Guia Completo de Medicina Legal: Laudos, Óbitos e Identificação

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Medicina Legal

Elementos do Laudo Pericial

O laudo pericial é um documento fundamental na medicina legal, composto por:

  1. Preâmbulo: local, data e horário da realização do exame pericial, autoridade requisitante, nome e qualificação dos peritos e identificação do periciando;
  2. Quesitos: a enunciação dos quesitos de praxe e/ou os formulados pelo requisitante ou pelas partes até a data da realização do exame;
  3. Histórico: breve relato das circunstâncias e do fato em si. Os peritos podem realizar diligências ou solicitar os esclarecimentos que julgam necessários;
  4. Descrição: relato objetivo do que foi observado;
  5. Discussão ou Comentários;
  6. Conclusão;
  7. Resposta aos quesitos;
  8. Ilustrações;
  9. Contraprova.

Quando a infração deixar vestígios, será indispensável o exame de corpo de delito (conjunto dos vestígios deixados pelo ato criminoso), podendo ser direto (quando as infrações legais deixam vestígios) ou indireto (quando as infrações legais não deixam vestígios), não podendo supri-lo a confissão do acusado.

Os relatórios, prontuários hospitalares e declarações de outros médicos não podem ser considerados laudos para efeito pericial, sendo, imperiosamente, necessário o exame do paciente (exame direto).

Médico plantonista de emergência hospitalar não pode e não deve realizar exame de corpo de delito em paciente por ele assistido. Tal incumbência deve ser reservada a médicos-legistas oficiais ou, inexistindo esses, a médicos indicados pelo delegado de polícia.

Documentos Médico-Legais

Informações de conteúdo médico com interesse judicial, apresentadas geralmente por escrito e emitidas por médicos habilitados a partir de exames médicos, visando o esclarecimento de questão judicial. Podem ser:

  1. Notificação: comunicação obrigatória de fato médico;
  2. Atestado: declaração de consequência de fato médico que exige providências;
  3. Relatório: compromisso prévio, formalidade, minucioso, esclarece fato. Pode ser laudo (escrito de próprio punho) ou auto (ditado a escrivão);
  4. Consulta: esclarecimento de dúvida ou omissão;
  5. Parecer: opinião pessoal, vale pelo prestígio de quem o escreve;
  6. Depoimento Oral: informação de viva voz, perante autoridade.

Declaração de Óbito (DO)

Função da Declaração de Óbito

Estabelecer a situação de saúde da população e a elaboração de condutas de prevenção. Os registros das causas da morte são usados para:

  1. Monitorar índices de morbidade e mortalidade da população;
  2. Planejar políticas de saúde;
  3. Implementar e monitorar estratégias de saúde pública;
  4. Fornecer a base de mudanças legislativas;
  5. Priorizar despesas com a saúde;
  6. Financiar pesquisas e trabalhos científicos.

A DO é emitida em três vias:

  1. 1ª via: Unidade notificadora (processamento de dados);
  2. 2ª via: Família (cartório, onde será emitida a certidão de óbito);
  3. 3ª via: Unidade notificadora (documentação do falecido).

Quando Emitir a DO

  1. Em todos os óbitos (naturais ou violentos);
  2. Criança nascida viva, independente do tempo de gestação, do peso e do tempo que tenha permanecido vivo;
  3. Óbito fetal com gestação igual ou superior a 20 semanas, feto com peso igual ou superior a 500g ou estatura igual ou superior a 25 cm.

Quando NÃO Emitir a DO

  1. Óbito fetal com gestação inferior a 20 semanas, peso inferior a 500g ou estatura inferior a 25 cm;
  2. Peças anatômicas amputadas (fazer relatório em papel timbrado do hospital, encaminhado ao cemitério).

Eventos de Morte

  1. Morte Não Violenta e de Causa Definida: Não há necessidade de autópsia, a DO pode ser emitida pelo próprio médico assistente.
  2. Morte Não Violenta, Porém Sem Causa Definida: Encaminhar para o SVO (Serviço de Verificação de Óbitos), sendo o médico anatomopatologista o responsável pela definição da causa e emissão da DO.
  3. Morte Violenta: Encaminhar para o IML (Instituto Médico Legal), onde o médico legista define o óbito e emite a DO.

Óbito por causa natural é aquele cuja causa básica é uma doença ou estado mórbido.

Itens da Declaração de Óbito

  • I. Exclusiva do Cartório;
  • II. Identificação do Falecido;
  • III. Residência;
  • IV. Local de Ocorrência do Óbito;
  • V. Específico para óbitos Neo e Perinatais (óbitos fetais e de menores de um ano);
  • VI. Condições e Causas de Óbito;
  • VII. Dados do Médico;
  • VIII. Causas Externas;
  • IX. Quando o registro do óbito é feito por não-médicos.

Certidão de Óbito

Também conhecida como Certificado de Óbito, é o documento emitido pelos Cartórios, utilizando os dados constantes na Declaração de Óbito.

Causas de Morte

  1. Causa Básica da Morte: Doença ou afecção que iniciou a cadeia de acontecimentos patológicos que conduziram diretamente à morte; ou as circunstâncias do acidente ou violência que produziu a lesão fatal.
  2. Causa Imediata da Morte: Lesão ou complicação que ocorreu próximo ao momento da morte (afecção mais recente), desencadeada pela Causa Básica da Morte (afecção mais antiga).
  3. Causa Intermediária da Morte: Lesão ou complicação que ocorreu em algum momento entre a causa básica e a causa imediata da morte.

A causa básica da morte, a causa intermediária da morte e a causa imediata da morte guardam entre si uma relação de causa e efeito.

Tanatologia Forense

Morte

Não é a ausência de vida, mas sua interrupção definitiva. A morte representa a parada total e irreversível das atividades encefálicas, com base em critérios clínicos e laboratoriais.

Critérios Diagnósticos de Morte (Critérios Tradicionais)

  1. Nenhuma respiração espontânea por 60 minutos;
  2. Nenhuma respiração reflexa e nenhuma alteração no ritmo cardíaco por pressão ocular ou do seio carotídeo;
  3. Eletroencefalograma isoelétrico por 60 minutos;
  4. Dados laboratoriais básicos.

Interessa para o diagnóstico de morte encefálica, exclusivamente a arreatividade supraespinal (ausência total de atividade do tronco cerebral): pupilas paralíticas, ausência de reflexo córneo-palpebral e ausência de reflexos oculovestibulares.

Não afasta este diagnóstico a presença de sinais de reatividade infraespinal (atividade reflexa medular) tais como: reflexos osteotendinosos ("reflexos profundos"), cutâneo-abdominais; cutâneos plantar em flexão ou extensão; cremastérico superficial ou profundo; ereção peniana reflexa; arrepio; reflexos flexores de retirada dos membros inferiores ou superiores; reflexo tônico cervical.

Classificação da Morte

Quanto à Reversibilidade
  1. Morte Aparente ou Relativa: Estados patológicos que simulam a morte como inconsciência, batimentos cardíacos imperceptíveis, movimentos respiratórios imperceptíveis ou ausentes (coma epiléptico, catalepsia, estados sincopais).
  2. Morte Intermediária: Ocorre reaparecimento de alguns sinais vitais depois de manobras de reanimação, podendo haver vida artificial por algum tempo.
  3. Morte Real: Ausência definitiva das funções biológicas: constatação da parada das funções, tanto cerebrais quanto cardíacas e respiratórias.
Quanto à Causa Jurídica
  1. Morte Natural: estado mórbido adquirido ou perturbação congênita;
  2. Morte Violenta: causas externas de instalação abrupta (Acidental, Criminosa, Voluntária);
  3. Morte Suspeita: indícios de violência.
Quanto ao Processamento
  1. Morte Súbita: inesperada e imprevisível;
  2. Morte Agônica: evolução de doença grave ou estado pós-traumático, de acordo com o prognóstico, sendo previsível e esperada.

Cronotanatognose

Métodos utilizados para estimar o tempo de morte.

Classificação dos Fenômenos Cadavéricos

Fenômenos Imediatos

  1. Inconsciência e insensibilidade;
  2. Imobilidade e abolição do tônus dos esfíncteres;
  3. Parada da respiração/apneia;
  4. Parada da circulação.

Fenômenos Consecutivos

  1. Desidratação;
  2. Algor mortis (queda da temperatura: 0,5°C/h nas primeiras 3h; 1°C/h da 4ª à 12ª hora; 0,5 a 0,7°C/h da 13ª a 24ª hora);
  3. Rigor mortis;
  4. Hipóstase ou livor (descoloração de uma região do corpo causada por acúmulo de sangue).

Fenômenos Tardios (Transformadores) Destrutivos

  1. Autólise: anóxia celular acidifica o pH, rompendo as membranas celulares e desintegrando as células;
  2. Putrefação: prosseguimento da autólise pela ação de microrganismos e suas toxinas;
  3. Maceração: fetos mortos intrauterino, ou seja, cavidade asséptica.
Maceração: Estimativa de Óbito Fetal (Natimorto)
  1. Grau 0: bolhas esparsas pela pele – até 8 horas;
  2. Grau 1: descolamento da epiderme – entre 8 e 24 horas;
  3. Grau 2: grandes áreas de descolamento da pele e presença de derrame cavitário serossanguinolento – mais de 24 horas;
  4. Grau 3: derrames cavitários se tornam turvos e o fígado assume uma coloração amarelo-amarronzada – cerca de 48 horas.

Fenômenos Tardios (Transformadores) Conservadores

(Por falta de ação bacteriana, a autólise não avança e não gera estado putrefato, havendo processo de conservação)

  1. Mumificação (desidratação intensa / saponificação);
  2. Corificação;
  3. Fossilização / Congelamento.

Estimativa de Óbito

2 Horas

  1. Opacificação da córnea;
  2. Temperatura retal: 36,5°C;
  3. Semirrigidez de mandíbula e nuca;
  4. Aparecimento de livores no pescoço.

3 Horas

  1. Esfriamento das mãos, pés e face;
  2. Temperatura retal: 36°C;
  3. Rigidez de mandíbula e nuca;
  4. Confluência de livores no pescoço.

4 Horas

  1. Esfriamento geral da pele;
  2. Temperatura retal: 35,5°C;
  3. Início de rigidez nos membros superiores;
  4. Livores bem nítidos.

6 Horas

  1. Temperatura retal: 34°C;
  2. Rigidez total dos membros superiores e parcial dos membros inferiores.

6-8 Horas

  1. Temperatura retal: 32°C;
  2. Rigidez generalizada.

14 Horas

  1. Mancha verde na fossa ilíaca direita;
  2. Livores com máxima extensão e intensidade.

18-24 Horas

  1. Mancha verde abdominal;
  2. Hemoconcentração no coração.

36-48 Horas

  1. Início do desaparecimento da rigidez;
  2. Desaparecimento do líquido cefalorraquidiano.

3 Dias

  1. Desaparecimento da rigidez;
  2. Cristais de Westenhöefer-Rocha-Valverde.

Antropologia Forense

Identidade

Conjunto de características físicas, funcionais e psíquicas permanentes que individualizam a pessoa ou coisa, diferenciando-a das demais. São elementos individuais, positivos e estáveis, originários ou adquiridos, próprios de cada indivíduo que permitem a caracterização individual.

Identificação

Conjunto de técnicas, métodos e sistemas, ou seja, o processo pelo qual, utilizando-se de meios adequados, se obtém a identidade de alguém.

Reconhecimento

É também um processo de identificação, todavia sem técnica de base científica, apenas utilizando-se da comparação empírica, resumindo-se a simplesmente descrever as características mais evidentes de uma pessoa.

Métodos de Identificação

Processos de identificação são sempre comparativos. Os processos de identificação podem efetivar-se no vivo, morto ou no esqueleto.

  • Médicos: através de técnicas médicas e auxiliares, busca a identidade biológica.
  • Não-Médicos: através de técnicas policiais, busca a identidade civil.

Ângulo Facial

  1. Ortognata (Caucasianos, indianos);
  2. Mesognata (Mongólicos);
  3. Prognata (negros, australoides).

Forma do Crânio

Dolicocéfalos (Negróide); Mesaticéfalos (Caucasiano); Braquicéfalos (Mongólico).

Capacidade Cúbica do Crânio

Brancos > Amarelos > Indianos > Negros.

Índice Nasal

Leptorrino (menor – Negróide); Mesorrino (Caucasianos); Mongólico (maior – Platirrino).

Prognatismo Racial

Ortognatismo (caucasoides); Prognatismo mandibular (negroides); Prognatismo maxilar ou facial (mongoloides).

Crânio Masculino

  1. Glabela e arcos superciliares salientes;
  2. Articulação fronto-nasal angulosa;
  3. Rebordos supraorbitários rombos;
  4. Crânio mais pesado;
  5. Côndilos occipitais longos e estreitos.

Crânio Feminino

  1. Glabela não saliente; continuação do perfil fronto-nasal;
  2. Articulação fronto-nasal curva;
  3. Rebordos supraorbitários cortantes;
  4. Crânio mais leve;
  5. Côndilos occipitais curtos e largos.

Dentes

A fórmula 16/16 corresponde a mais de 18 anos; 14/14 entre 14 e 18 anos e 12/12 menos de 14 anos.

Impressões Digitais

As impressões digitais possuem as seguintes características:

  1. Perenidade: duram sempre, instalam-se na vida intrauterina e se mantêm até certo tempo após a morte do indivíduo;
  2. Imutabilidade: os desenhos digitais não mudam durante toda a vida do indivíduo;
  3. Unicidade (individualidade): estes desenhos são exclusivos de cada indivíduo, não existem dois iguais;
  4. Praticidade: as impressões são de fácil obtenção, não requerendo procedimentos complexos;
  5. Classificação: fácil classificação permitindo rápido acesso ao que se deseja.

Estrutura da Impressão Digital

A impressão digital é formada por:

  1. Cristas papilares (linhas pretas);
  2. Sulcos papilares (linhas brancas);
  3. Sistema Marginal (ápice da polpa);
  4. Sistema Basilar (base da polpa);
  5. Sistema Nuclear (meio da polpa);
  6. Delta (formado no ponto de encontro dos sistemas basilar, nuclear e marginal).

Tipos de Impressões Digitais: Arco

É formado por linhas curvas que vão de um lado a outro do dedo, não possui delta. Representa-se pela letra A ou pelo número 1.

Tipos de Impressões Digitais: Presilha Interna

É formada por linhas que partem da esquerda do observador, vão até o centro, fazem uma curva e retornam ao mesmo lado. Formam o delta à direita do observador. Representa-se pela letra I ou pelo número 2.

Tipos de Impressões Digitais: Presilha Externa

É formada por linhas que partem da direita indo até o centro e retornando ao mesmo lado. Forma o delta à esquerda do observador. Representa-se pela letra E ou pelo número 3.

Tipos de Impressões Digitais: Verticilo

Formado por uma série de círculos concêntricos, apresentando dois deltas, um à direita e outro à esquerda. Representa-se pela letra V ou pelo número 4.

Classificação Dactiloscópica

Utiliza-se o NUMERADOR ou Série (dedos da mão direita) e o DENOMINADOR ou Secção (dedos da mão esquerda). Sendo o Polegar representado por uma letra (V, E, I, A) e o Indicador, anular, médio e mínimo representados por números (1, 2, 3, 4). Quando ocorre a falta de um dedo, representa-se por 0. Quando o desenho não permite a identificação, pela letra X.

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