O Iluminismo e as Grandes Revoluções do Século XVIII

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O Iluminismo no Século XVIII

O século XVIII é o século das Luzes ou do Iluminismo. Este conceito evoca, antes de mais, a luz da Razão (inteligência, esclarecimento). O raciocínio humano seria o meio de atingir o progresso em todos os campos (científico, social, político, moral). Por contraposição, os autores identificavam, nesta época, a ignorância com as trevas: Galileu, nomeadamente, refere a importância da linguagem matemática sem a qual "vagueia-se num labirinto, às escuras".

Pontos-Chave do Pensamento Iluminista

A corrente filosófica iluminista acreditava (na esteira do pensamento de John Locke, filósofo do século XVII) na existência de um direito natural – um conjunto de direitos próprios da natureza humana (e, como tal, naturais), nomeadamente:

  • A igualdade entre todos os homens;
  • A liberdade de todos os homens (em consequência da igualdade, "nenhum homem tem uma autoridade natural sobre o seu semelhante", escrevia Jean-Jacques Rousseau; porém, este direito natural não previa a abolição das diferenças sociais);
  • O direito à posse de bens (tendo em conta que o pensamento iluminista se identifica com os anseios da burguesia em ascensão);
  • O direito a um julgamento justo;
  • O direito à liberdade de consciência (a moral era entendida como natural, independente da crença religiosa).

O pensamento iluminista defendia, assim, que estes direitos eram universais, isto é, diziam respeito a todos os seres humanos e, por isso, estavam acima das leis de cada Estado. Os Estados deveriam, antes, usar o poder político como meio de assegurar os direitos naturais do Homem e de garantir a sua felicidade.

Paralelamente, o Iluminismo pugnava pelo individualismo: cada indivíduo deveria ser valorizado, independentemente dos grupos em que se integrasse.

O Caráter Revolucionário do Iluminismo

Destacam-se os seguintes pensadores iluministas pela sua perspetiva revolucionária de encarar o homem e a sociedade:

  1. Jean-Jacques Rousseau defende a soberania (poder político) do povo. É o povo que, de livre vontade, transfere o seu poder para os governantes mediante um pacto (ou contrato social). Consegue, desta forma, respeitar a vontade da maioria sem perder a sua liberdade. Em troca, os governantes têm de atuar com justiça, sob pena de serem depostos (obra de referência: O Contrato Social).
  2. Montesquieu defende a doutrina da separação dos poderes (legislativo, executivo e judicial) como garantia de liberdade dos cidadãos (obra de referência: O Espírito das Leis).
  3. Voltaire, entre outras contribuições importantes para o Iluminismo, advoga a tolerância religiosa e a liberdade de consciência: a religião que criou, o deísmo, rejeita as religiões instituídas, centrando-se na adoração a um Deus bom, justo e poderoso, Criador do Universo (obra de referência: Tratado sobre a Tolerância).

Estas ideias foram aplicadas na prática, nas revoluções liberais, sob a forma das constituições políticas.

Meios de Difusão do Pensamento Iluminista

O Iluminismo, apesar da oposição que sofreu na sociedade do seu tempo, foi-se difundindo graças a alguns apoios importantes, como sejam:

  • A admiração que alguns monarcas nutriam por estes novos ideais (Frederico II da Prússia, por exemplo, acolheu Voltaire na corte quando este estava exilado);
  • Os salões, espaços privados da aristocracia que se abriam ao debate das novas propostas filosóficas;
  • Os cafés, locais de aceso debate político-cultural e de apresentação de artistas;
  • A Maçonaria, sociedade secreta com origem na Inglaterra do século XVIII que pugnava pela liberdade política e pelo progresso científico;
  • O uso da língua francesa – conhecida dos intelectuais europeus – nas obras filosóficas editadas;
  • A Enciclopédia, publicada por Diderot e D'Alembert, que reunia em vários volumes os conhecimentos mais avançados da época sobre a ciência e a técnica e dava voz às propostas iluministas;
  • Os clubes privados, a imprensa e as academias, que faziam eco das novas propostas.

Iluminismo e a Desagregação do Antigo Regime

As ideias iluministas contribuíram para acabar com o Antigo Regime, pois:

  1. A defesa do contrato social transforma o súbdito passivo e obediente em cidadão interventivo; deste modo, e ao contrário do que acontecia no Antigo Regime, "um povo livre (...) tem chefes e não senhores" (Rousseau).
  2. A teoria da separação dos poderes acaba com o poder arbitrário exercido no Antigo Regime.
  3. A ideia de tolerância religiosa conduz à separação entre a Igreja e o Estado, presente nos regimes liberais.
  4. A teoria do direito natural leva a que os iluministas condenem todas as formas de desrespeito pelos direitos humanos (tortura, pena de morte, escravatura...), contribuindo para alterar a legislação sobre a justiça em vários países.

O Despotismo Iluminado: Absolutismo e Iluminismo

O despotismo iluminado foi a forma de poder real praticada no século XVIII em várias regiões da Europa, nomeadamente:

  • Na Prússia, com Frederico II;
  • Na Áustria, com José II;
  • Na Rússia, com Catarina II;
  • Na Suécia, com Gustavo III;
  • Em Portugal, com D. José I.

Sob o despotismo iluminado ou esclarecido, o rei tinha poder absoluto (era um déspota), mas justificava a sua autoridade através do pensamento iluminista. O rei, iluminado pela razão e apoiado pelos filósofos iluministas, propunha-se reorganizar o reino para o bem público e o progresso.

Este regime permitiu, por um lado, o reforço do poder que os monarcas pretendiam e, por outro lado, a aplicação prática dos princípios iluministas desejada pelos filósofos.

As Medidas Pombalinas e o Pensamento Setecentista

Na lógica do despotismo iluminado do século XVIII, o Marquês de Pombal, enquanto Secretário de Estado do rei D. José I, levou a cabo a reforma do reino em diversas áreas, em todas trabalhando para o reforço do poder régio e o controlo das classes privilegiadas.

  1. Instituições de centralização do poder: o Erário Régio, que centralizava a receção das receitas públicas e a sua redistribuição por todas as despesas; a Intendência-Geral da Polícia, criada no âmbito da reforma judicial que uniformizou a justiça em termos territoriais (submetendo o direito local ao direito nacional) e sociais (retirando à nobreza e ao clero antigos privilégios); a Real Mesa Censória, organismo do Estado que retirava a função de censura da alçada da Igreja (subordinando o Tribunal do Santo Ofício à Coroa).
  2. Principais episódios da repressão exercida sobre o clero e a nobreza: o suplício dos Távora (família da alta nobreza, opositora a Pombal, que foi executada por suspeita – infundada, pelo que se pôde apurar no reinado de D. Maria I – de tentativa de regicídio); a expulsão da Companhia de Jesus, de Portugal e das suas colónias (pois os jesuítas controlavam a missionação e o ensino).
  3. Ação urbanística: A reconstrução da cidade de Lisboa após o sismo de 1 de Novembro de 1755, entregue aos engenheiros Manuel da Maia e Eugénio dos Santos, foi orientada de acordo com o racionalismo iluminista da época. Este ditou as seguintes características:
    • Traçado geométrico;
    • Ruas largas e retilíneas;
    • Subordinação dos projetos particulares à unidade do conjunto (subordinando toda a sociedade a um mesmo projeto);
    • Sentido prático (evidenciado, por exemplo, no sistema da "gaiola", antissísmico);
    • Valorização da burguesia (transformação do Terreiro do Paço em Praça do Comércio).
  4. Reforma do ensino: Os estrangeirados (portugueses que, vivendo no estrangeiro, traziam para Portugal as ideias iluministas) foram acolhidos pelo Marquês de Pombal. Ribeiro Sanches, Luís António Verney e Martinho de Mendonça foram alguns dos estrangeirados que mais influenciaram a reforma do ensino. Esta pautou-se pelas seguintes medidas:
    • Criação do Real Colégio dos Nobres (para preparação dos filhos da nobreza de acordo com as novas conceções pedagógicas);
    • Criação da Aula do Comércio para os filhos dos burgueses;
    • Fundação das Escolas Menores, entre elas as de ler, escrever e contar, que eram oficiais e gratuitas;
    • Instituição de várias classes de Latim, Grego, Filosofia, Retórica, para preparação para a Universidade;
    • Reforma da Universidade de Coimbra, a qual foi dotada de novos estatutos.

Este novo ensino era alargado a um conjunto mais vasto da população e aberto às novas ideias da ciência experimental, de acordo com a Filosofia das Luzes; além disso, servia o propósito de preparar uma elite culta, de apoio à governação, colmatando a ausência dos jesuítas.


A Revolução Americana: Uma Revolução Fundadora

Diversidade e Unidade das Colómias Inglesas na América do Norte

No século XVIII, a Inglaterra possuía 13 colónias na costa oriental da América do Norte. Estas colónias estavam unidas:

  • Por uma mesma língua (o inglês);
  • Pela religião (protestante);
  • Pela luta contra os índios e Franceses;
  • Pela submissão à Coroa Britânica (Rei Jorge III) e ao Parlamento inglês.

Porém, também existiam fatores de diversidade:

  • As colónias do Norte e do Centro tinham como base económica a agricultura complementada pela pesca, criação de gado, comércio e indústria. Eram, também, constituídas por comunidades mais tolerantes;
  • As colónias do Sul especializaram-se na plantação do tabaco e do algodão, assente na exploração de mão de obra escrava.

Se, por um lado, os fatores de união podem ter favorecido a criação, em 1776, de um país novo e independente (os Estados Unidos da América), por outro lado, os fatores de diversidade podem ajudar-nos a compreender as hesitações na escolha de um modelo político após a independência: dever-se-ia escolher um governo central forte ou uma federação descentralizada? A formação, ainda que lenta, de uma consciência nacional levaria os Americanos a optar pela existência de um governo geral.

Conflito Económico entre Inglaterra e Colómias (1763)

Os principais motivos de descontentamento dos colonos americanos prendiam-se com questões económicas:

  • A Guerra dos Sete Anos, que estendera ao território americano os conflitos entre Franceses e Ingleses, terminou com a vitória inglesa (Tratado de Paris). No entanto, em troca da proteção concedida aos colonos, a Inglaterra sobrecarregou-os com impostos, de maneira a recuperar do esforço de guerra. Entre 1764 e 1767, o Parlamento Britânico decretou taxas aduaneiras sobre a importação de certos produtos (papel, vidro, chumbo, melaço, chá) e criou um imposto de selo.
  • A região que os colonos reivindicavam, a oeste, para se expandirem territorial e economicamente, foi considerada propriedade dos índios pelo governo britânico.
  • Os colonos americanos tinham falta de liberdade comercial: só podiam exportar os seus produtos para Inglaterra ou para outras colónias inglesas e só podiam importar mercadorias europeias por intermédio de Londres (teoria do exclusivo comercial).

A Revolução Americana deu início a uma vaga de revoluções liberais que ocorreram entre os séculos XVIII e XIX e que puseram fim ao sistema de Antigo Regime baseado no absolutismo e na sociedade de ordens. Estes movimentos instituíram a soberania popular, a separação de poderes, a livre iniciativa económica, a tolerância religiosa e a descolonização.

O Apoio Francês à Independência Americana

Apesar da aprovação da Declaração de Independência pelas colónias, os conflitos prosseguiram, sob o comando de George Washington. O apoio francês (em armas, soldados, dinheiro e barcos) surgiu em 1778 e justifica-se pela vontade de desforra deste país em relação à derrota na Guerra dos Sete Anos.

Foi graças ao apoio da França, da Espanha (aliada da França na Guerra dos Sete Anos) e à ação diplomática na Europa que a vitória sobre os Ingleses se tornou possível.

Em 1783, colonos e Ingleses assinaram o Tratado de Versalhes, no qual a Inglaterra reconhecia a independência das 13 colónias. Nesse momento, os Franceses puderam, também, sentir o sabor da vitória, recuperando alguns dos territórios perdidos em 1763.

Ideais Iluministas na Declaração de Independência e Constituição

A Declaração de Independência de 1776 justifica a rutura relativamente à Inglaterra com base nos pressupostos iluministas:

  • Defende o direito à igualdade e à independência como "Lei da Natureza";
  • Proclama, como direitos "inalienáveis" e concedidos por Deus, "a Vida, a Liberdade e a procura da Felicidade";
  • Institui a soberania popular com base em "governos, cujo justo poder emana do consentimento dos governados";
  • Prevê o direito de os povos deporem um governo que não os represente e de "instituir um novo governo";
  • Rejeita o "despotismo absoluto".

Em 1787, a Constituição definiu o modelo político do novo estado independente: foi instituída a República dos Estados Unidos da América, um conjunto de Estados federados com alguma autonomia mas obedientes a um Estado Central forte. Neste diploma foram aplicados, na prática, pela primeira vez, os ideais iluministas.

  • A divisão tripartida dos poderes, pensada pelo filósofo iluminista Montesquieu, foi aplicada da seguinte forma: o poder legislativo foi entregue ao Congresso, composto pela Câmara dos Representantes e pelo Senado (que reúnem no edifício do Capitólio, em Washington); o poder executivo coube ao Presidente dos Estados Unidos da América (residente na Casa Branca, em Washington, desde 1800) e o poder judicial passou a pertencer a um Tribunal Supremo e a tribunais inferiores;
  • Foram consignadas as liberdades e garantias dos cidadãos;
  • Foi consagrada a soberania nacional, nomeadamente pela possibilidade de exercer o direito de voto.

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A França nas Vésperas da Revolução

Nas vésperas de 1789, a França é fortemente marcada por uma conjuntura económica e financeira depressiva e pelo agravamento das tensões sociais que caracterizaram o século XVII, num tempo em que as correntes de opinião adversas à monarquia absoluta ganhavam cada vez mais adeptos em consequência do triunfo de uma nova ordem política e social nos Estados Unidos da América, desde 1776.

A Conjuntura Cultural e Mental

O pensamento iluminista e os princípios liberais a que veio dar origem encontraram na França do século XVIII um fértil campo para a sua proliferação. Foi, com efeito, em França que mais se fizeram sentir as influências do racionalismo iluminista na alteração dos quadros mentais e dos comportamentos.

A descristianização dos costumes alteração dos quadros mentais e dos comportamentos.

O Anacronismo das Estruturas Sociais Francesas

Estamos perante um anacronismo quando, numa determinada época, existem características que deveriam pertencer a outra: era o caso da sociedade francesa do século XVIII, ainda muito ligada às estruturas de Antigo Regime. Persistiam, assim, as seguintes características sociais:

  • A alta burguesia era superior às ordens tradicionalmente privilegiadas (clero e nobreza) em riqueza e instrução, contudo, não tinha acesso aos altos cargos da administração pública, do exército e da hierarquia religiosa, para os quais se exigia prova de nobreza;
  • Os camponeses, apesar de constituírem a maioria da população (cerca de 80%), continuavam na miséria, pois não eram detentores das terras que trabalhavam e ainda tinham de pagar impostos;
  • Os trabalhadores das cidades recebiam baixos salários;
  • A nobreza mantinha um estilo de vida ocioso e frívolo; porém, detinha a maior parte da propriedade fundiária, os postos mais importantes e estava isenta do pagamento de impostos;
  • O clero possuía terras, recebia rendas e a dízima (1/10 de toda a produção agrícola), no entanto, tal como a nobreza, não pagava impostos.

Esta situação de profunda injustiça social foi, então, uma das causas da Revolução Francesa.

A Crise Económico-Financeira Francesa

Nas vésperas da Revolução, a França era afetada por uma crise económica motivada pelos seguintes fatores:

  • O aumento do preço do pão, em virtude de maus anos agrícolas;
  • A quebra de produção têxtil, não só devido ao aumento do preço do pão (que limitava a capacidade de aquisição de outros produtos pelas famílias), mas também por causa do Tratado de Eden, de 1786;
  • As despesas do Estado com o exército, as obras públicas, a dívida pública e o luxo da corte, que originavam um défice constante, já que o clero e a nobreza não contribuíam para as receitas do Estado (pois não pagavam impostos).

Podemos considerar a crise económico-financeira como o segundo fator que conduziu à Revolução.

O Fracasso das Tentativas Políticas de Reforma

Perante a crise económico-financeira, o poder político tinha de agir. O rei Luís XVI, monarca absoluto, rodeou-se de ministros para o auxiliarem: Turgot, Necker, Calonne e Brienne propuseram, sucessivamente, reformas no intuito de solucionar a crise. Porém, a conclusão a que chegavam era sempre a mesma: a única maneira de obter mais receitas para o Estado passaria por fazer com que as ordens privilegiadas também pagassem impostos. Ora, o clero e a nobreza opuseram-se terminantemente às tentativas de redução dos seus privilégios.

A própria rainha Maria Antonieta, chamada pelo povo "Madame Défice" devido às suas despesas com a corte, contribuiu para que os ministros fossem despedidos.

Foi num clima de agitação popular e de oposição política das ordens privilegiadas que Luís XVI resolveu convocar os Estados Gerais (reunião dos representantes das diversas ordens sociais), enquanto se elaboravam os Cadernos de Queixas (registo dos anseios da sociedade francesa).

A Transformação dos Estados Gerais em Assembleia Constituinte

A reunião dos Estados Gerais, em maio de 1789, iniciou-se, desde logo, com uma questão controversa: a votação das propostas deveria fazer-se por cabeça (cada deputado, um voto) ou por ordem (cada grupo social, um voto)?

Se a votação por cabeça ganhasse, os deputados do Terceiro Estado, maioritários, fariam valer as suas propostas; porém, se a votação se fizesse por ordem, as duas ordens privilegiadas (clero e nobreza) poderiam unir-se, dado que tinham interesses convergentes, na defesa do seu estatuto.

Perante este impasse e a indecisão de Luís XVI, os deputados do Terceiro Estado (juntamente com alguns deputados do clero e da nobreza que partilhavam das mesmas ideias) reuniram-se à parte, na sala do Jogo da Péla, onde juraram, em junho de 1789, não se separarem até que estivesse pronta uma Constituição. Devido a este ato revolucionário (conhecido por "Juramento da sala do Jogo da Péla"), os Estados Gerais transformaram-se em Assembleia Nacional Constituinte (uma assembleia destinada a redigir uma Constituição): era o fim do absolutismo e o início da Nação soberana.

Abolição dos Direitos Feudais e o Fim do Antigo Regime

Entretanto, nas ruas, o povo realizava a sua revolução: a 14 de julho de 1789, em Paris, a Bastilha (fortaleza para os presos políticos do absolutismo) foi destruída pelo povo e pela Guarda Nacional (milícia composta por burgueses). A tomada da Bastilha ficaria, para sempre, conhecida como o símbolo máximo da Revolução Francesa, acontecimento comemorado todos os anos, em França, no dia 14 de julho.

Por toda a França, os camponeses revoltavam-se violentamente contra os senhores das terras e contra os encargos feudais (movimento denominado por "Grande Medo").

Face ao descontentamento popular, a Assembleia Nacional Constituinte produziu, em agosto de 1789, diplomas legais que aboliam os direitos feudais (como a dízima à Igreja e o trabalho gratuito – corveias – prestado aos nobres) "aclamando o povo" para atingir a "tranquilidade pública", como dizia, então, o presidente da Assembleia. Ao instaurarem a igualdade de todos perante a lei, nomeadamente no livre acesso aos empregos públicos, estes decretos destruíram a sociedade de ordens, assente nos privilégios da nobreza e do clero.

No ano seguinte (1790) a Assembleia aprovou um documento polémico – a Constituição Civil do Clero – que transformava os membros do clero secular em funcionários do Estado, extinguia o clero regular e procurava salvar a economia francesa com os bens confiscados à Igreja, que constituíam a garantia dos novos títulos de papel-moeda (os assinados).

Significado da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão

Ainda durante a etapa da Assembleia Constituinte (1789-1791), os deputados elaboraram a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, um documento de inspiração iluminista, fundamental, não só para a Revolução Francesa mas também para todos os movimentos revolucionários que esta inspirou. Os aspetos mais importantes da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão são:

  • A proclamação do fim da sociedade de ordens ("Os homens nascem e são livres e iguais em direitos");
  • A salvaguarda dos direitos naturais do homem ("A liberdade, a propriedade, a segurança e a resistência à opressão");
  • A defesa da soberania popular contra o absolutismo ("O princípio de toda a soberania reside essencialmente na Nação");
  • A proteção dos cidadãos pela lei ("Tudo aquilo que não é proibido pela lei não pode ser impedido [...]. Ninguém pode ser acusado, preso ou detido senão nos casos determinados pela lei");
  • A tolerância religiosa ("Ninguém pode ser inquietado pelas suas opiniões, incluindo opiniões religiosas");
  • A liberdade de expressão ("Todo o cidadão pode, portanto, falar, escrever, imprimir livremente)";
  • A defesa da burguesia e do direito à propriedade privada ("A propriedade é um direito inviolável e sagrado").

Pela alteração profunda que este documento provocou nas estruturas sociais e políticas de Antigo Regime, podemos relacioná-lo com o início de um novo período histórico: a Época Contemporânea.

Características da Monarquia Constitucional

Em setembro de 1791 foi aprovada a Constituição. O rei tinha de obedecer a este documento fundamental, pelo que designamos a nova etapa (1791-92) por monarquia constitucional. Esta caracterizou-se por:

  • Separação dos poderes: o poder legislativo era entregue à Assembleia Nacional Legislativa (composta por 745 deputados), o poder executivo pertencia ao rei (que podia vetar as leis durante dois anos: veto suspensivo) e o poder judicial cabia a juízes eleitos e a um Tribunal Superior;
  • Instituição da soberania nacional (é a Nação quem escolhe os governantes, através do voto – sistema representativo);
  • Consagração dos Direitos do Homem e do Cidadão;
  • Manutenção da distinção pela riqueza (o processo de eleição dos deputados da Assembleia Legislativa era indireto e realizado através do sufrágio censitário: apenas os homens mais ricos, que pagavam um imposto – ou censo – igual ou superior a três dias de trabalho, podiam votar; eram estes cidadãos ativos quem podia escolher os verdadeiros eleitores, os quais, por sua vez, eram aqueles que tinham riqueza suficiente para pagar um imposto igual ou superior a dez dias de trabalho).

Da Monarquia à República

A República foi proclamada em setembro de 1792. Dois fatores, em especial, precipitaram o fim do regime monárquico na França:

  • A tentativa de fuga do rei, em 1791, com o objetivo de ser acolhido no estrangeiro por um país de regime absoluto, e o seu regresso humilhante a Paris, apenas serviram para acelerar a instituição da República, forma de governo que, até então, não fora defendida;
  • A guerra da França, em abril de 1792, contra os estados absolutistas que queriam restituir o poder a Luís XVI (Áustria, Prússia) agravou os problemas económicos e contribuiu para o radicalismo político: os federados (milícias defensoras da Revolução) acorreram a Paris, assaltaram as Tulherias e o rei foi suspenso pela Assembleia Legislativa em agosto de 1792, terminando, assim, a monarquia constitucional.

O fim da monarquia viria a consumar-se em 1793 quando, após um julgamento de 26 horas, Luís XVI foi condenado à morte na guilhotina.

A Convenção, os Sans-Culottes e os Ideais Jacobinos

A etapa da Convenção republicana (1792-1795) foi marcada pela divisão entre duas fações políticas: por um lado os Girondinos, por outro lado os Montanheses (estes últimos liderados por Marat, Danton e Robespierre). Apesar de todos terem ligações ao Clube dos Jacobinos (clube de burgueses revolucionários), os Montanheses eram mais radicais. Eram apoiados pelos chamados sans-culottes. Estes eram membros das classes populares, artesãos, lojistas e operários que não tinham rendimentos suficientes para se tornarem cidadãos ativos (pois vigorava o sufrágio censitário) mas exprimiam as suas reivindicações em clubes, debates e através de petições (propostas aos poderes públicos). Tratavam a todos por tu e vestiam-se de maneira característica.

Foi devido à pressão dos sans-culottes que os Girondinos (e os burgueses, seus apoiantes) foram afastados do poder em 1793 e o rei foi condenado à morte, sentença que Robespierre considerava "uma medida de salvação pública". Os Montanheses estavam, então, livres para instaurar medidas que agradavam aos sans-culottes, tais como:

  • A Lei do Máximo (que fixava preços e salários);
  • A abolição total do feudalismo;
  • A instrução gratuita e obrigatória;
  • A partilha, pelos mendigos, de bens retirados aos "suspeitos" de oposição à Revolução;
  • As leis de assistência social (por exemplo, abonos de família);
  • A abolição da escravatura nas colónias (1794).

O Período do Terror

O Terror designa a fase mais radical e violenta da Revolução Francesa, ocorrida em 1793-1794. A Convenção, que desempenhava o poder legislativo, criou um governo centralizado e ditatorial: o poder executivo pertencia a dois Comités:

  • O Comité de Segurança Geral e o Comité de Salvação Pública, cujos membros dependiam da aprovação mensal da Convenção para se manterem em funções.
  • O Comité de Segurança Geral prendia os suspeitos de contrarrevolução e entregava-os a um Tribunal Revolucionário. Na verdade, a Lei dos Suspeitos, de 1793, traduziu-se pela legalização da violência: todos podiam ser suspeitos, quer "pelas suas conversas ou escritos", quer por não possuírem "o certificado de civismo", por serem "familiares dos nobres" ou porque haviam emigrado. Após um julgamento sumário (breve e sem hipótese de defesa, uma vez que nem sequer eram inquiridas testemunhas) as vítimas do Terror eram encarceradas e, na maior parte das vezes, executadas pela guilhotina (inventada em 1789).

Uma outra faceta do Terror consistiu na política de descristianização (movimento antirreligioso). O governo revolucionário instituiu um Estado laico (não religioso). As marcas do cristianismo foram apagadas:

  • O poeta Fabre Églantine criou um novo calendário, que situava o ano I na data da proclamação da República pela Convenção (1792) e criava novos nomes para os meses do ano;
  • A hierarquia religiosa era ridicularizada;
  • Os padres refratários eram perseguidos;
  • O culto dos santos foi substituído pelo culto aos mártires da revolução (por exemplo, a Marat, herói dos sans-culottes, assassinado no banho por uma jovem girondina);
  • O casamento religioso passou a ato civil, o divórcio foi autorizado (através da Lei do Casamento e do Divórcio).

Para compensar a aniquilação do cristianismo, Robespierre criou um culto ao Ser Supremo, porém, uma boa parte da população francesa, fiel à religião católica, afastou-se da revolução. Os confrontos fizeram-se sentir, em 1793, na região da Vendeia, onde monárquicos e católicos tentaram a contrarrevolução (sem sucesso).

O Fim da República Jacobina

A república jacobina teve o seu fim em julho de 1794 quando Robespierre, responsável por inúmeras condenações à morte foi, ele mesmo, guilhotinado em resultado de uma conspiração da Convenção. O extremismo desta etapa foi responsável pelo seu fracasso.

A Ação do Diretório

A etapa do Diretório (1795-1799) já foi descrita como a "anti-convenção", no sentido em que novo regime se opôs à ditadura de Robespierre e procurou restabelecer a concórdia social. Assim, de acordo com a nova Constituição de 1795:

  • O poder executivo era entregue a cinco diretores (o Diretório);
  • O poder legislativo pertencia a duas assembleias interdependentes – o Conselho dos Anciãos (que propunha as leis) e o Conselho dos Quinhentos (que votava as leis);
  • O sufrágio censitário indireto era restabelecido.

Em termos sociais, o fim do Terror jacobino e de todas as suas instituições exprimiu-se através de um ambiente de festas e de luxo (apesar dos problemas económicos decorrentes da guerra contra a Europa), bem como da adoção de uma moda extravagante.

A Ascensão de Napoleão Bonaparte

O golpe do 18 de Brumário do Ano VIII (09.11.1799), por Napoleão Bonaparte, acabou com o Diretório, dando início à etapa do Consulado (1799-1804). Uma nova Constituição (de 1799), entregou o poder a Napoleão, que exercia o cargo de primeiro-cônsul.

A obra do Consulado assentou nas seguintes medidas:

  • Centralização administrativa e judicial (os juízes e os funcionários locais eram nomeados pelo governo; o Código Civil de 1804 unificava a França em termos legais);
  • Recuperação financeira (criação do Banco de França, em 1800, e emissão de uma nova moeda – o franco germinal);
  • Reconciliação nacional (fim das perseguições políticas; Concordata com a Santa Sé, em 1801).

No entanto, Napoleão não abandonou o cargo de primeiro-cônsul ao fim de dez anos, como estava previsto; conseguiu que a Constituição de 1802 o tornasse cônsul vitalício e, em 1804, foi proclamado Imperador, autocoroando-se na Igreja de Notre-Dame, em Paris. Iniciava-se, então, a etapa do Império Napoleónico (1804-1815).

Figura de contornos míticos na história mundial, Napoleão teve um percurso político pautado por vitórias militares (destacando-se as campanhas da Itália, em 1796/97 e do Egito, em 1798), e derrotas sucessivas (1812-1815), acabando por se retirar da cena política e exilar-se de França.

A Consolidação da Revolução Burguesa

A Revolução Francesa começou por ser uma revolta do Terceiro Estado que, nas palavras do contemporâneo Abade Sieyes, queria ser "tudo". A Bastilha, símbolo da prepotência do regime absolutista, foi tomada pelo povo e por burgueses, as estruturas do Antigo Regime foram desmanteladas, a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão exprimia o ideal político burguês.

Durante a época da Convenção, o poder passou, efetivamente, para as mãos do povo: os sans-culottes conseguiram que o sufrágio direto fosse instaurado e a política de condenação de todos os suspeitos, encarnada por Robespierre, representou a vingança extremada do povo contra os séculos de repressão das ordens privilegiadas.

Assim, para defender a revolução, a Convenção impôs o despotismo, o Terror. Seguiu-se-lhe o Diretório que, preocupado em impedir uma nova tirania, instituiu a renovação periódica dos cargos e a distribuição dos poderes. Nesse processo, restituiu a chefia da nação aos burgueses.

Finalmente, Napoleão Bonaparte, para além de ser considerado um militar brilhante, destacou-se como legislador ativo, consolidando os direitos da burguesia, nomeadamente através:

  • Do Código Civil de 1804, que assegurava a proteção à propriedade privada;
  • Da criação dos liceus, em 1802, que permitia preparar os filhos dos burgueses para os cargos do Estado.

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