Princípios do Processo Civil Português: Guia Essencial
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Direito à Tutela Jurisdicional Efetiva
A CRP, no seu art. 20.º, n.º 1, assegura a todos o acesso ao direito e aos tribunais, mesmo àqueles com insuficiência de meios económicos, sendo reforçado no n.º 2 desse artigo, a possibilidade de exercitação desse direito através do direito ao apoio judiciário. Deste artigo podemos extrair o princípio da equidade e o princípio do prazo razoável, que devem estar associados ao princípio da publicidade do processo e ao princípio da legalidade e fundamentação da decisão (arts. 106.º e 205.º, n.º 1 da CRP). Atualmente o CPC dispõe, no art. 2.º, o princípio da tutela jurisdicional efetiva, uma vez que estabelece que a proteção jurídica através dos tribunais implica o direito de obter em prazo razoável, uma decisão judicial relativamente ao litígio em causa. Este direito a um processo de execução evita que as decisões judiciais e a garantia dos direitos e interesses particulares se reduzam a meras declarações proclamatórias de caráter simbólico.
Princípios Fundamentais do Processo Civil
Princípio Dispositivo
Em suma: o princípio dispositivo traduz-se praticamente em quatro vertentes essenciais: no impulso processual, na delimitação dos contornos factuais do litígio, nos poderes cognitivos do juiz e nos limites da sentença. Mas a antiga orientação que concebia o processo como uma pura querela intersubjetiva tem vindo paulatinamente a perder a sua rigidez ancestral. Pode mesmo afirmar-se que a conceção de um processo na completa disponibilidade das partes, perante cuja atuação o tribunal se deveria limitar a aplicar o direito, consubstanciada no brocardo latino da mihi facta, dabo tibi ius (dá-me os factos que eu dou-te o direito), se encontra hoje já superada, face aos amplos poderes de atuação oficiosa hodiernamente confiados ao juiz da causa no que tange aos chamados factos complementares e/ou concretizadores - art. 5.º, n.º 2, al. b) em conjugação com os arts. 590.º, n.º 2, al. b) e 591.º, n.º 1, al. c). Vem sendo entendido que a sentença não deve limitar-se a procurar e a declarar uma verdade meramente formal, mas antes a verdade material em progressivo relaxamento do princípio Nemo judex sine actore; ne judex procedat ex-officio. Sendo certo que ao autor cabe enunciar o pedido e a causa de pedir, assim moldando o objeto do processo, não é menos verdade que ao juiz assistem, hoje, com vista a uma justa e eficiente composição do litígio, amplos poderes/deveres de gestão material do processo, com sede própria de exercitação no âmbito da audiência prévia, fomentando no seu seio a discussão das posições das partes com vista à delimitação dos termos do litígio, para além do convite ao suprimento das insuficiências ou imprecisões na exposição da matéria de facto (art. 591.º, n.º 1, al. c)). E, na sequência dessa intervenção proativa do juiz, poderá mesmo o autor ser convencido ou instado a ratificar ou a modificar o pedido inicialmente formulado. O que, em última análise, poderá evitar a propositura de uma segunda ação em postergação do princípio da economia processual. Daí a controvérsia que vem sendo esgrimida na doutrina acerca da rigidez conceptual do princípio do pedido tendo vindo paulatinamente a ser perfilhado um conceito mais elástico desse princípio em prol da efetivação do processo condensado na fórmula da flexibilidade do princípio do pedido.
Princípio da Oficialidade
Como que em contraponto à rigidez tradicional do princípio do dispositivo, a reforma de 2013 veio consagrar/consolidar um novo paradigma com acentuação e reforço dos poderes/deveres do juiz, conferindo-lhe o papel de real “gestor do processo”. A oficialidade ou oficiosidade (atuação processual por iniciativa do juiz) não se limita agora ao antigo princípio do inquisitório. No conceito amplo da oficialidade que se perfilha compreendem-se, não só os poderes gerais de gestão processual formal (sanação da falta de pressupostos processuais, recusa e expurgação de expedientes), como ainda os poderes de gestão processual de mérito (apuramento da verdade material) e, outrossim, os poderes inquisitórios e instrutórios/probatórios instrumentais do apuramento da realidade material/factual, uns e outros pré-ordenados à justa composição do litígio em prazo razoável (arts. 6.º e 411.º).
Princípio/Dever de Gestão Processual
O dever de gestão processual consagrado no art. 6.º CPC possui como único destinatário o juiz, impondo-lhe uma diligente e proativa direção do processo, eliminando todas as peias burocráticas obstativas do desenvolvimento normal da lide em ordem à consecução do seu objetivo final e primordial consubstanciado na fórmula legal “justa composição do litígio em prazo razoável”. Impõe ao julgador que os seus poderes de regulação, direção e ordenamento processual sejam também exercitados em pré-ordenação a esse escopo primacial do processo. Essa gestão não deve nem pode reconduzir-se hoje a uma gestão meramente formal. Consubstancia, assim, este princípio/dever um claro afloramento da regra de prevalência do fundo sobre a forma e daí o seu caráter instrumental. A expressão: cumpre ao juiz dirigir ativamente o processo e providenciar pelo seu andamento célere, promovendo oficiosamente as diligências necessárias ao normal prosseguimento da ação ou “o juiz providencia oficiosamente pelo suprimento da falta de pressupostos processuais suscetíveis de sanção (art. 6.º, n.º 2), logo inculca assumir a panóplia dos amplos poderes conferidos ao juiz em ambos esses incisos normativos de caráter essencialmente vinculado. Vinculação essa do juiz a uma boa e eficiente direção e gestão do processo traduzido na evolução do poder de direção que se entendia assistir ao juiz para novel dever de gestão.
No art. 6.º, n.º 1 compreende-se na prática e em forma de lei o velho princípio de direção formal do processo pelo juiz. Direção formal esta intimamente associada ao princípio da cooperação ora vertido no art. 7.º, princípio este também ele funcionalmente dirigido a obter a justa composição do litígio. O art. 547.º veio impor ao juiz o dever de adotar a tramitação processual às especificidades da causa e adaptar o conteúdo e forma dos atos processuais ao fim que visam atingir, assegurando um processo equitativo. Deve, assim, o juiz adaptar a tramitação prevista na lei pela prática de atos que melhor se ajustem ao fim do processo. Trata-se de um subprincípio de agilização do processo. O princípio recomenda que a intervenção do juiz na adoção de mecanismos de simplificação e agilização processual deve ser antecedida da audiência das partes.
Princípio do Inquisitório
Constitui o contraponto do princípio do dispositivo, nele residindo as principais limitações ao princípio dispositivo. No art. 411.º CPC, encontra-se direcionado para a realização das diligências probatórias à recolha de material factual relevante para a justa composição do litígio. Na verdade, as provas têm por fundamentação a demonstração da realidade dos factos (art. 341.º CC) e a instrução tem por objeto os temas da prova previamente enunciados, ou quando não tenha de haver lugar para essa enunciação, os factos necessitados de prova (art. 410.º CPC). Traduz o art. 411.º a exuberante consagração do princípio da prevalência da verdade material sobre a verdade formal. A sentença de mérito tenderá a deixar definida a relação material, não com a configuração formal que as partes lhe hajam emprestado no decurso do pleito, mas tal como anteriormente existia, assim lhe conferindo força e autoridade de caso julgado. Incumbe ao juiz realizar ou ordenar, mesmo oficiosamente, todas as diligências necessárias ao apuramento da verdade e à justa composição do litígio.
Poderes Inquisitórios do Juiz
A necessidade de ser garantida pelo juiz a justa composição em prazo razoável encontra-se explicitamente consagrada no art. 6.º, n.º 1. Preveem-se no preceito poderes/deveres de recolha (indagação), atendibilidade e mesmo da prova dos factos concretizadores e instrumentais, mesmo que não alegados. Os números 2 e 3 do art. 5.º contemplam relevantes limitações à regra da circunscrição da pronúncia jurisdicional aos factos alegados. Assim, poderá o juiz fundar a sua decisão em factos:
- Instrumentais, que resultem da instrução da causa (n.º 2, alínea a));
- Complementares ou concretizadores de outros que as partes hajam alegado e resultem da instrução da causa (n.º 2, alínea b));
- Notórios (n.º 2, alínea c));
- De que o tribunal tenha tomado conhecimento por virtude do exercício das suas funções (n.º 2, alínea c));
- Que sirvam para qualificar de anormal o uso do processo (art. 612.º).
Poderes Instrutórios do Juiz
Os poderes de instrução respeitam tanto aos factos essenciais como aos factos complementares/concretizadores ou instrumentais. A iniciativa instrutória do juiz vem sendo pouco exercitada, já que a generalidade das provas é requerida pelas partes no momento processual “normal”, que é o da apresentação dos articulados. O ónus da iniciativa da prova (instrutória) por banda das partes continua a ser prevalecente (arts. 343.º, 344.º, 345.º CC).
Princípio do Contraditório
O direito de ser ouvido perante um qualquer órgão jurisdicional com competência decisória em matéria de existência ou subsistência de direitos é inerente (originário) à própria condição humana. O princípio da contradição ou do contraditório encontra-se expressamente consagrado no art. 3.º, n.º 1. O tribunal não pode resolver conflitos de interesses sem que a outra parte seja devidamente chamada para deduzir oposição. Princípio este que se encontra estreitamente correlacionado com o princípio da igualdade das partes (art. 4.º). O princípio só em casos excecionais pode ser legalmente postergado ou comprimido não devendo o juiz decidir qualquer questão, ainda que de conhecimento oficioso, sem que as partes hajam tido ensejo de sobre elas se pronunciar. Na eventualidade de serem deduzidas exceções no último articulado permitido, pode a parte contrária, sob pena de afronta ao princípio do contraditório, às mesmas responder na audiência prévia (art. 591.º) ou no início da audiência final. Também as provas não serão admitidas nem produzidas sem audiência contraditória (art. 415.º, n.º 1). O princípio conclama que, antes de ser proferida a sentença ou qualquer outra decisão judicial interlocutória ou incidental, seja facultada às partes a discussão efetiva de todos os fundamentos de direito em que a mesma se baseie. A violação deste princípio integra nulidade processual sujeita ao regime geral das nulidades contemplado no art. 195.º, n.º 1.
Princípio da Igualdade das Partes
Encontra-se consagrado no art. 13.º, n.º 1 CRP: “todos os cidadãos têm a mesma dignidade social e são iguais perante a lei”. O preceito vincula, desde logo, a jurisdição em três dimensões fundamentais:
- Igualdade no acesso dos cidadãos à jurisdição, isto é, direito a uma efetiva igualdade de oportunidades de recurso aos tribunais (art. 20.º, n.º 1);
- Igualdade dos cidadãos perante os tribunais, ou seja, igualdade na aplicação do direito através dos tribunais, mediante a aplicação de igual direito a casos congéneres e a utilização de critérios idênticos na aplicação de sanções e na fixação de montantes indemnizatórios;
- Igualdade na posição de sujeito processual, ou seja, “igualdade de armas no processo”, com proibição de discriminação das partes.
O processo tem, assim, de ser equitativo e leal. As partes têm de ser colocadas em perfeita paridade de condições. O destinatário legal do princípio é o tribunal da causa, ao qual cumpre promover a igualdade, através do esclarecimento ou auxílio e obviar a situação de desigualdade.
Princípio da Autorresponsabilidade das Partes
A disponibilidade subjetiva (iniciativa do impulsionamento dos meios a acionar e definição dos fins a prosseguir), assim como a disponibilidade objetiva do processo (domínio das partes sobre os factos a alegar e sobre os meios de prova a produzir) são em si geradoras de uma responsabilidade dos sujeitos processuais para consigo mesmos, que a doutrina apelida de “autorresponsabilidade das partes” ou “princípio da autorresponsabilidade das partes”. Competindo às partes o acionamento dos correspondentes meios de ataque e defesa, serão também elas a suportar as consequências das suas eventuais omissões ou inércias.
A eventual negligência alegatória/probatória das partes redundará em seu prejuízo, uma vez que não poderão as mesmas contar com uma aturada exercitação, pelo juiz, dos seus poderes/deveres de suprimento e indagação oficiosa. Recai, pois, sobre elas a tarefa de contribuir, de modo diligente e eficiente, para a formulação da convicção do julgador, esta naturalmente alicerçada na valoração final de todas as provas trazidas à instrução, discussão e julgamento do pleito. O ónus de alegar os factos que integram a causa de pedir e aqueles em que se baseiam as exceções (arts. 552.º, n.º 1, al. d); 573.º, n.º 1; e 584.º). A autorresponsabilidade traduz-se, assim, praticamente, em a parte ter de arcar com as consequências adversas de uma sua conduta processual/probatória inconsiderada, omissiva ou inconclusiva, em suma ineficaz, para obter formação de uma convicção judicial de sentido favorável.
Princípio da Preclusão e da Eventualidade
Prende-se diretamente com a oportunidade ou a eventualidade de exercitação de direitos ou a satisfação de ónus e deveres processuais, seja com o modus de propositura, seja com os atos a praticar no desenvolvimento da lide. As diversas fases processuais, atentas as suas finalidades específicas, integram ciclos dotados de uma relativa estanquicidade. Daí que fiquem precludidos certos atos se não forem produzidos dentro do prazo para o efeito cominado ou na sua fase ou oportunidade próprias. No que concerne ao princípio da eventualidade, ainda que intimamente associado ao princípio da preclusão, traduz-se o mesmo em os fundamentais da ação ou da defesa deverem ser enunciados todos de uma só vez e em certo momento (normalmente na petição inicial e na contestação – arts. 552.º, n.º 1, al. d) e 571.º respetivamente). Também no campo dos recursos se podem detetar situações de preclusão como as do art. 639.º, n.ºs 1 e 2 (falta de apresentação de alegações e não acatamento do despacho de aperfeiçoamento das conclusões) e art. 640.º, n.º 1, al. a) e b) – não especificação dos pontos de facto considerados como incorretamente julgados.
Princípio da Economia Processual
O princípio baseia-se numa equação atividade-resultado, em termos de aplicação racional dos meios processuais (economia de meios). O que se exige é que cada processo, por um lado, resolva o maior número possível de litígios (economia de processos) e, por outro, comporte apenas os atos e formalidades indispensáveis ou úteis (economia de atos e formalidades).
Economia do Processo
Quanto à economia de processos e prevenção de duplicação de ações, constituem afloramentos legais as disposições que permitem o litisconsórcio inicial (arts. 32.º e 33.º), a coligação de autores e de réus (art. 36.º), a ampliação do pedido e da causa de pedir (arts. 264.º e 265.º) a reconvenção (art. 266.º), os incidentes de intervenção de terceiros (art. 311.º e ss.), o pedido subsidiário (art. 554.º), a cumulação de pedidos (art. 555.º) e o pedido de prestações vincendas (art. 557.º).
Princípio da Celeridade Processual
O art. 20.º da CRP consagra o direito constitucional do acesso ao Direito e a uma tutela jurisdicional efetiva. No n.º 4 desse preceito institucionaliza-se o direito de todos (os cidadãos) a que uma causa em que intervenham seja objeto de decisão em prazo razoável e mediante um processo equitativo. Também o n.º 1 do art. 2.º do CPC - corolário lógico daquele direito fundamental - institui a garantia de acesso aos tribunais, sendo que a proteção jurídica através dos tribunais, ínsita no mesmo preceito, “implica o direito a obter, em prazo razoável, uma decisão judicial que aprecie, com força de caso julgado, a pretensão regularmente deduzida em juízo, bem como a possibilidade de a fazer executar”.
Princípios Relativos à Apreciação da Prova
Princípio da Livre Apreciação da Prova
No sistema de prova legal, o juiz encontra-se vinculado a regras legais que estabelecem de modo estrito o valor probatório de cada um dos meios de prova; no sistema de prova livre, o tribunal goza de inteira liberdade na apreciação das provas. Vigora, entre nós, um sistema híbrido ou misto. Consagra com efeito o citado preceito o princípio da liberdade de julgamento (art. 607.º). Assiste, pois, ao julgador o poder de livremente decidir – depois de ponderada a apreciação e avaliação – os diversos pontos de matéria de facto segundo a sua prudente e íntima convicção. Convicção esta alicerçada em regras técnicas ou em máximas de experiência, bem como em conhecimentos pessoais de ordem lógico-dedutiva sobre as realidades da vida e da convivência social. Elementos estes conducentes à prova direta do facto controvertido ou à ilação da realidade desse facto através da prova ou de um facto indiciário, nesta segunda hipótese se fundando a prova numa presunção natural ou judicial (art. 351.º CC). Poder que se exerce não apenas no que respeita à admissibilidade dos meios de prova propostos ou requeridos pelas partes, como também no que se refere à determinação do seu valor probatório. Em sede de julgamento da factualidade controvertida não está vedado ao julgador o recurso a presunções judiciais (arts. 349.º a 351.º CC), impondo-se-lhe o recurso a regras de experiência. Não se trata de um poder arbitrário ou discricionário, porquanto a liberdade conferida ao juiz é, no fundo, uma liberdade subordinada ou condicionada a um dever – dever de prosseguir a verdade material. Não se torna exigível que a convicção do julgador sobre a validade dos factos alegados pela parte assente num juízo de certeza absoluta, bastando que se baseie num juízo de razoável probabilidade, quiçá legitimado com recurso às presunções judiciais. Em caso de dúvida insanável há que fazer funcionar as regras distributivas do ónus da prova e da respetiva satisfação ou insatisfação pela parte sobre a qual esse encargo legalmente impendia (arts. 342.º a 348.º CC e art. 414.º CPC).
Princípio da Aquisição Processual
No art. 413.º, o tribunal deve atender na sua ponderação todos os factos que relevantes, bem como a todo o material probatório (todas as provas), tenham ou não tenham resultado da iniciativa ou atividade da parte que deveria produzi-la em obediência às regras de distribuição do ónus da prova. Assim, estes materiais, aduzidos embora por uma das partes no cumprimento do seu ónus subjetivo, ficam adquiridos para o processo, sendo por isso atendíveis mesmo quando sejam favoráveis à parte contrária. Não pode a parte retirar do processo uma prova já apresentada ou renunciar às suas provas uma vez produzidas, embora delas possa desistir antes dessa produção (arts. 474.º, 465.º).
Princípio da Imediação
Decorre logicamente dos princípios da prossecução da verdade material e da livre apreciação das provas, uma vez que ambos reclamam um contacto direto (imediação) do tribunal com os diversos intervenientes no processo e com a respetiva atividade alegatória/probatória com vista a proporcionar ao julgador uma melhor apreciação, ou seja, um juízo mais correto acerca da veracidade ou falsidade de uma dada afirmação ou alegação factual. Traduz-se no contacto pessoal entre o juiz e as pessoas ou coisas que servem de fontes de prova, devendo os meios de prova, em princípio, ser apresentados diretamente perante o julgador e devendo este, por sua vez, ter um contacto presencial e direto com eles. Concretização prática deste princípio é o n.º 3 do art. 604.º ao determinar quais os diversos atos de prova que devem ser realizados ou ser presentes ao juiz da audiência final. O princípio assume especial acuidade em primeira instância, sendo que é nela que é produzida a generalidade das provas pré-constituídas e constituídas, mas pode ser igualmente operante na segunda instância, nos casos em que o Tribunal da Relação entenda usar dos poderes que lhe são conferidos pelo n.º 2 do art. 662.º. Postula ainda o princípio que se dê prevalência à prova mais direta e mais recente, por se encontrar mais disponível ou acessível. Princípios com natureza instrumental relativamente a este: concentração, continuidade da audiência, oralidade, identidade do juiz e da publicidade da audiência e processo.
Princípio da Concentração e da Continuidade da Audiência
N.º 3 do art. 606.º. Princípio da concentração da audiência final, se possível, num dia só. Significa que os atos sequenciais de instrução, discussão e julgamento se realizem seguidamente e com o menor intervalo temporal possível entre eles (se possível). Todos os atos de produção de prova deverão ter lugar numa mesma sessão de audiência e que esta deve ser contínua (art. 606.º, n.º 2). Nem que para tanto tenham que sacrificar-se as férias judiciais e as diligências de outra secção diferente daquela por onde correr o processo, sendo que só em casos muito contados a audiência pode ser diferida ou adiada (n.º 3). Uma vez iniciada, a audiência deve prosseguir nos dias úteis imediatos sucessivos, ainda que com prejuízo de serviço já marcado. As irregulares interrupções em casos limite que ultrapassem a mera irregularidade integram nulidade processual se tiverem influído no exame e decisão em causa.
Princípio da Oralidade
Significa que os atos de instrução, decisão e julgamento da matéria de facto se devem fazer seguidos e oralmente, sem prejuízo da sua gravação obrigatória em registo adequado (art. 155.º, n.º 1). A forma escrita impõe-se em relação a todos aqueles atos processuais cujo conteúdo tenha de permanecer inalterado ou apenas consista em as alterações permitidas por lei e sujeitos a estrito controlo posterior. Já a instrução e discussão da matéria de facto em audiência final se encontra estruturada de harmonia com o princípio da oralidade (art. 604.º). Por força do disposto do art. 155.º, a audiência final, quer de ações, quer de incidentes e procedimentos cautelares, é sempre gravada mediante sistema sonoro, sem prejuízo de outros meios audiovisuais ou de outros processos semelhantes de que o tribunal possa dispor. A audiência prévia também é sempre gravada.
Princípio da Identidade do Juiz
O juiz que preside à produção da prova e a aprecia deve, em princípio, ser o mesmo que profere a decisão final. O juiz da causa é um único. Se houvesse muitos juízes já não seria possível passar a informação de forma fidedigna. Podia haver falhas na informação passada. Existem exceções, por exemplo se o juiz morrer. Os atos já realizados são, então, repetidos. Se o impedimento for definitivo os atos são retomados. Se for temporário é interrompido (art. 605.º CPC). 1- Se durante a audiência final falecer ou se impossibilitar permanentemente o juiz, repetem-se os atos já praticados; sendo temporária a impossibilidade, interrompe-se a audiência pelo tempo indispensável, a não ser que as circunstâncias aconselhem a repetição dos atos já praticados, o que é decidido sem recurso, mas em despacho fundamentado, pelo juiz substituto. 3 - O juiz que for transferido, promovido ou aposentado conclui o julgamento, exceto se a aposentação tiver por fundamento a incapacidade física, moral ou profissional para o exercício do cargo ou se for preferível a repetição dos atos já praticados em julgamento. A infração a estas regras é também potencialmente geradora de nulidade processual.
Princípio da Publicidade
As audiências dos tribunais são públicas, salvo quando o próprio tribunal decidir o contrário, em despacho fundamentado, para salvaguarda da dignidade das pessoas e da moral pública ou para garantir o seu normal funcionamento (art. 206.º CRP). Assim, a audiência final deve ser pública. Princípio este a que subjaz a ideia de assegurar a transparência da administração da justiça em geral e do julgamento em particular, bem como o auto e o heterocontrolo dos julgadores. De assinalar, contudo, que as ações sobre o estado das pessoas (divórcio, investigação e impugnação de paternidade ou maternidade) ou em que estejam em causa direitos fundamentais de personalidade aconselharão normalmente o julgamento à porta fechada. A publicidade reporta-se quer à abertura ao público quer ao relato público. O processo civil é público.
Também este direito de acesso aos autos é limitado nos casos em que a divulgação do seu conteúdo possa ser lesiva da dignidade das pessoas, da intimidade da vida privada ou familiar ou da moral pública ou pôr em causa a eficácia da decisão a proferir. Poderão os mandatários judiciais obter informações sobre o estado dos processos em que intervenham através de acesso aos ficheiros informáticos existentes nas secretarias. Os mandatários judiciais, os magistrados do Ministério Público e os que exerçam o patrocínio por nomeação oficiosa podem solicitar, por escrito ou verbalmente, que os suportes físicos de processos pendentes que contenham atos e documentos que não tenham representação eletrónica, lhes sejam confiados para exame fora da secretaria do tribunal – confiança de processo (art. 165.º, n.º 1). Os processos de execução só podem, contudo, ser facultados aos executados após a citação, ou, nos casos previstos no art. 626.º, após notificação, sendo também vedado o acesso à informação relativa aos bens indicados pelo exequente para penhora e atos instrutórios da mesma. O acesso à informação do processo também pode ser limitado em respeito pelo regime legal de proteção e tratamento de dados pessoais quando, estando em causa dados pessoais constantes do processo, os mesmos não sejam pertinentes para a justa composição do litígio (art. 164.º, n.º 3).