Fernando Pessoa Ortónimo: Temas Centrais e Estilo Poético
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Dor de Pensar
Fernando Pessoa é um homem que vive e pensa simultaneamente. Pensando no que vive, conclui que a vida só vale a pena ser vivida quando vivida sem pensamento, uma vez que o próprio pensamento corrompe a inconsciência, inerente à felicidade de viver. De facto, mais feliz é aquele que vive na ignorância, alheio à realidade da vida, do que aquele que baseia a sua existência na lucidez.
Esta dor de pensar surge no poema “Ela Canta, Pobre Ceifeira”, mais concretamente nos versos: “Ah, poder ser tu, sendo eu! / Ter a tua alegre inconsciência, / E a consciência disso!”. No que toca à obsessão pela análise, o seu sofrimento advém da constante autoanálise, não se permitindo sentir a felicidade, restando-lhe o sofrimento, uma vez que não abdica do saber doloroso.
Em suma, tanto a dor de pensar como a obsessão pela análise são fatores que invadem a mente do poeta e o impedem de viver plenamente a vida. A extensão dos seus sentimentos é constantemente diminuída pela vastidão do seu pensamento e autoanálise. (Ex: “Ela Canta, Pobre Ceifeira”; “Gato que Brincas na Rua”)
Fragmentação do “Eu”
A fragmentação do “eu” de Fernando Pessoa resulta da constante procura de resposta para o enigma do ser, aliada à perda de identidade. Pessoa vê-se confrontado com a sua pluralidade, ou seja, com diferentes “eus”, sem saber quem é nem se realmente existe.
Contudo, a negação do “eu” como um todo leva-nos à forma como os heterónimos foram criados, o que demonstra a angústia da procura pelo desvendar da vida e da morte, da perfeição e da tristeza, da humanidade e da divindade, expressa, por exemplo, no verso de Álvaro de Campos: “Para poder nunca esgotar os meus desejos de identidade”. Por vezes, o próprio “eu” lírico contradiz-se, tentando entender o seu desajustamento, a exemplo no verso “Multipliquei-me, para me sentir”.
Pessoa viveu a aurora do tempo em que Deus estava morto, tendo encontrado a salvação na fragmentação, na vida inventada, em que cada um dos seus heterónimos exprime um novo modo de ser e uma visão própria do mundo. Pode dizer-se que Fernando Pessoa é o poeta do não ser imaginário, sendo a heteronímia a busca de outros sentidos para a vida.
Em suma, Pessoa apresenta um diálogo múltiplo e descentrado, sendo que a sua despersonalização se trata do desaparecimento do “eu” para fazer surgir a persona, isto é, a máscara. (Ex: “Hora Absurda”; “Chuva Oblíqua”)
Nostalgia da Infância
Uma das principais temáticas de Fernando Pessoa é a nostalgia da infância. O poeta procura recordar a sua primeira infância, mas não consegue lembrar mais que a vida após os cinco anos, data da morte do pai.
De facto, no poema “Pobre e Velha Música”, Pessoa imagina ter sido alguém diferente na infância, “outro”, não sabendo sequer se fora feliz: “E eu era feliz? Não sei: / Fui-o outrora agora”. Estas dicotomias, sempre presentes na sua obra, mostram a dualidade de pensamentos do poeta, a impossibilidade de se definir, desconhecendo esta infância fugaz.
Na realidade, este passado é como um refúgio para o presente, uma alegria na alma do poeta, ao tentar recordar esse tempo em que era “o menino da sua mãe”. No entanto, esta não passa de um sonho, memória perdida e remota, como o próprio refere no poema “Quando as Crianças Brincam”: “E toda aquela infância / Que não tive me vem, / (…) Que não foi de ninguém”.
Concluindo, a morte prematura do pai, aliada à morte do irmão, no ano seguinte, foram factos marcantes na vida de Pessoa, que não pôde aproveitar o passado nem voltar a vivê-lo, como procurou exaustivamente durante a sua existência e o demonstrou na poesia. (Ex: “Quando as Crianças Brincam”; “Menino da Sua Mãe”; “Não Sei, Ama, Onde Era”)
Fingimento Poético
O poeta sente a dor, finge-a e escreve-a, tornando-a num poema. Para Fernando Pessoa, um poema é produto intelectual, pois não resulta do “momento da emoção”, mas sim da recordação. Esta temática está presente em poemas como “Autopsicografia” e “Isto”.
Encontra-se em Pessoa ortónimo uma dualidade entre a sinceridade e o fingimento. O fingimento implica exprimir intelectualmente as emoções; no entanto, o poeta fingidor que exprime chega a identificar-se com a sua própria poesia. (Ex: “Autopsicografia”; “Isto”)
Características Temáticas
- Identidade perdida;
- Consciência do absurdo da existência;
- Tensão sinceridade/fingimento, consciência/inconsciência e sonho/realidade;
- Oposição sentir/pensar, pensamento/vontade, esperança/desilusão;
- Antissentimentalismo: intelectualização da emoção;
- Inquietação metafísica, dor de viver;
- Autoanálise.
Características Estilísticas
- Musicalidade: aliterações, transportes, ritmo, rimas, tom nasal (que conotam o prolongamento do sofrimento e da dor);
- Verso geralmente curto;
- Predomínio da quadra e da quintilha;
- Adjetivação expressiva;
- Linguagem simples mas muito expressiva (significados escondidos);
- Pontuação emotiva;
- Uso de símbolos;
- Fiel à tradição poética “lusitana” e não longe, muitas vezes, da quadra popular.