A Filosofia de Ortega: Razão Vital e Perspectiva
Classificado em Filosofia e Ética
Escrito em em português com um tamanho de 6,64 KB
1. O Sentido da Filosofia segundo Ortega y Gasset
Para Ortega y Gasset, a filosofia é vital; os seres humanos têm uma necessidade vital de compreender o universo e "tudo o que há". Mas a filosofia encontra-se atualmente num beco sem saída devido à oposição entre realismo e idealismo, uma dicotomia que precisa ser superada.
2. Crítica ao Realismo e ao Idealismo
Ortega critica o idealismo por considerar o sujeito como o eixo em torno do qual gira a realidade. E critica o realismo por considerar o sujeito apenas como uma mera parte da realidade. Ortega entende o sujeito como uma realidade que vive aqui e agora.
Para o realismo, a verdadeira realidade são as substâncias (coisas que existem em si mesmas e são independentes da minha mente), deixando a consciência ou o Eu em segundo plano. Não se pode admitir que o sujeito seja apenas uma simples parte da realidade. Para Ortega, o realismo não deu importância ao Eu e o diluiu no mundo exterior.
Para o idealismo, as coisas são como o "Eu" as concebe. Ortega critica-o porque vai contra a vida. Se tudo é pensado, então viver é sofrer uma ilusão ótica. O dilema entre realismo e idealismo é um falso dilema, pois existem coisas independentemente do meu pensamento (do Eu), mas também não existe um Eu sem coisas para pensar; o mundo não é apenas o Eu, nem apenas as coisas. Ortega encontra no "viver" uma síntese intermediária, que ultrapassa o realismo e o idealismo. O dado radical do universo é a vida, entendida como Eu-com-o-Mundo.
3. Razão Vital: O Raciovitalismo
O raciovitalismo, teoria do conhecimento que parte da VIDA, busca superar a oposição entre racionalismo e vitalismo. Para Ortega, não existe nem racionalismo puro nem vitalismo isolado, mas sim o raciovitalismo. É errado falar da razão como algo separado da vida. A razão raciovitalista é considerada uma função vital, que parte da vida e tenta compreendê-la.
O homem tem a necessidade de viver. A razão é algo que o homem teve de inventar para viver; é uma razão vital para o homem. A razão que explica a vida não se ocupa do que já foi feito, mas do que está por fazer (do fazer-se). Razão, vida e história estão ligadas. Não pode haver oposição entre razão e vida, portanto, a razão pura deve ceder a sua supremacia à razão vital. A nossa tarefa consiste em fundamentar a razão na vida, superando a razão pura.
Desde a filosofia grega, a razão tem sido considerada a única fonte de conhecimento, representando a verdadeira realidade. A razão tem sido entendida como o instrumento que captura a essência das coisas. Esta posição culmina com a razão matemática dos racionalistas do século XVII e a razão pura de Kant. Mas a razão "exata" (ou pura) é incapaz de captar a realidade em mutação. Então, em oposição ao racionalismo, surgiram correntes que valorizam a vida acima da razão. A razão vital refere-se à totalidade da minha vida. Isso leva a compreender o homem numa dimensão mais complexa que a da razão pura. Assim, em suas Meditações sobre Dom Quixote, Ortega faz a seguinte afirmação: "Eu sou eu e minha circunstância". Com esta fórmula, Ortega quer expressar a relação do eu com o mundo.
- Eu: Na filosofia de Ortega, a vida é individualizada; o homem tende ao seu Eu, a ser ele mesmo.
- E minha circunstância: Minha vida não sou apenas eu, mas toda a realidade que me rodeia. A circunstância é tudo aquilo que me é imposto e que eu não posso escolher. Assim, minha circunstância seria tudo o que me rodeia: os outros, costumes, ideias, crenças, etc.
A vida humana é projeto. Ortega entende a vida humana como um projeto, algo que o homem tem que inventar, é uma decisão permanente. Assim, a vida é projeto. O homem é realmente futuridade, uma tarefa contínua, um plano para o futuro, mas no presente. Vivemos construindo neste planejamento e antecipação do futuro, e este "projeto" é uma característica da razão humana. Se apenas estivéssemos vivendo no presente imediato, viveríamos instalados no aqui e agora, como os animais. Para Ortega, viver é decidir, e essa decisão nos diferencia. Eu e circunstância são os dois elementos básicos que compõem a vida. Para Ortega, o destino do homem é salvar-se (realizar-se) em sua circunstância. Viver é estar perdido entre as coisas. O homem deve salvar-se, isto é, ser ele mesmo.
4. Razão Histórica: O Historicismo
Esta posição raciovitalista é colocada num contexto mais amplo fornecido pela razão histórica. A razão vital é histórica. A vida humana é constitutiva da história; ela é devir (vir a ser). Portanto, para Ortega, "o homem não tem natureza, mas história". A história da vida humana é algo que se está fazendo.
O homem vive num tempo, e esse tempo deve ser abordado a partir da própria vida. A história converte nossos problemas em tarefas atuais e futuras a resolver. A história é o lugar adequado onde se inserem as circunstâncias humanas, a partir das quais começamos a desenvolver nossa própria vida.
5. Perspectivismo: A Doutrina do Ponto de Vista
Esta é a teoria que Ortega desenvolverá em sua obra. Ortega encontrará uma solução original no perspectivismo. O perspectivismo defende que não existe uma única perspectiva absoluta da realidade. Todo homem, toda vida é um ponto de vista. Conhecemos a realidade tal como ela se apresenta a cada um, a partir da perspectiva que lhe é oferecida. Existem tantas perspectivas quantos indivíduos.
As perspectivas são infinitas, e cada um observa a realidade do lugar que lhe coube viver. Assim, para Ortega, o conhecimento é "verdadeiro", mas não é uma verdade absoluta. Ninguém tem o direito de impor seu ponto de vista, mas deve complementá-lo com os dos outros. Eu ocupo um lugar no espaço e no tempo, e somente a partir daí conheço as coisas. E, assim como cada indivíduo conhece tudo em perspectiva, as comunidades e os povos também têm sua própria perspectiva espaço-temporal.
Portanto, nenhuma aldeia, comunidade ou nação pode absolutizar sua perspectiva, mas deve complementá-la e enriquecê-la com a dos outros povos. A possibilidade de alcançar uma soma de todas as perspectivas é viável. Mas Ortega especula sobre um sujeito que poderia realizar essa soma: Deus. Deus, enquanto ponto de vista que abarca todos os outros, representaria a soma de todas as perspectivas. A perspectiva divina seria, assim, a única verdade completa, constituída pela totalidade das perspectivas individuais e históricas.