Fundamentos da Metodologia Científica e Planos de Investigação

Classificado em Psicologia e Sociologia

Escrito em em português com um tamanho de 15,67 KB

1. Características da Ciência

A ciência é definida por critérios rigorosos que garantem a validade e a replicabilidade do conhecimento:

  • Causalidade Finita: Investiga causas que podem ser medidas e observadas empiricamente.
  • Caráter Público e Aberto: Os resultados são compartilhados abertamente para crítica, validação e replicação pela comunidade científica.
  • Objetividade: Busca a minimização de subjetividades no processo investigativo.
  • Relação de Implicação-Distanciação:
    • Implicação: A ciência está conectada à sociedade e aos seus problemas.
    • Distanciação: Mantém o rigor metodológico e a neutralidade na análise dos dados.

2. Funções da Ciência

  • Explicativa: Compreende causas e efeitos, permitindo a previsão de fenômenos.
    Exemplo: A teoria da gravitação explica por que objetos caem.
  • Descritiva: Caracteriza e mapeia fenômenos.
    Exemplo: Relatar taxas de desemprego em diferentes regiões.
  • Aplicativa: Resolve problemas práticos e concretos.
    Exemplo: Uso de vacinas para combater epidemias.

3. Funções da Teoria Científica

A teoria científica desempenha papéis cruciais na organização do conhecimento:

  • Descrição: Organiza e resume informações complexas.
  • Explicação: Relaciona fenômenos para identificar causas subjacentes.
  • Predição: Antecipa eventos futuros com base em padrões estabelecidos.
  • Controle: Proporciona intervenções eficazes baseadas no conhecimento adquirido.

4. Critérios de Apreciação de uma Teoria

A qualidade de uma teoria é avaliada pelos seguintes critérios:

  • Parcimônia: Simplicidade; utiliza o menor número de hipóteses para explicar o maior número de fenômenos.
  • Precisão: Define conceitos e relações de forma clara e inequívoca.
  • Testabilidade (Falsificabilidade): As hipóteses devem ser passíveis de serem testadas e refutadas.
  • Relevância: Aplica-se a múltiplos contextos e problemas significativos.
  • Produtividade: Estimula novas investigações e descobertas.

Investigação Básica vs. Investigação Aplicada

  • Investigação Básica: Busca ampliar o conhecimento teórico fundamental.
    Exemplo: Estudo da evolução genética.
  • Investigação Aplicada: Resolve problemas concretos e imediatos.
    Exemplo: Desenvolvimento de novos medicamentos.

5. Processo de Investigação Científica

Modelo Clássico

  1. Identificação do problema.
  2. Revisão da literatura existente.
  3. Formulação de hipóteses.
  4. Planeamento (design experimental ou não experimental).
  5. Recolha de dados.
  6. Análise e interpretação dos resultados.

Circularidade e Evolução

  • O processo de investigação é dinâmico e ajusta-se com a obtenção de novos dados e descobertas.

Planos, Variáveis e Análise Estatística

1. Tipos de Problemas de Investigação

  • Descritivos: Caracterizam fenômenos.
    Exemplo: Qual é a taxa de alfabetização em jovens de 15 anos?
  • Diferenciais: Comparam grupos.
    Exemplo: Diferença de desempenho entre homens e mulheres.
  • Relacionais: Avaliam a relação entre variáveis.
    Exemplo: Nível de exercício físico e saúde mental.

2. Variáveis

  • Independente (VI): Variável manipulada ou controlada (Causa).
  • Dependente (VD): Variável medida (Efeito).
  • Parasitas (ou Estranhas): Variáveis que influenciam o resultado e que necessitam de controlo.
    Exemplo: Idade em um estudo sobre desempenho físico.

3. Tipos de Planos Experimentais

  • Simples (A-B-A): Observação inicial (A), intervenção (B), retorno ao estado inicial (A).
  • Ex-post Facto: Análise realizada após o fato, sem manipulação da variável independente pelo investigador.
  • Quase-experimental: Há manipulação da variável independente, mas falta a randomização completa dos participantes.

4. Escalas de Medição (Dados Estatísticos)

  • Nominais: Categorias sem ordem (e.g., gênero, estado civil).
  • Ordinais: Categorias com ordem, mas sem distâncias fixas entre elas (e.g., rankings, nível de satisfação).
  • Intervalares: Distâncias iguais, mas sem um zero absoluto (e.g., temperatura em Celsius).
  • Racionais (Razão): Distâncias iguais, com um zero absoluto (e.g., peso, altura, tempo).

5. Escalas de Atitude

  • Escala de Likert: Mede atitudes ou opiniões (e.g., Concordo Totalmente – Discordo Totalmente).
  • Escala Semântica Diferencial: Polariza conceitos usando adjetivos opostos (e.g., Bom ↔ Ruim).

6. Métodos de Recolha de Dados

  • Questionários: Recolha de dados estruturados em larga escala.
  • Entrevistas: Obtenção de informações profundas e qualitativas.
  • Análise Documental: Uso de fontes secundárias e registros existentes.

7. Planos Transversais e Longitudinais

  • Transversais: Analisam dados em um único momento no tempo.
  • Longitudinais: Acompanham os mesmos sujeitos ou fenômenos ao longo do tempo.

8. Correlação vs. Causalidade

  • Correlação: Indica uma associação ou covariância entre variáveis, mas não prova causalidade.
  • Causalidade (Relação): Envolve um vínculo causal comprovado, onde a manipulação de uma variável leva à alteração da outra.

9. Postulados da Ciência Pós-Moderna

  • Aceitação da pluralidade de métodos (qualitativos e quantitativos).
  • Integração de contextos sociais e históricos na investigação.
  • Valorização da interdisciplinaridade.
TermoExemplo
Variável DependenteDesempenho cognitivo
Variável IndependenteHoras de estudo
Ex-post FactoEstudo sobre dieta e histórico de saúde
A-B-AObservação inicial → Intervenção → Retorno
ParcimôniaExplicação simples para muitos fenômenos

Simbologia em Planos Experimentais

SímboloSignificado
OObservação ou medição de uma variável dependente.
XIntervenção ou manipulação da variável independente.
Linha HorizontalRepresenta um grupo ou condição no experimento.
Coluna VerticalRepresenta um momento no tempo (antes, durante ou após a intervenção).

Exemplo de Diagrama Simples:

  • Grupo Experimental: O₁ — X — O₂
    • O₁: Observação inicial.
    • X: Intervenção aplicada.
    • O₂: Observação final (pós-intervenção).
  • Grupo de Controlo: O₁ — — O₂
    • Não recebe intervenção (linha com espaço).

Tipos de Investigação e Controlo

Experimental
Manipulação de variáveis, controlo rigoroso de condições e randomização. (Exemplo: Testar a eficácia de um medicamento com grupos aleatórios.)
Quase-Experimental
Manipulação da variável independente sem randomização completa. (Exemplo: Comparar o desempenho de duas escolas após a introdução de uma nova metodologia de ensino.)
Não Experimental
Observação e análise de variáveis sem manipulação. (Exemplo: Analisar a relação entre consumo de mídia e crenças políticas em uma amostra populacional.)
Ex-Post Facto
Variáveis são analisadas após o evento ter ocorrido. (Exemplo: Estudo sobre o impacto de dieta vegetariana na saúde com base em registos médicos antigos.)

Tipos de Hipótese

Direcional
Prevê o sentido e a natureza da relação entre as variáveis. (Exemplo: "X leva a Y" ou "X aumenta Y".)
Não Direcional
Indica que existe uma relação, mas não prevê o seu sentido. (Exemplo: "Existe uma relação entre X e Y".)
MétodoDescrição
QuestionáriosObtenção de respostas padronizadas em larga escala.
EntrevistasColeta de informações detalhadas e qualitativas.
Análise DocumentalUso de registos existentes como fonte de dados.

Postulados da Ciência Pós-Moderna (Detalhe)

PostuladoDescrição
Pluralidade de MétodosCombinação de métodos qualitativos e quantitativos.
InterdisciplinaridadeIntegração de conhecimentos de diferentes áreas.
ContextualidadeReconhecimento do papel do contexto social e histórico na investigação.

Exercícios Práticos de Metodologia

Exercício 1: Leitura com Ilustrações

Situação: Investigação para testar a hipótese de que as pessoas levam menos tempo a ler um artigo jornalístico com ilustrações do que o mesmo artigo sem ilustrações.

a) Variável Independente: Presença de ilustrações no artigo.

b) Variável Dependente: Tempo de leitura do artigo.

c) Categoria da Hipótese: Hipótese diferencial (compara dois grupos: com ilustrações e sem ilustrações).


Exercício 2: Reforço Positivo em Sala de Aula

Situação: Um investigador pretende testar a hipótese de que o uso do reforço positivo é vantajoso na redução de comportamentos indesejáveis na sala de aula.

a) Formule o problema de investigação: Como o reforço positivo afeta os comportamentos indesejáveis na sala de aula?

b) Identifique as variáveis:

  • Variável Independente: Uso do reforço positivo.
  • Variável Dependente: Redução de comportamentos indesejáveis.

Exercício 3: Métodos de Escolha de Fontes

Situação: "Comparar a eficácia de dois métodos de escolha de fontes jornalísticas."

a) Como transformar esta ideia numa questão específica? Comparar a eficácia do método A com o método B na escolha de fontes jornalísticas para verificar qual deles resulta em fontes mais confiáveis e diversificadas.

b) Qual termo necessita de definição operacional? "Eficácia" precisa ser definido. Pode ser operacionalizado como o número de fontes confiáveis selecionadas ou a diversidade de fontes.


Exercício 4: Classe Social e Criação de Filhos

Situação: A classe social dos pais influencia a criação dos filhos?

a) Identifique as variáveis:

  • Variável Independente: Classe social dos pais.
  • Variável Dependente: Métodos de criação dos filhos.

b) Justifique a escolha das variáveis: A variável dependente ("criação dos filhos") é mais genérica e abrangente do que, por exemplo, "momento do desmame", permitindo analisar comportamentos como disciplina, educação, entre outros.


Exercício 5: Bebé de 2,5 anos (Plano A-B-A)

Situação:

  • Sujeito: Um bebé de 2,5 anos.
  • Variável Dependente: Birras.
  • Variável Independente: Atitude dos pais quando o bebé é contrariado.

a) Descreva uma série temporal do tipo A-B-A:

  1. Fase A (Linha de Base): Observar e registar a frequência de birras sem qualquer intervenção dos pais.
  2. Fase B (Intervenção): Orientar os pais a ignorarem consistentemente as birras durante um período de tempo.
  3. Fase A (Retorno à Linha de Base): Retomar a atitude habitual dos pais e medir novamente a frequência de birras.

b) Avaliação da praticabilidade (Questões Éticas e Metodológicas):

  • A consistência do comportamento dos pais pode variar, afetando a validade do plano.
  • Aspectos éticos: Ignorar birras pode causar desconforto emocional no bebé.
  • Dificuldade em controlar variáveis externas, como o ambiente familiar ou o estado de saúde do bebé.

Exercício 6: Experiência com Ratos (Miller e Dicara, 1968)

Texto: Miller e Dicara (1968) investigaram a possibilidade de controlar respostas do sistema nervoso autónomo. Dois grupos de ratos foram submetidos a estímulos cerebrais para aumentar ou diminuir a secreção urinária.

a) Variável Dependente: Secreção urinária.

b) Formule a hipótese: O treino cerebral pode controlar a secreção urinária, aumentando ou diminuindo conforme os estímulos aplicados.

c) Plano utilizado: Experimento clássico com dois grupos (experimental e de controlo).

d) Como foi medida a performance? Quantidade de urina secretada antes e depois do treino.

e) Conceito metodológico correspondente: Definição operacional da variável dependente (secreção urinária).

f) Plano para estudar um rato particular: Plano de caso único com análise de séries temporais (A-B-A).


Exercício 7: Amostra Aleatória

Situação: Uma população de 18 pais com anos de escolaridade conhecidos. Selecione uma amostra aleatória de 6 pais.

Solução:

  1. Numere os 18 pais (1 a 18).
  2. Use uma tabela de números aleatórios para selecionar 6 números distintos entre 1 e 18.
  3. Verifique se a amostra representa proporcionalmente a distribuição dos anos de escolaridade da população (amostragem estratificada, se necessário).

Entradas relacionadas: