Espanha: Transição Democrática e Constituição de 1978

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A Transição Democrática Espanhola (1975-1979)

As Três Opções Políticas na Paisagem Espanhola dos Anos 70

No cenário político espanhol dos anos 70, apresentaram-se três opções distintas. Alguns defenderam claramente a não continuidade com o regime de Franco. Outros apostavam numa reforma promovida pelas próprias instituições, culminando com a democratização do sistema. E outros estavam dispostos a romper com o passado ditatorial e a construir um novo sistema político liderado pelas forças democráticas.

O Governo de Arias Navarro (Novembro de 1975)

O governo de Arias Navarro, iniciado em novembro de 1975, incorporou em seu governo os reformistas Fraga Iribarne e José María de Areilza, na esperada aceleração de reformas que deveriam conduzir à progressiva democratização do sistema político espanhol.

Quando Arias Navarro apresentou sua agenda perante as Cortes, verificou-se que ele defendia a continuidade do franquismo e sua abordagem reformista era totalmente inadequada. Sua proposta era simplesmente uma reprodução do programa anterior, com poucas vagas, propondo apenas algumas leis muito restritivas sobre a liberdade de reunião e de associação, que não contemplavam a existência de partidos políticos.

A Proposta de Coordenação Democrática

A Coordenação Democrática propunha um procedimento constitucional que, através de um governo provisório e eleições gerais, lançaria as bases de um novo sistema político.

Como se Realizou a Reforma Democrática?

Os “teimosos” (setores mais conservadores) aceitavam apenas a continuidade da repressão do sistema e da polícia, estimulando a ação de grupos paramilitares para silenciar a oposição (incluindo os eventos de Montejurra).

Os reformistas trabalharam para afastar o governo dos “obstinados”, com a aprovação da monarquia. Seu projeto visava promover a mudança progressiva do sistema político a partir da evolução das leis e das instituições do franquismo. Isso forçou a demissão de Arias Navarro, que foi substituído por Adolfo Suárez (pertencente ao movimento reformista). Suárez iniciou contatos com as forças democráticas e emitiu um indulto para os presos políticos. Ele também propôs a Lei para a Reforma Política (aprovada), que reconheceu os direitos fundamentais dos indivíduos.

Primeiros Atos do Governo Pós-Lei de Reforma Política

Esta lei abriu o caminho para eleições gerais. Primeiramente, uma série de decretos permitiu a liberdade de associação, a legalização dos partidos políticos (incluindo o Partido Comunista) e uma ampla anistia para os crimes políticos cometidos durante a ditadura.

Partidos Políticos com Representação Nacional Pós-Legalização

Os partidos com representação nacional que se formaram foram a União de Centro Democrático (UCD), o Partido Socialista Operário Espanhol (PSOE) e a Aliança Popular (AP). Com representação regional destacada, surgiram o Partido Nacionalista Basco (PNV) no País Basco (Euskadi) e o Pacto Democrático da Catalunha (PDC) na Catalunha.

A Legalização do Partido Comunista (PCE)

A legalização do PCE, um marco crucial, ocorreu em um contexto de grande tensão. Apesar de um atentado de extrema-direita que resultou na morte de cinco advogados trabalhistas ligados à CCOO e ao PCE, a pressão popular e a necessidade de estabilidade política levaram à sua legalização. Mais de um milhão de grevistas demonstraram o apoio popular, e o PCE era visto como um grande símbolo antifranquista e o partido mais organizado da classe trabalhadora e da classe média.

Resultados das Eleições Gerais de 1977

A União de Centro Democrático (UCD) venceu as eleições gerais de 1977, obtendo a maioria simples.

A Fase de Pré-Autonomia: Regiões Concedidas

É o processo de construção do Estado das Autonomias. Teve duas fases: a primeira foi a da pré-autonomia, ou seja, a concessão de autonomia provisória às regiões cujos representantes a solicitassem. A segunda fase foi lançada a partir do momento da constituição definitiva do regime autonômico. O primeiro regime de pré-autonomia foi concedido à Catalunha (a Generalitat foi restaurada), e também foi concedido ao País Basco e à Galiza.

Impacto da Crise Internacional dos Anos 70 na Espanha

Houve um processo de inflação, perda de competitividade (a inflação derrubou as exportações), e o défice da balança comercial dobrou. A desvalorização da peseta favoreceu a manutenção das exportações, as receitas do turismo e o investimento de capital estrangeiro, aliviando a gravidade do défice durante os primeiros anos. A crise energética resultou numa forte crise industrial, e o desemprego aumentou.

Compromissos Políticos dos Pactos da Moncloa

Os Pactos da Moncloa comprometeram o governo com a regulação da vida pública em conformidade com os princípios democráticos (liberdade de reunião, expressão e associação, a reforma do Código Penal e do Código de Justiça Militar), que encontraria sua manifestação na Constituição.

Objetivos Econômicos dos Pactos da Moncloa

Os objetivos econômicos dos Pactos da Moncloa incluíam a redução da inflação e a implementação de um conjunto de reformas para compartilhar de forma equitativa os custos da crise. Para controlar os preços e a forte desvalorização da peseta, foi criada uma estratégia para controlar a despesa pública. Acordou-se um programa para racionalizar o consumo de energia e a contenção salarial. Sobre o problema do desemprego, o seguro-desemprego foi ampliado, e o objetivo final era o fomento da economia de livre mercado.

Inimigos da Democracia e Suas Ações no Período

As principais ameaças vieram da involução (tentativas de golpes militares) e de manifestações de terrorismo. Organizaram-se grupos violentos, incluindo grupos de pistoleiros como os Guerrilheiros de Cristo Rei, a Triple A ou o Batalhão Basco Espanhol. Houve também algumas tentativas de desestabilização promovidas por grupos militares, instigados pela imprensa de direita, como a tentativa de golpe “Operação Galáxia”.

A Constituição de 1978: Um Resultado de Consenso

Pela primeira vez na história da Espanha, a elaboração do texto constitucional não respondeu à imposição unilateral de uma parte, mas sim ao acordo e consenso entre as forças políticas mais importantes. A redação ficou a cargo de um documento em que os grupos majoritários estavam representados no Congresso dos Deputados.

As Três Partes da Constituição de 1978

  • Parte Dogmática: Estabelece os princípios básicos, os direitos fundamentais, os princípios de política econômica e social, as garantias dos direitos e os mecanismos de suspensão.
  • Parte Orgânica: Desenvolve as funções e mecanismos das competências-chave (legislativo, executivo e judicial), abordando questões fiscais, a organização territorial do Estado e o Tribunal Constitucional.
  • Parte de Reforma Constitucional: Refere-se ao sistema através do qual se podem estabelecer as reformas da Constituição.

10 Aspectos Regulamentados na Constituição de 1978

  1. O Estado é definido como um Estado social e democrático de Direito, organizado como uma monarquia parlamentar.
  2. Reconhece o direito à autonomia e ao autogoverno das nacionalidades e regiões.
  3. O Estado não se define como católico. Embora reconheça a importância da Igreja Católica, o Estado mantém-se distante de todas as denominações e é declarado implicitamente laico.
  4. Reconhece os direitos civis de todos: liberdade de associação, reunião e expressão, direito à privacidade, direito à honra, etc. O divórcio foi legalizado e a pena de morte suprimida.
  5. Estabelece a igualdade de direitos entre homens e mulheres e a não discriminação em razão de sexo, religião ou raça.
  6. Limita os poderes representativos da Coroa, que apenas detém o comando supremo das Forças Armadas.
  7. Organiza a representação política em Cortes Gerais, compostas por duas câmaras: o Senado e a Câmara dos Deputados.
  8. Estabelece a divisão de poderes (legislativo, executivo e judicial). O poder executivo é exercido pelo Governo, nomeado e liderado por um Presidente, que concentra grandes poderes. O Presidente do Governo deve ser eleito pelos deputados e deputadas.
  9. Reconhece o livre mercado, mas também prevê o direito do Estado de intervir na economia e, se for do interesse geral, a expropriação de bens.
  10. O ensino é considerado um serviço público que o Estado deve promover e controlar.

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