Ética, Moral e Direito: Conceitos, Teorias e Legitimidade

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Moral, Ética e Direito: Sistemas de Regulação

Outra forma de abordar os sistemas de regulação é através da maneira como as normas são impostas. Existem dois extremos: **Normas Legais** (que utilizam alguma forma de coerção e podem ser impostas pela força, se necessário) e **Normas Morais e Éticas** (que apelam a imperativos internos, emocionais ou racionais). A separação entre estes sistemas de normas não é absoluta. Os costumes têm força de lei em muitas sociedades, e os códigos legais não são independentes da moral, mas baseiam-se nela.

Autonomia e Heteronomia na Ação Moral

A obediência à lei que vem de fora (externa) é chamada de ***heteronomia***. A obediência à lei que encontramos em nós mesmos (interna) é chamada de ***autonomia***. Agir de forma autônoma é a maneira humana de agir, pois respeita escrupulosamente a liberdade e a racionalidade humana.

Ética Pública e Moralidade Privada

Para resolver possíveis contradições entre normas objetivas e de consciência, deve ser feita uma distinção entre ética pública e moralidade privada. As fundações têm objetivos e graus de exigibilidade diferentes:

  • Objetivos: A moral privada visa a perfeição moral ou a felicidade pessoal. A ética pública visa a justiça nas relações entre os seres humanos.
  • Fundamentos: A moral privada depende de crenças pessoais e verdades particulares (como a religião). A ética pública baseia-se num modelo de coexistência dotado de força de evidência para ser aceito por todas as razões informadas e imparciais.
  • Exigibilidade: A moralidade privada pertence ao domínio da privacidade e não pode ser exigida coercivamente. A ética pública é de domínio público e é aplicada pela legislação positiva.

A Declaração Universal dos Direitos Humanos é uma teoria ética pública que, em parte, foi incorporada pela legislação. Ela defende os direitos individuais, incluindo a liberdade de consciência e a prática de morais privadas, mas sempre dentro da margem dos direitos humanos. Esta teoria ética é mais humilde do que outros modelos morais tradicionais que pretendem transmitir o comportamento humano e da sociedade.

Fundamentos Históricos dos Direitos Humanos

A Declaração sobre os Direitos do Homem e do Cidadão surgiu num contexto de combate ao poder absoluto do rei, que deixava o súdito indefeso contra a arbitrariedade do soberano. Daí a necessidade de afirmar a existência de direitos anteriores ao poder legislativo do monarca. É importante distinguir:

  • Direitos do Homem (Direitos Naturais): Direitos que os seres humanos possuem por serem pessoas, previamente à nossa integração na sociedade. Estes direitos precedem a natureza e qualquer organização política e serviram como defesa dos indivíduos contra o poder monárquico.
  • Direitos Civis: Direitos que recebemos pela nossa integração na sociedade.

Na Declaração dos Direitos da Virgínia, afirma-se que todos os homens são por natureza igualmente livres e independentes e têm certos direitos inerentes, dos quais não podem privar ou despojar a sua posteridade. A Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, pelos representantes do povo francês, decidiu expor solenemente os direitos naturais, inalienáveis e sagrados.

Diferentes Significados do Direito

O termo "Direito" possui diferentes significados:

  • Direito Objetivo: Refere-se ao conjunto de regras ou leis em vigor (o ordenamento jurídico existente no país).
  • Direito Subjetivo: É o poder de fazer algo concreto (exemplo: votar nas eleições).
  • Direito Positivo: Abrange todo o conjunto de leis promulgadas pelo Estado.
  • Direito Natural: É o conjunto de bases e princípios éticos universais que devem guiar o Direito Positivo. Os valores éticos que ele representa são vistos como um ideal ético a ser alcançado. É chamado de Direito Natural porque a fonte desses valores reside na natureza humana e no conceito de dignidade humana.

Legalidade e Legitimidade

Legalidade refere-se ao campo jurídico. Significa que algo é legal por ter sido feito em conformidade com as leis de um país. Legitimidade está relacionada com a ética e a moral, na medida em que analisa não só a legalidade de uma norma, mas se ela também concorda com os valores e princípios morais de justiça.

O **Positivismo Jurídico** afirma que não há Direito além do Direito Positivo, pois separa a ética da lei, argumentando que o fundamento último da lei reside nas instituições políticas e jurídicas. Para o positivismo, legalidade e legitimidade são identificadas, mas esta é uma teoria inadequada do ponto de vista da justiça, porque nem sempre as disposições legais coincidem com o que é justo.

O **Direito Natural** é composto por um conjunto de teorias que aceitam a existência de valores objetivos e universais que devem guiar o Direito Positivo. Para os gregos, os conceitos de justiça e direito tinham uma interpretação naturalista. O pensamento cristão medieval identificou a lei natural universal com a lei divina. A escola moderna do Direito Natural confiou na razão humana e nas suas possibilidades.

Teorias integrativas surgiram para reconhecer e tentar integrar as posições anteriores. Por isso, retomaram a abordagem baseada no Direito Natural e reabriram o debate sobre a legitimidade da legislação em vigor. Essas teorias afirmam que a lei é norma, mas está sujeita à realização da justiça como valor ético.

Componentes do Modelo Ético-Político Ideal

O modelo teórico ideal (baseado nos Direitos Humanos) inclui:

  • Reconhecimento dos direitos individuais perante a lei, defendendo os valores fundamentais da vida.
  • Rejeição das diferenças não legítimas, protegendo os valores éticos da igualdade e da justiça.
  • Participação no poder político, alcançada graças à liberdade.
  • Racionalidade como a melhor forma de resolver conflitos, evitando a violência e a discriminação injusta.
  • Garantias legais para que todos os cidadãos sejam protegidos da arbitrariedade jurídica dos sistemas de garantias.
  • Função social da propriedade, defendendo o valor da igualdade.
  • Políticas de ajuda, impostas para resolver a situação dos pobres, baseadas na igualdade essencial dos seres humanos e seus direitos.

As Teorias Políticas e a Legitimidade do Poder

As diferentes teorias distinguem-se pela forma como tratam a origem ou a legitimidade do poder político. As principais classificações são:

  • Teoria Organísmica: Acredita que os seres humanos só podem alcançar a plenitude e a felicidade na comunidade. Aristóteles diz que o homem é, por natureza, um animal político.
  • Teoria Individualista: Assume que o soberano é o indivíduo, que escolhe viver sob um poder comum como forma mais eficiente de organizar a convivência. Esta mudança resultou na preeminência da autonomia individual e pessoal. Dentro deste modelo, podemos encontrar:
    • Teoria Absolutista: Sustenta que o poder deve ser exercido de forma absoluta sobre os cidadãos, que são entendidos como súditos fora de qualquer controle.
    • Teoria Liberal: Pioneira das democracias modernas, desenvolveu-se contra o absolutismo, buscando legitimar o poder não na força, mas em relação a uma série de direitos e liberdades.

Justiça como Igualdade

Aristóteles distingue dois tipos de justiça:

  1. Justiça Distributiva: Distribuição pelo Estado de uma série de honrarias com base no mérito.
  2. Justiça Comutativa: Baseada no acordo ou contrato e depende dos termos acordados entre as partes.

A igualdade é dupla: **igualdade natural** e **igualdade política ou de direito**. Embora sejamos diferentes por natureza, o direito é o que pode nos dar o estatuto de igualdade perante a lei. A concepção de justiça como igualdade refere-se a este segundo significado, sendo um termo relacionado ao Estado Democrático de Direito.

Desafios Políticos e Éticos Atuais

Os desafios da ética e da política surgem da violação de quaisquer componentes do modelo ético. O desafio principal é garantir que os direitos humanos sejam respeitados. Os principais problemas incluem:

  • Negação dos direitos individuais: Ataques de tirania sobre a vida, negligência dos direitos humanos.
  • Permanência das desigualdades não justificadas por razões econômicas, religiosas ou raciais (exclusões).
  • Ausência de democracia: Embora o número de países democráticos tenha crescido, muitos estão sujeitos a tiranias.
  • Fanatismo irracional: Modos de agir que são propícios a comportamentos violentos.
  • Arbitrariedade dos regimes legais: Regimes arbitrários e ditatoriais não oferecem garantia de segurança jurídica, defendendo o "direito a ter direitos" (como disse Hannah Arendt).
  • Pobreza: Quando a propriedade não cumpre sua função social.
  • Falta de solidariedade: Problemas globais que requerem soluções globais.

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