Petição Inicial: Requisitos e Procedimentos no CPC

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1. Introdução à Petição Inicial

Para que a atividade jurisdicional contenciosa (composição de lide) seja exercida, é necessário que o interessado a provoque, pois prevalece o princípio da inércia.

A petição inicial é o instrumento pelo qual o interessado invoca a atividade jurisdicional, fazendo surgir o processo. Nela, o interessado formula sua pretensão, limitando a atividade jurisdicional, pois o juiz não pode proferir sentença de natureza diversa da pedida, nem condenar o réu em quantidade superior ou em objeto diverso do que foi demandado.

2. Requisitos da Petição Inicial (Art. 282 do CPC)

A) Indicação do Juiz ou Tribunal

A petição inicial é dirigida ao Estado, pois a ele é formulada a tutela jurisdicional.

Se o juízo for absolutamente incompetente, no qual todos os atos decisórios são nulos (art. 113, § 2º, do CPC), o magistrado poderá encaminhá-lo ao competente; mas se deixar de fazê-lo ao despachar a petição inicial, caberá ao réu suscitar a incompetência absoluta (art. 301, II, do CPC), sob pena de responder pelas custas processuais (art. 113, § 1º, do CPC). A qualquer tempo, o réu ou o autor poderão suscitar o problema, bem como o juiz reconhecer sua própria incompetência (art. 113, caput, do CPC).

Se o juízo for relativamente incompetente, a petição só poderá ser encaminhada ao juízo competente após o acolhimento da exceção de incompetência oposta pelo réu (art. 112 do CPC); se a exceção não for oposta pelo réu, o juízo relativamente incompetente terá a competência prorrogada. Se dela o juiz não declinar, a nulidade da cláusula de eleição de foro, em contrato de adesão, poderá ser declarada de ofício pelo juiz, que declinará de competência para o juízo de domicílio do réu, ou se o réu não opuser exceção declinatória nos casos e prazos legais (art. 114 do CPC).

B) Qualificação das Partes

É necessário indicar os nomes, prenomes, estado civil, profissão, domicílio e residência do autor e do réu para analisar a legitimidade das partes, bem como individualizar e distinguir as pessoas físicas e jurídicas das demais. O estado civil faz-se necessário para verificar a regularidade da petição inicial nos casos em que o autor precisa de outorga uxória. O endereço é imprescindível para determinar a competência territorial e a citação do réu.

C) Causa de Pedir (Fato e Fundamentos Jurídicos)

São as causas de pedir, que podem ser modificadas: antes da citação do réu, mediante requerimento do autor; após a citação, com consentimento do réu (art. 264 do CPC); na revelia, após a nova citação do réu.

Fato (causa de pedir remota): todo direito ou interesse a ser tutelado surge em razão de um fato ou um conjunto deles, por isso são necessários na petição inicial. Ex.: direito de rescindir o contrato de locação (fato gerador do direito) em razão do não pagamento dos aluguéis (fato gerador da obrigação do réu).

Fundamentos jurídicos (causa de pedir próxima): não se trata da mera indicação do dispositivo legal que protege o interesse do autor, mas da relação jurídica afirmada.

D) Pedido e Suas Especificações

O pedido também limita a atuação jurisdicional.

  • Pedido Imediato: é sempre certo e determinado. É o pedido de uma providência jurisdicional do Estado (Ex.: sentença condenatória, declaratória, constitutiva, cautelar, executória etc.).
  • Pedido Mediato: pode ser genérico nas hipóteses previstas na lei. É um bem que o autor pretende conseguir com essa providência.
  • Pedido Alternativo: (art. 288 do CPC) Ex.: peço anulação do casamento ou separação judicial.
  • Pedido Cumulativo: (art. 292 do CPC) desde que conexos, os pedidos podem ser cumulados.

Porém, nem sempre o autor pode definir o seu pedido. Nas ações universais, o autor não pode definir o pedido porque há uma universalidade de bens (Ex.: petição de herança). Em algumas ações não se pode definir o quantum debeatur (Ex.: indenização de danos que estão sucedendo).

E) Valor da Causa

Toda causa deve ter um valor certo, ainda que não tenha conteúdo econômico (art. 258 do CPC), pois tal valor presta a muitas finalidades, como:

  • Base de cálculo para taxa judiciária ou das custas (Lei Estadual/SP nº 4.952/85, art. 4º);
  • Definir a competência do órgão judicial (art. 91 do CPC);
  • Definir a competência dos Juizados Especiais (Lei nº 9.099/95, art. 3º, I);
  • Definir o rito a ser observado (art. 275 do CPC);
  • Base de multa imposta ao litigante de má-fé (art. 18 do CPC);
  • Base para o limite da indenização.

Os arts. 259 e 260 do CPC indicam qual o valor a ser atribuído a algumas causas, sob pena de o juiz, de ofício, corrigir a petição inicial, determinando o recolhimento da diferença.

Se não se tratar de causa prevista nestes artigos e o seu valor estiver incorreto, a correção dependerá de impugnação do réu, ouvindo-se o autor em 5 dias. Após a alteração da petição, o juiz determinará o recolhimento das custas faltantes (art. 261 do CPC).

F) Indicação das Provas

O art. 282, VI, do CPC exige a indicação das provas com que o autor pretende demonstrar a verdade dos fatos alegados. É praxe forense, contudo, deixar de indicar especificamente as provas, apenas protestando na inicial por “todas que sejam necessárias”. Em razão disso, surgiu um despacho comum, embora não previsto expressamente no procedimento: "Intimem-se as partes para que indiquem as provas que efetivamente pretendem produzir".

Tipos de provas:

  • Documental: fatos que são comprovados somente por escrito.
  • Pericial: fatos que dependem de parecer técnico.
  • Testemunhal: fatos demonstráveis por testemunhas.

G) Requerimento de Citação do Réu

O art. 282, VII, do CPC exige o requerimento para a citação do réu, ato pelo qual se assegura o exercício do contraditório (defesa do réu). A citação pode ocorrer:

  • Pelo correio: com A.R. (Aviso de Recebimento);
  • Por mandado: quando o réu é incapaz ou quando não há entrega domiciliar de correspondência (art. 221 do CPC);
  • Por edital: nas hipóteses do art. 231 do CPC, devendo ser declarado na inicial. Se houver dolo por parte do autor, ele incorrerá na sanção do art. 233 do CPC;
  • Por meio eletrônico: conforme regulado em lei própria (Incluído pela Lei nº 11.419/2006).

Importante observar que, de acordo com o parágrafo único do art. 223 do CPC: "A carta será registrada para entrega ao citando, exigindo-lhe o carteiro, ao fazer a entrega, que assine o recibo. Sendo o réu pessoa jurídica, será válida a entrega a pessoa com poderes de gerência geral ou de administração".

3. Instrução da Petição Inicial

O art. 283 do CPC determina que a petição será instruída com os documentos indispensáveis à propositura da ação, inclusive com a procuração, caso o autor esteja representado por um advogado. Porém, admite-se que o advogado se obrigue a apresentá-la posteriormente, em casos urgentes.

Há duas espécies de documentos que devem ser juntados à petição inicial:

  • Substanciais: os expressamente exigidos por lei. Exemplo: art. 60 da Lei nº 8.245/91, in verbis: "Nas ações de despejo fundadas no inciso IV do art. 9º, inciso IV do art. 47 e inciso II do art. 53, a petição inicial deverá ser instruída com prova da propriedade do imóvel ou do compromisso registrado".
  • Fundamentais: os oferecidos pelo autor como fundamento de seu pedido. Exemplo: um contrato.

A Lei nº 1.060/50 regula a assistência judiciária aos necessitados, que também deve ser requerida na inicial, se for o caso.

4. Indeferimento da Petição Inicial

Ao receber a petição inicial, o juiz examinará se ela atende a todos os requisitos legais. Se faltar qualquer um deles ou se a petição estiver insuficientemente instruída, o juiz apontará a falta e dará o prazo de 10 dias para que o autor a emende ou a complete (art. 284 do CPC).

Vindo a emenda ou sendo completada a inicial, o juiz ordenará a citação (art. 285 do CPC), caso contrário, a inicial será indeferida.

Deve-se atentar, inclusive, para o dispositivo estabelecido pela Lei nº 11.277/2006, que incluiu o art. 285-A do CPC: "Quando a matéria controvertida for unicamente de direito e no juízo já houver sido proferida sentença de total improcedência em outros casos idênticos, poderá ser dispensada a citação e proferida sentença, reproduzindo-se o teor da anteriormente prolatada.
§ 1º Se o autor apelar, é facultado ao juiz decidir, no prazo de 5 (cinco) dias, não manter a sentença e determinar o prosseguimento da ação.
§ 2º Caso seja mantida a sentença, será ordenada a citação do réu para responder ao recurso".

O indeferimento pode ocorrer por:

  • Inépcia: reconhecimento de que a petição inicial não tem aptidão para obter a prestação jurisdicional reclamada em razão de ocorrer uma das hipóteses do art. 295 do CPC.
  • Prescrição de direito patrimonial (art. 295, IV, do CPC) ou outras causas de indeferimento liminar (art. 295, II a VI, do CPC).
  • Falta de um dos requisitos da lei, se a petição não for emendada no prazo de 10 dias.
  • Instrução insuficiente, se não for completada no prazo de 10 dias.

Indeferida a petição, extingue-se o processo sem resolução de mérito (arts. 162, §1º, 267, I, e 296 do CPC - referências adaptadas ao contexto, pois o art. 513 trata de cumprimento de sentença). O autor pode apelar no prazo de 15 dias (art. 508 do CPC), e o juiz pode reformar sua decisão (juízo de retratação). Se não o fizer, manterá o indeferimento e encaminhará os autos ao tribunal (art. 296, parágrafo único, do CPC).

5. Pedido de Antecipação da Tutela

A Lei nº 8.952/1994 inseriu no CPC a possibilidade de se pedir a antecipação dos efeitos da tutela pretendida na sentença.

Normalmente, os efeitos da sentença somente serão produzidos com a sua prolação e, em alguns casos, desde que contra ela não seja interposto recurso com efeito suspensivo.

A antecipação deve ser requerida pela parte e exige prova inequívoca que convença o julgador da verossimilhança da alegação, além de fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação, ou abuso de direito de defesa ou manifesto propósito protelatório do réu (requisitos do art. 273 do CPC).

Devemos observar que a tutela antecipada diverge das medidas cautelares: aquela satisfaz (antecipadamente) o direito material, enquanto estas visam assegurar a utilidade do processo.

A antecipação da tutela é provisória, pois o juiz pode modificá-la ou revogá-la a qualquer momento (art. 273, § 4º, do CPC).

A Lei nº 10.444/2002 incluiu novos parágrafos no art. 273 do CPC, estabelecendo que a tutela antecipada também pode ser concedida quando um ou mais dos pedidos cumulados, ou parcela deles, se mostre incontroverso (§ 6º). E que, se o autor, a título de antecipação de tutela, requerer providência de natureza cautelar, poderá o juiz, quando presentes os respectivos pressupostos, deferir a medida cautelar em caráter incidental do processo ajuizado (§ 7º).

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