Ortega y Gasset: Filosofia, Vida e Contexto Histórico
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A Filosofia de José Ortega y Gasset
Ortega concebe a filosofia como uma forma de lidar com tudo no universo, seja real ou irreal. Ele não confia em suposições prévias à filosofia que será desenvolvida, mas tenta ir além do que é dado e suas aparências. Tanto a autonomia quanto a busca do universal devem ser baseadas na clareza, pois a filosofia é conhecimento teórico, que faz uso de conceitos e busca a transparência.
Ortega critica tanto a filosofia pré-moderna (o realismo) quanto o idealismo, a filosofia que se desenvolveu a partir de Descartes.
Crítica ao Realismo e Idealismo
No Realismo, a filosofia anterior a Descartes, a realidade é entendida como o conjunto de coisas que existem independentemente do sujeito. Esta realidade é algo acabado, estático, e explica os conceitos de essência ou substância. Além disso, no Realismo, o sujeito é mais uma coisa a ser absorvida pelo mundo.
Ele critica também o idealismo, a filosofia que surge com Descartes. No idealismo, o conhecimento da realidade baseia-se no sujeito, chegando a afirmar que todas as realidades não são nada mais do que ideias sobre o sujeito. No idealismo, as coisas são absorvidas pelo próprio sujeito (subjetividade). Além disso, esse sujeito é em si uma substância estática que não evolui com o tempo.
Ambos se contentam com meias verdades: as coisas, incluindo os seres humanos, não são algo fixo e imutável; por sua vez, a consciência, as ideias, não são isoladas, implicam sempre pensar em alguma coisa, na realidade das coisas. A realidade não é a natureza ou a consciência, é a relação entre o sujeito e o mundo, na qual as duas coisas estão subordinadas, como se fossem ideias. Ortega chama a esta 'realidade radical'. Para Ortega, a realidade real é o 'eu com as coisas', não sendo algo que eu não termino, nem as coisas independentes, mas dependente tanto na sua formação quanto no seu desenvolvimento.
A Vida como Realidade Radical
Esta relação mútua entre sujeito e objeto se dá na vida, sendo este o fundamento de toda a realidade. Tanto o eu quanto o mundo são mutuamente constitutivos ao longo da vida, da minha vida. Assim, a vida é a 'Realidade Radical'.
Ortega refere-se à Vida como um 'eu' que tem de viver em uma determinada circunstância, dependendo do seu ambiente, e, nesta ocasião, uma série de elementos que ele chamou de 'crenças'. As crenças são as ideias ou pensamentos que temos sobre as coisas, que são de conteúdo intelectual puro, e as crenças são o caminho que a sociedade dispõe para a continuidade de suas criações (isto é, a vida humana se realiza dentro dos limites estabelecidos pela história). Desta forma, a vida é primordial, mas assim também é a razão, pois é a única que pode esclarecer a sua própria vida.
Raciovitalismo e Perspectivismo
O Raciovitalismo é onde a razão não é algo fora ou antes da vida, algo que existe de forma abstrata, "pura" ou "a priori", mas é encontrada na vida concreta de cada um. É, portanto, uma razão vital e pessoal, mas também imersa em uma realidade social e histórica particular. A vida é feita de razão e, uma vez que a vida humana é sempre concreta, é, portanto, sempre razão histórica. Razão vital e razão histórica são, portanto, dois motivos distintos.
Esta relação é assumida para a vida como algo temporário e, portanto, compreende a realidade em seu futuro. A razão histórica ou vital não aceita nada como uma coisa fixa; ela estuda o processo da realidade através de esquemas intelectuais, categorias e conceitos que mudam à medida que a vida se modifica. Portanto, ela é tão móvel quanto a realidade que é conhecida, sendo um processo que nunca termina.
Isto leva ao Perspectivismo: cada indivíduo tem uma perspectiva, uma verdade própria. Estas verdades são visões individuais da realidade e não podem ser tomadas como verdades absolutas. Assim, a realidade será sempre diferente e mudará com as perspectivas de cada um, que se relaciona com elas de diferentes maneiras, mudando também, dando-lhes um significado, valor e sentido, criando um mundo, o seu próprio mundo. Por sua vez, estas perspectivas podem se juntar a outras para formar perspectivas mais amplas e verdadeiras, mas nunca chegarão à verdade absoluta, pois isso implicaria a soma de todas as perspectivas.
Biografia e Contexto Histórico de Ortega y Gasset
Vida e Obra
Ortega nasceu em Madrid, numa família liberal e esclarecida: a família da sua mãe era proprietária do jornal El Imparcial de Madrid e o seu pai era diretor. Estudou filosofia na Universidade de Madrid e visitou universidades alemãs. Conquistou a cátedra de Metafísica na Universidade Central, fundou o jornal El Sol e a Revista de Occidente, que também dirigiu. As suas doutrinas contrárias à ditadura de Primo de Rivera levaram-no a renunciar à sua cátedra, mas continuou as suas aulas no Teatro Rex e mais tarde no Infanta Beatriz. Na Segunda República, fundou com Pérez de Ayala e Marañón o "Grupo a Serviço da República" e tornou-se deputado por León e Jaén. No início da Guerra Civil, exilou-se, viajou e lecionou em Paris, Holanda e Argentina, onde viveu até 1942, quando se mudou para Portugal e, em 1945, regressou a Espanha. Longe da cátedra, fundou o Instituto de Humanidades, onde exerceu a sua função de ensinar.
Principais Obras
- ¿Qué es filosofía?
- La rebelión de las masas
- El tema de nuestro tiempo
O Século XX: Crises e Transformações
O século XX é um século altamente controverso, que começa com o confronto de impérios na Primeira Guerra Mundial, que finalmente destruiu a ingénua ideia de progresso do século XIX: a técnica, ao ser lançada, foi utilizada para destruir. O fim da Primeira Guerra Mundial em 1918 foi apenas uma pausa para a próxima guerra. Surgem, nestes anos, o fascismo italiano e alemão e o comunismo soviético. Assim, o período entre guerras é vivido como um momento dramático em que tudo parece condenado a outra guerra mundial, e que é fundamental para um tempo antes desta, a Guerra Civil Espanhola. Em 1939, no final da guerra na Espanha, começa a Segunda Guerra Mundial. Após a vitória dos Aliados em 1945 sobre os poderes fascistas da Alemanha, Itália e Japão, o mundo divide-se em dois blocos liderados pelos EUA (o bloco capitalista) e pela URSS (o bloco comunista), causando a chamada Guerra Fria.
Espanha no Início do Século XX
Em Espanha, esta crise mundial é ainda agravada desde o começo do século, com a perda das últimas colónias espanholas e o colapso final do Império (1898). Assim, um grupo de intelectuais, a Geração de 98, busca algo que influenciará diretamente Ortega: estudar o problema de Espanha, a partir do ensaio, literatura e poesia. Essa geração será responsável pelo surgimento do Novecentismo ou Geração de 14, à qual Ortega pertence. O reinado de Afonso XIII não satisfaz o anseio de mudança, e a ditadura de Primo de Rivera, a Guerra em África e a Dictablanda de Berenguer causam a queda da má reputação que restou à monarquia. Afonso XIII abdica e, em 1931, é proclamada a Segunda República. A princípio, é apoiada por Ortega, mas, não sendo como ele esperava, logo se desilude, afastando-se gradualmente da política. Finalmente, no início da Guerra Civil (1936-39), Ortega exila-se para regressar em 1945, já sob a ditadura de Franco.
Cultura e Ciência na Primeira Metade do Século XX
A primeira metade do século XX é um ponto de viragem. Quebradas as ilusões no progresso eterno, o mundo entra em crise, que culminará na Segunda Guerra Mundial. Surge a sociedade de massas (que Ortega discute no seu livro A Rebelião das Massas), caracterizada pela produção em massa, melhoria das condições económicas e de trabalho e consumo. Na arte, surge uma nova forma de expressão: o cinema. As vanguardas nas artes visuais (Dada, Surrealismo,...) e na literatura (Kafka, Joyce,...) rompem definitivamente com o realismo burguês. No mundo científico, haverá uma mudança de paradigma com a Teoria da Relatividade (Einstein) e a mecânica quântica. Espanha viverá uma era de renascimento cultural com homens notáveis na ciência (Ramón y Cajal) e nas artes (a Geração de 98 e 27), surgindo uma geração de intelectuais preocupados com as questões sociais.
Filosofia no Século XX
Nem a filosofia será afetada por esta mudança. Na primeira metade do século XX, dominam a Filosofia da Vida (Bergson e Ortega em Espanha), a Psicanálise (Freud), a Fenomenologia (Husserl e Heidegger), o Existencialismo (Sartre), o Marxismo (com diferentes interpretações, enfatizando a Escola de Frankfurt), o Neopositivismo (Russell) e a Filosofia Analítica (Wittgenstein). A maioria deles são a evolução, muitas vezes original, dos grandes pensadores do século XIX: Hegel, Nietzsche, Marx... e não só porque colocam problemas filosóficos típicos, mas também o próprio papel da filosofia como conhecimento. Assim, a filosofia do século XX é, essencialmente, uma filosofia que reflete sobre si mesma de acordo com o conjunto de conhecimentos. Em Espanha, juntamente com o Vitalismo de Ortega, destaca-se a figura de Unamuno, que, a partir de uma tentativa de irracionalismo, enfrentou o mesmo problema que Ortega: a vida. Por último, a revista fundada por Ortega, Revista de Occidente, onde os intelectuais espanhóis refletiam sobre todos os tipos de questões, será fundamental para compreender o renascimento intelectual frustrado pela Guerra Civil Espanhola.