Kant: Contrato Social, Soberania e Razão Prática

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O pensamento político de Kant faz parte da tendência conhecida como contratualismo. Sua filosofia surge em um clima de otimismo característico do período Iluminista e reflete as influências de teóricos importantes como Montesquieu, Rousseau e Hobbes. Com efeito, Kant, em sua filosofia prática, introduziu a ideia de contrato social que conheceu através do trabalho de Rousseau.

No entanto, as duas abordagens não representam um salto quântico. Para Kant, o contrato social é uma ideia reguladora da razão prática, um pressuposto fundamental. O contrato social é, portanto, um padrão em si mesmo, uma ideia da razão com um relacionamento prático, pois obriga o legislador a agir "como se" as leis que dita pudessem nascer da vontade geral de todos. A vontade geral e a ideia de contrato social representam, portanto, um ideal de razão. Isso significa que a hipótese não é histórica, nem algo que possa ser realizado de forma utópica, mas sim um ponto de referência para legitimar ou deslegitimar as práticas de regulação política reais.

A Ideia de Soberania: Kant versus Rousseau

Há outra diferença importante na ideia de soberania. Para Rousseau, a soberania reside no povo; o verdadeiro soberano é a vontade unida de todos, de modo que o próprio povo, sujeito às leis, deve ser o legislador delas. A comunidade inteira é o legislador.

Para Kant, o monarca soberano, ou os deputados, é eleito pelo povo, pelos cidadãos. Os legisladores são representantes do povo, ao contrário de Rousseau. No entanto, Kant distingue entre cidadãos passivos e ativos, concedendo o direito de participação política apenas aos cidadãos ativos. A base dessa distinção é a independência econômica dos indivíduos. Assim, o cidadão ativo, que não depende dos outros para sobreviver, pode participar na escolha de seus representantes políticos. Os cidadãos passivos (funcionários, mulheres e crianças) são excluídos da participação política, podendo apenas dar seu consentimento à lei.

O Contrato Social e o Estado de Natureza em Hobbes

A concepção kantiana do contrato social também apresenta semelhanças e diferenças com o contratualismo que Hobbes desenvolveu um século antes. Para ambos os autores, a necessidade do contrato social deve-se à situação de guerra e violência entre os homens. Kant, neste ponto, afasta-se de Rousseau, que acreditava que o homem no estado de natureza é bom e que é a sociedade que o corrompe.

No estado de natureza, o homem não é calmo e bom, mas sim, como advertiu Hobbes,"o lobo do home". Essa situação de violência exige a paz. Sob a perspectiva kantiana, a paz torna-se um dever moral. Esta é a principal diferença: Kant exige a razão prática para evitar a guerra e buscar a paz. Alcançar o estado civil é uma obrigação moral. Em Hobbes, não há dever moral, mas simplesmente a necessidade e o interesse de salvaguardar a vida.

Limitação do Poder Soberano

Há outra diferença importante entre Kant e Hobbes sobre o papel do soberano. Enquanto o soberano de Hobbes tem poder ilimitado, o soberano de Kant é sempre limitado pela ideia do contrato social e pela ideia da vontade geral, que o força a ditar suas leis como se fossem resultado da vontade unida do povo.

A Divisão de Poderes Segundo Montesquieu

Outro autor importante mencionado é Montesquieu. Kant adota dele um elemento essencial: a divisão dos poderes (legislativo, executivo e judicial). Tal divisão é crucial, pois garante que as formas de governo não se tornem arbitrárias.

Se não houver forças que se oponham aos meios do soberano (onde tanto o Exército quanto a lei e sua implementação estão do seu lado), o governo degenera em autoritarismo e nos caprichos dos governantes. A oposição das autoridades é fundamental para a proteção dos direitos, e a história tem demonstrado que a ausência de tal oposição leva a estados totalitários. Assim, Montesquieu defendia uma forma legal de organização política baseada no equilíbrio de poderes.

Legado Kantiano: A Conexão com J. Rawls

Podemos concluir observando a estreita ligação que o pensamento político de Kant mantém com autores contemporâneos como John Rawls. Rawls aborda a ideia transcendental kantiana do contrato social em sua obra Uma Teoria da Justiça, confrontando posições neoliberais sobre o papel do Estado na distribuição equitativa dos bens sociais.

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