Penhora de Bens e Impenhorabilidade no Novo CPC
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A Penhora de Bens do Devedor
Decorrido o prazo de 15 dias para pagamento voluntário, o cartório expedirá o mandado de penhora e avaliação de bens ao oficial de justiça.
Em princípio, serão penhorados os bens que o exequente indicou na petição com que requereu o início do cumprimento de sentença. Não havendo essa indicação, o oficial de justiça procederá à penhora livre, realizando a constrição dos bens que conseguir encontrar.
Porém, recorde-se que o executado intimado a pagar não está proibido de peticionar ao juiz para fazer sua indicação e que, havendo divergência entre ele e o exequente, o juiz a resolverá por meio de decisão interlocutória.
Ordem Preferencial de Penhora (Art. 835 do NCPC)
O art. 835 do Novo Código de Processo Civil (NCPC) prevê uma ordem preferencial de penhora, relacionando em 13 incisos um conjunto de bens passíveis de constrição.
Os bens relacionados nessa sequência numérica devem ser penhorados obedecendo exatamente à respectiva preferência. O bem relacionado em primeiro lugar e, portanto, preferencial, é o dinheiro em espécie, depósito ou aplicação em instituição financeira. Além de preferencial sobre os demais bens do devedor, o dinheiro também é prioritário segundo o CPC.
Isso significa que a existência dele afasta a penhora dos demais bens colocados na sequência, sem a possibilidade de inversão da ordem legal. Os demais bens também seguem a preferência imposta pelo CPC, mas, quanto a eles, a referida ordem é flexível e, desse modo, pode ser invertida, quando não se verificar a presumível facilidade de comercialização que levou o legislador a criar essa sequência, que é a seguinte:
- Dinheiro em espécie, em depósito ou aplicação em instituição financeira;
- Títulos da dívida pública da União, dos Estados e do Distrito Federal com cotação em mercado;
- Títulos e valores mobiliários com cotação em mercado;
- Veículos de via terrestre;
- Bens imóveis;
- Bens móveis em geral;
- Semoventes;
- Navios e aeronaves;
- Ações e quotas de sociedades simples e empresárias;
- Percentual do faturamento de empresa devedora;
- Pedras e metais preciosos;
- Direitos aquisitivos derivados de promessa de compra e venda e de alienação fiduciária em garantia;
- Outros direitos.
A Impenhorabilidade
Já vimos que no cumprimento de sentença que reconhece a exigibilidade da obrigação do particular de pagar quantia certa, o decurso do prazo de 15 dias sem pagamento resulta na expedição do mandado de penhora e de avaliação. Porém, não é qualquer bem do executado que pode ser penhorado, pois ficam de fora os seguintes:
- Os bens absolutamente impenhoráveis: são aqueles que não podem ser penhorados em situação alguma, a saber:
- Os bens inalienáveis e os declarados por ato voluntário são impenhoráveis.
- Os bens relativamente impenhoráveis:
Entende-se por bem relativamente impenhorável aquele cuja penhora só pode ser realizada quando não houver outros bens passíveis dessa constrição. O CPC prevê que são relativamente impenhoráveis os frutos e rendimentos dos bens inalienáveis, a exemplo da safra e do valor do arrendamento de um imóvel rural inalienável.
- O Bem de Família (Lei nº 8.009/90):
A Constituição Federal de 1988 disciplinou um conjunto de direitos e garantias fundamentais, dentre os quais se acham os direitos sociais, nos quais se insere o direito à moradia, direito este intimamente ligado à proteção da dignidade da pessoa humana.
Em atenção a essa garantia, dois anos mais tarde foi criada a Lei nº 8.009/90 para definir o bem de família e torná-lo impenhorável nas execuções por dívidas em geral.
No art. 1º da referida Lei está previsto que se considera bem de família o imóvel residencial próprio do casal ou da entidade familiar, utilizado em caráter permanente para a moradia.
A jurisprudência a respeito dessa previsão legal é muito fértil e difícil de ser reproduzida em aula dada a enorme variação de casos concretos, mas não custa lembrar que a proteção do bem de família compreende não só o núcleo familiar formado a partir do matrimônio, mas também todas as demais espécies de família que hoje se conhece, inclusive aquelas formadas a partir da união estável e da união civil homoafetiva. Aliás, essa proteção abrange inclusive o indivíduo que leva uma vida monastérica (expressão utilizada pelo STJ), a exemplo do solteiro, do divorciado, do separado, do viúvo, etc.
Havendo dois ou mais imóveis residenciais do devedor, a Lei nº 8.009/90 torna impenhorável apenas o de menor valor, ainda que ele não seja utilizado como moradia permanente da família.
Exceções à Impenhorabilidade do Bem de Família
No entanto, no art. 3º da Lei nº 8.009/90, estão as várias situações em que o bem de família pode ser penhorado, a saber:
- Pelo titular do crédito decorrente do financiamento para a aquisição ou a construção do imóvel, nos limites do crédito e dos acréscimos constituídos em virtude do contrato;
- Nas execuções de prestação alimentar, resguardados os direitos do coproprietário que, com o devedor, integre união estável ou cônjuge;
- Pela cobrança de impostos predial ou territorial, taxas e contribuições devidas em função do imóvel familiar, a exemplo do IPTU;
- Para a execução de hipoteca sobre o imóvel oferecido como garantia real pelo casal ou entidade familiar;
- Por obrigação decorrente de fiança concedida em contrato de locação;
- Por ter sido adquirido como produto de crime ou para a execução da sentença penal condenatória transitada em julgado a ressarcimento, indenização ou perdimento de bens.
Penhora Online (BACEN-JUD)
A penhora online tem por objetivo a constrição de dinheiro em poder de instituição financeira, quer a título de depósito ou de aplicação. Vale lembrar que a penhora de dinheiro, além de preferencial, também é prioritária para o artigo 835 do CPC, de modo que a existência dele afasta a constrição dos demais bens nela referidos. Esta modalidade de penhora só se realiza a requerimento do exequente, não de ofício, exceto no processo do trabalho.
Embora o exequente possa requerê-la logo na petição intermediária com que postula o início do cumprimento de sentença, na prática ninguém procede assim porque, intimado o executado, ele pode levantar previamente todo dinheiro que mantém depositado e frustrar a constrição.
Por isso, normalmente o exequente aguardará o decurso do prazo de 15 dias para o executado pagar espontaneamente a dívida e requererá, ato contínuo, a penhora online.
Tão logo receber o requerimento do exequente, o juiz deferirá a penhora sem realizar o contraditório prévio, isto é, sem intimar o executado sobre o requerimento e o deferimento. Só depois de efetivada a penhora é que o juiz intimará o executado, de modo a evitar a prática de ato fraudulento.
É o próprio magistrado que promoverá o bloqueio de valores em nome do executado, utilizando-se de um sistema de informática denominado BACEN-JUD, que interliga eletronicamente o Poder Judiciário à autoridade monetária supervisora do sistema financeiro nacional, isto é, ao Banco Central do Brasil. Valendo-se de uma senha pessoal, o próprio magistrado acessará o referido sistema e, ao preencher uma série de dados cadastrais do processo, requisitará eletronicamente ao BACEN o bloqueio de determinada soma em dinheiro que especificar na ocasião.
Tão logo o BACEN recebe essa requisição do juiz, também eletronicamente ele a retransmite a todas as instituições financeiras que operam no território nacional, o que resultará no bloqueio de valores porventura existentes em contas.
Ao cumprir a requisição, o BACEN enviará eletronicamente ao juiz uma resposta, acusando a efetivação ou não da indisponibilidade. Efetivada esta, essa resposta especificará o respectivo valor, bem como as instituições financeiras e as contas em que a indisponibilidade foi realizada.
Tão logo o juiz recebe essa resposta do BACEN, começa a correr para ele o prazo de 24h, a fim de que determine de ofício a liberação de valores porventura bloqueados em excesso. A indisponibilidade excessiva pode ocorrer porque o sistema BACEN-JUD não escolhe uma única conta bancária para bloquear e acaba compreendendo todas as contas vinculadas ao executado, no valor da indisponibilidade ordenada pelo juiz.
Perceba que até esse momento ainda não há penhora, senão uma mera indisponibilidade ou bloqueio online.
Enfim, efetivado esse bloqueio, o juiz deve realizar o contraditório e intimar o executado para se manifestar no prazo de cinco (05) dias.
Intimado, o executado pode peticionar ao juiz no referido prazo para alegar e comprovar que ainda persiste alguma indisponibilidade excessiva ou que os valores constritos são impenhoráveis, por exemplo, porque originários dos ganhos do trabalhador ou de doações que ele recebeu para o sustento próprio ou de sua família (vide art. 833, IV do CPC).
Juntada aos autos essa petição, o juiz intimará o exequente para se manifestar, também no prazo de cinco (05) dias, decidindo em seguida. Essa decisão é interlocutória e desafia agravo de instrumento da parte prejudicada.
Decidindo a favor do executado, o juiz novamente acessará o BACEN-JUD e requisitará eletronicamente ao BACEN o desbloqueio do excesso, a ser efetivado pelo respectivo Banco no prazo de 24h.
O NCPC prevê que a instituição financeira responsável pela efetivação do bloqueio deverá indenizar o executado pelos danos que ele sofrer em duas (02) situações:
- Bloqueio de valor superior ao requisitado;
- Não efetivação do desbloqueio em 24h do recebimento da ordem.
De outro lado, se o executado intimado não se manifestar naquele prazo ou o juiz rejeitar a manifestação dele, consideram-se penhorados os valores até então indisponíveis, independentemente da lavratura do termo ou do auto de penhora.
Penhora de Crédito
O patrimônio do executado é formado pelos bens de sua propriedade e pelos direitos patrimoniais que ele titulariza. Por isso, podem ser penhorados não só os bens do devedor, mas também os referidos direitos, a exemplo do direito de crédito que titulariza em relação a terceiro.
Para que essa penhora ocorra, são necessárias duas (02) intimações:
- Intimar o executado para que não transfira o seu direito de crédito a outra pessoa;
- Intimar o terceiro devedor para que não pague o executado.
Se o direito do executado estiver documentado em algum título de crédito, além dessas duas (02) providências, a penhora também compreenderá a apreensão do respectivo título, a fim de tentar evitar a circulação dele.
Penhora no Rosto dos Autos
Quando a penhora incidir sobre direito de crédito que o executado está exigindo em algum outro processo em face de terceiro, o juiz da execução mandará anotar na capa dos autos a constrição do respectivo crédito, para que essa averbação sirva de advertência ao juiz da causa, a fim de que ele não autorize o levantamento de dinheiro pelo executado autor da ação, sem antes se certificar de que já houve o pagamento do credor no processo em que a penhora foi determinada.
Penhora de Percentual do Faturamento da Empresa
As empresas em geral exercem suas atividades econômicas que resultam em sucessivos faturamentos mensais. Esses faturamentos integram o patrimônio da empresa, junto com os demais bens e direitos de créditos que ela titulariza. Daí o interesse dos credores e a possibilidade de penhora desse faturamento mensal.
No entanto, se essa penhora incidir sobre a totalidade do faturamento da empresa executada, normalmente em pouco tempo ela acaba se tornando insolvente por não conseguir honrar outros compromissos.
Por isso, o CPC só autorizou que esse tipo de penhora incidisse apenas sobre uma parte do mencionado faturamento, mais especificamente sobre algum percentual dele. O interessante é que o CPC não prefixa esse percentual e deixa o arbitramento dele ao prudente arbítrio do juiz, que buscará, a um só tempo, um percentual que permita o pagamento do credor em tempo razoável e que não inviabilize a continuação da atividade empresarial.
Embora o CPC não diga, esse arbitramento normalmente passa pela análise dos balanços ou balancetes apresentados pela executada.
Contudo, para o deferimento dessa modalidade de penhora, o NCPC impôs as seguintes condições ou pressupostos:
- Que a executada não possua outros bens; ou
- Que, possuindo-os, eles não sejam suficientes para saldar a dívida ou sejam de difícil comercialização.
É preciso certo cuidado para interpretar essa regra, afinal, a penhora do faturamento pode se tornar letra morta porquanto as empresas em geral normalmente possuem bens penhoráveis, ainda que apenas aqueles que ela emprega na sua atividade-fim. Ora, se esses bens fossem penhorados em lugar do faturamento, por certo a empresa se tornaria inviável, razão pela qual deve ser possível a penhora do faturamento quando os bens que ela possui forem indispensáveis ao exercício da atividade empresarial.
Enfim, ao deferir esse tipo de penhora, o juiz nomeará um auxiliar seu denominado administrador depositário, que ficará incumbido de gerir a empresa enquanto se desenrolarem as sucessivas penhoras sobre percentual do seu faturamento. Para essa função o juiz pode nomear o exequente, o executado ou mesmo um terceiro com habilidade para tanto.
Intimado esse administrador, ele tem o prazo de 10 dias para juntar aos autos o seu plano de administração, detalhando para o juiz como pretende gerir a empresa para que ela produza um faturamento a ser parcialmente penhorado.
Apresentado o plano, o juiz intimará as partes para que elas se manifestem e decidirá em seguida por uma decisão interlocutória. Aprovado o plano, o administrador inicia a sua função.
Um dos componentes desse plano de administração é a estimativa do tempo de administração necessário para o pagamento da dívida, mas qualquer que seja a estimativa ela pode ser ampliada ou diminuída, a depender, por exemplo, do montante dos faturamentos, bem como dos juros e da correção monetária que incidirem sobre a dívida.
O administrador depositário titulariza dois direitos elementares: o direito a uma remuneração que o juiz arbitrará para ser paga pela executada e o direito de ser reembolsado das despesas que fizer no exercício da função.
Enfim, mensalmente o administrador prestará contas ao juiz das suas atividades, juntando aos autos os respectivos balancetes e depositando os valores que penhorar, a fim de que sejam imputados e contabilizados no pagamento.