h2 A Revolução dos Cravos e a Transição para a Democracia em Portugal

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A Revolução dos Cravos e a Transição para a Democracia em Portugal

O MFA e a Eclosão da Revolução:

Os primeiros anos da década de 70 foram marcados por descontentamento perante o governo de Marcello Caetano, a guerra colonial, a crise do petróleo e a condenação internacional da ditadura.

Neste contexto, o Movimento dos Capitães transformou-se no Movimento das Forças Armadas (MFA), que, inicialmente por motivos de carreira, percebeu que podia mudar o regime através de um golpe militar, restaurando as liberdades cívicas e resolvendo o problema colonial. Assim, ocorreu a Revolução dos Cravos em 25 de Abril de 1974.

A operação foi coordenada pelo major Otelo Saraiva de Carvalho, Vasco Lourenço e Vítor Alves. As unidades militares ocuparam as estações de rádio, a RTP, controlaram o aeroporto e os quartéis-generais, e cercaram os ministérios militares.

Salgueiro Maia dirigiu o cerco ao Quartel do Carmo, onde Marcello Caetano se rendeu ao general Spínola após 18 horas de resistência. No final do dia, o MFA sagrou-se vitorioso, restando apenas a resistência da polícia política, que se rendeu na manhã seguinte.

O Caminho da Democracia

Entre 25/04/74 e a institucionalização de um regime democrático pluralista em 1976, o país viveu tempos de grande instabilidade política.


1. Desmantelamento das Estruturas do Estado Novo

No dia da Revolução, Portugal ficou sob a autoridade de uma Junta de Salvação Nacional, constituída por acordo entre o MFA e a hierarquia das Forças Armadas. A Junta tomou medidas para liberalizar a política partidária e desmantelar o regime deposto, com os objetivos de “Democratizar, Descolonizar, Desenvolver”:

  • Destituição das autoridades do Estado Novo. Américo Tomás e Marcello Caetano partiram para o exílio no Brasil;
  • Extinção da PIDE/DGS, Legião Portuguesa, Organizações de Juventude, Censura e Acção Nacional;
  • Amnistia e libertação dos presos políticos e regresso dos exilados;
  • Autorização da formação de partidos políticos e sindicatos livres, legalizando organizações clandestinas como a central sindical Unitária e o Partido Comunista Português;
  • Descolonização, nova política económica e social de defesa dos trabalhadores contra os grupos monopolistas.

O MFA comprometeu-se a passar o poder para os civis, definindo um prazo máximo de um ano para eleições constitucionais. A Junta de Salvação Nacional nomeou o general Spínola como presidente da República, que escolheu Palma Carlos para chefiar o I Governo Provisório.

O Período Spínola

Poucos dias após o golpe militar, os anseios de justiça social resultaram em reivindicações laborais, greves e manifestações. Esta efervescência social era difícil de controlar.

O I Governo Provisório demitiu-se menos de dois meses após a tomada de posse, deixando Spínola isolado. O poder político dividiu-se em dois polos opostos:

  • O General Spínola, mais moderado e com convicções federalistas relativas à África Portuguesa, apoiado pelas forças conservadoras;
  • A comissão coordenadora do MFA e seus apoiantes, adeptos da independência dos territórios ultramarinos e da revolução social.

Spínola perdeu influência para as forças esquerdistas do MFA. Vasco Gonçalves foi nomeado para chefiar o II Governo Provisório. Após reconhecer o direito dos povos africanos à independência, Spínola demitiu-se.

A Junta de Salvação Nacional reduziu-se a três membros e indigitou Costa Gomes para a Presidência da República.


A Radicalização do Processo Revolucionário

A revolução radicalizou-se. Otelo Saraiva de Carvalho assinou ordens de prisão de elementos moderados. O PC ganhou protagonismo, com a simpatia do primeiro-ministro Vasco Gonçalves.

Spínola liderou um golpe militar em 11 de março de 1975, que fracassou, obrigando-o a refugiar-se em Espanha. Os acontecimentos de 11 de março acentuaram o radicalismo. Formou-se o Conselho da Revolução, que passou a ser o órgão executivo do MFA.

O Conselho da Revolução tornou-se o centro do poder, propondo-se a orientar o Processo Revolucionário em Curso (PREC) rumo ao socialismo.

As Eleições de 1975 e a Inversão do Processo Revolucionário

A inversão do processo deveu-se ao forte impulso do PS para a realização das eleições constituintes. As primeiras eleições com sufrágio universal realizaram-se em 25 de abril de 1975, com vitória do PS, seguido pelo PPD. No verão, a oposição entre as forças políticas atingiu o auge, com assaltos a sedes partidárias e manifestações.


Estas alterações levaram a um último golpe militar em 25/11, liderado pelos paraquedistas de Tancos, em defesa de Otelo e do processo revolucionário. O golpe fracassou, abrindo caminho para a implantação de uma democracia liberal.

3. Política Económica Antimonopolista e Intervenção do Estado

A agitação social após o 25 de Abril foi acompanhada de medidas que alargaram a intervenção do Estado na economia e finanças. Estas medidas visavam a destruição dos grandes grupos económicos, a apropriação dos setores-chave da economia pelo Estado e o reforço dos direitos dos trabalhadores:

  • Nacionalização das instituições financeiras e das grandes empresas ligadas aos setores económicos de base;
  • Intervenção do Estado nas empresas cujo funcionamento não contribuísse para o desenvolvimento económico;
  • Reforma Agrícola: coletivização dos latifúndios do Sul.

Foi aprovada legislação para proteger os trabalhadores e os grupos desfavorecidos. As nacionalizações determinaram o fim dos grupos económicos “monopolistas” e permitiram ao Estado um maior controlo sobre a economia.


4. A Opção Constitucional de 1976

A 2 de junho, abriu a Assembleia Constituinte. Os deputados não tinham total liberdade de decisão, pois o MFA impôs um compromisso que conservava as conquistas revolucionárias: PACTO MFA-PARTIDOS. Este foi substituído por um segundo pacto, mais moderado.

A Constituição reiterou a via de transição para o socialismo, considerando irreversíveis as nacionalizações e expropriações de terras. Manteve o Conselho da Revolução como órgão de soberania.

A Constituição:

  • Define Portugal como um “Estado de direito democrático”;
  • Reconhece o pluralismo partidário;
  • Confere a todos os cidadãos a mesma dignidade social.

Esta opção liberalizante foi reforçada pela adoção dos princípios da Declaração Universal dos Direitos do Homem, eleição direta da Assembleia Legislativa e do PR, e independência dos tribunais.

O Reconhecimento dos Movimentos Nacionalistas e o Processo de Descolonização

As pressões internacionais levaram a ONU e a OUA a apelar à JNS para que consagrasse o princípio da independência das colónias. A nível interno, a independência das colónias tinha o apoio da maioria dos partidos e das manifestações.

O Conselho de Estado aprovou a lei reconhecendo o direito das colónias à independência, intensificando as negociações com o PAIGC, FERELIMO e MLPA, UNITA, FNLA.

No entanto, Portugal encontrava-se numa situação frágil devido:

  • Desmotivação do exército;
  • Deterioração das relações entre os militares africanos e os comandos europeus;
  • Instabilidade política na metrópole.

Portugal não conseguiu assegurar os interesses dos portugueses residentes no Ultramar.

A Revisão Constitucional de 1982 e o Funcionamento das Instituições Democráticas

A Constituição de 1976 foi criticada por um excessivo comprometimento com o socialismo. Após quatro anos, a AR procedeu à Primeira Revisão Contratual.

Mantiveram-se os artigos que proibiam retrocessos nas nacionalizações e na Reforma Agrária, mas de forma mais moderada. As alterações mais significativas foram ao nível das instituições políticas:

  • Abolição do Conselho de Revolução;
  • Limitação dos poderes do presidente e aumento dos da instituição parlamentar.

O regime reforçou o seu cariz democrático-liberal, assente no sufrágio popular e no equilíbrio dos órgãos de soberania:

Presidente da República

  • Eleito por sufrágio direto e por maioria absoluta;
  • Assistido por um Conselho de Estado;
  • Mandato: 5 anos, com interdição de mais de 2 mandatos consecutivos.

FUNÇÕES:

  • Moderação do poder político;
  • Zelar pelo bom funcionamento das instituições;
  • Poderes para demitir o governo e dissolver a AR.

(Este conjunto de poderes confere à constituição um carácter semipresidencialista)

Assembleia da República

  • Constituída por deputados eleitos por círculos eleitorais;
  • Cada mandato: 4 anos;
  • Órgão legislativo por excelência.

Governo

  • Órgão legislativo por excelência;
  • Condução da política geral do país;
  • Detém competência legislativa.

Tribunais

  • Independência, com juízes nomeados pela Magistratura;
  • O Tribunal Constitucional zela pelo cumprimento das disposições constitucionais.

O Governo das Regiões Autónomas exerce-se através de uma Assembleia Legislativa Regional, um Governo Regional e um ministro da República. O poder local estrutura-se com um órgão legislativo (Assembleia Municipal e Assembleia de Freguesia) e outro executivo (Câmara Municipal e Junta de Freguesia).

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