Indemnização por Dano de Morte: Transmissibilidade e Aquisição Originária

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Não se trata aqui do direito à indemnização às pessoas que a lei reconhece pelo sofrimento causado pela perda dessa pessoa, direito este que é adquirido autónoma e originariamente pelas pessoas referidas no art. 496.º, n.º 2, do CC. O direito de indemnização transmissível por morte é o direito adquirido pela pessoa que veio a falecer em decorrência do dano, relacionado com o seu próprio sofrimento e dor ao enfrentar a morte, adquirido no momento da lesão e no momento da morte. Contudo, surgem maiores dúvidas relativamente à titularidade do direito à indemnização do dano de morte nos termos do art. 496.º, n.º 3, 2.ª parte. A doutrina e a jurisprudência dividem-se quanto à sua transmissibilidade.

Para alguns autores, como Galvão Telles, a perda do bem vida constitui um dano indemnizável e a correspondente indemnização integra a herança do falecido, sendo, por isso, transmissível mortis causa. Nesta linha, também Jorge Duarte Pinheiro entende que o momento determinante é o da lesão que origina a morte, momento que precede a extinção da personalidade jurídica. Com base no art. 564.º do CC, admite uma construção retroativa da aquisição do direito à indemnização. Capelo de Sousa acompanha esta posição.

Por outro lado, Pamplona Corte Real recusa a indemnizabilidade do dano morte por considerar que o direito não pode ser adquirido por quem perde, no mesmo instante, a personalidade jurídica. Ou seja, o falecido não pode simultaneamente adquirir e perder um direito. Já Pereira Coelho defende a indemnização do dano morte, mas considera que o direito é adquirido originária e diretamente pelas pessoas referidas no art. 496.º, n.º 2 do CC, não havendo, portanto, transmissão sucessória.

Trata-se de um direito autónomo e iure proprio atribuído pela lei a determinadas pessoas, e não um direito que transita da esfera jurídica do falecido para os herdeiros. Em nosso entender, o direito à indemnização pelo dano de morte não chega a integrar o património da vítima, não sendo, por isso, suscetível de transmissão. Esta posição é a mais coerente com a sistemática da responsabilidade civil extracontratual, com a história legislativa e com a natureza do direito previsto no art. 496.º, n.ºs 2 e 3. À semelhança do regime dos seguros de vida, estamos perante uma aquisição originária por parte das pessoas identificadas pelo legislador, e não perante um fenómeno sucessório. Concluímos, assim, que o direito à indemnização pelo dano morte é atribuído iure proprio às pessoas referidas no art. 496.º, n.º 2, do Código Civil.

O dano morte (art. 496º) insere-se no âmbito do direito das sucessões, mais concretamente na definição dos direitos transmissíveis mortis causa. De acordo com a regra geral, são transmissíveis em absoluto as situações jurídicas patrimoniais, tanto inter vivos como mortis causa, ao passo que as situações jurídicas de natureza pessoal ou não patrimonial são, em regra, intransmissíveis. No entanto, existem exceções, nomeadamente no domínio da responsabilidade civil. O direito de indemnização por danos patrimoniais é, em princípio, transmissível mortis causa. Já quanto aos danos não patrimoniais, a transmissibilidade tem sido objeto de controvérsia. Esta controvérsia funda-se sobretudo no caráter pessoal dos danos e na alegada injustiça de permitir que sucessores possam reclamar uma indemnização por sofrimentos que não experienciaram. Contudo, o art. 496.º, n.º 3, 1.ª parte, ao remeter para o art. 494.º, permite a fixação equitativa da indemnização, segundo as circunstâncias do caso.

Como salienta Pereira Coelho, o direito de indemnização por danos não patrimoniais tem natureza patrimonial e não está legalmente limitado à pessoa do lesado. Assim, deve entender-se que, caso o direito à indemnização por danos não patrimoniais se encontre já na esfera jurídica do autor da sucessão à data da sua morte, esse direito transmite-se aos seus herdeiros, mesmo que ainda não tenha sido judicialmente exercido. Caso o falecimento ocorra durante o processo judicial, a posição processual transmite-se nos termos da lei adjetiva. É objeto do direito das sucessões o direito de indemnização por morte, compreendendo os direitos patrimoniais e morais decorrentes do dano morte, sendo transmissível por morte o direito que a pessoa então falecida adquiriu em vida que originou o seu falecimento, como sucede, por exemplo, num acidente de viação.

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