Principais Correntes Filosóficas e Epistemológicas
Classificado em Filosofia e Ética
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Racionalismo e Empirismo: Correntes do Conhecimento
No que diz respeito ao **Racionalismo**, a **razão** é a sua fonte principal de conhecimento. Logo, esta corrente defende que as representações da razão são as mais acertadas e as únicas que podem conduzir ao conhecimento logicamente necessário e, acima de tudo, válido.
O principal fundador do Racionalismo é **Descartes**, que defende a ideia de que, após o nascimento, somos dotados de **ideias inatas**, como, por exemplo, a existência de Deus. Segundo os racionalistas, esta é uma ideia inata e, por essa razão, não é posta em causa.
O principal objetivo desta corrente é a busca de conhecimento válido através da razão humana, criando, portanto, verdades indiscutíveis. Do ponto de vista desta teoria, o método de busca do conhecimento é o uso constante da dúvida, atribuindo validade científica apenas àquilo que provém única e exclusivamente da razão (**dúvida metódica**).
Durante todo este processo de busca de conhecimento, tendo sempre por base a dúvida, chega-se a uma **primeira evidência**: o facto de que, depois de se pôr tudo em causa, a única coisa que não cai em dúvida é a **razão**. Deste modo, formula-se a primeira verdade absoluta desta filosofia: *“Penso, logo existo”* (**cogito**).
Por outro lado, o **Empirismo**, tal como o Racionalismo, tem como preocupação a busca do conhecimento. Contudo, distinguem-se na medida em que o Empirismo defende que o conhecimento só é válido cientificamente se tiver origem na experiência, negando assim qualquer tipo de possibilidade de existência de ideias inatas.
O Empirismo defende, por sua vez, a ideia de que nascemos como uma *tábua rasa* que será preenchida com conhecimento inerente à experiência. Desta forma, tanto teorias particulares como universais têm como base a experiência, ou seja, são comprovadas de forma empírica.
Nesta corrente destacam-se **John Locke** e **David Hume**, entre outros filósofos. Locke comparava a nossa mente a uma tábua rasa à nascença, referindo que esta se completaria com as vivências (experiências sensoriais). Hume, por sua vez, explicava que as ideias eram formadas devido a experiências e que não aconteciam de forma inata, ou seja, a ideia da existência de Deus era negada por esta corrente, uma vez que não era possível arranjar evidências empíricas.
Pontos em Comum
Tal como referido anteriormente, o Racionalismo e o Empirismo partilham a preocupação com o problema do conhecimento, porém constroem teorias diferentes: *Intelectualista* por parte do Racionalismo e *Sensista* por parte do Empirismo. Outro ponto comum entre estas teorias é o **Fenomenismo**, pois o sujeito conhece não as coisas em si, mas as suas representações.
Círculo de Viena e Karl Popper: Critérios da Ciência
O **Círculo de Viena** remete-nos automaticamente para o **Neopositivismo**, doutrina que tem como base empírica o Positivismo, contudo com algumas diferenças na sua génese. Quando abordamos **Karl Popper**, este remete-nos para o **Falsificacionismo**.
Estas duas teorias **têm em comum o facto de desejarem um critério de demarcação da ciência e da não ciência**, porém abordam-no de forma diferente. O Círculo de Viena usa o **método indutivo** através da verificação das hipóteses das proposições científicas. Enquanto isso, Popper utilizava o **método hipotético-dedutivo**, ou seja, o falsificacionismo, que consiste num processo de conjeturas e refutações. Quanto mais uma teoria resiste, maior será o seu grau de veracidade. Com isto, percebemos que, para Popper, as verdades não são absolutas, mas sim provisórias, até que uma nova teoria ou hipótese chegue e a refute.
Estas teorias entram em desacordo, mais uma vez, no que diz respeito à **metafísica** e à **ética**. O Círculo de Viena considera que ambas devem ser afastadas do conhecimento científico, não pelo facto de serem falsas, mas sim porque as proposições a elas associadas necessitam de significação.
Popper, por sua vez, referia que a metafísica e a ética devem ser mantidas, pois a metafísica é consubstancial ao pensamento científico e, em conjunto, podem elaborar grandes hipóteses mais tarde submetidas a testes empíricos.
Kuhn e Foucault: Paradigmas e Epistemes na Ciência
No que diz respeito a estes dois teóricos, **Thomas Kuhn** e **Michel Foucault**, ambos apresentam uma preocupação semelhante a outros filósofos: o estudo da ciência e de tudo aquilo que lhe está associado. No entanto, Kuhn apresenta uma maior preocupação nas ciências exatas, enquanto Foucault estuda as ciências sociais.
Ambos apresentam um novo conceito: para Kuhn, nasce o conceito de **paradigma**, que se define como o estado em que uma teoria científica é aceite por toda a comunidade científica como válida. Os paradigmas de Kuhn correspondem à *Episteme* de Foucault, contudo, a Episteme é mais abrangente, uma vez que aborda as ciências sociais. Tanto os paradigmas como a Episteme formam uma espécie de estrutura teórica para a produção de discursos considerados verdadeiros em certos momentos históricos.
O paradigma de Kuhn passa por diversas fases, sendo que a **revolução científica** (altura em que se dá a mudança de paradigmas) é paralela à **rutura epistemológica** em Foucault (passagem de uma época histórica para outra).
Estas estruturas não são absolutas. Foucault acredita que existem continuidades, pois estuda as ciências sociais sob duas formas: a **histórica** (faz uma espécie de “escavação” para perceber de que forma o passado influencia o presente) e a **genealógica** (estudo das inter-relações dos poderes na sociedade, onde todas as classes e subclasses o detêm, tornando a sociedade num jogo de poder). De forma semelhante, Kuhn acredita que é possível levar termos de um paradigma para outro.
Estes pensadores distinguem-se pelo tipo de ciência que estudam: Kuhn refere-se apenas às ciências naturais e exatas, não incluindo as sociais, pois torna-se difícil um paradigma social ser aceite por toda a comunidade científica devido à subjetividade das variáveis. Já Foucault dedica-se exclusivamente ao estudo das ciências sociais, tornando-se então mais abrangente (dentro destas, explora a fundo as relações de poder, biopoder, interesses e desejos).
Gaston Bachelard: Epistemologia e Obstáculos ao Saber
Durante o século XX, a Epistemologia procurou o critério de demarcação entre o conhecimento científico e o conhecimento comum. Para **Gaston Bachelard**, a diferença entre ambos reside na **reflexão** (quando refletimos, estamos mais próximos da ciência) sobre a **perceção** (aceitação de forma passiva do conhecimento comum), na procura do progresso do saber. Bachelard considera que, para haver progresso científico, é necessário que haja uma **rutura** entre ambos os conhecimentos, manifestando assim a sua visão *descontinuísta*.
Bachelard aponta críticas a duas correntes de pensamento com maior influência do século XVII: o **Racionalismo de Descartes** e o **Empirismo de Bacon**.
No que diz respeito ao Racionalismo de Descartes, Bachelard aponta uma forte negligência filosófica, ou seja, na sua perspetiva, Descartes faz da ingenuidade um método científico (uma vez que os racionalistas acreditavam que a razão era a única variável na busca do conhecimento).
Por outro lado, critica também o Empirismo de Bacon, uma vez que a experiência é subjetiva, ou seja, as conclusões das proposições podem variar muito da experiência de sujeito para sujeito.
Bachelard é, então, apologista de um **racionalismo dialético**, ou seja, a sua filosofia partia do ponto de vista da descoberta racional (através das estruturas *a priori* do sujeito). Contudo, o racionalismo proposto por Bachelard não era igual ao racionalismo formal, na medida em que este considerava que a experimentação e a formulação matemática são complementares.
Uma das contribuições da epistemologia de Bachelard é a primazia conferida ao **erro e à retificação**. Ao contrário da maioria dos filósofos que interpretam o erro como um acidente lamentável, Bachelard defende que é preciso errar em ciência, pois o conhecimento científico só se constrói pela retificação desses erros.
Assim, o erro deixa de ser interpretado como um equívoco ou uma anomalia a ser extinta, assumindo uma função positiva na génese do saber. Desta forma, a verdade em ciência de hoje não é imutável e definitiva, pois as verdades de hoje podem amanhã surgir erros. Desta forma, não existem verdades definitivas, mas sim provisórias.
Para Bachelard, as **ruturas** e os **erros** eram aquilo que demarcavam a ciência comum da ciência científica. No entanto, estas ruturas acontecem também dentro do conhecimento científico, na medida em que o processo de negação não implica o abandono das teorias, tratando-se então de reordenar os erros e introduzir uma nova racionalidade.
A **filosofia do não** é uma atitude de conciliação e não de recusa das teorias científicas.
Na teoria de Bachelard, evidencia-se uma reformulação do conhecimento científico através da rutura com o passado (*descontinuísmo*). Contudo, na perspetiva de Bachelard, continuam a existir **“obstáculos epistemológicos”**, que se definem como particularidades que põem em causa a formação de conhecimentos:
- Empirismo: O observador nunca será totalmente neutro ao olhar para o objeto de investigação devido a fatores de natureza externa;
- Racionalismo Dedutivo: Generalização (Problema da indução);
- Filosofia: O pensamento abstrato pode pôr em causa a experiência e até sobrepor-se à realidade;
- Senso Comum: A subjetividade inerente ao sujeito (preconceito, opiniões, bagagem cultural, etc.) pode influenciar a busca do conhecimento.
Desta forma, o conhecimento sobre os obstáculos é essencial, pois pode ser a chave para o sucesso ou insucesso da procura do conhecimento nas teorias científicas. O estudo do passado histórico é, portanto, extremamente importante. Bachelard defende que é importante o historiador conhecer o passado para conseguir julgar o presente, mas não no sentido de ver no passado uma preparação para o presente, mas sim de melhorar as interpretações do passado com o conhecimento do presente, para assim as aprimorar.