Psicoterapias: Abordagens, Técnicas e Aplicações

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Terapia Psicanalítica

Criado por Freud, o método psicanalítico assenta no pressuposto de que os problemas neuróticos têm origem em traumas e conflitos recalcados no decurso da infância. O papel do terapeuta é fazer com que a pessoa traga à consciência o seu passado remoto, o reviva e compreenda as razões por que os incidentes ocorreram. Uma vez consciente das causas traumáticas, o paciente liberta-se e os sintomas incomodativos desaparecem. Esta tarefa terapêutica é levada a cabo por psicanalistas, que se servem de procedimentos específicos, que, de resto, já estudámos no Tema 1 da Unidade 2. Estes processos partem da convicção de que os sonhos, as hesitações de linguagem, os atos falhados e a revivência de acontecimentos passados são portas de acesso ao universo conturbado do inconsciente e, simultaneamente, saídas pelas quais as vivências frustrantes podem escapar.

Psicoterapias Humanistas

Ao contrário das psicoterapias de inspiração psicanalítica, as terapias humanistas dão mais importância aos pensamentos e sentimentos conscientes do que aos aspetos inconscientes da mente, ao presente do que ao passado. O seu objetivo não é tanto o de curar doenças reduzindo tensões devidas a recalcamentos, mas o de promover o crescimento pessoal e a autocompreensão da pessoa que solicita terapia. Dito de outro modo: as psicoterapias humanistas encorajam os indivíduos a assumirem-se e a assumirem a responsabilidade pelas suas ações e sentimentos de modo a compreenderem-se a si mesmos. Procuram ajudá-los a desenvolver perante a sociedade um sentido de liberdade, tomando consciência do que estão a fazer das suas vidas. Há duas formas de psicoterapia humanista: a terapia centrada na pessoa (desenvolvida por Carl Rogers) e a terapia da Gestalt (criada por Frederick Perls).

Carl Rogers: Terapia Centrada na Pessoa

Rogers acreditava que os seres humanos são naturalmente bons, mas que a sociedade exige de nós excessivo conformismo. Habitualmente não recebemos louvor e estima, a não ser que correspondamos à expectativa dos outros, a não ser que sejamos como eles querem ou esperam que sejamos. Em suma, vivemos em geral demasiado preocupados com as expectativas do meio social. Quando não nos consideramos à altura dessas expectativas, dá-se uma redução da nossa autoestima e da nossa crença na possibilidade de sermos queridos e amados pelo que somos. Isto significa que há um desacordo entre o nosso eu ideal – o que desejamos ser de acordo com as expectativas dos outros – e o nosso eu real – o que realmente somos. A necessidade de terapia surge quando uma pessoa – e Rogers nunca utiliza o termo paciente – dá mais importância às avaliações e opiniões dos outros sobre si do que às suas próprias. Segundo Rogers, as pessoas muitas vezes distorcem os seus próprios sentimentos e desejos, formam uma falsa imagem de si para responderem à pressão das expectativas sociais, submetem-se para serem aceites a juízos impostos a partir do exterior. O principal objetivo da terapia humanista é o de ajudar as pessoas a tornarem-se verdadeiramente conscientes dos seus sentimentos e desejos, do que realmente são. Devem ser elas mesmas, ganhar controlo sobre as suas próprias vidas, em vez de agirem meramente segundo o que os outros esperam delas e julgam que elas devem ser.

Para que a terapia tenha sucesso, é preciso criar um ambiente terapêutico acolhedor, que aceite as pessoas como elas são. Neste sentido, o terapeuta que se centra na pessoa deve evitar desaprovar o que esta faz ou diz em ambiente terapêutico. Rogers pensava que esta atitude incondicionalmente positiva favorecia e fomentava a autoestima do indivíduo. O terapeuta abdicava de um papel diretivo, não tentando conduzir o indivíduo a qualquer descoberta. Devia identificar-se com o cliente. Devia limitar-se a ouvir ativamente num ambiente de empatia os problemas do cliente e encorajar a autonomia, a avaliação independente dos seus atos, pensamentos e sentimentos.

Frederick Perls: Terapia da Gestalt

Tal como a terapia centrada na pessoa, a terapia da Gestalt centra-se na pessoa e na consciência, procurando que o cliente desenvolva a consciência de si mesmo e aumente o grau de aceitação de si próprio (fomento da autoestima). Perls acreditava que grande parte dos problemas psicológicos advinha do facto de o indivíduo se recusar a aceitar o que é ou ter dificuldade em expressar os seus sentimentos e desejos. Muitas pessoas têm medo dos juízos dos outros e isso traduz-se em comportamentos defensivos – negamos o que somos, mascaramos o que somos para evitar o confronto com o que os outros pensam sobre nós.

Ao contrário da terapia centrada na pessoa, esta forma de psicoterapia tem um caráter fortemente diretivo. Muitas vezes, o terapeuta confronta, desafia e frustra as opiniões e avaliações do seu cliente. Dá opiniões ou sugestões acerca do problema que o seu cliente está a viver e orienta-o na descoberta do que realmente pensa e sente. Uma técnica muito usada e ilustrativa é o desempenho de papéis (role playing), uma espécie de dramatização de sentimentos e conflitos ou assunção de papéis como os de indivíduo culpado ou de criança submissa. Imaginemos que um cliente está perturbado por um conflito com a sua mãe. O terapeuta pode reatualizar ou reabrir o conflito fazendo o papel de mãe, enquanto a outra parte faz o papel que na vida real desempenha. O cliente poderá ser encorajado a reativar os sentimentos de hostilidade em relação à figura materna, gritando, insultando, pontapeando objetos, etc. A terapia da Gestalt defende que, assim, será o indivíduo que vai gerir os seus conflitos, em vez de serem estes a dominá-lo.

Psicoterapias Comportamentais

As psicoterapias comportamentais usam determinados princípios estabelecidos por teorias da aprendizagem como as de Watson e Skinner para reduzir e eliminar comportamentos desadaptados. Este tipo de psicoterapias defende que os comportamentos desadaptados não são o sinal ou o sintoma de problemas internos. Os próprios comportamentos são o sintoma dos problemas. Por isso, os indivíduos podem tomar consciência das razões por que andam deprimidos e, contudo, continuarem deprimidos. A depressão é uma resposta observável que está diretamente ligada a aspetos observáveis do meio (mau ambiente familiar, por exemplo, ou fracasso familiar).

Vejamos algumas técnicas usadas nesta modalidade de psicoterapia.

Terapia da Aversão

Como tratar um problema de alcoolismo? O tratamento consiste em associar estímulos segundo os princípios do condicionamento clássico. Damos a um alcoólico uma droga que produz náuseas. Um pouco antes de a droga começar a fazer efeito, damos ao paciente uma razoável quantidade de uma bebida alcoólica. Assim, o gosto e o cheiro da bebida são seguidos por náuseas. Ao fim de algum tempo, o emparelhamento sucessivo da droga indutora de náuseas e da bebida alcoólica faz com que ver ou cheirar a bebida alcoólica induza náuseas e provoque aversão. O álcool deixará de ser associado a algo

Dessensibilização Sistemática

Esta técnica, inventada em 1950 pelo psiquiatra Joseph Wolpe, baseia-se também no condicionamento clássico e é sobretudo usada para tratar fobias. Está dividida em duas fases:

  • Numa primeira fase, que dura várias sessões, ensina-se ao paciente a técnica de relaxamento muscular que lhe permita atingir um estado de calma e tranquilidade até aí desconhecido;
  • De seguida, procede-se à progressiva exposição ao estímulo que causa ansiedade e medo. Imaginemos que alguém sofre da fobia das alturas. O psicoterapeuta começará por pedir ao paciente que relaxe imaginando que está à janela do segundo andar de um prédio, depois à janela do terceiro, do quarto, do quinto e assim sucessivamente até conseguir imaginar, sem se sentir ansioso, que está na varanda do último andar de um arranha-céus. Em situações reais relativas a pessoas com medo de cobras, pode começar-se por pedir que procurem a palavra cobra no dicionário, que leiam a sua definição e terminar o processo visitando a secção de répteis no jardim zoológico. Pretende-se que, após o tratamento, os pacientes que se sentem muito ansiosos quando pensam acerca de um objeto (cobra), quando estão perto de uma coisa ou quando vivem uma situação (viajar de avião) possam vencer essas fobias.

Economia da Recompensa

Em alguns hospitais psiquiátricos, os pacientes tendem a perder boa parte das suas aptidões sociais. Referimo-nos a competências tais como saudar outra pessoa e a responder quando se é interpelado. Trata-se de formas de comportamento básicas e necessárias para o dia a dia, seja onde for. Os psicólogos descobriram que é importante recompensar os pacientes imediatamente depois de exibirem os comportamentos desejáveis. Para o fazerem, usam uma técnica terapêutica designada economia da recompensa ou do prémio. O comportamento desejado é recompensado com uma rifa ou uma senha que depois pode ser trocada por reforços ou recompensas apetecíveis (doces, dinheiro, cigarros ou uma ida ao cinema).

Modelação

Esta é considerada uma das formas mais eficazes de modificação comportamental. Trata-se de, em condições controladas e protegendo devidamente o paciente, o orientar para uma progressiva aproximação ao estímulo ou situação que provoca ansiedade e medo. Como consegui-lo? Imaginemos que tenho medo de cobras ou de cães. A modificação comportamental consistiria em, ao longo de várias sessões, observar outras pessoas a lidarem com tais animais sem que nada de mal lhes acontecesse. Ser-me-ia depois solicitado que fizesse o mesmo.

O psicólogo Albert Bandura mostrou que esta técnica – que corresponde a um ato tão espontâneo e frequente na nossa vida quotidiana – pode ter taxas de sucesso elevadas na redução do medo, uma vez que o paciente, através da modelação, vai desenvolvendo autoconfiança ou crença na sua capacidade de imitar o que observou e assim ser bem-sucedido. Por outras palavras, a técnica da modelação resulta na crença de que podemos dominar a situação e, à semelhança do que aconteceu com o modelo observado, podemos conseguir resultados positivos.

Psicoterapias Cognitivas

As terapias cognitivas baseiam-se na seguinte crença: são, em grande parte, as nossas cognições e pensamentos que estão na origem de comportamentos desajustados e de problemas psicológicos. Imaginemos que Fernando, jovem de 16 anos, julga que é um inútil. Pensa que é um fracasso quer para os seus professores quer para os seus pais por não ter decidido a sua vida profissional. Mas na verdade exagera esses aspetos negativos e esquece os positivos. O seu tipo de comportamento é muito comum em indivíduos que sofrem de depressão. Ora, o objetivo das terapias cognitivas é o de mudar cognições distorcidas («Não presto», «Não valho nada», «Ninguém gosta de mim pelo que sou, mas só pelo que tenho») de modo a eliminar comportamentos desadaptados. O alvo das terapias cognitivas são os pensamentos e crenças conscientes dos pacientes, utilizando uma abordagem diretiva muito vincada na relação com o paciente.

Terapia Racional-Emotiva de Albert Ellis

Ellis acreditava que desenvolvemos perturbações psicológicas por causa das nossas crenças, em especial as que são irracionais e autodestrutivas. A terapia proposta por Ellis baseia-se na famosa teoria ABC das emoções. A designa o acontecimento Ativante que se dá na vida da pessoa, como, por exemplo, um divórcio conturbado, um despedimento ou o fracasso no acesso à universidade. B é a crença (Belief) que se forma na mente do paciente. C é a Consequência emocional dessa crença. O psicoterapeuta trabalha com o paciente para, no caso de isso lhe parecer verdadeiro, o convencer de que o fator B, responsável pela passagem de A a C, resulta de uma perceção distorcida da realidade. Suponhamos que um indivíduo acredita irracionalmente que todas as pessoas devem gostar dele e se sente infeliz quando alguém não corresponde a esse desejo. O primeiro passo consistirá em tentar convencê-lo de que é descabido querer que todos gostem de nós e de que é normal que nem toda a gente goste de nós. O psicoterapeuta desafia ativamente aquilo que o paciente pensa. Conseguindo-se que o paciente admita a irracionalidade da sua crença, trata-se de o libertar dela para que esses pensamentos não ocorram de novo. Escusado será dizer que um longo trabalho espera o psicoterapeuta e o paciente. As nossas crenças tornam-se muitas vezes hábitos e manifestam-se automaticamente, a não ser que enfrentem uma resistência ativa.

Vejamos outro exemplo: Alberto vê um anúncio de emprego no jornal e fica entusiasmado porque acredita que aquele é o emprego certo para si e ele a pessoa certa para o lugar. Candidata-se imediatamente. A partir daí, espera todos os dias que o telefone toque a convocá-lo para uma entrevista. Contudo, algumas semanas mais tarde recebe uma carta informando-o de que o seu emprego perfeito fora oferecido a outro candidato. Fica devastado. Ellis argumenta que Alberto não deveria ter ficado infeliz e deprimido por não ter conseguido o emprego nem interpretar a situação como sinal de falta de capacidade. Deve antes pensar que havia dezenas de candidatos ao lugar com muita experiência e competência. Mais, deve convencer-se de que a empresa que não o contratou perdeu um valioso empregado.

Assim, o método terapêutico de Ellis ensina os seus pacientes a detetarem crenças que distorcem a realidade e são autoderrotantes, desafia essas crenças (as interpretações de determinadas situações) e incita-os a desenvolverem crenças alternativas racionais, mais próximas da realidade e mais favoráveis à autoestima do indivíduo.

Terapia Cognitiva de Beck

Aaron Beck é um psicoterapeuta americano que se especializou no tratamento de depressões. Estava convicto de que as pessoas deprimidas têm uma visão negativa de si mesmas, do seu mundo e do seu futuro. É frequente interpretarem os acontecimentos de forma distorcida e são muito dadas à autocensura. As interpretações distorcidas que fazem das situações, são alimentadas por «pensamentos automáticos», ou seja, por frases de teor negativo que constantemente repetem a si mesmos («Não sou capaz de fazer amigos») e que ocorrem mesmo que sejam contrárias à realidade objetiva. Há um problema com esses pensamentos automáticos: são rapidamente aceites pela pessoa deprimida e são repetidos tantas vezes que se tornam parte do habitual modo de pensar do indivíduo. Por outro lado, apesar de provocarem emoções desagradáveis, não temos geralmente consciência plena da sua influência nas nossas reações emocionais.

A terapia de Beck é mais suave do que a de Ellis, uma vez que, por um lado, não informa imediatamente os seus pacientes sobre os seus pensamentos desajustados e, por outro lado, tenta que sejam os pacientes a descobrir esses pensamentos e a corrigi-los. Beck prefere este procedimento à terapia diretiva porque torna possível que os pacientes se apercebam de que podem corrigir pensamentos inadequados e não dependerem sempre do psicoterapeuta.

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