento oficial da proclamação do presidente eleito feita pelo TRICEL. No Congresso Pleno, o presidente do Senado toma o juramento ou promessa do Presidente eleito (juramento se religioso, promessa se não). Este juramento ou promessa consiste em desempenhar fielmente o cargo, respeitar a CPR e as leis, e garantir a independência da nação. Após o juramento ou promessa, o presidente cessante entrega o cargo.
Impedimento do Presidente Eleito Antes de Assumir
O que acontece se o presidente eleito estiver incapacitado de assumir o cargo? Deve-se distinguir entre impedimento absoluto e relativo.
- Impedimento absoluto: Morte, renúncia ou doença grave declarada pelo Senado.
- Impedimento relativo: Doença temporária, viagem ao exterior.
Impedimento Relativo (Sub-rogação)
A sub-rogação implica transitoriedade, não substituição (que é permanente). Quem assume o título de Vice-Presidente da República neste caso? Não sub-roga nenhum ministro, pois presume-se que o presidente eleito ainda não nomeou formalmente seus ministros. Sub-roga o Presidente do Senado; se este estiver impossibilitado, o Presidente da Câmara dos Deputados; e, se este também não puder, o Presidente do Supremo Tribunal (CS). Originalmente, a CPR estabelecia uma ordem diferente: 1º Presidente do Senado, 2º Presidente do CS, e 3º Presidente da Câmara dos Deputados. O motivo era o receio de que uma pessoa de 21 anos pudesse se tornar presidente, já que os deputados precisam ter no mínimo 21 anos. Contudo, a reforma constitucional de 2005, em ligação com a tradição, restabeleceu a ordem tradicional.
Impedimento Absoluto (Substituição)
Neste caso, não há sub-rogação, mas sim substituição, devendo-se implementar o mecanismo correspondente. Imediatamente, assume como Vice-Presidente da República quem deveria sub-rogar (Presidente do Senado, da Câmara dos Deputados ou do CS). Este Vice-Presidente implementará o mecanismo de substituição. No prazo de 10 dias após assumir, deverá emitir um decreto convocando novas eleições para eleger o presidente substituto.
Impedimento Temporário do Presidente em Exercício
Se o presidente em exercício está temporariamente impedido, ocorre um caso de incapacidade temporária que exige sub-rogação. Quem assume o faz com o título de Vice-Presidente da República. Neste cenário, o presidente já nomeou seus ministros. A CPR estabelece que sub-roga o ministro correspondente (a lei indica o Ministro do Interior como primeiro), segundo a ordem de precedência legal. A Lei Orgânica Constitucional (LOC) dos Ministérios estabelece uma ordem de precedência:
- Ministro do Interior
- Ministro das Relações Exteriores
- Ministro da Fazenda
- Ministro da Defesa, etc.
A CPR indica que a sub-rogação segue essa ordem, esgotando todos os ministérios se necessário.
Pode o Presidente alterar a ordem de sub-rogação por decreto?
Sim, o Presidente pode alterá-la por decreto simples, pois a LOC o autoriza. Há duas razões para esta flexibilidade:
- De acordo com a LOC dos Ministérios, o primeiro na linha é o Ministro do Interior.
- O Presidente pode alterar essa ordem.
Se todos os ministros estiverem impedidos, sub-roga o Presidente do Senado, seguido pelo Presidente da Câmara dos Deputados e, por último, pelo Presidente do CS.
Impedimento Absoluto do Presidente em Exercício
Se o impedimento do presidente em exercício é absoluto, procede-se à sua substituição. Imediatamente, sub-roga o ministro indicado pela lei. O procedimento subsequente depende do tempo restante do mandato:
- Menos de 2 anos para completar o mandato: O Vice-Presidente (ministro que sub-rogou), no prazo de 10 dias, convoca o Congresso Pleno. Este elege um substituto por maioria absoluta dos seus membros em exercício, que completará o mandato restante. A eleição popular não é realizada por razões práticas, como o curto período restante. Os candidatos podem ser deputados, senadores, políticos, etc.; a matéria não é regulamentada.
- Mais de 2 anos para completar o mandato: O Vice-Presidente, no prazo de 10 dias, convoca eleições populares diretas para eleger um presidente substituto, que completará o mandato do presidente impedido.
Status de Ex-Presidente da República
Ao completar integralmente seu mandato, o Presidente adquire o status de ex-presidente da República, com vantagens significativas:
- Imunidade parlamentar: Não pode ser privado de liberdade nem acusado de crime sem autorização prévia da Corte de Apelações (CA) respectiva, após declaração de formação de culpa.
- Subsídio parlamentar vitalício: Além da imunidade, goza de um subsídio parlamentar vitalício (artigo 30º, relacionado com o artigo 61º, nº 2, que concede a imunidade, e o artigo 62º, que concede o subsídio), de aproximadamente 7,5 milhões de pesos chilenos (o equivalente em USD pode variar). Se o ex-presidente assumir um cargo público remunerado, o subsídio parlamentar é suspenso (não se aplica a cargos privados). Ao cessar o cargo público remunerado, volta a receber o subsídio.
Poderes Legislativos do Presidente
De acordo com o artigo 32º, nº 1, da CPR, corresponde ao Presidente participar do processo de elaboração das leis, devendo promulgá-las e ordenar sua publicação. Isso significa que o Presidente é um colegislador com o Congresso. Contudo, o Presidente não é um legislador comum, mas qualificado, e, em certos termos, encontra-se em posição igual ou, em alguns casos, superior à do Congresso.
Fases do Processo Legislativo
i. Iniciativa Legislativa
É a capacidade de elaborar um projeto de lei e submetê-lo a uma das câmaras legislativas. Esta iniciativa pertence exclusivamente ao Presidente da República e aos parlamentares (deputados e senadores), individualmente. O Congresso Nacional, como um todo, a Câmara dos Deputados ou o Senado, enquanto órgãos colegiados, não possuem iniciativa legislativa.
- O projeto apresentado pelo Presidente é chamado de mensagem.
- O projeto apresentado por parlamentares é chamado de moção. Uma moção não pode ser assinada por mais de 10 deputados nem por mais de 5 senadores. Esta limitação visa incentivar o debate, pois se presume que um projeto assinado por muitos parlamentares já estaria pré-aprovado, diminuindo a discussão.
O Presidente escolhe livremente a câmara de origem do projeto. Se o projeto é de iniciativa parlamentar, o deputado o apresenta à sua câmara, e o senador, à sua. A câmara onde o projeto é apresentado é a câmara de origem. A outra câmara, que o examinará posteriormente, é a câmara revisora. A revisão consiste em decidir se aprova, rejeita ou modifica o projeto. No sistema chileno, há uma dupla revisão (câmara de origem e câmara revisora). Qualquer câmara pode ser de origem ou revisora, com exceções:
Projetos com Câmara de Origem Específica:
1. Câmara dos Deputados (Artigo 65º):
- Projeto de lei do orçamento geral da nação.
- Qualquer projeto sobre tributos.
- Qualquer projeto sobre recrutamento militar.
As razões para esta exclusividade são históricas e de fundo, pois se acredita que estes projetos requerem idealismo, generosidade, dedicação, entusiasmo e juventude, características presumivelmente mais presentes nos deputados, que são geralmente mais jovens que os senadores.
2. Senado:
- Projeto de lei de indultos gerais (indultos particulares são concedidos por decreto presidencial).
- Projeto de lei de anistia.
A aprovação destes projetos exige moderação, temperança e ponderação, características consideradas mais adequadas aos senadores, geralmente mais experientes.
ii. Iniciativa Legislativa Regular e Exclusiva
A iniciativa regular é aquela que pertence tanto ao Presidente quanto aos parlamentares, abrangendo a generalidade das matérias de lei. Contudo, há matérias que só podem ser iniciadas por mensagem presidencial, pois são de iniciativa exclusiva do Presidente. Justificativas:
- Estas matérias estão intimamente ligadas às funções de governo e administração do Estado, que são exclusivas do Presidente.
- Várias destas matérias referem-se à administração do Estado e seus órgãos, dos quais o Presidente é o chefe.
- Outras matérias de lei estão ligadas à vida económica, social e cultural da nação, cujo desenvolvimento é impulsionado pelo governo e, portanto, pelo Presidente.
- Se estes projetos pudessem ser iniciados por parlamentares, haveria o risco de serem usados para pagar favores eleitorais, com o Congresso aprovando projetos que concedem benefícios a eleitores em troca de apoio.
- Risco de parlamentares alterarem a divisão político-administrativa do país (regiões, províncias, comunas) para fins eleitorais, buscando vantagens para seus partidos.
Matérias de Lei de Iniciativa Exclusiva do Presidente:
- Qualquer matéria relacionada à administração financeira e orçamentária do Estado; em outras palavras, qualquer projeto que implique despesas.
- Qualquer projeto referente à divisão político-administrativa do país.
- Qualquer projeto relacionado às Forças Armadas, Carabineiros e Segurança Pública. Por exemplo:
- Projeto de lei que autoriza a entrada de tropas estrangeiras no Chile e a saída de tropas nacionais.
- Projeto de lei que autoriza o Presidente a declarar guerra.
- Projeto de lei que fixa os efetivos das Forças Armadas (Exército, Marinha e Aeronáutica) em tempo de paz e guerra. (Nota: a lei que fixava os efetivos sob a CPR de 1833 era periódica, juntamente com a lei orçamentária e tributária).
- Projetos enunciados no artigo 63º, nº 7, 8 e 9:
- Nº 7: Autorização para órgãos do Estado contraírem empréstimos. Para garantir a confiabilidade na gestão financeira, a CPR estabelece que a lei que autoriza o empréstimo deve definir seu objeto e a fonte de financiamento para os juros. Se o vencimento do empréstimo ocorrer em um governo diferente daquele que o contratou, a lei exige quórum qualificado (artigo 63º, nº 7). Apenas o Banco Central não precisa de autorização para contrair empréstimos.
- Nº 8: Leis que autorizam órgãos do Estado a celebrar contratos que possam comprometer o crédito ou a responsabilidade financeira do Estado. Ex: emissão de títulos para captação de recursos no exterior, perdão de dívida de um país estrangeiro pelo Chile.
- Nº 9: Projeto de lei que estabelece um regime geral e permanente para que uma empresa estatal possa contrair empréstimos. A CPR adverte que uma empresa estatal não pode emprestar a outra empresa estatal ou ao próprio Estado. Anteriormente, empresas estatais emprestavam umas às outras, gerando déficits orçamentários cobertos por emissões inorgânicas do Banco Central.
- Matérias referidas no artigo 65º, nº 1 a 6 (já mencionadas no artigo 63º, mas repetidas no 65º para indicar que são de iniciativa exclusiva do Presidente). Incluem a criação de impostos e tudo relacionado a eles (proposta apenas na Câmara dos Deputados).
- Criar ou suprimir serviços públicos; estabelecer as atribuições dos funcionários públicos. Ex: lei que cria um ministério do Meio Ambiente (MA) ou a superintendência do MA.
- Projetos de lei que autorizam qualquer órgão do Estado a realizar transações ou contratos que impliquem risco de crédito ou responsabilidade financeira do Estado.
- Fixar remunerações e quaisquer benefícios económicos para os funcionários ativos do setor público e estabelecer as pensões (de sobrevivência) para os pensionistas da administração do Estado. Também fixar os salários mínimos dos trabalhadores do setor privado.
- Qualquer projeto de lei sobre negociação coletiva no setor público ou privado.
- Qualquer projeto de lei sobre segurança social (requer quórum qualificado).
Poderes do Congresso Diante de um Projeto de Iniciativa Exclusiva do Presidente
Os poderes do Congresso são reduzidos. Diante de um projeto de lei de iniciativa exclusiva do Presidente, o Congresso pode aprová-lo, rejeitá-lo ou diminuir seus alcances, mas não pode aumentá-los. A ideia é evitar que os parlamentares aumentem despesas que afetem a gestão financeira do Presidente, cujos recursos são limitados pelo orçamento nacional. O Presidente planeja sua política financeira com base nesses recursos, e o aumento de despesas implicaria aumento de impostos (sempre problemático) ou criação de novos, afetando empresas e consumidores, e gerando inflação. Outro motivo é evitar pressões parlamentares para pagar favores eleitorais.
Domínio Legal: Teoria e Prática
As matérias de lei podem ser de iniciativa exclusiva do Presidente ou de iniciativa comum (Presidente e parlamentares). Supõe-se, teoricamente, que a CPR definiu exaustivamente estas últimas.
Domínio Legal na CPR de 1925
A Constituição de 1925 não apresentava uma lista exaustiva das matérias de lei. O artigo 72º continha uma lista, mas entendia-se que não eram as únicas que o legislador poderia regular. Dizia-se que a CPR de 1925 fixava um domínio legal mínimo, ou seja, o conteúdo mínimo que o legislador poderia regular, mas não o máximo. Consequentemente, não se sabia com exatidão tudo o que poderia ser objeto de lei. O problema agravava-se porque as matérias de competência regulamentar do Presidente (decreto) também não estavam exaustivamente especificadas no artigo 72º. Assim, nem o legislador nem o Presidente tinham seus poderes taxativamente definidos. Ambos podiam estender seu âmbito de regulação a matérias não especificadas na CPR, conhecidas como "terra de ninguém".
Nessa "terra de ninguém", podia antecipar-se a regulação por decreto ou por lei, com consequências distintas:
- Se o decreto viesse primeiro, corria o risco de ser revogado por uma lei posterior sobre o mesmo assunto.
- Se a lei viesse primeiro, por ter hierarquia superior, bloqueava a possibilidade de regulação por decreto. Tecnicamente, dizia-se que a lei "fechava a competência" do regulamento. A lei era a norma de encerramento na "terra de ninguém".
Domínio Legal na CPR de 1980
Para evitar a incerteza da CPR de 1925, a Constituição de 1980 tentou substituir o critério do domínio legal mínimo pela teoria do domínio legal máximo, estabelecida no artigo 63º. Portanto, em teoria, não haveria outras matérias de lei além das indicadas no artigo 63º. As matérias de Lei Orgânica Constitucional (LOC), Lei de Quórum Qualificado (LQC) e Lei Simples de Quórum Comum (LSQC) são, teoricamente, exaustivas e seus conteúdos são determinados na própria CPR.
Contudo, ao tratar das matérias de lei comum, a CPR adverte que são absolutas apenas em teoria, não na prática. A Constituição incorre num erro ao tentar determinar exaustivamente o conteúdo das matérias de lei comum. No artigo 63º, nº 19, ela altera o critério e não define mais o conteúdo específico da matéria de lei comum, usando uma formulação muito genérica. Com efeito, o nº 20 do mesmo artigo estabelece que também são matérias de lei: "toda outra norma de caráter geral e obrigatório que estabeleça as bases essenciais de uma ordem jurídica". Esta cláusula residual ampla dificulta a exaustividade pretendida.