A Questão Social e a Evolução do Estado-Providência

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A Questão Social e a Crise do Trabalho

A Questão Social (QS)

Refere-se à emergência do Estado Social e às suas diferentes modalidades e domínios da política pública.

A Nova Questão Social (NQS)

A fragilidade do modelo anterior leva à Nova Questão Social (NQS), uma problemática estruturada em torno do trabalho, que muda o seu entendimento e configuração do ponto de vista político e social. A sociedade oitocentista definia-se em torno do trabalho industrial. Devido à fragilidade a que o salário foi submetido, emergiu uma vulnerabilidade de massa nas relações de trabalho.

Por um lado, temos os mais atingidos (desempregados, mulheres, estrangeiros, entre outros) que vivem a relação de trabalho como algo instável e inseguro. Por outro lado, os restantes trabalhadores assistem à alteração daquilo que estruturava a questão social, nomeadamente:

  • A separação entre quem trabalha ou não e quem tem condições para ser protegido ou não.
  • A fixação do posto de trabalho.
  • A relação salarial, construída, regulada e remunerada.

O salário dita o consumo e permite o surgimento do tempo de lazer. O Estado assume um papel importante na proteção (institucional e legal).

No séc. XX, surge uma malha social de segurança do indivíduo no mundo do trabalho. Contudo, nos anos 70, verifica-se uma nova onda de insegurança, instabilidade, vulnerabilidade e precarização do trabalho.

Com a Grande Depressão e a II Guerra Mundial, o sistema capitalista é posto em causa, sendo a resposta o New Deal, que traz de forma permanente a presença do Estado e resolve muitos problemas.

O Modelo Fordista e as Suas Clivagens

O Fordismo caracterizava-se por:

  • Mecanismos de organização e desgaste dos trabalhadores.
  • Salário fixo.
  • Direitos e deveres.

A fábrica era um instrumento de dominação, regido pela "lei do mais forte", evidenciando a fragilidade do operário. Surgiram clivagens entre o rural, o industrial e o urbano (em contexto de miséria), e as redes institucionais e familiares deram lugar ao individualismo.

Perspetivas Sociológicas sobre a Marginalidade

Robert Castel

Castel foca-se na problemática da recomposição da relação salarial, da precarização e desfiliação do trabalho nas sociedades contemporâneas, bem como na marginalidade, exclusão social e nas transformações económicas, políticas e sociais.

Robert Castel não considera que o problema esteja nos indivíduos em si, pois estes não estão alheios à sociedade, fazendo parte de um processo central. A solução encontrada foi a criação dos Estados Sociais. Contudo, este modelo está a erodir, sendo esse o cerne da nova questão social. Castel não acredita num regresso aos tempos anteriores aos Estados Sociais, visto que esta solução definiu uma nova forma de encarar o problema. A sua análise centra-se nos processos de marginalização e nas estratégias de inserção.

“Trata-se de tentar tomar a marginalização como um processo e de compreender a situação desses indivíduos como resultado de uma dinâmica de exclusão, que se manifesta antes que ela produza efeitos completamente dessocializantes.”

A zona de exclusão é constituída não só pelos que já são marginalizados, mas também pelos que correm o risco de o ser. Relativamente à pobreza, Castel aponta a questão económica como central na maior parte das situações de marginalidade, mas sublinha que é difícil definir patamares de pobreza e que a informação económica, por si só, não é suficiente.

Loïc Wacquant

Wacquant analisa o impacto do novo regime de marginalidade, pautado por várias formas de pobreza inscritas na sociedade contemporânea. A violência emergente tem uma história própria em cada sociedade. O seu estudo foca-se na marginalidade, pobreza, relegação e recomposição salarial, através de um estudo etnográfico e de um exercício comparativo entre a periferia de Paris e o centro de Chicago.

  • Aspetos comuns: Ambos os locais são fortemente marcados pela pobreza.
  • Diferenças: Composições étnicas diferenciadas, diferenças ecológicas (espaço físico), incidência do perigo e da marginalidade com modalidades distintas, e políticas públicas diferentes. A presença do Estado é maior em França, onde a periferia é mais densa demograficamente, enquanto a mobilidade física é maior nos EUA.

O Estado foi o criador de muitas destas diferenças, que aumentaram com a desindustrialização e o desemprego. Ambos os contextos têm propriedades sociais, históricas e institucionais específicas.

Pontos em Comum: Wacquant e Castel

Ambos os autores partilham o foco nos conceitos de marginalidade e nos processos de precarização do trabalho.

O Modelo Social Europeu e os Seus Limites

A construção do Modelo Social Europeu baseia-se na intervenção do Estado nas relações sociais para responder aos desafios da sociedade. Com o passar do tempo, surgiram limites e novos desafios:

  • Movimento ecológico: Nos anos 60/70, a consciencialização sobre os limites da fratura ambiental trouxe o pensamento ecológico e a sustentabilidade para o debate.
  • Feminismo: A crítica da relação social em torno do género e as lutas contra a desigualdade de género levaram à criação de novas sensibilizações políticas.
  • Terceira Via: Deu prioridade aos direitos da cidadania associativa e a uma ética de responsabilidade.

O Estado Social envolve uma responsabilidade estatal em assegurar um mínimo de bem-estar aos cidadãos, através do desenvolvimento de serviços e da satisfação das necessidades básicas das famílias e grupos, tendo a despesa pública como foco.

Modelos de Estado-Providência

1. Modelo Liberal

Típico dos países anglo-saxónicos, caracteriza-se por:

  • O movimento de desmercadorização (redução da dependência do mercado) é muito difícil.
  • As soluções são, por princípio, privilegiadas e a qualidade dos serviços é baixa.
  • Os direitos sociais constituem-se com dificuldade, prevalecendo um modelo individualista.
  • Oferece um pacote de mínimos sociais.

2. Modelo Conservador

Apresenta uma lógica de progressiva desmercadorização (menos difícil que no modelo liberal):

  • Os direitos sociais constituem-se a partir de um modelo de seguro social, com contribuições prévias dos cidadãos.
  • Possui uma lógica estratificante: quem muito tem, muito contribui e muito recebe; quem pouco tem, pouco contribui e pouco recebe.
  • Oferece um pacote de mínimos sociais.

3. Modelo Social-Democrata

Predominante no Norte da Europa, procura a estabilização política e social:

  • Fornece bens e serviços do standard mais elevado possível, independentemente dos contributos prévios e das performances individuais.
  • Dependente do pleno emprego, fornece um patamar estável a qualquer cidadão.
  • Implementa soluções de proteção social ativa que não dependem de carreiras prévias ou de relações com o mercado de trabalho.
  • O cidadão tem um pacote básico de direitos que o liberta de certas exigências que outros Estados impõem para aceder a serviços sociais.
  • Oferece um pacote de máximos sociais, ao contrário dos modelos anteriores.

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