Filosofia de Santo Agostinho: Deus, Fé e Razão

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O Pensamento de Santo Agostinho

A Prova da Existência de Deus

Santo Agostinho de Hipona (Séculos IV - V) parte da existência de certas verdades absolutas presentes na mente humana para provar a existência de Deus. Estas são chamadas de "verdades eternas" ou "razões eternas", que não provêm da experiência sensível, pois são mais perfeitas que o próprio homem, sendo atemporais e universais.

A conclusão de Santo Agostinho é que a origem de tais verdades é Deus: se essas verdades eternas não vêm da mente humana, devem ter sua origem num ser superior à mente, igualmente eterno e perfeito. Esse ser é Deus.

Assim, Agostinho demonstra a existência de Deus a partir do próprio pensamento. O mesmo princípio se aplica à prova de Santo Anselmo de Cantuária (1033-1109). Contudo, as provas de caráter aristotélico, como as de São Tomás de Aquino, partem sempre da experiência sensível.

A prova da existência de Deus em Santo Agostinho está ligada à teoria da Iluminação. De fato, para Santo Agostinho, vivemos em Deus e Nele conhecemos as verdades eternas. Portanto, o Deus de Santo Agostinho é simultaneamente imanente e transcendente ao mundo:

  • Imanente: porque Nele vivemos.
  • Transcendente: ao mundo, para salvaguardar o dogma cristão.

Para Santo Agostinho, em Deus residem as formas, ideias ou razões eternas (semelhantes às Ideias platônicas), que servem como modelos para a obra criadora divina. Podemos compreender essas ideias ou razões através da iluminação divina, pois, como mencionado, Deus é imanente.

O Problema da Relação entre Fé e Razão

A frase de Santo Anselmo de Cantuária, credo ut intelligam (creio para entender), resume a posição clássica da primeira Escolástica sobre o problema da relação entre fé e razão. Esta formulação, que confere clara primazia à fé sobre a razão, é matizada por outras abordagens onde o conhecimento surge como preparação ou busca pela fé. Santo Agostinho, inicialmente, inclinou-se para essa posição, mas, por fim, defendeu a complementaridade na relação entre fé e razão. Essa complementaridade ou cooperação é definida pela expressão dupla: intellego ut credas (compreendo para crer) e credo ut intelligas (creio para compreender):

  • A razão ajuda a fé a formular suas doutrinas de modo racional e a torná-las credíveis para adeptos de outras crenças.
  • Por sua vez, a fé auxilia a razão ao promover uma transformação moral no homem. Ou seja, à luz da fé, o mundo parece diferente, nossas perguntas mudam e nossas respostas se tornam distintas.

Essa complementaridade entre fé e razão já estava sugerida no pensamento de Platão: à luz da Ideia do Bem, a razão pode ser transformada e alcançar um conhecimento para o qual, sozinha, não era suficiente.

Antropologia Agostiniana

Para Santo Agostinho, Deus é o fim último do homem; o ser humano tende para Ele (assim como para o Bem platônico, o fim de toda a realidade). Daí a inquietude radical que caracteriza o ser humano: nada nos satisfaz plenamente, estamos sempre buscando, em movimento, porque nosso destino último é a união com Deus.

Esta seria uma segunda via para provar a existência de Deus. O homem não se satisfaz com as coisas deste mundo porque intui e tende para uma realidade mais perfeita, que não pode ser meramente experimentada pelos sentidos. Portanto, Deus existe, e temos um conhecimento prévio de Sua existência.

Esta prova assemelha-se à teoria platônica da reminiscência (conhecer é recordar). Contudo, Santo Agostinho rejeita a teoria da reminiscência de Platão, pois ela contraria a crença cristã numa única vida para a alma (o Cristianismo nega a reencarnação ou a transmigração das almas).

Cosmologia Agostiniana

Segundo Santo Agostinho, Deus é a causa do mundo e o cria a partir do nada (ex nihilo). Contudo, não podemos considerar Santo Agostinho um fixista no sentido moderno. Ele sustentava que Deus não criou todas as coisas de forma definitiva e estática desde o início. Deus teria criado, inicialmente, as razões seminais (rationes seminales), como sementes de vida, que se desenvolveriam ao longo do tempo, resultando nos diferentes seres que conhecemos hoje. Isso sugere uma forma de desenvolvimento ou evolução imanente à criação.

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