História do Direito Português: Fontes, Evolução e Períodos
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Introdução à História do Direito Português
O Direito é um conjunto de definições, categorias e conceitos. Em Direito Civil, toda a definição é perigosa. É perigosa porque a nossa imaginação é tão grande que, por vezes, delira. Retiramos efeitos que ela não concorda, correndo o risco de a definição ser perigosa.
A História do Direito Português é a ciência jurídica que estuda o fenómeno jurídico do Direito português do passado. A ciência que estuda o Direito do presente é a Dogmática Jurídica. A ciência que estuda o Direito do futuro é a Filosofia do Direito. A ciência do passado existe porque agora é presente, amanhã já é passado. Há uma continuidade. O Direito do presente não se compreende sem o estudo do Direito do passado.
Objeto de Estudo da História do Direito Português
- Fontes;
- Pensamento Jurídico;
- Instituições Jurídicas.
Fontes do Direito
Fonte é aquilo em que o Direito se fundamenta. É uma metáfora, porque em rigor fonte é água, e o Direito não é água. Fontes são várias, metaforicamente falando. Existem fontes de produção, manifestação, conhecimento e fundamentação.
Tipos de Fontes
- Existentia (Produção): órgãos que criam (produzem) o Direito.
- Manifestandi: a forma como o Direito é criado, como se manifesta.
Exemplo: o Parlamento é das mais importantes existentia, pois cria as leis. O Governo é existentia e o decreto-lei é manifestandi.
Pensamento Jurídico e Instituições
O Pensamento Jurídico (ciência do Direito) é uma fonte voluntária do Direito: a Doutrina. As Instituições Jurídicas, por exemplo, estudam o Direito de Propriedade desde que surgiu até aos nossos dias.
Metodologia de Estudo
Método Cronológico
O método cronológico divide a História do Direito Português em várias épocas. Cada época é constituída com alguma homogeneidade, possuindo características próprias que lhe dão um sentido comum e a individualizam.
Épocas do Direito Português
- 1ª Época: Fundação de Portugal – individualização do Direito português.
- 2ª Época: Direito Comum.
- 3ª Época: Ordenações.
- 4ª Época: Direito Português Moderno, jus-racionalista.
- 5ª Época: Direito individualista – Revolução Liberal.
- 6ª Época: Estado Social.
A existência de várias épocas na História do Direito Português deve-se ao facto de o Direito ter história; o Direito não é igual, progride. O Direito é cultura. Transforma-se. Modifica-se. Enriquece. Empobrece. Tem fases!
Formação e Evolução da Ciência Jurídica
- 1ª Fase da Fundação: Surgiu no século XVIII, no ano de 1772, com a lei dos Estatutos Pombalinos da Universidade de Coimbra. Almeida da Costa chamou Pascoal José de Melo Freire de “Savigny de Portugal” – este foi o primeiro momento da história desta cadeira, o Momento da Fundação.
- 2ª Fase da Consolidação: Surgiu no século XIX, porque esta cadeira consolidou-se e firmou-se. E firmou-se graças a dois homens portugueses: Alexandre Herculano (historiador português) e Gama Barros.
- 3ª Fase da Renovação: Surgiu no século XX. O Positivismo em Portugal foi representado por Manuel Paulo Mereia, Luís Cabral de Moncada e Guilherme Braga da Cruz (discípulo de Manuel Paulo Mereia).
Periodização: Individualização do Direito Português
A individualização do Direito Português, também conhecido como Direito Peninsular, tem como ponto de partida a fundação de Portugal (1142/1143) com o Tratado de Zamora, quando D. Afonso Henriques se intitula Rei de Portugal. O ponto de chegada é o ano de 1248, início do reinado de D. Afonso III.
Reinados da Época
- D. Afonso Henriques: o Conquistador;
- D. Sancho I: o Povoador;
- D. Afonso II: o Rei Legislador;
- D. Sancho II: o Rei Capelo.
O Direito Peninsular e as Suas Influências
O Direito Peninsular torna-se português séculos mais tarde. Quando Portugal não foi criado, não havia Direito, mas sim referência ao Direito Peninsular.
Direito Primitivo
O Direito Primitivo aplicou-se nos tempos mais remotos. É o Direito dos povos mais antigos da nossa história, como os Celtas Ibérios, povos mais afastados. Existem muitas coisas que derivam dos celtas, pois estes deixaram muitas marcas, até ao nível do Direito. Era um povo rural, viviam da caça, da pesca e da exploração de minério. O Direito deste povo só tinha uma fonte: os costumes, pois era um povo inculto. Costume é algo que se recebe e que se entrega a quem vem depois de nós – TRADICTIO (tradição de algo que se recebe e que depois entregamos à geração vindoura).
Direito Turdetano
Os Turdetanos eram um povo espanhol que tinha leis escritas em verso, porque assim eram mais fáceis de decorar e conhecer, como também de obedecer. Só se obedece àquilo que se conhece! Transmitiam-se de geração em geração. Era regido por costumes!
Os crimes graves incluíam o assassínio d’El Rei e as penas de morte, que eram executadas de modo a que as pessoas ficassem avisadas no precipício. Se um filho matasse um pai, era preso por lapidação (morte à pedrada). Nos crimes menos graves, o autor da ofensa era condenado a levar um certo número de varadas, daí vem o nome “entrar às varadas”. A família ou a vítima era quem dava as varadas. As varadas aplicadas à mulher casada só podiam ser dadas pelo marido, em respeito à dignidade do poder marital. Se a prática de varadas ocorresse na praça pública, era para que todos vissem, para que a pessoa que visse não praticasse nenhum crime – prevenção geral. O autor do crime assim não voltava a fazer o mesmo crime – prevenção especial. Houve uma altura em que a pena corpórea foi substituída pela pena de prisão.
Romanização Jurídica
Com a chegada do Direito Romano, apareceu o Direito Romano Vulgar (218 a.C.), marcando a duração da romanização. Depois da reconquista romana, o senado manda à península um general para estabelecer um funcionamento de organização administrativa. Com a paz, segue-se a romanização (difusão da cultura romana na nossa península).
Instrumentos de Difusão
- Engenheiros e arquitetos que construíram grandes obras;
- Funcionários da Administração Romana que iam difundindo a cultura romana.
O Imperador Vespasiano, nos anos 73 e 74, concedeu a algumas cidades da península o estatuto de latinidade, ou seja, os habitantes dessas aldeias tornaram-se latinos – IUS COMMERCII (Direito do Comércio), direito de fazerem negócios jurídicos à luz do Direito Romano. No ano de 212, o imperador Antonino Caracala concedeu a todo o Império Romano a cidadania Romana, tanto da Península Ibérica como de Roma.
Organização Jurídica Administrativa Romana
Os Romanos deixaram a organização jurídica administrativa, cujos constituintes eram:
- Assembleia municipal que delibera;
- Grupo restrito de magistrados que executam as decisões da assembleia municipal;
- Órgão de consulta: senado, constituído por homens velhos, que aconselhavam.
Quanto ao Direito propriamente dito, os Romanos deixaram entre nós o Direito de Propriedade, usufruto, servidão de passagem, servidão de visitas, contratos que estão consagrados no Código Civil Português, sucessões e heranças. Muito do que consta do Direito Civil Português provém do Direito Romano.
A Queda de Roma e os Povos Bárbaros
No ano 476, Roma caiu às mãos de um povo oriundo da Ásia Menor, povo este que não tinha a cultura romana, nem grega, era bárbaro! (não tem cultura greco-romana). Bárbaro é um estrangeiro. Derrotaram o imperador Romano. Era diversificado, com várias etnias. Impuseram vários reinados. Os Germanos, povo que, afastando-se da nossa península, deu motivo ao que se seguiu: o Direito Germânico. Era um povo heterogéneo, rude, sem cultura, que invadiu o Império Romano e a nossa península porque procurava aqui algo que pudesse matar a sua fome. Idálio, bispo que nos deixou uma palavra escrita, dizia que os bárbaros tinham tanta fome que até as mães cozinhavam os seus próprios filhos. Aqui se justifica a migração da Ásia Menor para o Império Romano.
Marcas do Direito Germânico
- Suevos: povo de raça germânica, fixaram-se em Bracara Augusta. Este povo teve uma particularidade: um bispo vindo da Hungria cristianizou-os, tornando-se estes cristãos e a cultura jurídica aumentou. São Martinho de Dume, graças à ação deste bispo, deu prestígio a Braga como cidade católica.
- Visigodos: fixaram-se em Toledo (cidade de cariz medieval), que foi a capital da Espanha antes de Madrid. Deixaram-nos cá a organização do Reino (organização política).
Organização Política Visigótica
Os Visigodos assentavam em três pilares:
- Rei: era eleito, não era uma monarquia hereditária, era um autêntico Presidente da República, não governava, apenas era eleito.
- Aula Régia (Cortes Portuguesas e Assembleia da República): assembleia que aconselhava o rei, espécie de Conselho de Estado. Reuniam-se para formar decisões. Estas decisões afetavam, por vezes, a Igreja.
- Concílios: reuniões do alto clero.
Tudo isto foi deixado em Portugal pelos Visigodos.
Codificação Visigótica
Os Visigodos preocuparam-se em fazer diversos códigos. Um deles foi feito apenas para os Visigodos: o Código de Eurico, um rei que promulgou este código para combater os povos invasores. Faltava um código para os Romanos (população invadida que já cá estava – povo invadido), este código foi feito por Alarico – “O Breviário de Alarico”.
O Princípio da Personalidade exigia a existência de mais do que um código. Quando havia casamentos mistos (Romanos com Visigodos), as pessoas geradas nesses casamentos eram as duas coisas (Visigodos e Romanos). E o direito a aplicar era o Novo Código Visigótico, promulgado pelo rei Recesvinto em 654, aplicando-se para todo o povo. Unificou a Península Ibérica! Este foi o Princípio da Territorialidade.
Instituições Jurídicas Germânicas
Dote Germânico (Arras)
Até 1972, tivemos este dote (conjunto de bens), em que o noivo dava à sua noiva antes do casamento para que, depois de casada, a mulher, dispondo de bens, pudesse ajudar o marido nas despesas de família. Ou, caso ficasse viúva, para ter bens para sobreviver. Em Roma também havia o dote, só que o dote era dado pela mulher/sogro/amigo ao marido. E à morte do marido, os bens ficavam para a mulher, também se chamava Arras.
O noivo dava à noiva, pois estes povos tinham do casamento a ideia de que era uma compra e venda ao futuro sogro (o noivo comprava a mulher ao sogro). Comprava, logo pagava o preço da mulher. O dote eram os bens que dava ao sogro, mas eram da noiva (preço). O anel de aliança de noivado vem daqui! Antes do dote era compra e venda.
Morgengabe
Herdamos dos Visigodos. O marido dava à mulher na manhã seguinte da noite de núpcias: compensação da perda da virgindade.
Ordálios (Juízos de Deus)
O risco de absolver um criminoso era maior do que condenar um inocente. IN DUBIO PRO REO: presunção de inocência. Provém de Roma. Os Visigodos não tinham este princípio, mas o problema era o mesmo. Suspeita-se apenas, pois não se sabe de nada ao certo. Estamos na Idade Média: época de muita religiosidade. Deus está sempre presente. Não tem suspeitas, tem verdades. Deus viu! Pede-se a Deus um sinal e é aqui que funcionam os ordálios: prova do ferro candente ou em brasa. Dependia da cura da ferida para se saber se havia ou não criminosos/inocentes.
Casamento de Juras
As filhas só casavam mediante o consentimento de seus pais. Mas muitas vezes, os pais opunham-se. O noivo jurava com a noiva, a Igreja reconhecia este casamento e o pai já nada tinha a ver.
Direito Muçulmano
Em 711, uma cavalaria em Tarifa invadiu a Península Ibérica, conquistando tudo, exceto as Montanhas das Astúrias (local onde os Visigodos se refugiavam). O exército árabe era chefiado por Tarique, e rapidamente conquistou a Península Ibérica aos Visigodos.
Relativamente ao Direito Árabe: é um direito religioso, e à frente deste direito estão as normas da Igreja. Os muçulmanos foram um povo tolerante, respeitaram os direitos dos invadidos (Visigodos) – Princípio da Personalidade. Tudo o que tem ‘al’ provém dos árabes.
Fontes do Direito Muçulmano
- Alcorão: bíblia dos Muçulmanos;
- Sunna: conduta pessoal de Maomé, visto como um exemplo;
- Costume.
Instituições Muçulmanas
A Parceria Agrícola era um contrato de repartição de terras. Chegou até 1910. A terra pública tinha uma terça parte, isto é, herança. A parte disponível podia ser dada a estranhos à família. A parte indisponível não podia ser dada, pois ficava para a família mais próxima. O testamento é um negócio jurídico que produz efeitos mortis causa. Esta figura da terça foi estabelecida no Direito Português até 1910.
A Reconquista Cristã e o Direito Peninsular
Os Árabes invadiram a Península Ibérica em 711, menos a Montanha das Astúrias, onde se refugiaram os Visigodos. É aqui que se dá a reconquista cristã, com os Visigodos a expulsarem os Árabes da Península Ibérica. Antes da fundação de Portugal, essa reconquista já existia. O Direito Peninsular tornou-se Direito da Reconquista Cristã. É a partir do refúgio dos Visigodos nas Astúrias que se dá a reconquista cristã, com a expulsão dos Árabes da Península Ibérica, incluindo os territórios de Portugal, excluindo o Condado Portucalense.
Fontes do Direito na Reconquista Cristã
- Costumes.
- Forais: documento em que uma entidade (ex.: rei, igreja, nobre) concede um conjunto de direitos e obrigações que passam a regulamentar a vida de uma localidade. As suas relações passam a ser disciplinadas através deste foral. Trata-se de uma plena Constituição que é dada a uma localidade e que está na base da sua fundação.
- Código Visigótico (654).
- Cânones: leis feitas em reuniões do alto clero (concílios).
Direito de Avoenga
Também chamado de retrato da família. Provém da revolução cristã. É visto como um direito de preferência que um familiar tem para evitar que os bens caiam noutra pessoa que não familiar. Preço por preço é para o irmão, pois é da família. Objetivo: salvaguardar os bens!
D. Raimundo e D. Henrique (primo de D. Raimundo), dois nobres que vieram de França e com eles veio uma comunidade de agricultores.
Posse de Ano e Dia
Provém do Direito Francês. Esta posse tem de ter a duração de pelo menos 1 ano e 1 dia.
O que é a posse? É uma grande figura jurídica que se aproxima muito do direito de propriedade, mas é diferente. É um direito sobre coisas. A propriedade é o poder que o proprietário tem de usar, fruir e dispor, cujas faculdades (poder) são protegidas pelo Direito. É um poder de Direito! A posse é o poder de usar, fruir e de um modo de dispor, mas só é protegido pelo Direito em certas circunstâncias. É um poder de facto que pode transformar-se em poder de direito, basta que decorra o tempo de usucapião (modo em que a posse se transforma em Propriedade).
Época da Individualização do Direito Português
O Direito Peninsular que vem de trás agora adquire o nome de Direito Português. De 1141 até 1248, o Direito Peninsular individualiza-se. Esta época, com o Direito Português e com a fundação de Portugal, é marcada por:
- O momento em que D. Afonso Henriques se intitula Rei de Portugal – 1141.
- O Tratado de Zamora – 1143.
A Chegada da Ciência Jurídica a Portugal
Havia costumes grosseiros, violentos e injustos. Estávamos perante um direito rudimentar e imperfeito! Vai-se transformar em direito de progresso. Chega a Portugal no século XIII (1248). No ano de 1248, deu-se o início do reinado de D. Afonso III, que vem de França substituir o seu irmão.
Fontes de Leão e Castela
- Forais concedidos pelo Rei de Leão e Castela;
- Costume;
- Código Visigótico.
Fontes de Direito Portuguesas
A ciência jurídica é a reunião da nobreza presidida pelo rei. As fontes feitas em Portugal são os forais outorgados pelo rei português, pela Igreja portuguesa e pela nobreza portuguesa. Esta noção é científica e, nesta altura, ainda não temos conceção científica. Atualmente, a noção é científica! O costume nesta época é tudo aquilo que não seja lei (sentido amplo e lato).
A preocupação de D. Afonso Henriques era a reconquista cristã dos territórios árabes. A esperança de D. Sancho (filho) era conquistar as povoações. Em 1211, o rei reuniu a cúria: início do movimento legislativo. Até aqui, as fontes eram os forais.
Período da Individualização do Direito Português (Revisão)
Contextualização Temporal
O período da individualização do Direito Português decorre da fundação da nacionalidade, do ano em que Afonso Henriques passa a intitular-se rei, até ao começo do governo de Afonso III, portanto, de 1140 a 1248. Com efeito, a independência política de Portugal não envolveu uma autonomia imediata no campo do direito. Verificou-se a manutenção do sistema jurídico herdado do estado Leonês. Só pouco a pouco foram surgindo as fontes tipicamente portuguesas. Trata-se de um direito de base consuetudinária e foraleira, caracterizado pelo empirismo jurídico com predomínio da atividade dos tabeliães na sua evolução, sendo um tabelião alguém com um certo conhecimento jurídico. Além do mais, importa aqui referir que o facto de este período terminar no ano de 1248 é justificado pela entrada em Portugal da ciência jurídica.
Características
É importante ter em conta que o Direito Português, até meados do século XIII, teve uma base consuetudinária, como sucedeu nos restantes estados peninsulares medievais, onde o Código Visigótico cada vez mais perdia terreno e a legislação ia crescendo timidamente. Compreende-se, igualmente, que o sistema jurídico dos começos da nacionalidade portuguesa fosse um direito rudimentar caracterizado por instituições de tipo primitivo, assim como pelo empirismo que presidia à criação jurídica, orientada no âmbito do direito privado fundamentalmente pelos tabeliães.
Fontes do Direito (Período de Individualização)
As fontes do direito respeitantes a este período iniciaram-se com a fundação da nacionalidade e terminaram em meados do século XIII. Importa analisar separadamente as fontes que se conservaram em vigor das que despontaram após a autonomia política portuguesa.
- Código Visigótico: permanece como fonte do direito no território português durante o século XII. As alusões ao Código Visigótico tanto podem significar meras reminiscências eruditas ou fórmulas rotineiras dos juízes e dos tabeliães, como também testemunhos de vigência efetiva dos seus preceitos. Desde o início do século XIII, começaram a escassear as referências ao Código Visigótico nos documentos portugueses, como reflexo de uma progressiva perda de autoridade.
- Leis dimanadas de ciências ou concílios reunidos em Leão: As chamadas cúrias, órgãos auxiliares do rei que tinham um caráter eminentemente político. Enquanto que os concílios caracterizam-se pela sua natureza eclesiástica.
- Forais de terras portuguesas anteriores à independência: os forais são diplomas concedidos pelo rei, ou por um senhorio laico ou eclesiástico, a determinada terra, contendo normas que disciplinam as relações dos povoadores ou habitantes entre si e destes com a autoridade outorgante. Os forais incluem essencialmente normas de direito público, enquanto que os preceitos de direito privado ocupam nos forais um plano muito secundário.
- Costume: o direito privado tinha como fonte principal ou quase exclusiva o costume que prosseguia a linha das mesmas normas consuetudinárias leonesas. Nesta época, utilizava-se o conceito de costume num sentido amplo ou residual, pois considerava-se que este abrangia todas as fontes de direito tradicionais que não tinham caráter legislativo.
- Leis gerais dos primeiros monarcas: são as mais antigas fontes de direito de origem portuguesa. Contudo, embora pouco, alguma coisa se legislou, destacando desde logo uma lei de Afonso Henriques (1128/1185); uma provisão de Sancho I que oferece as características de diploma geral e se reporta ao ano de 1210; Afonso II, logo após a subida ao trono, convocou uma reunião extraordinária da cúria que se realizou em Coimbra no ano de 1211. De lá saíram várias leis.
- Forais: são abundantes nesta época as fontes de direito local. Durante os primeiros reinados, sobretudo, concederam-se muitos forais e também certas cartas de povoação. Estes constituem, sem dúvida, até Afonso III (1248/1279) uma das mais importantes fontes de direito português.
- Concórdias e Concordatas: consistiam em acordos efetuados entre o rei e as autarquias eclesiásticas, comprometendo-se reciprocamente a reconhecer direitos e obrigações relativos ao estado e à Igreja. Esses acordos resultavam de respostas dos agravamentos proferidos em cortes pelos representantes do clero. Outras vezes derivavam de negociações do rei com as autoridades eclesiásticas.
O Renascimento do Direito Romano e a Ciência Jurídica
Pré-Renascimento do Direito Romano (Século XI)
O pré-renascimento do Direito Romano nasceu em Itália no século XI.
Fatores para o Fim da Ignorância
- Fator Político: o rei era detentor de um poder esmagador face aos poderes da nobreza e do clero. O instrumento de que ele necessitava para estar acima de todos os poderes era a lei.
- Fator Cultural: assiste-se na corte de Carlos Magno ao Renascimento Carolíngio. O próprio imperador colocou homens de letras, músicos, filósofos, para quem a cultura fosse um ideal a cultivar na sua corte. Estudava-se também o Direito Romano.
- Fator Económico: com o fim do Império Romano do Ocidente, cada cidade italiana tornou-se independente (estados diferentes). Chamavam um direito superior porque os locais eram muito pobres e incapazes de acompanhar o progresso.
- Fator Religioso: a Igreja tinha poucos séculos de vida e interessava-se em fomentar o estudo do Direito Romano para o juntar ao canónico. No século XI, estudava-se o Direito Romano em Pavia e Ravena, o que é igual ao pré-renascimento do Direito Romano.
Em Itália, no século XII, surge o Grande Renascimento do Direito Romano, estudado agora em Bolonha (1ª universidade dos tempos modernos).
A Escola de Bolonha (Glosadores)
A Escola de Bolonha é também conhecida como Escola dos Glosadores (porque criavam glosas) ou Escola Irneriana (devido ao mestre Irnério).
A Glosa
É um pequeno comentário a um pequeno texto nas margens para facilitar a leitura do que está ao lado. De início, era tão pequeno que cabia entre duas linhas de um texto. Comentários interlineares: glosas interlineares. Quando a ciência jurídica cresce, os comentários são maiores e não cabem em duas linhas, então temos as glosas marginais. A cada dia que se estudava mais, cada vez se faziam mais comentários.
Nascimento da Escola
A Escola nasceu no século XII, em Bolonha. Irnério era um homem com grandes conhecimentos de gramática latina (tinha, portanto, tudo para ser um bom jurista e era tão bom que a sua fama chegou a toda a Europa, chamando-lhe a Lucerna Iuris (a candeia, luz do Direito)), dialética (arte de bem falar) e retórica. Começou a ensinar a ciência jurídica Romana, e de toda a Europa chegavam a Bolonha pessoas que iam estudar Direito. Em Bolonha, agrupavam-se segundo as suas nacionalidades, criando as Nações (grupo de estudantes de cada uma das nacionalidades). Em Coimbra e em Lisboa era igual, iam pelos bosques, correndo perigos e muitas dificuldades, mas atraídos por este homem para Bolonha, que começou a ensinar nos Claustros dos Mosteiros, onde o ouviam e questionavam. A partir de dada altura, eram tantos que até se criou a primeira Universidade de Bolonha.
Trabalho dos Glosadores
Os glosadores fizeram glosas. Uma glosa é um comentário que se faz a um texto do Corpus Iuris Civilis.
Produção Científica
- Glosa interlinear: feita entre linhas.
- Fizeram coletâneas de casos práticos: casus.
- Fizeram coletâneas de pontos de vista diferentes: dissentiones.
- Summae: suma de matérias.
Finalidade: resolução dos problemas práticos concretos, não para fazer teorias.
Método exegético: interpretação literal. Não dispensa o recurso dos elementos lógicos, só nos dá o sentido literal das palavras e não o sentido mais profundo.
Magna Glosa de Acúrsio
Os glosadores dividiam o Corpus Iuris Civilis em 5 partes.
A Escola dos Comentadores (Bartolistas)
O chefe da Escola dos Comentadores foi Bartolo, considerado o melhor jurisconsulto de sempre. Criou-se uma cadeira na faculdade: “A cadeira de Bartolo”, para que não se perdessem as Lições de Bártolo.
Finalidade prática: (igual aos glosadores) – permitir a resolução dos problemas da vida: método escolástico.
Organização do Método
- Lectio: primeiro professor que começa a sua aula a ler o texto.
- Questio: questão/problemas que estão em causa.
- Disputatio.
Ars Inveniendi
- Momento das leis – leges: a partir de uma leitura a um texto, começa-se a sua interpretação dinâmica, explorando todos os sentidos possíveis de forma a encontrar várias soluções – arte dinâmica.
- Em razão – rationes: fase da fundamentação/razões para o problema (dialética e retórica (convencer, persuadir)).
- Auctoritas: o saber socialmente reconhecido. Momento da autoridade. Passa por uma questão: “Quem é ele?” É alguém cuja sociedade concede valor. A partir de Savigny, este distingue o processo da integração e da interpretação. Isto pertence a uma atitude extensio iuris.
A Escola dos Comentadores teve sede em Perúgia.
Chegada da Ciência Jurídica a Portugal
A Escola dos Glosadores, em Bolonha, foi o palco onde nasceu a ciência jurídica em Itália. Chegou a Portugal em meados do século XIII. A chegada da ciência jurídica a Portugal surgiu em Itália. Em 1140, já encontramos um homem formado em Bolonha: Mestre Alberto Julião e Vicente, formados em Direito, e que estavam na corte de D. Afonso Henriques. Antes do século XIII, estes já estavam em Portugal. Não passou de uma manifestação esporádica.
A Renovação do Direito Canónico
O Direito Canónico
O Direito Canónico estrutura a Igreja, as hierarquias da Igreja, desde o padre ao papa. Trata dos formalismos e das obrigações e direitos dos membros do clero. Disciplina as relações entre os fiéis e a Igreja (ex.: excomunhão).
Fontes do Direito Canónico
Fontes do Direito Divino (antes do século IV)
- Sagrada Escritura;
- Evangelhos;
- Traditio (tradição);
- Ensinamentos de Jesus Cristo (ex.: Antigo Testamento).
Coletâneas Antigas e Evolução
A prática e atuação dos cristãos (costume) também foram fontes. Do século V ao século XI, o Direito Canónico evoluiu de tal modo que se encontram coletâneas do Direito Canónico, tais como:
- Os Capitula Martini: capítulos de Martinho de Dume – arcebispo de Braga.
- Collectio Hispaniae: coleção de Espanha: Santo Isidoro de Sevilha.
- Decretum de Ivo: bispo de Chartres.
O século XII marca a renovação propriamente dita do Direito Canónico.
Grandes Compilações do Direito Canónico
Reunidas no Corpus Iuris Canonici por Chappois:
- Decretum de Graciano (monge e professor em Bolonha): ensinada nas universidades por um professor.
- Decretais – século XIII de Gregório IX;
- Sextum de Bonifácio VIII.
Compilações do Século XIV
- Clementinas: por Papa Clemente V.
- Extravagantes de João XXII.
- Extravagantes Comuns.
Nas Cortes de 1211, prevalece o Direito Canónico face a outro direito, uma vez que são contraditórios. O Direito Canónico é muito importante, pois a Igreja ainda hoje o aplica nos tribunais eclesiásticos.
Fatores de Penetração da Ciência Jurídica e a Universidade
Fatores de Penetração da Ciência Jurídica
- Estudantes de Portugal: Com eles vinha a ciência jurídica em que se tinham formado. Quando regressaram a Portugal, trouxeram os livros que estudaram em Itália.
- Difusão dos livros jurídicos em Portugal: (ex.: Codex, Corpus Iuris Civilis, Magna Glosa, Lei de Acúrsio).
- Influência da Lei: A lei, que arrancou na Cúria de Coimbra, é vista como uma grande influência da ciência jurídica romana. Obras mandadas fazer por Afonso X, o Sábio, que fez muitos livros de Direito que foram trazidos para Portugal e foram aplicados nos Tribunais portugueses, tais como: Nove Tempos, Las Flores del Derecho, Sete Partidas e Fuero Leal.
- Ensino e Investigação: A fundação da universidade, como a Universidade de Bolonha.
- Progresso do Saber: O apetite pelo saber, o desejo dos vários países europeus (estados nascentes na Europa).
As universidades não foram criadas da mesma maneira. Existe um critério que distingue os vários tipos de universidade. Além do espírito corporativo, existem vários movimentos de criação de diversas universidades na Europa.
Tipos de Universidades
- Universidade Consuetudinária: aquela universidade que nasce do nada, à sombra do mestre que depois cria discípulos, alunos e do nada surge uma grande escola (ex.: Universidade de Bolonha).
- Universidade criada por fragmentação/secessão: onde havia uma, passa a haver duas. Acontecia quando numa cidade os estudantes viviam em conflito com os cidadãos dessa cidade. Quando faziam as pazes, já não voltavam ao local de origem (ex.: Cambridge-Oxford).
- Universidade por Privilégio: o rei fundou a universidade e o papa confirma. O papa era o chefe da cristandade. A licenciatura estendeu-se por toda a Europa e o professor das universidades podia lecionar em toda a Europa (ex.: Salamanca e Portugal).
A Universidade Portuguesa
A Universidade Portuguesa foi criada entre 12.11.1288 e 01.03.1290 pelo Rei D. Dinis. Nestas datas, ocorreu também que um grupo de homens do alto clero sentiu vivamente a falta de universidade em Portugal. Este grupo reuniu-se na vila de Montemor-o-Novo (Alentejo) e dessa reunião foi elaborada uma ata. Decidiram pedir ao rei português que criasse uma universidade. Ainda não existiam universidades!
Em 01.03.1290, há uma lei de D. Dinis em que diz: “Eu, Rei de Portugal e dos Algarves, já criei a Universidade em Portugal e dei aos alunos e professores determinados privilégios”. Foi criada em Lisboa. Uma vez em Lisboa, a universidade regressa a Coimbra. Surgiram posteriormente conflitos em Coimbra e esta regressa a Lisboa. Em 1537, no século XVI, D. João III fixou a universidade de Coimbra no palácio real.
Faculdades da Universidade Portuguesa
Na universidade portuguesa existiam:
- 2 faculdades de Direito (uma de leis (Direito Romano) e a outra de cânones (Direito Canónico));
- 1 faculdade de Artes;
- 1 faculdade de Medicina.
A justificação para a criação da universidade portuguesa era evitar o afluxo de estudantes para Itália, para obterem cá a sua formação jurídica. A universidade de Portugal não foi bem-sucedida porque o prestígio do curso é o prestígio da universidade, e era diferente ser licenciado por Bolonha do que por uma universidade nova (Portugal). Por isso, muitos estudantes emigraram. Só com o tempo é que a universidade portuguesa veio a ser projetada a nível nacional e internacional. Daqui, os estrangeiros vêm também para Portugal e os portugueses ficam cá.
A Época do Direito Comum (1248-1446/7)
Foi a nossa segunda época. A ciência jurídica já cá estava. O Direito Português transforma-se e adquire cada vez mais perfeição. Antes era rudimentar e imperfeito! Isto justifica o fim da época de individualização e o início desta época.
Fontes e Instituições do Direito Comum
Fontes do Direito na Época do Direito Comum
- Lei: manifestação expressa da vontade do rei. As leis mais importantes eram registadas na chancelaria régia. Nesta altura, não havia imprensa, logo não havia Diário da República, nem de monarquia. Havia senhores que faziam cópias à mão, utilizavam penas de pato – Copistas. As cópias eram enviadas para os vários concelhos. As leis chegavam primeiro aos municípios e não passavam dali. Fazia-se publicidade com a cópia: havia um funcionário da autarquia que ia à igreja e, depois da missa, lia a cópia da lei em voz alta, e o povo ali tomava conhecimento. Os senhores que liam eram pregoeiros. Assim se cumpria o princípio da publicidade das leis. Vacatio Legis: não havia. A lei entrava em vigor no dia em que era feita.
- Resoluções Régias: leis solenes que o rei fazia respondendo a perguntas chamadas de agravos feitas pelo povo.
- Costume: o que não é lei. Nesta altura, já havia ciência jurídica e o costume é uma fonte voluntária do Direito. É uma prática reiterada que se observa ao longo de um tempo e que, por isso, juridicamente é obrigatória. É composto pelo animus e pelo corpus: definição científica. Já se diz o que é costume cientificamente. As leis podem revogar os costumes; se não revoga, é porque aceita. Assim, o Costume é uma manifestação tácita da vontade do rei. Tanto a lei como o costume eram elaborados de acordo com a vontade do rei. Há compilações de Direito Local para facilitar a vida às populações: forus/costumes.
- Forais: concedidos pelo rei, nobreza e clero.
- Concórdias e Concordatas.
Nesta altura, o direito era muito lacunoso. Há sempre problemas para os quais o legislador não fez uma lei em concreto porque ninguém pensou nesse problema. Não há fonte de Direito, logo estamos perante uma lacuna. Uma lacuna é um litígio que não tem uma solução e devemos criar uma solução o mais rapidamente possível. Perante uma lacuna, o juiz deve criar a solução para resolver o problema. Naquela época, havia muitas lacunas para as quais não havia uma solução. Na altura, recorria-se a outro direito lacunoso: direito subsidiário (pode ser: direito romano, canónico, castelhano…). Os nossos tribunais não estão obrigados a dar prioridade. Os tribunais são livres de aplicar qualquer direito. O direito que se aplica na ausência do direito português é o direito subsidiário.
O Regime Senhorial
O território português estava repartido por pequenos territórios, pequenos distritos civis, uns maiores e outros menores. E em frente a cada território estava um senhor. Este senhor podia ser do alto clero ou da nobreza, sobretudo da nobreza. Tinha poderes senhoriais.
Poderes Senhoriais
É o senhor, e não o rei, quem administra a justiça. É ele que recebe os tributos (impostos). Faz o recrutamento militar. Aqui, o rei não entra com funções de soberania. O senhorio é uma pequena circunscrição territorial. Nem todos os senhorios foram constituídos da mesma maneira.
Formas de Senhorio
- Couto: diploma concedido pelo rei a um senhor. Confere ao senhor as funções que o rei faz noutros sítios.
- Honra: o nobre entende que deve ser recompensado pela sua defesa e vai a um local construir a sua propriedade, chamando-a assim senhorio.
- Behetria: os moradores escolhiam um senhor que os ia proteger. Senhorio formado para os moradores das várias cidades.
Em qualquer destes tipos, o rei não entra! Fora dos senhorios, a terra é do rei!
Contratos de Exploração Agrícola
Nesta época, havia terras abandonadas ao cultivo, não eram trabalhadas. Eram matagais! Não produziam pão e não matavam a fome, assim surgiam doenças. E nesta altura, Portugal passava problemas relacionados com doenças. Assim, tinham de as pôr a produzir, o que beneficiava o proprietário da terra e o agricultor, mas tinha de interessar as duas partes. A maneira de interessar era feita através de um contrato de exploração agrícola, cujo efeito é a fragmentação da propriedade.
Enfiteuse
Exemplo: o Sr. A é proprietário de um terreno, o terreno não está cultivado, não produz. Efeito deste contrato: o Sr. A chama o B (agricultor) e B planta árvores duradouras. Onde não havia nada, passa a haver árvores duradouras. Quando as árvores já estiverem a produzir, o terreno é dividido ao meio, entre o Sr. A e B. O Sr. A era dono de tudo, agora só tem metade, mas ganhou árvores de fruto. Ganhou mais do que o que perdeu. O agricultor perdeu as árvores, mas ganhou a parte do terreno. Ambos ganharam mais do que o que perderam, logo o interesse era dos dois!
A enfiteuse é um contrato em que o senhor fica com o domínio direto e o agricultor (enfiteuta) fica com o domínio útil. Onde havia um proprietário, passam a existir dois. O enfiteuta pode aliená-lo, pode doá-lo, mas com o limite de poder vender. Vende o domínio útil, deve perguntar primeiro ao proprietário do domínio direto e deve dar preferência ao proprietário do domínio direto. Mas ele não é obrigado a comprar. É aqui que o enfiteuta pode vender a quem quiser, mas 2% do preço (laudémio) vai para o titular do domínio direto. Este contrato é oneroso, implica uma renda anual. É paga, em regra, por uma percentagem dos frutos que deu. É constituída por dois proprietários e pode transferir a propriedade inter vivos ou mortis causa. O interesse destes senhores era porque recebiam a renda. O enfiteuta tinha interesse porque tem agora uma propriedade e pode fazer o que quiser, desde que a renda seja paga. Terrenos que eram abandonados passam a ser agricultados, assim diminuía a fome.
Complantação
Exemplo: o Sr. A é proprietário de um terreno, o terreno não está cultivado, não produz. Efeito deste contrato: o Sr. A chama o B (agricultor) e B planta árvores duradouras onde não havia nada, passa a haver árvores duradouras. Quando as árvores já estiverem a produzir, o terreno é dividido ao meio, entre o Sr. A e B. O Sr. A era dono de tudo, agora só tem metade, mas ganhou árvores de fruto. Ganhou mais do que o que perdeu. O agricultor perdeu as árvores, mas ganhou a parte do terreno. Ambos ganharam mais do que o que perderam, logo o interesse era dos dois! Fazia-se com frequência porque beneficiava as duas partes e interessava também à sociedade.
Contratos de Crédito
- Compra e Venda de Rendas:
Exemplo: A, proprietário de um terreno, precisa de contrair um empréstimo de B (credor). O Sr. B empresta a A – contrato de mútuo. Quem paga o empréstimo e o juro é A, o devedor. Os juros e o capital são pagos pelo rendimento do prédio, por aquilo que o prédio produziu. Quem paga os rendimentos é o Sr. A. Se A transfere a propriedade a C, C é agora o proprietário. O devedor é C porque quem vai pagar as dívidas é o proprietário. Primeiro foi A, segundo foi C e depois pode ser outro. Quando é assim, estamos perante a figura do ónus real.
- Penhor Imobiliário:
Exemplo: o A transfere a posse do seu prédio a B, que é agora possuidor. Para garantir a dívida, o possuidor é que é devedor. E se a dívida for paga, a posse é re-transferida para A.
A Vingança Privada (Autotutela)
Estamos no século XIII, em que a organização política e a existência do Estado, Portugal, estava em construção. Havia vários focos de poder (nobreza, clero e rei). O Estado não existia, mas existiam poderes dispersos. Não havendo Estado, não havia organismos dispostos para a proteção dos direitos dos cidadãos portugueses. Não havia tribunais pelo país. Quando há falta disto, as pessoas protegem-se a elas próprias. Autotutela – tutela privada: autoprotegem-se.
Todavia, nem sempre a pessoa atingida tem força para reagir e, se não tem força, não reage, sofre de injustiça. Mas, se reage a quente excessivamente, é também injustiça, pois repara o mal que lhe foi causado desproporcionadamente. O que é desproporcionado é injusto! Na vingança privada, arriscava-se a ser injusto através de duas maneiras: reagir desproporcionadamente; ou não reagir, sofrendo injustiça.
Reações à Vingança Privada
A reação é um conjunto de medidas que procuram afastar a vingança privada.
- Pax: Significa que há momentos, períodos em que a vingança privada está proibida. Não é possível! Ex.: paz de El-Rei. Assegurava-se a paz, paz do concelho. Paz do mercado: se numa localidade houve uma feira, durante este tempo não pode haver uma vingança privada. Os feirantes e fregueses só usavam a paz.
- Tréguas: São acordadas ou impostas pelas pessoas de uma certa localidade. A Igreja proíbe a vingança privada. Trégua imposta pelas igrejas! Falamos de particulares: autotutela.
- Asilo: Ex.: na igreja, alguém que ofende é perseguido e os perseguidos refugiam-se na igreja. O perseguidor não entra na igreja porque proíbe a vingança privada. Alguém que é perseguido nos terrenos do vizinho. Direito de Asilo: dá pela casa, igreja, terreno vizinho.
Estas três grandes modalidades de reações à vingança privada mostram o incómodo (injustiça) da vingança privada (reação excessiva ou falta de reação).
Organização Judicial: Tipos de Tribunais
Estamos na época do Direito Comum. Já estamos na vivência do Direito e já temos universidades. O nosso território é invadido pelos Tribunais.
- Julgados: Tribunais em que o juiz é nomeado pelo rei. Encontram-se nas terras sujeitas à administração régia. Atuais Tribunais de Comarca.
- Senhoriais: Em que havia senhores. O juiz é o funcionário do senhor ou o próprio senhor. Julga os problemas dentro do território que é do senhorio.
- Concelhios: Tribunais dentro dos territórios que pertencem a um concelho. Os juízes são nomeados pela Assembleia Municipal. Nesta altura, também se admitia recurso.
- Tribunais Superiores:
A Casa de Justiça da Corte: é um tribunal ambulatório, isto é, porque acompanha o rei. A Casa Cível: tribunal fixo, primeiro funcionou em Santarém e depois funcionou em Lisboa. Veio do Reinado de Afonso V – Ordenações Afonsinas, mas depois mudou de nome para Casa da Suplicação. No século XIX, depois da Revolução Liberal, mudou de nome novamente para: Supremo Tribunal de Justiça.
Coletâneas Privadas e Leis Relevantes
Leis das Sesmarias
Perto de 1375, são atribuídas ao Rei D. Fernando. Os terrenos de cultura estavam abandonados! Terrenos sem cultivo significam fome! Os filhos dos agricultores deviam trabalhar nos campos. Os falsos mendigos deviam ir trabalhar também para os campos. Se os proprietários não pusessem os prédios a dar frutos, os prédios seriam confiscados. Esta lei fez com que os campos começassem a produzir. Assim, diminuíam as doenças!
Lei Mental
Cuja autoria se atribui ao nosso rei D. Duarte. Esta lei compreende-se também se tivermos em conta que o Rei português era muito pobre e a nobreza e o clero eram muito ricos. O rei era pobre porque dava as terras à nobreza e ao clero e ficava sem nada. Dava-as para a nobreza e o clero produzirem pão. Daqui se explica que o rei fosse pobre e a nobreza e o clero ricos. Esta lei procedeu à recuperação para a coroa da riqueza que tinha perdido. Se se verificassem vários princípios, as terras eram herdadas pelo filho do nobre herdeiro. Se não houvesse determinados princípios, as terras regressavam à coroa: Princípio da Progenitura, Masculinidade e Indivisibilidade.
As Ordenações
Ordenações Afonsinas (1446/7)
Não havia uma compilação oficial, não havia um livro de leis, um código, uma compilação. Havia muitas leis, mas eram dispersas, avulsas. Os tribunais queriam resolver problemas, mas não sabiam onde a lei estava. D. João I tinha sido eleito e com ele começou a segunda dinastia portuguesa. Tomou a iniciativa de mandar fazer uma obra, nomeando João Mendes (fez o livro I e a obra tem cinco livros). D. João morreu e sucedeu o Rei D. Duarte e depois João Mendes também morreu. D. Duarte nomeia Rui Fernandes que vem fazer os livros II, III, IV e V. A obra ficou completa em Arruda, hoje Arruda dos Vinhos, e não se sabe qual entrou em vigor em Portugal, se em 1446 ou 1447.
Dois autores: dois compiladores. A técnica ou estilo que utilizaram na feitura das nossas primeiras ordenações foi:
- João Mendes: estilo decretório (mais perfeito). Decreta-se. O estilo que hoje ainda se utiliza na elaboração de um Código Civil, ou seja, apresenta-se uma lei que passa a vigorar. Quem a desrespeita é sancionado!
- Rui Fernandes: estilo compilatório. Transmissão integral. Transcreve-se uma lei que já existia e no fim da transcrição confirma-se se a lei ainda está em vigor.
Sendo uma obra: Ordenações Afonsinas. Dois estilos, duas técnicas: porque foram feitas por autores diferentes. A ciência do direito regrediu (andou para trás), pois o estilo decretório é mais perfeito do que o segundo. Então, Rui Fernandes andou para trás.
Ordenações Manuelinas
Foram mandadas fazer pelo Rei D. Manuel I. Esta obra foi mandada fazer porque, primeiro, havia leis que já estavam desatualizadas; quando assim é, há que fazer algo atual. Estamos no século XVI (1500 e pouco) e tinha sido descoberta a imprensa, ou seja, nas Ordenações Afonsinas não havia imprensa. Na altura, faziam cópias à mão e eram enviadas a todos os concelhos do país, mas nem todos os concelhos conheceram as cópias. Utilizando a imprensa, seria oportuno fazer-se uma obra nova.
O Imperador Justiniano foi o criador da compilação do Corpus Iuris Civilis. Napoleão Bonaparte não é só conhecido pelas invasões francesas. Napoleão Bonaparte é conhecido também pelo Código Civil Francês, chamado Código de Napoleão. A obra ficou completa em 1514 e D. Manuel recusou a obra e não queria encontrar em nenhuma casa nenhuma compilação desta. Assim, a obra desapareceu! D. Manuel não gostava da obra, por isso, mandou prosseguir! Em 1521, D. Manuel aprovou a tão esperada obra. O que está nas Ordenações Afonsinas e não nas Ordenações Manuelinas são as Leis sobre Mouros e Judeus porque os Judeus e os Mouros foram obrigados a converter-se ou então tinham de sair do país.
Direito de Avoenga (Revisão)
O Direito de Avoenga é um direito de preferência, da família. Foi criado na época da Reconquista Cristã, antes da Fundação de Portugal. Dá preferência ao familiar na compra de bens. É o retrato familiar!
Regimes de Bens no Casamento
- Comunhão Geral de Bens: Todos os bens presentes e futuros dos cônjuges, incluindo os adquiridos antes e durante o casamento, tornam-se comuns ao casal.
- Regime de Separação de Bens: Os bens que cada cônjuge possuía antes do casamento e os que adquirir durante o casamento permanecem propriedade exclusiva de cada um. Não há bens comuns.
- Comunhão de Adquiridos: Os bens que cada cônjuge leva para o casamento são dele, e os bens que herda são só dele também (e vice-versa). São comuns apenas os bens adquiridos onerosamente durante o casamento.