h2: Tenda dos Milagres: Pedro Archanjo e a Defesa da Mestiçagem
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É 1968, e a chegada a Salvador, do professor americano Levenson, provoca alvoroço na imprensa. Ele vem em busca de quatro livros que documentam a formação do povo baiano, escritos por Pedro Archanjo (pobre, pardo, boêmio e mulherengo).
Na juventude, Archanjo conheceu Lídio Corró, um "riscador de milagres", que virou parceiro na luta contra o preconceito racial e religioso. A Tenda dos Milagres, no Pelourinho, lugar onde os amigos trabalhavam, era também palco de candomblé e capoeira de Angola. Os folhetos de literatura popular e os livros de Archanjo, impressos na tipografia da Tenda, transformaram-na em uma espécie de universidade livre da cultura popular.
Bedel da Faculdade de Medicina da Bahia, Archanjo inspirou-se no convívio com os catedráticos da instituição e passou a estudar a história do povo baiano. Mas suas teorias, que valorizavam a miscigenação, despertam o ódio do professor Nilo Argolo, para quem os mestiços eram "degenerados".
Em Tenda dos Milagres, Jorge Amado opõe as ideias de Archanjo às de Argolo para enaltecer a mestiçagem, a tradição popular e a cultura negra. O romance critica a postura colonizada de aceitação de teorias racistas originárias da Europa no início do século XX e ironiza a valorização tardia da obra do intelectual negro, reconhecida à revelia da elite local graças à iniciativa de um estrangeiro.
A narrativa entrelaça com extrema habilidade os registros erudito e popular. As críticas à repressão contra o candomblé e outras manifestações da cultura negra ganham relevo em dois momentos históricos: o começo do século XX, quando da atuação de Pedro Archanjo, e a época em que o livro foi publicado, em plena Ditadura Militar.
A trajetória do intelectual negro Pedro Archanjo personifica a formação étnica e cultural brasileira e se confunde com a luta do povo baiano para preservar suas tradições populares. Archanjo defende a miscigenação, combate o racismo e valoriza o caráter mestiço de sua cultura. Essa mescla aparece também na linguagem do romance, que incorpora termos e ritmos afro-brasileiros.
A Mestiçagem como Base da Nacionalidade
Pedro Archanjo analisou as fontes da mestiçagem e comprovou sua extensão, maior do que ele próprio imaginara: não havia família sem mistura de sangue – apenas uns quantos gringos recém-chegados, e esses não contavam. Branco puro era coisa inexistente na Bahia; todo sangue branco se enriquecera de sangue indígena e negro, em geral dos dois. A mistura começou com o naufrágio de Caramuru, nunca mais parou, prossegue correntia e acelerada, é a base da nacionalidade.
O capítulo dedicado a provar a capacidade intelectual do mestiço inclui imponente relação de nomes de políticos, escritores, artistas, engenheiros, jornalistas, e até barões do Império, diplomatas e bispos, todos mulatos, o melhor da inteligência do país.
O Projeto Racista de Nilo Argolo
Segundo projeto, de claríssima urgência, lei ou decreto de salvação nacional, proibiria o casamento entre brancos e negros, entendido por negros todos os portadores de “sangue afro”. Proibição absoluta, capaz de pôr freio à mestiçagem.