Espanha: Crise da Restauração e Queda da Monarquia (1898-1931)

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Afonso XIII e a Crise da Restauração

A Catástrofe de 1898 marcou a primeira fase do reinado de Afonso XIII, caracterizada pela busca da regeneração espiritual.

1. Projetos de Regeneração Política

O Regeneracionismo é um movimento político-cultural que surgiu em resposta ao clima geral de fracasso e frustração que prevalecia na sociedade espanhola, na sequência de 1898. O seu expoente máximo é Joaquín Costa, cujas ideias estão contidas na sua obra "Oligarquia e Caciquismo". Ele propôs um sistema político baseado na limpeza do sistema eleitoral, na moralidade política, na reforma da educação, na promoção de obras públicas e no fomento da agricultura através de obras hídricas, irrigação e reflorestamento. Também propôs uma mudança na política externa, com foco na África e no afastamento da constante lembrança do passado glorioso espanhol.

O Regeneracionismo não formou partidos políticos. Silvela, o novo líder conservador, tentou implementar o programa regeneracionista. No entanto, isso exigia um grande orçamento, o que implicava mais impostos, recusados pela Catalunha e pela oligarquia, tornando a reforma impossível.

Mais importante foi a sua relevância cultural, pois, juntamente com os Krausistas, formaram a maioria dos professores na ILE (Instituição Livre de Ensino).

Primeiro Regeneracionismo (1898-1907)

A chave para o sucesso da restauração da estabilidade política baseava-se em dois pilares: a existência de dois grandes partidos (bipartidarismo) e uma mudança pacífica no governo da na nação (turnismo). Os dois partidos dinásticos não eram partidos de massa, mas eram significativos. A morte dos dois líderes políticos (Cánovas em 1897 e Sagasta em 1903) criou uma grande crise em ambos os partidos. A crise interna dos dois partidos dinásticos durante o reinado de Afonso XIII explica o grande papel político que o monarca assumiu. Em 1905, o governo liberal aprovou a Lei de Jurisdições, que equiparava os crimes contra o exército a crimes contra a Pátria. Esta lei agravou o descontentamento dos socialistas e, sobretudo, dos nacionalistas catalães. Tentava controlar a insatisfação do exército e a sua intromissão na política.

Governo Conservador de Maura (1907-1909)

Em 1907, os conservadores iniciaram as primeiras tentativas de reformas políticas com Maura, cuja intenção era fazer a "revolução de cima". Seus objetivos eram eliminar o caciquismo e obter a pureza das eleições. Sua reforma mais ambiciosa foi a Lei de Administração Local, que concedeu autonomia aos municípios. No mesmo sentido, propôs a criação de associações.

Entre as reformas do governo conservador, destacam-se as leis trabalhistas que levaram à criação do Instituto Nacional de Previdência (1908), cujo objetivo era promover e facilitar o seguro social coletivo, com prioridade para resolver a situação dos trabalhadores que, por força da idade, paravam de trabalhar. A Lei Eleitoral (1907), que declarou o voto obrigatório, visava eliminar fraudes e garantir eleições limpas, mas estas continuaram a ser manipuladas. Esta lei ilustra bem o espírito da "revolução de cima" conservadora.

A Espanha tentou participar da Partilha da África, da qual as potências europeias estavam a beneficiar. Após a Conferência Internacional de Algeciras (1906), realizada para resolver litígios entre França, Marrocos e Alemanha, a Espanha obteve o reconhecimento definitivo dos seus direitos no norte de Marrocos. A ocupação militar da área designada começou em fevereiro de 1909, sob o governo conservador, defensor da presença espanhola em Marrocos. No entanto, esta questão causou descontentamento popular devido ao recrutamento forçado de soldados para uma guerra que beneficiava apenas dois interesses minoritários: uma secção dos militares e os capitalistas. Até 1912, quem tinha dinheiro podia evitar o serviço militar através de um pagamento elevado, o que penalizava as classes mais baixas. Isso gerou um forte antimilitarismo popular.

Eventos cruciais ocorreram na Semana Trágica de Barcelona, em julho de 1909, quando uma insurreição no Rif forçou o governo a enviar tropas. O Ministro da Guerra cometeu o erro de enviar um corpo de exército que incluía reservistas catalães. Em Barcelona, no porto onde as tropas estavam a embarcar, começaram as manifestações. As autoridades militares declararam estado de guerra. Esta insurreição, conhecida como "Semana Trágica", desencadeou uma onda de violência de rua que culminou numa Greve Geral em 26 de julho, seguida em massa. As consequências foram:

  • 116 mortos, 300 feridos e 17 condenados à morte, dos quais 5 foram executados, incluindo Francisco Ferrer, intelectual anarquista cuja execução foi, para muitos, duvidosa.
  • Maura, embora politicamente competente, perdeu a confiança do rei. A Semana Trágica revelou a situação de stress social acumulado que explodiu naquele momento. O anticlericalismo e o antimilitarismo foram efetivamente explorados pelos movimentos de esquerda (PSOE, UGT, republicanos e, especialmente, anarquistas), que perceberam a conveniência de uma organização mais eficaz para combater o poder do Estado. Assim, em 1910, foi fundada a Confederação Nacional do Trabalho (CNT).

Governo Liberal de Canalejas (1910-1912)

O liberal Canalejas sucedeu a Maura, com uma abordagem regeneracionista. Realizou uma série de medidas: a regulação social, como a proibição do trabalho noturno para mulheres; a substituição do imposto de consumo por um imposto sobre a renda; e a militarização progressiva das populações urbanas e dos serviços de transporte ferroviário para acabar com as greves de ferroviários. Estabeleceu o serviço militar obrigatório em tempos de guerra; em tempos de paz, a duração era de apenas cinco meses, com a possibilidade de pagamento de uma quantia em dinheiro para dispensa. No campo religioso, promulgou a Lei do Cadeado (1910), que proibia a instalação de novas ordens religiosas em Espanha por dois anos. A questão marroquina foi firmemente decidida a ser enfrentada. Em 1912, o Congresso aprovou a Lei das Associações.

Fortalecimento da Oposição

Os Republicanos representaram a principal força política de oposição ao regime, defendendo o progresso, a justiça social, o desenvolvimento da ciência e a extensão da educação, com uma natureza anticlerical. Durante o reinado de Afonso XIII, o republicanismo tradicional dividiu-se no Partido Radical e no Partido Reformista. Dentro do espectro republicano, merece menção especial o PSOE, fundado por Pablo Iglesias. Durante este século, emergiram diferenças nacionais, sendo as mais importantes as catalã e basca; o nacionalismo galego, por sua vez, não teve grande relevância. O nacionalismo catalão foi defendido por dois grupos políticos: a Lliga Regionalista (conservadora) e o Estat Català. Em relação ao nacionalismo basco, destacou-se um partido de ideologia ultraconservadora: o Partido Nacionalista Basco (PNV).

2. Afonso XIII: A Crise do Governo Parlamentar (1914-1923)

Antecedentes

O governo conservador de Dato teve de decidir sobre o papel espanhol na Primeira Guerra Mundial. O seu governo começou em meio a lutas internas dentro do seu partido, entre os apoiantes de Maura e os da antiga liderança. Da mesma forma, o Partido Liberal estava dividido.

Em relação à Grande Guerra, a tese isolacionista estava em vigor e, portanto, o conflito trouxe benefícios económicos. A neutralidade espanhola resultou num espetacular crescimento da procura externa pelos seus produtos, mas causou um processo inflacionário, com os preços a aumentarem devido à produção destinada à exportação. O empobrecimento dos trabalhadores coincidiu com o enriquecimento dos empresários, causando inquietação social.

A Crise de 1917

A crise de 1917, de natureza ideológica e moral, animada pela Revolução Russa e em meio à crise geral da classe política, manifestou-se em três frentes: militar, política e social. Os militares, que se sentiam rejeitados pela sociedade e esquecidos pelo governo, decidiram intervir, especialmente os "africanistas" (militares com experiência em África) que buscavam uma rápida ascensão. Para defender o sistema de promoção por antiguidade previsto no código militar, formaram as Juntas de Defesa. O governo liberal tentou dissolvê-las, mas teve de renunciar. Rapidamente, as Juntas foram além do seu papel corporativo e aprofundaram-se em questões políticas. O movimento acabou por se diluir.

No âmbito político, fora do governo, a Assembleia Parlamentar (julho de 1917) foi convocada. A crise do sistema bipartidário e a sua incapacidade de renovação favoreceram uma crescente oposição política. A iniciativa partiu da Lliga Regionalista, liderada por Cambó, que convocou uma assembleia ilegal de parlamentares catalães em Barcelona, em 5 de julho. Decidiu-se solicitar ao Governo a convocação de umas Cortes Constituintes com uma dupla missão:

  • Quebrar o sistema político da Restauração.
  • Autonomia da Catalunha.

O Governo não acedeu a este pedido e convocou uma nova reunião, conhecida como a Assembleia Parlamentar, que reafirmou as resoluções da reunião anterior. O Governo limitou-se a declarar tais alegações inconstitucionais. Devido à sua composição heterogénea e ao receio dos seus componentes face aos grandes eventos sociais, a Assembleia dissolveu-se. A expressão social da crise foi a greve geral, motivada em parte pela manipulação de preços (aumento de 37% em cinco anos). Organizada pela CNT e pela UGT, reivindicava aumentos salariais e progresso político. A greve geral foi convocada antes do previsto, uma vez que uma greve ferroviária em Valência precipitou os acontecimentos. Dada a enorme adesão à greve, a resposta do governo foi chamar o Exército para as ruas, resultando em mortos, presos e condenados à morte, enquanto se tentava normalizar a situação no país.

O Colapso Final do Regime (1918-1923)

Durante o período de 1918-1923, a ineficiência governamental acentuou-se. De nada serviram os governos de concentração, inaugurados pelo liberal Manuel García Prieto. Assim, o bipartidarismo quebrou-se. Este sistema não funcionou, e o turnismo tornou-se inviável devido à incapacidade de obter maiorias.

A Revolução Russa causou efeitos na sociedade espanhola. Além disso, o triunfo da Revolução Bolchevique inspirou um entusiasmo extraordinário nas organizações operárias, para as quais a Rússia se tornou um mito, o "paraíso dos trabalhadores".

Na Andaluzia e no Levante, entre 1918 e 1920, as precárias condições de vida dos jornaleiros estiveram por trás do chamado Triénio Bolchevique, liderado por anarquistas, socialistas e republicanos. Através de greves, ocupação de terras e destruição de colheitas, exigiam condições de trabalho mais justas. Os oligarcas e caciques locais, contando com o apoio do exército contra o movimento, deixaram o problema do campesinato por resolver. A tensão social foi aumentando, tanto no campo quanto na indústria, com a ocorrência de greves. Os empresários responderam com o lock-out, deixando 100 mil trabalhadores na rua. A resposta dos empregadores foi a contratação de pistoleiros e segurança privada, e o governo permitiu as leis de fuga, que autorizavam matar detidos que tentassem escapar.

A Guerra em Marrocos

O acordo entre Espanha e França de 1912 transformou as áreas de abrangência de ambos os países em Marrocos num protetorado partilhado. O protetorado espanhol, localizado no norte, cobria uma área muito menor e mais pobre do que o francês. Além disso, o controlo destes territórios tinha mais inconvenientes do que vantagens. Mas o descontentamento no território explica a política vacilante do governo, alternando fases de intervenção militar com outras de inatividade. A isso somava-se a impopularidade da guerra e a divisão no seio do exército.

Em julho de 1921, o Comandante de Melilla, o General Silvestre Fernández, cometeu um erro militar cujo trágico desfecho causou consequências não intencionais. Este erro levou à Derrota de Annual, que provocou um verdadeiro desastre militar: a destruição virtual de todas as forças do comando, com mais de 13.000 baixas (mortos e feridos) e até mesmo um grave perigo para a Praça de Melilla.

3. A Ditadura de Primo de Rivera (1923-1930)

Preparado na primavera, em setembro de 1923 e apoiado pela burguesia, o General Primo de Rivera deu um golpe de Estado, apoiado pelo rei Afonso XIII, devido à situação de crise geral. As causas foram:

  • A crise política, incapaz de se renovar a partir de dentro e cada vez mais prejudicada pela agitação social da crise de 1917.
  • A falha da política em Marrocos, especialmente aguda desde o Desastre de Annual de 1921.

Primo de Rivera obteve sucesso porque, desde o início, contou com apoios importantes: Afonso XIII, um setor significativo do exército e a burguesia catalã. Também foi importante a passividade dos socialistas e anarquistas.

Diretório Militar (1923-1925)

Na primeira fase da ditadura, o poder foi exercido por um Diretório Militar, presidido por Miguel Primo de Rivera, que acumulava os Poderes Executivo e Legislativo. Com aprovação geral, o ditador tinha a intenção de resolver os problemas (falência económica, incompetência política, desordem social) à custa da eliminação das garantias constitucionais. Os objetivos de Primo de Rivera foram definidos pelo lema "menos política e mais administração". A ditadura durou pouco mais de seis anos, em grande medida, devido ao sucesso na restauração da ordem pública e na resolução do problema em Marrocos. Os primeiros passos de Primo de Rivera foram:

  • Assumiu todos os poderes, dissolveu o Parlamento e suspendeu a Constituição. Censurou a imprensa.
  • Baniu partidos políticos e sindicatos.
  • Ordenou o fim das autoridades civis e elaborou novos estatutos municipais e provinciais, dando estatuto legal às organizações políticas.
  • Reprimiu o movimento operário e o nacionalismo, suspendendo a Mancomunidade da Catalunha.
  • Militarizou a ordem pública.

Diretório Civil (1925-1930)

Em dezembro de 1925, o Diretório Militar foi substituído por um Diretório Civil. A mudança não significou um retorno às garantias constitucionais. Uma vez resolvidos dois problemas importantes que justificavam a situação excecional da ditadura (ordem pública e Marrocos), Primo de Rivera poderia ter-se retirado da política e permitido o regresso à normalidade constitucional. Contudo, fez o contrário, propondo a renovação do seu regime ditatorial, substituindo o Diretório Militar por um novo Diretório Civil. Promoveu grandes obras públicas e a criação de empresas estatais como a Telefónica, a Iberia e a Campsa, além de investir em redes de água e irrigação.

  • O Código do Trabalho (1926), que regulamentava os contratos, tribunais de trabalho, tribunais de acidentes, abono de família, seguro de maternidade, etc.
  • No mesmo ano, criou a Organização Corporativa Nacional, com o intuito de resolver os conflitos laborais através de Comissões Mistas, formadas por trabalhadores e empregadores.

A fase final da ditadura viu a recuperação demográfica e um equilíbrio. A dinâmica industrial colocou a Espanha em 5º lugar na fabricação mundial de automóveis. As reformas sociais incluíram a construção de casas a preços acessíveis, seguros de saúde, subsídios sociais e escolares. No entanto, houve problemas de fundo que levaram à queda da ditadura:

  • Foi incapaz de acabar com o caciquismo, sobretudo na Galiza e no sul.
  • Ganhou inimigos no exército ao implementar um sistema de promoção que privilegiava o mérito em detrimento da antiguidade.
  • Não lidou bem com a questão nacionalista, especialmente a catalã, que limitou fortemente, inclusive no uso da língua. Além disso, os estatutos provinciais não avançaram para uma autonomia real.
  • O atrito com os universitários e intelectuais foi constante, apesar da criação de novas escolas, com indiciamentos e prisões de pensadores como Unamuno, Fernando de los Ríos, Jiménez de Asúa e Valle-Inclán.

A Crise de 1929 piorou a situação, e Afonso XIII finalmente retirou a sua confiança, assim como a hierarquia militar. Primo de Rivera renunciou ao mandato em 28/01/1930 e faleceu logo depois, em Paris.

A Queda da Monarquia

Após a renúncia de Primo de Rivera, o rei decidiu restaurar o antigo sistema parlamentar e nomeou um governo chefiado pelo General Dámaso Berenguer, um dos envolvidos no Desastre de Annual. A sua primeira medida, tomada por decreto e sem convocar eleições, foi a anistia geral, a restauração da Constituição de 1876 e o restabelecimento dos cargos civis.

Enquanto isso, os partidos da oposição organizaram-se fora do sistema, assinando o Pacto de San Sebastián (1930). Seus objetivos eram estabelecer a República, apoiada por um levante cívico-militar, e considerar um estatuto de autonomia para a Catalunha. Como resultado de atos de conspiração por republicanos, ocorreu o Levante de Jaca (1930). Falhou, mas o fuzilamento de dois ativistas transformou-os em heróis da causa republicana.

Em 13 de fevereiro de 1931, Berenguer convocou eleições, mas demitiu-se e foi substituído por Juan Bautista Aznar. As eleições foram realizadas em abril. Com este pano de fundo, Afonso XIII abdicou e, em 14 de abril de 1931, foi proclamada a II República Espanhola e formado um Governo Provisório. Em 15 de abril, Afonso XIII deixou o país.

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