Fases do Processo Penal Português: Notícia, Inquérito e Julgamento
Classificado em Outras materias
Escrito em em
português com um tamanho de 44,44 KB
NOTÍCIA DO CRIME – Pré-Inquérito
Temos de iniciar pelo princípio do processo. Em Portugal, o processo penal inicia com a notícia do crime (condição que, uma vez verificada, obriga ao início do procedimento penal). É esta que vai permitir, nomeadamente e por regra, o desenvolvimento da fase de investigação por excelência (fase de inquérito). Esta regra resulta do artigo 241.º do CPP, tendo desenvolvimento no artigo 262.º, n.º 2 do CPP. Esta norma do último artigo tem exceções que se encontram ressalvadas, ou seja, há situações em que a notícia do crime não dá origem a inquérito, dá origem à abertura de procedimento, mas pode não dar origem à abertura de inquérito. A notícia do crime vem regulada nos artigos 241.º a 247.º do CPP. É a notícia de facto que pode desencadear a responsabilidade jurídico-criminal. É o conhecimento de factos de um acontecimento histórico que pode determinar a responsabilidade jurídico-penal. Quem adquire a notícia do crime é o MP, esta é a entidade que tem o poder de promoção processual inicial (artigo 53.º, n.º 2, alínea a) do CPP). É no exercício deste poder que o MP faz um juízo de valor jurídico-factual à notícia.
A notícia do crime não se basta com o mero boato nem com um conhecimento e suspeita incompletas. A notícia do crime chega ao MP:
- Por conhecimento próprio;
- Por intermédio dos OPCs (Órgãos de Polícia Criminal);
- Mediante denúncia.
Qualquer agente do MP tem poder para dar início a um inquérito com base no conhecimento que tinha de um crime, mesmo que ele lhe não tenha sido denunciado por qualquer pessoa ou entidade. A denúncia é obrigatória, quer para as entidades policiais, quer para os funcionários (artigo 386.º do CP), mas só quanto aos crimes de que tiverem conhecimento no exercício das suas funções e por causa delas (artigo 242.º do CPP). Toda a denúncia que não tenha sido entregue diretamente ao MP deve ser-lhe remetida no mais curto prazo possível, que não pode exceder 10 dias, podendo ser transmitida por qualquer meio informal de comunicação, sujeito a posterior confirmação escrita (artigos 243.º, n.º 3, 245.º e 248.º do CPP). Este dever, quando referido aos OPCs, não perde validade ou sofre qualquer condicionalismo derivado do tipo de competência daqueles órgãos ou da delegação genérica em que o MP os tenha investido (artigo 270.º, n.º 4 do CPP). O dever de denunciar ou de "participar" deve ceder perante o dever de segredo profissional. A denúncia é um ato facultativo para o comum dos cidadãos.
Denúncia, Queixa e Auto de Notícia
A denúncia só pode ter lugar a crimes públicos, pois quanto aos crimes semipúblicos e particulares, a denúncia toma a designação de queixa e é privativa, por razões várias de política criminal, do ofendido, do respetivo representante legal, ou de quem represente ou continue a sua vontade, devendo ser apresentada no prazo legalmente previsto (artigo 242.º, n.º 3, e 113.º e seguintes do CP). A queixa significa mais do que dar conhecimento, está coenvolvida a intenção do titular de perseguir criminalmente através de uma expressa manifestação. O prazo que a lei vigente impõe é de 6 meses (artigo 115.º, n.º 1 do CP) a contar da data em que o titular tiver tido conhecimento do facto e dos seus autores, ou a partir da morte do ofendido, ou da data em que ele se tiver tornado incapaz, ou, nos casos previstos no n.º 6 do artigo 113.º (ofendido menor de 16 anos ou incapaz de discernir o significado e alcance do exercício do direito de queixa), a contar da data em que o ofendido perfizer 16 anos. A queixa a determinados factos não pode ser convolada para queixa por factos substancialmente diferentes, na aceção da alínea f) do artigo 1.º do CPP, sem que haja nova queixa por parte do titular do respetivo direito, pressupondo, pois é de queixa que falo, que os factos denunciados constituem crime semipúblico ou particular. Quanto aos crimes cujo procedimento depende de queixa, a legitimidade do MP assenta no exercício daquele direito por parte do respetivo titular. A denúncia de um crime presenciado pela autoridade judiciária, no exercício das suas funções e por causa delas, ou pelas entidades policiais, toma a forma de auto de notícia, com as formalidades do artigo 243.º, n.º 1 e 2 do CPP, o qual é remetido ao MP no mais curto prazo possível, que não pode exceder 10 dias (n.º 3 do artigo 243.º do CPP). A denúncia tanto pode ser verbal como escrita, sendo a verbal logo reduzida a escrito pela entidade que a recebe, e deve conter os elementos que devem constar no auto de notícia (artigo 243.º do CPP). Tratando-se de crime particular, é obrigatória, por parte do queixoso, a declaração de que pretende constituir-se assistente, para o que deve ser expressamente advertido pela entidade que receber a denúncia verbal (artigo 246.º, n.º 4 do CPP), que engloba informação sobre os procedimentos a observar para o efeito no artigo 68.º, n.º 2 do CPP. Em caso de denúncia por escrito, a informação continua a ser devida pela entidade que a recebe.
A Denúncia Anónima e o Registo
A denúncia anónima, sendo aquela que seja impossível referir a um determinado autor, implica a abertura de inquérito, mas apenas nas condições estabelecidas no n.º 5 do artigo 246.º do CPP: se dela se retirarem indícios da prática de crime ou se ela própria constituir crime; caso contrário, a denúncia anónima deve ser destruída por ordem da competente autoridade judiciária (n.º 7 do artigo 246.º do CPP), que só não será o MP se for apresentada numa das fases posteriores ao inquérito e dirigida ao juiz que lhe presidir, não decidirá sem prévia audição do MP. Sendo na abertura de inquérito (satisfazendo as condições do n.º 5), e tratando-se de crime cujo procedimento dependa de queixa, a autoridade judiciária ou o OPC competentes devem informar o titular daquele direito da existência da denúncia anónima para que, querendo, exerça o seu direito (n.º 6 do artigo 246.º do CPP). O mesmo devem fazer relativamente ao ofendido que, não obstante a natureza pública do crime, goza do direito de participação. Todas as denúncias são registadas pelos serviços do MP; o denunciante pode requerer certificado desse registo (artigo 247.º, n.º 4 e 5 do CPP). É que não pode haver dúvidas que ensombrem o cumprimento do princípio da legalidade. Deve o MP informar o ofendido da notícia do crime, sempre que tenha razões para crer que ele (ofendido) a não conhece (artigo 247.º, n.º 1 do CPP). Este é um dever que não depende da natureza do crime: particular, semipúblico ou público.
INSTRUÇÃO
O artigo 289.º do CPP delimita o conteúdo da instrução penal. Este conteúdo refere-se fundamentalmente àquilo que constitui o núcleo essencial da instrução, mas, do ponto de vista dinâmico, a instrução integra mais momentos para além destes que constituem o núcleo essencial da instrução que podemos designar como momentos instrutórios. Para isso temos de olhar para a instrução em termos dinâmicos onde podemos apontar os seguintes momentos que compõem toda a instrução:
- Momentos Prévio e Inicial
- Corresponde aos atos de abertura de instrução.
É prévio porque a instrução tem natureza meramente eventual (artigo 286.º do CPP), essa natureza está relacionada com a circunstância de que a instrução, para ter lugar, depende de requerimento. Portanto, há aqui um momento prévio que é o momento de apresentação do requerimento de abertura de instrução (RAI).
- O requerimento de abertura de instrução é apresentado perante o próprio MP e é a partir desta apresentação ou não que o MP decide o destino a dar ao processo. Se o requerimento for apresentado, o MP remete o processo para o juiz de instrução. Se o requerimento não for apresentado e se estiver na presença de uma acusação, o processo é remetido para o tribunal de julgamento.
- A instrução nunca tem lugar por efeito automático da lei e nunca tem lugar oficiosamente, isto é, por decisão do juiz. A instrução depende sempre desta manifestação formal de vontade que é o requerimento de abertura de instrução.
- Em termos gerais, para haver lugar à instrução temos de olhar para os requisitos que devem estar reunidos para que possa haver lugar a esta fase.
Requisitos para a Abertura de Instrução (artigo 287.º do CPP):
- Necessidade de apresentação do RAI;
- Prazo de 20 dias (prazo perentório – a sua ultrapassagem extingue o direito a requerer a abertura de instrução);
- Legitimidade:
- Arguido – é uma legitimidade plena, ou seja, o arguido pode requerer a abertura de instrução relativamente a qualquer crime independentemente da sua natureza processual.
- Assistente – é uma legitimidade restringida aos crimes públicos e semipúblicos. O assistente não tem legitimidade para requerer a abertura de instrução no caso de crime cujo procedimento depende de acusação particular (artigo 50.º do CPP + artigo 285.º do CPP) porque quem acusa é o assistente e se a instrução visa o controlo da decisão de acusar não faz sentido o assistente fazer um controlo de si próprio.
Quanto aos intervenientes processuais principais, não tem legitimidade para abertura de instrução o MP porque é o titular de ação penal (artigo 219.º do CPP). Quanto ao defensor, este tem legitimidade para requerer a abertura de instrução independentemente da vontade do arguido, na medida do artigo 63.º do CPP, pois não é um direito pessoal do arguido. Quanto ao defensor, este tem legitimidade para requerer a abertura de instrução independentemente da vontade do arguido, na medida do artigo 63.º do CPP, pois não é um direito pessoal do arguido.
Há uma formalidade mínima que o requerimento deve ter que tanto vale para o arguido como para o assistente, trata-se das razões de facto e de direito da discordância. Quanto ao assistente, o legislador ainda exige outras condições formais: narração dos factos e disposições legais aplicadas. O assistente tem de construir o requerimento de abertura de instrução como uma verdadeira acusação. Quando o assistente não cumpre estas exigências, não é admissível o convite ao aperfeiçoamento – Acórdão 7/2005 –, sendo assim o RAI inadmissível.
- Há também condições negativas onde a instrução pura e simplesmente não pode ter lugar, sendo as formas especiais de processo condição negativa.
- Verificadas todas as condições, a instrução torna-se obrigatória e o juiz está obrigado a abrir e realizar a instrução, sob pena de nulidade sanável. O juiz deve apenas verificar formalmente as condições que determinam a abertura de instrução.
- Artigo 287.º, n.º 3 do CPP – rejeição do RAI.
- No despacho de abertura de instrução, o juiz deve nomear defensor ao arguido (caso não o tenha ainda). Logo no momento de abertura de instrução, o juiz deve, desde logo, pronunciar-se quanto ao conteúdo da instrução. Isto a propósito da realização ou não de atos de instrução.
Atos de Instrução e Debate Instrutório
Os atos de instrução no âmbito do processo penal são diligências de prova que possuem caráter eventual, ou seja, podem não ocorrer. Cabe ao juiz decidir sobre a sua realização, podendo determinar qualquer diligência necessária à instrução (artigo 297.º do CPP). Caso não sejam realizados atos de instrução ou os requeridos sejam rejeitados, o juiz deve designar o debate instrutório, que é obrigatório, sob pena de nulidade sanável.
O despacho que decide a realização ou não dos atos de instrução não admite recurso, apenas reclamação para o próprio juiz (artigo 291.º do CPP). Existem exceções ao caráter eventual, como as declarações do arguido e o depoimento da vítima, caso sejam requeridos (artigo 292.º do CPP). Os atos de instrução são, em regra, não contraditórios, ao contrário do debate instrutório, que possui natureza contraditória.
Na instrução, podem ser produzidas todas as provas legalmente admissíveis, mas há uma regra de não repetição de atos probatórios realizados no inquérito, exceto em casos específicos. Não se admite a produção de prova abonatória nessa fase, e todas as diligências devem ser documentadas em auto (artigo 296.º do CPP).
Após a realização dos atos de instrução, o juiz deve marcar o debate instrutório, exercendo poderes de disciplina, direção e organização, conforme os artigos 322.º e 323.º do CPP. O debate segue os passos previstos no artigo 302.º do CPP. A produção de prova antes ou durante o debate instrutório segue as regras dos atos de instrução (artigo 299.º do CPP). O adiamento do debate instrutório está regulamentado pelos artigos 300.º e 304.º do CPP, e sua documentação deve constar em ata (artigo 305.º do CPP).
A fase de instrução culmina com a decisão instrutória, momento decisório final que marca o encerramento da instrução (artigo 306.º do CPP). Os prazos dessa fase possuem natureza ordenadora, não sendo perentórios, e variam conforme a situação do arguido: 2 meses se houver medidas privativas de liberdade e 4 meses nos demais casos. O prazo começa a contar a partir da abertura da instrução (n.º 3 do artigo 306.º do CPP).
A Decisão Instrutória
A decisão instrutória é proferida pelo juiz com base no princípio da legalidade, podendo ter dois sentidos:
- Pronúncia – Equivale a uma decisão de acusação (artigo 308.º, n.º 2 do CPP), aplicando-se os requisitos do despacho de acusação.
- Não Pronúncia – Equivale a um despacho de arquivamento.
O artigo 308.º, n.º 1 do CPP estabelece que o juiz deve proferir decisão de pronúncia caso existam indícios suficientes para submeter o arguido a julgamento ou, caso contrário, decisão de não pronúncia. Após o encerramento do debate instrutório (artigo 307.º do CPP), o juiz pode ditar a decisão imediatamente para ata ou, caso necessário, dispor de um prazo de 10 dias para decidir. O juiz pode fundamentar sua decisão por remissão para os fundamentos constantes da acusação ou do requerimento de abertura de instrução, visando economia processual.
Se apenas um ou alguns arguidos requerem a instrução, o juiz deve pronunciar todos aqueles em relação aos quais existam indícios suficientes, incluindo os que não requereram a abertura de instrução (artigo 307.º, n.º 4 do CPP). Alternativamente, o juiz pode aplicar mecanismos como a suspensão provisória do processo, nos termos dos artigos 307.º, n.º 2, e 281.º do CPP.
Na decisão instrutória, o juiz deve, antes de apreciar o mérito, verificar nulidades processuais (artigo 308.º, n.º 3 do CPP). Após este saneamento, a decisão é limitada pelos factos constantes da acusação ou do requerimento de abertura de instrução, garantindo a vinculação temática ao objeto do processo. Tanto o inquérito quanto a instrução têm como objetivo final determinar se o arguido deve ser submetido a julgamento.
PROCESSO ABREVIADO
A aplicação de um processo abreviado depende da verificação de dois requisitos cumulativos, sob pena de nulidade insanável (artigo 119.º, alínea f) do CPP):
- Requisito Primário
- Está relacionado com o tipo de crime e sanção aplicável (artigo 391.º-A do CPP).
- Aos crimes puníveis com pena de prisão cujo limite máximo é superior a 5 anos pode ser aplicada a forma de processo abreviado caso o MP entenda que, no caso em concreto, não deve ser aplicada uma pena superior a 5 anos. Também pode ser aplicada esta forma de processo quanto a concursos de crimes puníveis com pena de prisão não superior a 5 anos ou concursos de crimes com pena de prisão superior a 5 anos, mas que o MP entenda que, no caso em concreto, não deve ser aplicada uma pena superior a 5 anos (n.º 2 do artigo 391.º-A do CPP).
- Impõe-se que a prova seja simples e evidente (artigo 391.º-A, n.º 1 do CPP). Ainda que esta simplicidade e evidência sejam conceitos indeterminados, o legislador determina (artigo 391.º-A, n.º 3 do CPP) quais são as situações suscetíveis de resultar, em termos probatórios, na simplicidade e evidência.
- Requisito Secundário
- Prende-se com o prazo para dedução de acusação. Por força do artigo 391.º-B, n.º 2 do CPP, o prazo para dedução de acusação é de 90 dias a contar da aquisição da notícia do crime ou da apresentação de queixa.
A tramitação do processo inicia-se após a detenção em flagrante delito. Há dois momentos:
- Momento Judiciário Preliminar
- Tem lugar perante o MP. Pode consistir ou não na realização de um inquérito sumário. Se optar por realizar inquérito sumário, esse segue as regras do inquérito em processo comum (artigo 272.º do CPP).
- Culmina na decisão de deduzir ou não acusação a proferir no prazo já referido. A dedução de acusação segue as regras formais da acusação em processo comum (artigo 283.º do CPP).
- Ainda que o legislador obrigue o cumprimento dos requisitos formais previstos no artigo 283.º, n.º 3 do CPP, em sede de processo abreviado, o MP pode “simplesmente” remeter para o auto de notícia ou denúncia, mas sempre identificando o arguido e narrando os factos (artigo 391.º-B, n.º 1, parte final do CPP).
- A circunstância de se estar perante um processo abreviado não obsta a que o MP lance mão do arquivamento do processo em caso de dispensa de pena (artigo 280.º do CPP) ou da suspensão provisória do processo (artigos 281.º e 282.º do CPP) desde que verificados os respetivos requisitos (artigo 391.º-B, n.º 4 do CPP).
Momento Judiciário Final
- Inicia-se após a dedução da acusação com a remessa do processo para julgamento.
- Integra os atos preliminares à audiência de julgamento, nomeadamente o saneamento do processo e a marcação da data da audiência (artigo 391.º-C do CPP), a audiência de discussão e julgamento e a sentença.
- Quanto aos atos preliminares:
- Saneamento – o juiz deve verificar e conhecer das nulidades ou outras questões acidentais referidas no artigo 311.º do CPP, designadamente as que obstam à apreciação do mérito da causa. Para além disso, o juiz deve também verificar da validade de aplicação e tramitação desta forma de processo. Caso o juiz verifique que esta forma de processo foi mal aplicada e que deva, por conseguinte, ser utilizada forma de processo diversa, é proferido despacho de reenvio dos autos ao MP para tramitação sob outra forma processual mais adequada (artigo 391.º-D, n.º 1 do CPP). Esta nova forma de processo a aplicar deve ser decidida pelo MP. Deve rejeitar a acusação sempre que se verifiquem as circunstâncias previstas no artigo 311.º, n.ºs 2 e 3 do CPP. Sendo o processo válido e aceite, o juiz deve marcar a data para audiência.
- Audiência de discussão e julgamento - segue as disposições legais do julgamento na forma de processo comum (artigo 391.º-E do CPP).
- Sentença – toda a prova que não for apreciada em julgamento não pode ser valorada e usada em efeito de fundamentação da sentença do juiz. O juiz deve proferir sentença logo após as alegações finais (artigo 391.º-F do CPP). Quando proferida oralmente é sempre e obrigatoriamente documentada, sob pena de nulidade. Podendo fazer por escrito e posteriormente feita a sua leitura (artigo 389.º-A, n.º 5 do CPP + 379.º, n.º 1 do CPP).
- Recurso – artigo 391.º-G do CPP. Só é admissível recurso da sentença ou de qualquer despacho que ponha termo ao processo. As formas de processo especial são formas de processo urgente por isso até à sentença de 1.ª instância todos os atos processuais e prazos processuais podem ser praticados fora de horário de expediente, ou seja, dias não úteis, fora das horas de expediente e em férias judiciais (artigo 103.º + 104.º do CPP).
PROCESSO SUMARÍSSIMO
Está regulado nos artigos 392.º a 398.º do CPP. Partilha com as outras formas especiais, em termos de fundamentação, a ideia forte do princípio da celeridade. Diferentemente das outras formas especiais, este assenta num outro fundamento que é o princípio do consenso porque a decisão final que aplica a pena é toda ela construída com base no consenso processual. Aqui não há instrução e a sua particularidade é que não há audiência de julgamento porque a pena concreta é aplicada por simples despacho judicial escrito. A sua condição de aplicabilidade tem 3 requisitos cumulativos, sob pena de nulidade insanável (artigo 119.º, alínea f) do CPP):
- A aplicação da pena só pode ocorrer em caso de crime punível com pena de prisão não superior a 5 anos ou com pena de multa. Note-se que, em contrário às outras formas especiais, não há exceções, não vale o tal juízo de prognose feito pelo MP. É uma forma de tramitação especial exclusivamente aplicada à pequena e média criminalidade sem exceções (artigo 392.º, n.º 1, 1.ª parte do CPP).
- A aplicação da pena só pode acontecer se o MP for do entendimento de que não deva ao caso concreto ser aplicada pena ou medida de segurança privativa da liberdade (artigo 392.º, n.º 1, 2.ª parte do CPP).
- A aplicação da pena só pode acontecer se nas situações concretas do caso se manifestar consenso processual entre os principais sujeitos quanto à pena concreta a aplicar, ou seja, têm de estar de acordo quanto à concreta pena a aplicar ao arguido (disposições conjugadas dos artigos 392.º, n.º 1, 2.ª parte, 396.º e 397.º do CPP).
Quanto à tramitação pode-se dizer que esta forma, em rigor, resume-se a um procedimento simplificado fundado no consenso processual de aplicação da pena não privativa da liberdade através de um despacho judicial escrito. No essencial, é uma tramitação que integra um quadro reduzido de atos mínimos legalmente exigidos. Este procedimento simplificado pode acontecer no âmbito de um processo concreto que se inicie sob qualquer outra forma processual. Esta forma é o mecanismo processual simplificado que se afigura como uma alternativa da decisão de acusar desde que verificados os requisitos enunciados de aplicabilidade. Este procedimento é essencialmente escrito, não integra atos orais salvo eventual audição do arguido pelo MP. Mesmo simplificado não deixa de manifestar-se os dois momentos em que se desdobra qualquer tramitação de processo especial:
- Momento Judicial Preliminar
- Integra atos da competência do MP (artigos 392.º e 394.º do CPP).
- Este momento implica uma iniciativa processual que se traduz no lançar mão deste procedimento. É em regra uma iniciativa oficiosa do MP. O MP pode ouvir previamente o arguido para o efeito.
- Todavia, o legislador já permite que seja o arguido a requerer ao MP o lançar mão deste procedimento, ou seja, a iniciativa seja do arguido.
- Só se inicia através de uma promoção do MP – ato formal da promoção de aplicação de pena em processo sumaríssimo – independentemente de quem seja a iniciativa. Este ato concretiza-se através de um requerimento escrito que contenha uma proposta sancionatória concreta (artigo ...) – Requerimento Acusatório Sancionatório Sumaríssimo.
- Forma – escrito (artigo 394.º, n.º 1 do CPP).
- Conteúdo – constituído por duas partes obrigatórias: acusatória (artigo 394.º, n.º 1, 2.ª parte do CPP) e sancionatória (artigo 394.º, n.º 1, 3.ª parte e n.º 2 do CPP).
- Após a apresentação do requerimento este é remetido ao juiz de julgamento – transição entre os dois momentos.
- Momento Judicial Final (artigos 395.º a 398.º do CPP)
- É da competência do juiz de julgamento e do tribunal singular (artigo 16.º, n.º 2, alínea b) do CPP).
- Inicia-se com a apreciação liminar onde o juiz pode proferir um dos seguintes despachos (artigo 395.º do CPP):
- Despacho de rejeição liminar: Quando o juiz conclua que o procedimento é legalmente inadmissível (falta de legitimidade do MP para ação penal) ou quando o requerimento se afigurar manifestamente infundado (artigo 311.º, n.º 3 do CPP).
- Despacho de rejeição com reenvio: Quando, não sendo caso de arquivamento imediato, o caso possa prosseguir, mas apenas noutra forma processual (não há lugar para seguir na forma sumaríssima do processo); quando o juiz não concorda com a sanção proposta pelo MP. Insuscetível de recurso. Nas situações de reenvio, o arguido é notificado e equivale a uma acusação, tendo prazo para requerer abertura de instrução.
- Despacho contendo uma diferente proposta sancionatória: Quando entende que o processo está em condições de prosseguir na forma sumaríssima havendo apenas discordância com a sanção. Se não houver concordância, o juiz deve determinar o reenvio para outra forma processual. Havendo concordância, o juiz deve notificar ao arguido a proposta sancionatória.
- Despacho para notificação ao arguido da proposta de condenação (artigo 396.º do CPP):
- Se não tiver defensor, é nomeado um.
- O despacho traduz-se numa ordem para que a secretaria proceda à notificação ao arguido, mas também ao defensor.
- Face à natureza da notificação, tem de ser feita por contacto pessoal.
- Deve conter obrigatoriamente os elementos referidos no n.º 2 do artigo 396.º do CPP.
- Após o despacho, o arguido dispõe de um prazo para tomar posição:
- Nada dizer – inércia (consequência: o silêncio equivale como declaração de não oposição).
- Manifestar formalmente a sua concordância escrita.
- Opor-se sem fundamentação.
- Despacho final de aplicação da pena: Quando o arguido não se oponha. Não há intervenção das partes civis, podendo, ainda assim, haver lugar ao arbitramento oficioso de uma quantia a título de reparação (artigo 394.º, n.º 2, alínea b) do CPP com referência ao artigo 82.º-A do CPP).
PROCESSO SUMÁRIO
Regulado nos artigos 381.º a 391.º do CPP. Aplicável em casos de detenção em flagrante delito por autoridade judiciária ou entidade policial (ou cuja entrega seja feita a estas entidades no prazo de duas horas, artigo 255.º, n.º 2 do CPP), cujo crime tenha uma pena não superior a 5 anos e o julgamento seja feito num curto período de tempo (20 dias). Constitui um mecanismo de prevenção e repressão de todo o tipo de criminalidade, incluindo a criminalidade grave (com as exceções previstas no artigo 381.º, n.º 2 do CPP). No processo sumário predominam prazos curtos e preclusivos porque a simplicidade do processo está ligada ao curto intervalo que se estabelece entre a notícia do crime e o julgamento. Os atos relativos a esta forma de processo até à sentença da 1.ª instância podem ser praticados em dias não úteis, fora das horas de expediente e durante as férias judiciais, por força do artigo 103.º, n.º 2, alínea d), e os respetivos prazos também correm em férias (artigo 104.º, n.º 2 do CPP). A apresentação do arguido e testemunhas deve ser feita ao MP de imediato não excedendo as 48h posteriores à detenção (artigo 28.º, n.º 1 da CRP), devendo o MP providenciar a nomeação de defensor no caso do detido não se fizer acompanhar por advogado, podendo interrogá-lo sumariamente caso este não peça prazo para preparação da defesa, e de imediato, ou no mais curto espaço de tempo, apresenta-lo a julgamento. Casos em que o MP pode concluir que não há condições para julgamento com base nas declarações do detido, no próprio auto de notícia ou auto sumário de entrega que o acompanha:
- Se ao crime ou crimes pelos quais se procedeu à detenção for aplicável, unitariamente ou em concurso, pena de prisão de máximo superior a 5 anos, ou se não verificar qualquer outro dos requisitos daquela forma de processo, como por exemplo, o flagrante delito;
- Se, não havendo lugar para a realização de diligências probatórias prévias ou a prazo para a preparação da defesa, tiver razões para crer que o julgamento se não pode iniciar antes de passadas 48h sobre a detenção.
Nestes casos, o MP profere despacho no sentido de o processo passar a seguir a forma comum, ou outra que lhe caiba e manda libertar imediatamente o detido, e, se for caso disso, sujeitá-lo a TIR (Termo de Identidade e Residência) e caso esta medida seja insuficiente o arguido é apresentado a primeiro interrogatório judicial de arguido detido para aplicação de medida de coação e/ou garantia patrimonial. Poderá ainda acontecer a libertação do detido e arquivamento do processo nos casos em que...
O INQUÉRITO
O inquérito é iniciado com a notícia do crime e constitui uma fase indispensável do processo penal, sendo prévia ao julgamento. É composto por um conjunto de diligências destinadas a investigar a existência de um crime, identificar os seus agentes, determinar a responsabilidade deles e recolher provas para fundamentar a decisão de deduzir acusação ou arquivar o processo (artigo 262.º do CPP). O objeto do inquérito corresponde ao crime, conforme definido no artigo 1.º, n.º 1, alínea a) do CPP, e vai adquirindo identidade ao longo da investigação. Nos crimes semipúblicos ou particulares, o inquérito é delimitado pelo teor da queixa. Em crimes públicos, o Ministério Público (MP) pode alterar o crime investigado, devendo respeitar as regras de competência por conexão se surgirem indícios de outros crimes, separando processos, quando necessário. A competência do MP no inquérito é aferida territorialmente pelo lugar onde o crime foi cometido (artigo 26.º, n.º 1 do CPP), enquanto a competência do tribunal baseia-se no local de consumação do crime. A competência por conexão do MP reflete a do tribunal (artigo 264.º, n.º 5 do CPP). O MP tem liberdade para realizar as diligências necessárias para fundamentar a acusação ou o arquivamento, sendo essa liberdade condicionada pelas finalidades do inquérito, que incluem apurar a existência do crime, identificar os agentes, determinar a responsabilidade e recolher provas. A insuficiência do inquérito ocorre quando o MP omite um ato obrigatório previsto na lei, e esta omissão resulta em nulidade (artigo 120.º, n.º 2, alínea d) do CPP). Há atos do inquérito que dependem de ordem ou realização pelo juiz de instrução (artigo 268.º, n.º 1 do CPP), como perícias, buscas domiciliárias (exceto as que o MP pode ordenar ou os OPC podem realizar), apreensão de correspondência e interceção de comunicações. O MP também não pode delegar os atos mencionados no artigo 270.º, n.º 2 do CPP. O inquérito é um processo escrito (artigo 275.º do CPP), e as diligências probatórias são reduzidas a auto. Nos interrogatórios de arguidos, deve ser utilizada gravação áudio ou audiovisual. Atos dependentes do juiz de instrução e declarações para memória futura devem ser reduzidos a auto. A ausência de auto equivale à inexistência do próprio inquérito e constitui nulidade insanável, nos termos do artigo 119.º, alínea d) do CPP.
Encerramento e Suspensão Provisória do Inquérito
O encerramento do inquérito é regulado por prazos máximos que visam garantir a eficácia da investigação, a reposição da paz jurídica e social e o respeito pelas garantias fundamentais do arguido. O prazo conta-se a partir do momento em que o inquérito começa a correr contra pessoa determinada ou com a constituição de arguido (artigo 276.º, n.º 4 do CPP). O inquérito encerra-se com o despacho de acusação ou de arquivamento (artigo 276.º, n.º 1 do CPP).
No arquivamento do inquérito, conforme os artigos 277.º e 280.º do CPP, podem ocorrer dois tipos: por falta de indícios suficientes ou por não determinação dos agentes (artigo 277.º do CPP), e por dispensa ou isenção de pena (artigo 280.º do CPP). Após o arquivamento, o ofendido pode constituir-se assistente e requerer a abertura de instrução no prazo de cinco dias (artigo 287.º do CPP), ou, na ausência deste requerimento, os autos seguem para o superior hierárquico do MP, que pode ordenar novas diligências ou deduzir acusação no prazo de 30 dias (artigo 278.º do CPP).
Os casos de dispensa de pena (artigo 280.º do CPP) envolvem situações em que o arguido confessa, colabora com a justiça e é dispensado de pena pela lei, com concordância do Juiz de Instrução. Nos casos de isenção de pena, como estado de necessidade, o arquivamento também exige concordância do Juiz de Instrução. Caso a acusação já tenha sido deduzida, o arquivamento depende da concordância do juiz, do MP e do arguido, sendo inviável se a instrução estiver encerrada ou a acusação já deduzida.
A suspensão provisória do inquérito ocorre quando, embora existam indícios suficientes da prática do crime, o MP decide não deduzir acusação, observadas as seguintes condições: crime punível com pena até 3 anos, delinquente primário, culpa diminuta, ausência de dolo, e concordância do arguido, do assistente e do Juiz de Instrução Criminal.
O artigo 281.º do CPP permite ao Ministério Público, em vez de deduzir acusação, optar pela suspensão provisória do processo, impondo ao arguido injunções e regras de conduta. Essas injunções, quando implicam limitações aos direitos do arguido, requerem a concordância do Juiz de Instrução Criminal. As regras de conduta previstas no artigo 281.º, n.º 2 do CPP, não são permanentes, sendo aplicáveis por um período máximo de dois anos. Durante este período, o processo fica suspenso, aguardando o cumprimento das obrigações impostas ao arguido.
Se o arguido não cumprir as injunções ou regras estabelecidas, o processo retoma ao ponto em que foi suspenso. Nesse caso, havendo indícios suficientes, o Ministério Público deve deduzir acusação e prosseguir com o processo. A suspensão provisória do processo é possível apenas em crimes públicos e semipúblicos, nunca em crimes particulares, pois nestes a decisão cabe ao assistente, que não possui poderes para propor a suspensão.
A Acusação no Processo Penal
No que concerne à acusação, esta é deduzida pelo Ministério Público com base em indícios que apontem para a prática do crime pelo arguido. Não é necessário ter certeza absoluta, mas sim uma razoável convicção de que os elementos recolhidos indicam a prática do crime, suficiente para justificar a submissão do arguido a julgamento. Mesmo em caso de dúvida, aplica-se o princípio da legalidade (artigo 283.º do CPP), e o Ministério Público deve acusar, cabendo ao julgamento avaliar as provas.
Os indícios são considerados suficientes quando o Ministério Público conclui que as provas já obtidas, juntamente com outras que possam surgir no decurso do processo, têm potencial para levar à aplicação de uma pena ou medida de segurança ao arguido.
A acusação deve conter a identificação do arguido, seguida pela narração dos factos que lhe são imputados, as disposições legais aplicáveis (sendo sua ausência uma nulidade) e a indicação das provas, incluindo a prova testemunhal. Finaliza-se com a data e a assinatura. Quando o Ministério Público determina que a pena a aplicar não deve exceder três anos de prisão, está, implicitamente, definindo a competência do tribunal singular para julgamento. A acusação é notificada ao arguido, ao assistente, se existente, e ao denunciante nos crimes públicos e semipúblicos (artigos 285.º, n.º 3, e 273.º, n.º 3 do CPP). Nos crimes particulares, quem deduz a acusação é o próprio assistente.
A notificação ao arguido equivale a uma citação, podendo ser feita diretamente no tribunal, se ele ainda não tiver sido constituído arguido, ou nos autos, caso já o seja. O assistente tem prerrogativas como interpor recurso ou requerer a abertura de instrução, mas para isso deve estar representado por um advogado. Após preencher os requisitos, o juiz admite o ofendido como assistente, conferindo-lhe a qualidade de sujeito processual. Nos crimes particulares, o indivíduo deve declarar que se constituirá assistente, o que permite o envio da queixa ao Ministério Público (artigo 246.º, n.º 4 do CPP).
Uma vez constituído como assistente, o Ministério Público inicia o inquérito e, ao término, cabe ao assistente apresentar a acusação ao tribunal, pois o Ministério Público já encerrou sua função investigativa. Assim, o objetivo da acusação, seja feita pelo assistente ou pelo Ministério Público, é submeter o arguido a julgamento, sendo sempre dirigida ao tribunal.
O JULGAMENTO
O julgamento é a fase processual em que os princípios jurídicos, como o contraditório, a publicidade e a verdade material, atingem sua maior intensidade. Ele exige uma acusação definitiva como condição para ocorrer, conforme regulado nos artigos 311.º a 380.º do CPP.
O princípio do contraditório é destacado no artigo 327.º do CPP, enquanto o princípio da publicidade é reforçado no artigo 321.º do CPP, sendo a violação deste uma nulidade insanável. O princípio da verdade material atribui ao juiz poderes para esclarecer fatos alegados no julgamento (artigo 340.º do CPP). Já o princípio da imediação tem sua máxima aplicação nessa fase (artigo 355.º do CPP).
As finalidades do julgamento incluem a determinação da sanção concreta (artigo 369.º do CPP). A direção cabe ao juiz presidente, que possui poderes específicos previstos nos artigos 311.º, 311.º-A, 312.º e 323.º do CPP, e atua na condução e imputação dos atos processuais (artigo 365.º do CPP). Dependendo do caso, o julgamento pode ocorrer em tribunais singulares, coletivos ou de júri (artigos 13.º a 16.º do CPP).
A dinâmica do julgamento divide-se em três momentos principais, que incluem a direção processual, a produção de provas e a decisão final.
O julgamento é dividido em três momentos principais:
Atos Preliminares e Audiência de Discussão e Julgamento
O momento dos atos preliminares, previsto nos artigos 311.º a 320.º do CPP, tem como finalidade preparar a audiência de discussão e julgamento e desdobra-se em quatro atos principais:
- O primeiro é o saneamento do processo, que envolve a verificação dos atos processuais e a análise formal da acusação pelo juiz para verificar se o processo pode prosseguir. Caso não haja impedimentos, o juiz profere despacho de recebimento da acusação.
- O segundo ato é o convite à contestação, em que o juiz convida o arguido a contestar, indicando as disposições legais aplicáveis e permitindo a correção de erros materiais evidentes. O juiz pode alterar a qualificação jurídica dos fatos desde que assegure a ampla defesa do arguido.
- O terceiro ato refere-se à contestação criminal, incluindo a apresentação do rol de testemunhas, que vincula o tribunal à sua audição. O prazo para contestação é peremptório, e sua inobservância não acarreta consequências processuais ou probatórias.
- Por fim, o quarto ato trata da marcação da audiência e das comunicações inerentes, que devem ocorrer no prazo de até dois meses, com prioridade sobre outros julgamentos e articulação com as agendas dos advogados.
Após os atos preliminares, segue-se o momento da audiência, que é probatório e contraditório, regulado pelos artigos 321.º a 364.º do CPP, e culmina na decisão final, a sentença, que está prevista nos artigos 365.º a 380.º do CPP e reflete a organização sistemática do Código de Processo Penal.
O momento solene do julgamento é a audiência de discussão e julgamento, caracterizada por ser o momento mais solene e contraditório, onde se produz toda a prova e se manifestam intensamente os princípios relativos à prova, sendo um momento probatório contraditório, nos termos do artigo 327.º do CPP. Nesse contexto, também se aplica o princípio da publicidade, que determina que todas as audiências em Portugal são públicas, admitindo-se algumas restrições conforme os artigos 321.º e 87.º do CPP. A audiência de julgamento desdobra-se em três tipos de atos:
- Os atos introdutórios, regulados pelos artigos 329.º a 339.º do CPP, que incluem o controlo das presenças e ausências das pessoas que devem participar, o saneamento do processo para verificar a regularidade da instância e as exposições introdutórias, que, embora prescindíveis, têm utilidade em processos complexos.
- Os atos de produção de prova, regulados pelos artigos 340.º a 357.º do CPP, são orientados por princípios como o da verdade material, que confere ao tribunal poderes de investigação oficiosa, e o da celeridade, que busca economia processual. A produção da prova segue uma ordem prevista no artigo 341.º do CPP, iniciando-se pelas declarações do arguido, que tem direito ao silêncio e à confissão, podendo esta ser integral ou parcial, com ou sem reservas, conforme o artigo 344.º do CPP. Havendo mais de um arguido, as declarações de um contra outro só têm valor probatório se submetidas ao contraditório, nos termos do artigo 345.º do CPP.
As declarações de outros intervenientes, como assistentes e partes civis, bem como o interrogatório e contrainterrogatório de testemunhas, seguem as disposições dos artigos 346.º a 348.º do CPP, sendo o princípio da imediação fundamental, pois determina que apenas as provas produzidas ou examinadas em audiência têm validade, com exceções previstas nos artigos 356.º e 357.º do CPP. Os atos finais da audiência, regulados pelos artigos 360.º e 361.º do CPP, incluem as alegações orais, onde são apresentadas as conclusões de fato e de direito das provas produzidas, e as últimas declarações do arguido, completando o procedimento da audiência.
A Sentença e o Procedimento Decisório
O julgamento em processo penal pode ser realizado por tribunal singular, tribunal coletivo ou tribunal de júri. Quando é o tribunal de júri, a sentença segue a forma de acórdão conforme o artigo 97.º, n.º 2 do CPP. No tribunal coletivo, como envolve várias pessoas na decisão, ocorre um procedimento decisório que inclui discussão, deliberação e votação. No tribunal singular, esse procedimento não se aplica. O mérito da ação implica a resposta a duas questões, uma obrigatória e outra eventual, conforme os artigos 339.º, n.º 4, 368.º e 369.º do CPP. A questão da culpabilidade, prevista no artigo 368.º do CPP, é obrigatória e não se confunde com culpa penal, exigindo a resposta às questões do n.º 2 desse artigo. Caso a resposta seja afirmativa, o tribunal deve decidir a questão da sanção, nos termos do artigo 369.º do CPP. A questão da sanção é eventual, pois só se coloca caso a culpabilidade seja confirmada. Nos tribunais coletivos, o procedimento decisório é dirigido pelo juiz presidente e conta com a participação de todos os juízes, enquanto no tribunal de júri há participação tanto dos juízes quanto do júri, que deliberam e votam sobre todas as questões, incluindo as de direito e de fato. Concluída a deliberação e votação, a sentença é elaborada e assinada por todos os membros do tribunal, conforme o artigo 372.º do CPP. Os requisitos da sentença, conforme o artigo 374.º do CPP, incluem o relatório, que delimita o objeto da decisão; a fundamentação, que é constitucionalmente exigida e deve indicar as provas que sustentam a decisão com um exame crítico das mesmas, explicando por que foram valorizadas para provar determinado fato; e o dispositivo, que é a parte decisória. Nas sentenças condenatórias, previstas no artigo 375.º do CPP, o tribunal deve justificar a pena concreta e reapreciar a situação do arguido. Nas sentenças absolutórias, previstas no artigo 376.º do CPP, ocorre a extinção de qualquer medida de coação.