O Estado e o Setor Público: Funções, Intervenção e Finanças

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Noção de Estado

É uma comunidade estabelecida num território e dotada de poder político soberano.

Funções do Estado

Conjunto de atividades desempenhadas pelo Estado para atingir os seus fins.

Classificação Jurídica

  • Função Legislativa: Elaborar leis que visam alcançar os fins estabelecidos (AR - lei e Governo - decreto-lei).
  • Função Administrativa ou Executiva: Levar as leis à prática e satisfazer as necessidades coletivas (segurança, saúde, educação). (Governo + Órgãos do poder soberano).
  • Função Judicial: Administrar a justiça, solucionar conflitos de acordo com os direitos legais, punir as infrações à lei. (Tribunais).

O Estado tem objetivos para atingir, que são alcançados através de funções exercidas por órgãos e serviços.

Classificação Não Jurídica

  • Função Política: Medidas de caráter organizativo, económico, social, cultural, ambiental, etc., para a prossecução dos interesses coletivos.
  • Função Económica: Medidas relativas ao crescimento económico e desenvolvimento das atividades económicas.
  • Função Social: Medidas relacionadas com o bem-estar das populações e redução de desigualdades sociais.

Estado e Setor Público

O Setor das Administrações Públicas inclui as unidades institucionais (órgãos, serviços e agentes do Estado e demais entidades públicas) que são produtoras não mercantis que satisfazem necessidades coletivas ou individuais que não podem ser deixadas apenas à iniciativa privada. E as que operam a redistribuição do rendimento e riqueza, sendo financiadas principalmente por pagamentos obrigatórios.

As Administrações Públicas (ou SPA) dividem-se em:

  1. Administração Central

    É o conjunto de órgãos e serviços que satisfazem necessidades comuns à população de todo o país.

    • Subsetor Estado

      Inclui o Governo e serviços integrados dele diretamente dependentes (ex: ministérios, direções-gerais, repartições de finanças, escolas, embora espalhadas por todo o território). Os dirigentes dos serviços dependentes do Governo podem tomar decisões de gestão corrente, mas não têm flexibilidade contratual.

    • Serviços e Fundos Autónomos (SFA)

      São entidades públicas que o Estado vigia, mas que são independentes e autónomas (ex: universidades).

      Têm autonomia administrativa e financeira: ter personalidade jurídica, poder ter/adquirir património, ter autonomia de tesouraria, ter receitas próprias, poder aceder a crédito, ter maior liberdade contratual.

  2. Administração Local

    Serviços que constituem e dependem das autarquias locais: assembleia de freguesia e junta de freguesia, assembleia municipal e câmara municipal.

  3. Administração Regional

    Serviços que constituem e dependem dos órgãos autónomos dos Açores e da Madeira.

    • Descentralização política (Órgãos de Governo Próprio).
    • Independência Orçamental (Orçamentos elaborados, votados e fiscalizados por estes órgãos, sujeitos a: Leis das finanças regionais e Lei de Enquadramento Orçamental aprovados na AR).
  4. Segurança Social

    Engloba as unidades institucionais que fornecem prestações sociais* e que têm como recursos essencialmente as contribuições sociais obrigatórias.

    * As mais importantes são: pensões de reforma e invalidez, subsídio de desemprego, rendimento social de inserção.

    Não se enquadram na AC por uma questão de maior transparência do sistema, mas integram a OE.

Setor Público Empresarial

É o conjunto de empresas que produzem bens e serviços comercializáveis cujo capital social é, total ou em parte, propriedade do Estado.

Tipos de Empresas no Setor Público Empresarial:

  • Empresas Públicas: A totalidade do capital é do Estado ou parte do capital é privado e parte do capital é do Estado (+50%). Origem: nacionalização ou criadas de novo pelo Estado.
  • Empresas Participadas: Há apenas uma participação direta ou indireta no capital por parte do Estado.

Objetivos do Setor Público Empresarial:

  • Domínio de setores essenciais (energia, água).
  • Domínio de setores-chave (transportes).
  • Controlo de empresas importantes para o país.
  • Satisfação de necessidades coletivas da população.

Conceitos Relevantes:

  • Nacionalização: Transferência de propriedade de uma empresa para o Estado.
  • Privatização: Venda de parte ou da totalidade das participações do Estado numa empresa pública.

Estado Liberal (Final do Séc. XVIII e XIX)

Caracterizado por:

  • Propriedade privada dos meios de produção.
  • Livre iniciativa (liberdade contratual).
  • Livre concorrência entre produtores e entre consumidores.
  • Não intervenção do Estado na esfera económica.
  • O mercado é o "regulador natural" da atividade económica.

Ao Estado caberia:

  • Garantir a segurança externa (defesa nacional).
  • Defender a ordem social e as liberdades individuais.
  • Aplicar a justiça.
  • Exercer a função política.

Estados Intervencionistas

No decurso da 1.ª metade do séc. XX, devido a:

  • A amplitude da crise dos anos 30.
  • As Guerras.
  • As necessidades de reconstrução da Europa pós 2.ª Guerra.

Estes fatores deram um novo impulso ao papel económico e social do Estado, através da Segurança Social, criada em 1945, com o objetivo de garantir um rendimento mínimo às pessoas atingidas por riscos sociais.

O papel do Estado na vida económica altera-se, dando lugar ao chamado Estado intervencionista (também chamado de Estado Providência em virtude da sua atuação no campo social).

Intervenção do Estado na Economia:

  • Condução de políticas anticrise e regulação da Economia.
  • Planeamento da Economia (OE).
  • Nacionalização de setores-chave (água, luz).
  • Produção de sistemas de contabilidade nacional e de métodos de previsão.
  • Produção legislativa (Leis).
  • Fiscalização dos agentes económicos e sociais (ASAE).
  • Incentivos à iniciativa privada.

Formas de Intervenção do Estado-Providência:

  • Combater o desemprego.
  • Combate à doença.
  • Combate à miséria e à exclusão social.
  • Apoio à 3.ª idade.
  • Apoio à infância.
  • Produção legislativa, etc.

Porque os mercados não garantem o equilíbrio automático da economia, o setor público deve assegurar a intervenção.

Princípios que Presidem ao Exercício das Funções do Estado

  1. A Eficiência

    Afetar os recursos económicos de forma ótima (afetação).

  2. A Equidade

    Promover o bem-estar social (repartição justa dos rendimentos).

  3. A Estabilidade

    Promover a estabilização macroeconómica da economia (regulação da atividade económica).

1. Promover uma Afetação Eficiente de Recursos

A eficiência significa que os agentes económicos devem fazer escolhas racionais – as que, com um mínimo de recursos, possibilitem o máximo de satisfação.

A eficiência do setor privado é diferente: é eficiência técnica – produzir ao mais baixo custo; regulada pelo preço de bens e pela oferta e procura.

A eficiência da empresa privada nem sempre leva à máxima eficiência para a sociedade.

2. Para o Estado, promover afetações eficientes de recursos significa:

  • Assegurar os fundamentos do funcionamento dos mercados (ex: garantir direitos de propriedade).
  • Corrigir as falhas de mercado (Concorrência Imperfeita e Externalidades).

Concorrência Imperfeita

  • Quando o mercado permite a formação de monopólios que anulam a concorrência e impedem a formação do preço de equilíbrio.
  • O Estado deve limitar o poder do monopólio ou evitar a sua formação.
  • Podem recorrer à publicação de Leis, controlo dos preços, apoio a pequenas e médias empresas.

NOTA: Uma empresa não é eficiente quando produz bens nocivos à saúde porque quer poupar recursos e obter o máximo de lucro (ex: produção de frangos com excesso de dioxinas).

Tipos de Intervenção: Regulação

Externalidades

Existe uma externalidade quando a ação de um agente económico afeta significativamente o bem-estar de outros agentes.

  • Positivas: Ex: intervenções que melhoram a vida de todos e não apenas quem as fez.
  • Negativas: Ex: fumo da fábrica que polui.

Uma externalidade negativa (positiva) gera um custo (benefício) social.

Para a sociedade, o custo de se produzir esse bem:

Custo Social Total = Custo privado + Custo externo (ex: custos ambientais e sociais resultantes de uma maré negra).

Para lidar com externalidades negativas:
  • Impostos ou multa: Equivalente ao custo externo.
Para lidar com externalidades positivas:
  • Subsídio: Equivalente ao benefício externo.

Bens Públicos

Podem ser individuais ou coletivos e satisfazem necessidades da população.

Características dos Bens Públicos:

  1. Não Exclusividade (Bens não excluíveis)

    Nenhuma pessoa pode ser excluída da sua utilização. A exclusão não é possível ou, caso seja possível, não é desejável – não se pode impedir o acesso de ninguém a esse bem.

    O mecanismo de exclusão é o preço. Ex: a defesa, as estradas, o saneamento básico.

  2. Não Rivalidade (Bens não rivais)

    A sua utilização por um indivíduo não reduz as quantidades disponíveis para os outros. Não existe rivalidade no consumo – se alguém usufrui do bem, não pode impedir outrem de usufruir também.

A rivalidade no consumo é a característica essencial para distinguir os tipos de bens:

  • Públicos: Não rivalidade (ex: Defesa).
  • Mistos: Rivalidade parcial, porque têm limites ao seu funcionamento, ficam lotados (ex: Escolas, Hospitais).
  • Privados: Rivalidade Total.

Condições para praticar a exclusão:

  • Possibilidade legal (ligada com direitos de propriedade)

    Exemplo de impossibilidade legal: As praias portuguesas.

  • Viabilidade tecnológica

    Exemplo de impossibilidade tecnológica: A iluminação pública.

  • Razoabilidade económica

    Exemplo: O estabelecimento é pago quando passa a ser um bem escasso. Passa a existir um mecanismo de exclusão.

Tipos de Intervenção: Despesa Pública em Bens e Serviços

Repartição dos Rendimentos

Para promover uma sociedade mais justa e a Equidade, o Estado deve:

  • Assegurar a todos os cidadãos o acesso a certos bens e serviços considerados meritórios (cuidados básicos de saúde, ensino).
  • Alterar a repartição primária de rendimentos resultantes do mercado, através de:
    • Progressividade do sistema fiscal.
    • Prestações sociais cobrindo situações de risco (doenças, desemprego) e diferenciadas em relação aos níveis de rendimento.

A Estabilidade

Nas economias de mercado, há períodos de crescimento económico e de recessão.

O Estado deve reduzir as flutuações e promover a estabilidade macroeconómica ao nível de:

  • Emprego.
  • Estabilidade de preços.
  • Equilíbrio das contas externas.
  • Crescimento económico.

Instrumentos de Intervenção Económica do Estado

  • Planeamento económico.
  • Políticas económicas e sociais, por exemplo:
    • Política fiscal.
    • Política de redistribuição do rendimento.
    • Política de emprego.
    • Política Orçamental.

Planeamento Económico

Os planos têm como função articular as diferentes políticas do Estado (económica, social, regional, cultural, ambiental) por forma a garantir o crescimento económico, a justiça social e o desenvolvimento harmonioso da sociedade.

  • O Planeamento permite articular as iniciativas públicas e privadas para maximizar a satisfação das necessidades coletivas e individuais, utilizando o mínimo de recursos.
  • Os planos, na medida em que exigem prévios diagnósticos, são úteis para ambos os setores para melhorar o conhecimento da realidade económica e social.
  • Os planos podem ser de médio/longo prazo ou anuais (ex: OE).

São elaborados pelo Governo, aprovados pela AR, que também controla a sua execução.

Os planos aplicam-se de forma diferente aos setores de propriedade:

  • Para o setor público, o plano é imperativo, têm de ser cumpridos os objetivos que ele estipula.
  • Para o setor privado, o plano é indicativo, pois o Estado não pode obrigar os particulares a atingir esses objetivos. Deve o Estado criar incentivos para que os particulares colaborem. Por exemplo, se numa dada região se quer incentivar a produção de um bem, o Estado pode isentar de impostos, durante um dado período de tempo, as empresas que o façam.

Orçamento do Estado (OE)

É um documento onde se estabelece a previsão da natureza e do montante das despesas e receitas públicas realizadas anualmente. O OE é elaborado pelo Governo e apresentado à AR, que o aprova.

Funções do OE:

  • Adaptação das receitas às despesas

    Não serão previstas despesas superiores às receitas e serão arrecadadas as receitas estritamente necessárias à efetivação das despesas previstas.

  • Limitação das despesas

    Não serão realizadas despesas não previstas no orçamento ou por montantes superiores aos previstos.

  • Exposição do Plano Financeiro do Estado

    Os cidadãos podem conhecer as áreas que a AP privilegia em cada ano e as fontes das receitas.

Despesas e Receitas Públicas: Sistema de Classificação

  • Classificação Económica: Distingue receitas e despesas correntes e de capital.
  • Classificação Funcional: Por funções: defesa, educação, segurança social, transportes, agricultura, etc.
  • Classificação Orgânica: Segundo a orgânica governamental: Ministérios, Secretarias de Estado, etc.

Despesas Públicas

Gastos que se destinam à promoção de fins de interesse público e à satisfação das necessidades coletivas da população.

  • As despesas públicas implicam receitas públicas. Nas finanças públicas, o montante das receitas é em função das despesas, nunca o contrário.

Exemplos de despesas correntes:

  • Vencimentos.
  • Transferências sociais (pensões de reforma e outros subsídios às famílias).
  • Bens para funcionamento dos serviços.
  • Pagamento de juros da dívida pública.

Exemplos de despesas de capital:

  • Investimentos em capital fixo (construção de infraestruturas, aquisição de equipamento e tecnologias).
  • Compra de ações.
  • Concessão de empréstimos.
  • Reembolso de empréstimos.

Receitas Públicas

Meios financeiros indispensáveis à cobertura das despesas públicas.

Classificação Económica das Receitas Públicas:

  • Receitas Correntes: Geradas no período de vigência do OE. Voltam a repetir-se nos anos seguintes. Exemplo: Impostos diretos, Multas, Taxas, Contribuições Sociais, Rendimentos de propriedade, Venda de bens e serviços.
  • Receitas de Capital: Podem não voltar a repetir-se nos anos seguintes. Exemplo: Venda do património, Venda de títulos de empréstimos concedidos, Contratação de empréstimos.

Classificação Jurídica das Receitas Públicas:

  • Receitas Coativas (impostos, multas, taxas, contribuições sociais) – Obrigatórias.
  • Receitas Patrimoniais.
  • Receitas Creditícias.

Receitas Coativas

  • São autoritariamente fixadas pelo Estado por via legislativa (lei).
  • Não resultam de qualquer acordo ou negociação entre o Estado e os particulares.
  • São prestações pecuniárias exigidas aos particulares que terão de se submeter a tal exigência.
  • Subdividem-se em impostos, taxas e licenças, contribuições sociais e multas.

Receitas Patrimoniais

  • Correspondem ao valor da venda, realizada pelo Estado aos particulares, de uma parcela do seu património.
  • O seu preço não é autoritariamente pré-fixado, mas sim estabelecido por um acordo negociável.
  • O Estado age como particular.
  • Ex: as receitas provenientes da venda de edifícios ou terrenos, da exploração de matas nacionais, rendas de prédios pertencentes ao Estado e lucros das empresas públicas; Venda de participações, Juros.

Receitas Creditícias

  • Receitas resultantes de empréstimos contraídos pelo Estado, autarquia local ou outras entidades públicas.
  • O Estado contrai empréstimos (com autorização prévia da AR), originando dívida pública interna ou externa.
  • Devem ter caráter excecional porque implicam o reembolso futuro acrescido de juros.

Saldos Orçamentais e Dívida Pública

Saldo Orçamental

Receitas - Despesas

  • R > D = Saldo Positivo
  • R < D = Défice
  • R = D = Equilíbrio

Défice Orçamental (Regra da UE)

  • < 3% do PIB (limite máximo)
  • > 3% do PIB (situação de défice excessivo)

Dívida Pública (Regra da UE)

  • Não pode ter mais que 60% do PIB.

Outros Saldos:

  • Saldo Corrente: Receitas Correntes - Despesas Correntes.
  • Saldo de Capital: Receitas de Capital - Despesas de Capital.

"Regra de Ouro" das Finanças Públicas:

Nunca devem ser pagas despesas correntes com receitas de capital.

Saldo Global ou Efetivo:

Receitas Efetivas (1) - Despesas Efetivas (2)

  • (1) Total das receitas menos empréstimos contraídos e reembolso de concedidos.
  • (2) Total das despesas menos empréstimos concedidos e reembolso de empréstimos contraídos.

É o saldo mais importante, pois indica o endividamento ou a capacidade de o diminuir.

(ps: juros são despesas correntes)

Saldo Primário:

(Caso se retirem os juros da dívida pública do cálculo da despesa primária: efetiva - juros = primários)

Receitas Efetivas - Despesas Primárias

SP = Receitas Efetivas - (Despesas Efetivas - Juros)

SP = Saldo Global + Juros

Dívida Pública

Montante monetário que o Estado deve aos credores em determinado momento.

  • O défice orçamental leva o Estado a contrair empréstimos, originando dívida pública.
  • Os empréstimos são reembolsados e obrigam ao pagamento de juros – Juros da dívida pública.

Tipos de Dívida Pública:

  • Interna: Se os financiadores são residentes no país.
  • Externa: Se os financiadores não são residentes no país.
  • Flutuante: Para ultrapassar falhas momentâneas de liquidez, amortizada até ao final do exercício do OE.
  • Fundada: Amortizada nos orçamentos dos anos seguintes.

Políticas Económicas e Sociais

São ações que o Estado desenvolve para atingir determinados objetivos previamente fixados.

  • Para alcançar os objetivos, o Estado utiliza diversos instrumentos macroeconómicos (ex: no âmbito da política fiscal, utiliza como instrumento a taxa do imposto).
  • Os objetivos podem entrar em conflito. Exemplo:
    • Redução do imposto sobre o rendimento → aumento da procura → aumento da oferta e redução do desemprego.
    • Mas, por outro lado: aumento da procura → aumento das importações → aumento do défice da balança de bens.

Políticas Económicas Conjunturais (ou de Estabilização ou de Curto Prazo)

  • Destinam-se a corrigir desequilíbrios existentes no curto prazo (normalmente < 1 ano).

Políticas Económicas Estruturais (ou de Médio e Longo Prazo)

  • Destinam-se a modificar estruturas em que assenta a economia, como, por exemplo, as políticas setoriais.
  • Produzem efeitos a médio (1 a 5 anos) e longo prazo (+5 anos).

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