Qualidade em Saúde: Limitações, Medição e Melhoria Contínua

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1. Limitações à Qualidade em Saúde

Case Mix

Situações de multipatologia (ex.: processo de envelhecimento). As patologias interagem entre si, logo as intervenções também irão interagir entre si. A probabilidade de melhoria do estado de saúde diminui.

Gravidade da Doença

A probabilidade de melhoria do estado de saúde depende do estádio da doença, ou seja, quanto menor for o estádio da doença, maior será a probabilidade de melhoria do estado de saúde (ex.: doença oncológica).

Expectativas

O cuidador tem que saber gerir as expectativas da população, que normalmente se baseiam na cura, explicar a situação de doença e quais os limites de tratamento. Se as expectativas não forem geridas, entramos na submedicação, subtratamento e subintervenção (pode levar a iatrogenias): tentativa de controlar a doença, indo para além das suas fronteiras, à procura de tecnologia milagrosa. O cuidador deve ter presente na sua atuação as fronteiras da tecnologia, e o que a tecnologia pode oferecer em cada situação.

Efetividade da Tecnologia

As tecnologias produzem resultados limitados, a maioria possui efeitos colaterais, e a sua especificidade é ainda limitada. Os nossos conhecimentos também são tecnologias.

Recursos

Tem a ver com a quantidade (a sua distribuição) e qualificação: técnicos (saberes e competências), financeiros (orçamento), organizacionais (desenhos adaptados às necessidades). Perante um desvio da qualidade fazemos um diagnóstico da organização e das competências.

2. Orientações para o Utilizador

Orientação para o Utilizador

Todos os recursos, competências e conhecimentos são orientados para o utilizador saudável ou não saudável, atuando assim no âmbito da promoção da saúde e prevenção da doença.

Quem São os Utilizadores

Idade, género, raça, nacionalidade, grupo etário, estado civil, religião, habilitações literárias, profissão, antecedentes pessoais (alergias, hábitos nocivos, antecedentes familiares).

Identificação de Necessidades e Expectativas

Colheita de dados, anamnese, parâmetros de crescimento, vacinação, comportamento. Expectativas: entrevista, esclarecimento de dúvidas, receios, avaliação da adaptação.

Verificação da Satisfação das Necessidades

Comparar os comportamentos observados com os esperados, validar conhecimentos, realizar ensinos.

Disponibilidade e Obtenção de Recursos

Financeiros, ambientais (ambiente calmo, privacidade, propício), humanos (prestadores diretos e indiretos), materiais (tecnologia, folhetos, guias do utente, material necessário). Os conhecimentos e competências dos prestadores de cuidados diretos assegurando a formação periódica dos mesmos.

Acompanhamento da Evolução das Necessidades

Registo adequados, boletim individual de saúde e vacinação. Incentivar a continuidade das consultas, esclarecer dúvidas e ter escuta ativa, questionários de satisfação, sugestões e necessidades sentidas e atualizar os conhecimentos técnico-científicos através da investigação com base na evidência.

3. Requisitos para Cada Processo

Exigências

Em termos de especificação do utilizador. Quais as especificações necessárias para resolver um problema.

Condições

Instalações, equipamentos, competências profissionais, procedimentos ou instruções, para cada processo.

Indicadores

Permitem manter o processo sob controlo, pois é no processo que se fazem os procedimentos. Servem para medir a percentagem de procedimentos realizados relativamente aos esperados, para análise de desvios, frequências, etc. Verificar quantitativamente os processos que são realizados relativamente aos esperados - desvios.

Comunicação

Potencia a obtenção de um maior valor acrescentado entre profissionais - complementaridade para ajustar expectativas.

4. Instrumentos de Medida da Qualidade

Critério

Instrumento de medida que determina as condições que os cuidados de saúde hão de cumprir para que possam ser considerados de qualidade - quais as condições da estrutura (o que deve estar presente), do processo (o que deve ser feito), e dos resultados (o que se deve obter), para serem considerados de qualidade.

Exemplos de critérios: Critérios para qualificação: observação direta da manipulação de CTDL:

  1. Realizar higienização das mãos.
  2. Realizar a manipulação do CTDL com técnica estéril, etc.

Padrão

Especificação de quanto de um critério se deseja observar.

Exemplos de padrões:

  • Garantir uma taxa de cobertura vacinal aos 2 anos de idade ≥ 95%.
  • Garantir a vigilância do crescimento de ≥ 75% das crianças do grupo etário 0-5 anos.
  • Garantir uma taxa ≤ 1% de infeções nas feridas suturadas.

Indicador

É um instrumento quantitativo destinado a avaliar atividades e orientar os prestadores através da monitorização dos cuidados de saúde prestados.

Exemplos de indicadores:

  • Total de crianças 0-2 anos com o esquema completo de vacinação / Total de crianças 0-2 anos recenseadas x 100;
  • Total de crianças 0-5 anos a quem foi vigiado o crescimento / Total de crianças 0-5 anos recenseadas x 100;
  • Total de doentes com infeção das feridas suturadas / Total de doentes com feridas suturadas sob observação x 100.

5. Definição de Qualidade em Saúde

É o conjunto das características de uma entidade (bem, produto ou serviço) que lhe confere aptidão (capacidade) para satisfazer necessidades explícitas (procura de cuidados) ou implícitas (oferta de cuidados). Melhoria do estado de saúde correspondente às expectativas de uma população, dadas as limitações da tecnologia existente. Cada processo para ter qualidade deve ter como finalidade a melhoria do estado de saúde. É a prestação de serviços acessíveis e equitativos, com um nível profissional ótimo, que tem em consideração os recursos disponíveis e consegue a adesão e satisfação dos utilizadores.

6. Ciclo de Melhoria Contínua da Qualidade

1. Avaliar: O Que Se Passa?

Avaliar o que se está a fazer, de forma sistemática. Comparar com o que se devia fazer, para identificar problemas.

Identificação de Problemas

Podem ir de 0 até n problemas. É comparado o observado com o esperado, no que diz respeito à estrutura, processo e resultados, através de indicadores:

  • Percentagens: totalidade dos critérios observados / totalidade dos critérios esperados x 100;
  • Rácios (duas quantidades com qualidades diferentes): nº de enfermeiros / nº de utentes - é um padrão de qualidade da estrutura.

Existe sempre variabilidade no processo (decorrente dos cuidados prestados) e nos resultados (decorrente dos problemas). Se a estrutura for muito incerta ou pouco fixa, então irá existir ainda maior variabilidade: o que queremos é que o rácio seja constante.

Problemas conjunturais (esporádicos): frequentemente presentes no processo.

Problemas estruturais (crónicos): frequentemente presentes na estrutura.

Taxas de Incidência

Consiste na incidência de um acontecimento - um acontecimento x possui um valor aceitável entre y e w.

Ex.: taxa de incidência de úlceras por pressão:
(nº de acontecimentos novos num ano / nº de acamados do hospital ou no domicílio no último ano) x 100

Taxas de Prevalência

(Total de casos novos + os casos antigos dos anos anteriores (até ao caso mais antigo) / Total de acamados dos anos anteriores + novos acamados deste ano) x 100

Revisão de Fichas

Verificação e análise dos registos de enfermagem - se foram feitos, se os critérios foram cumpridos, para se identificar desvios. As fichas de enfermagem também são descritivas: a descrição significa a competência de perceção de uma dada situação de saúde. Assim existem dois tipos de registos: registo de critérios (análise quantitativa do que foi realizado) e registos descritivos (análise qualitativa do que foi analisado).

Técnicas Grupais

O focus group e o brainstorming permitem identificar problemas para os quais ainda não existem normas (desempenho incerto) e antecipar problemas.

Queixas

O livro de ocorrências interno é centrado no prestador e pode decorrer da autoavaliação (desejavelmente), e o livro de reclamações é centrado no utilizador e decorre da sua satisfação em relação à estrutura, ao processo, e aos resultados. Nos resultados podem existir desvios entre o observado e as expectativas do utilizador: as expectativas podem ser não admissíveis (ex.: tecnologia) ou admissíveis (são razoáveis e o resultado podia ser melhor decorrente do que foi feito no processo).

As queixas dos utilizadores permitem identificar aspetos de estrutura, processo e resultados que podem ser melhorados: são muito importantes, para dar início ao processo de correção.

Avaliação

Comparação do padrão observado com o padrão previamente estabelecido, de outro estabelecimento ou da bibliografia.

Padrão estabelecido: Normas: são oficiais e correspondem ao melhor valor nacional (DGS) e internacional (OMS/WHO).

Golden Standard

Na ausência de normas nacionais, a comparação faz-se através dos valores de um estabelecimento que tenha os melhores valores relativamente a um dado processo/resultado (valor de referência) num dado período.

Bibliografia: pesquisa relativamente aos melhores valores de uma dada estrutura, processo ou resultados.

2. Planear: O Que Mudar?

Na estrutura, no processo e nos resultados.

As mudanças que podem ocorrer devido aos desvios que existem são:

  • Mudanças estruturais: ligadas aos recursos tecnológicos (ex.: tecnologias ultrapassadas e que já não produzem os resultados esperados), financeiros, e instalações.
  • Mudanças no processo: desempenho dos profissionais de forma contextualizada, face a cada situação/processo (aplicação das competências profissionais).
  • Mudanças nos resultados: interação prestador/utilizador (resultado ajustado).

Os objetivos de mudança têm que ter descritos quanto e quando mudar para serem precisos e avaliáveis.

Introdução de Correções

Estrutura

Substituição de tecnologias, por regra, por outra equivalente (substituição de stocks) ou por inovação (tecnologias mais rigorosas e fiáveis).

Processo

Capacitação para o desempenho dos prestadores - aquisição de novos conhecimentos e competências (saber aplicar) ou melhoria do treino em relação aos atos, de forma a que seja melhorada a aplicação de competências na rotina.

Melhoria das Competências

Centrada nos prestadores ou nos serviços de saúde (não prestam cuidados de acordo com a sua missão), para a melhoria dos conhecimentos e das capacidades. As competências estão associadas à posse de conhecimentos.

Pessoa competente = conhecimento + capacidade. Onde está o desvio? Nas capacidades e/ou nos conhecimentos? Quando o erro está nas capacidades tem a ver com a aplicação dos conhecimentos técnico-científicos.

Alterar Procedimentos

Alterar o fluxo de acontecimentos (sequência de procedimentos), ou inovação/atualização dos procedimentos (existe uma nova maneira de se proceder decorrente da evidência científica).

Substituição de Tecnologias e Equipamentos

Stocks ou equipamentos decorrentes da inovação tecnológica para obtermos melhores resultados, executando melhores processos, pois a inovação é mais rigorosa (menos falsos positivos e menos falsos negativos).

Redesenhar Segmentos Organizativos

Redesenhar segmentos organizativos ou estilos de gestão: ex. cuidados continuados. Os idosos com alta clínica e com indicação de cuidados continuados, sem alta para o domicílio, possuem riscos de infeção nosocomial, hospitalismo (meio ambiente propício à depressão, por estarem sempre no hospital). Redesenhar permite aumentar ganhos de eficiência organizativa, evitar custos indesejáveis (mortalidade e morbilidade intra-hospitalar para doentes): reduzir riscos para os doentes redesenhando os segmentos organizativos.

3. Verificar: O Que Mudou? (Reavaliar)

Reavaliar = desempenho corrente + correção / padrão. Consiste em avaliar se as correções introduzidas foram adequadas e pertinentes aos erros e se melhorou o processo.

Reavaliação

Comparação do padrão observado com o padrão fixado e decorrente da introdução de correções, num horizonte temporal:

  • Introdução de correções: durante quanto tempo até serem transformadas em rotina, e serem esquecidas as antigas rotinas.
  • Obtenção do valor previamente fixado: fixar o momento da reavaliação - período durante o qual foram introduzidas as correções e o momento em que se vai reavaliar os efeitos das correções.

4. Agir: Garantia e Melhoria Contínua

Garantia

Após se atingir o valor desejado dentro do intervalo admissível, temos que garantir que se vai manter o valor desejado - manter a variação positiva na estrutura, no processo, nos resultados, ou nos três. Para tal temos que monitorizar, isto é, medir através de indicadores. É uma atividade de combinação e instalação de recursos que permite a manutenção dos padrões já alcançados. Atingindo um dado padrão decorrente da melhoria, qual foi a combinação de recursos (profissionais, tecnológicos, financeiros, etc.) que estiveram na origem dessa melhoria, que irá ser o benchmark interno.

Melhoria Contínua

A garantia pressupõe a melhoria, através da identificação sistemática de oportunidades para melhorar - trabalho em equipas de garantia da qualidade, para assim existir um padrão de controlo e garantia da qualidade, num ciclo de melhoria -> qualidade -> melhoria.

É um processo sistemático (contínuo) de identificação de oportunidades que possam elevar o nível de qualidade já alcançado. Está relacionado com a estrutura, processo e resultados, nunca esquecendo a satisfação.

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