Reinado de Isabel II: Política, Reformas e Crise (1843-1868)
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Queda de Espartero e Proclamação de Isabel II (1843)
Em 1843, após novas eleições que deixaram Espartero sem apoio, formou-se uma verdadeira coalizão antiesparterista. O governo encarregou o progressista Joaquín María López de formar um gabinete, mas este programa, que limitava os poderes do regente e rejeitava Espartero, levou-o a demitir-se. A insurreição generalizada no verão de 1843 viu os liberais revoltarem-se contra a tirania do general e triunfarem graças ao apoio dos moderados. O exército, liderado por Narváez, juntou-se aos rebeldes e, a 12 de agosto, Espartero exilou-se em Londres.
Perante a falta de alternativas, deputados e senadores, por maioria, votaram pela proclamação de Isabel II como Rainha em novembro de 1843, embora ainda não tivesse completado 13 anos. Os moderados, regressados do exílio, assumiram posições na corte e Narváez tornou-se o homem forte do momento. Uma nova insurreição em Barcelona foi brutalmente reprimida por um então jovem general Prim.
Após a demissão do general López em novembro, seguiu-se o progressista Salustiano Olózaga, que foi expulso do poder através de um verdadeiro golpe de palácio moderado, terminando assim o governo progressista. A partir de dezembro de 1843, o novo chefe de governo, González Bravo, iniciou uma clara regressão. Ordenou a dissolução das milícias, aumentou o exército para 100.000 homens e restaurou a Lei Municipal de 1840. Foram emitidas ordens de detenção contra os principais líderes progressistas e os seus clubes e jornais foram encerrados. Além disso, o exército esmagou dois levantes militares em Cartagena e Alicante, resultando em mais de 200 execuções. Em 1 de maio de 1844, a Rainha nomeou Narváez, líder do partido moderado, Presidente do Conselho de Ministros.
A Década Moderada (1844-1854)
Com a década de 1844, inicia-se a Década Moderada, presidida pela figura de Narváez, o homem forte do partido, e, em menor medida, por Luis Bravo Murillo. Narváez controlava a vida política, tanto como chefe de governo quanto quando deixava a presidência do gabinete. Bom organizador, foi o arquiteto da Constituição de 1845 e de algumas das principais reformas legais, controlou o Exército e combateu os movimentos populares com extrema dureza.
Governos Iniciais de Narváez e a Constituição de 1845
Os governos iniciais de Narváez mostram uma continuidade com a linha política adotada por González Bravo. Ele convocou eleições para uma Assembleia Constituinte que aprovou, em 1845, uma constituição moderada, que, em teoria, era uma reforma da de 1837. Os princípios básicos da nova Constituição foram os seguintes:
- Soberania compartilhada entre o Rei e o Parlamento.
- Uma Declaração de Direitos muito teórica.
- Exclusividade da religião católica.
- Eliminação dos limites dos poderes do Rei.
- Senado composto por membros designados pela Coroa para a vida.
- Municípios e conselhos sob administração nomeada.
- Poder da Coroa para dissolver o Congresso.
- Supressão da Milícia Nacional.
Legislação e Reformas na Década Moderada
Além disso, houve uma parte significativa de legislação e reforma:
- Em 1846, foi aprovada uma lei eleitoral baseada no sufrágio censitário, que limitava o voto a 99 mil pessoas numa população de cerca de 12 milhões (em 1837, 635.000 pessoas votaram).
- Desde 1844, suspendeu as vendas de bens desvinculados e devolveu à Igreja os bens não vendidos.
- Foi aprovada uma Lei de Imprensa que restringiu a liberdade de edição e restabeleceu a censura.
- Nesse mesmo ano, foi criada a Guarda Civil, com o objetivo de garantir a ordem e a propriedade, especialmente nas áreas rurais. Contava com 6.000 soldados e caracterizava-se pela disciplina militar e pelo desempenho exemplar.
- Em 1851, foi aprovado um novo Código Penal e lançadas as bases para o futuro Código Civil.
- Seguindo o modelo francês e a Reforma da Província de Burgos de 1833, fortaleceu o poder dos governadores civis e militares.
- Finalmente, em 1845, reformou o sistema fiscal, eliminando o antigo sistema e fundindo os muitos impostos existentes em quatro contribuições essenciais.
A Concordata de 1851 e Conflitos
Em 1851, foi assinada uma Concordata com o Vaticano, sob a chefia de governo de Bravo Murillo. Esta concordata normalizou as relações entre o Estado e a Igreja Católica. Roma aceitou a venda de bens desvinculados e a legitimidade da monarquia isabelina. Em contrapartida, o Estado repôs à Igreja o resto das suas propriedades, providenciou um orçamento para o culto e o clero, e reservou para si o acompanhamento da educação religiosa e a vigilância e censura em matéria de doutrina. Regulamentou-se a jurisdição eclesiástica e a intervenção do Estado na nomeação da hierarquia.
Durante os primeiros anos, um problema sério foi o casamento da Rainha, que finalmente se uniu ao seu primo Francisco de Assis. Outro grave conflito foi a Segunda Guerra Carlista, iniciada em 1846 devido ao fracasso da união entre o pretendente carlista e a sua prima Isabel. Em 1848, tal como ocorreram rebeliões por toda a Europa, Narváez recebeu plenos poderes do Parlamento, suspendeu a Constituição e iniciou uma forte repressão nas ruas.
Crise do Partido Moderado
A crise do partido moderado veio da tentativa do chefe de governo Bravo Murillo (1851-1852) de reformar a Constituição. Apresentou um projeto de reforma que quase significou a eliminação da vida parlamentar e um retorno ao absolutismo. Três semanas após a apresentação do projeto, em dezembro de 1852, teve de se demitir, sucedendo-se vários governos menos eficazes. No final de 1853, o chefe de governo Sartorius dissolveu o Parlamento e governou de forma ditatorial.
O Biénio Progressista (1854-1856)
Este período começou com a Revolução de 1854. O primeiro pronunciamento do general Leopoldo O'Donnell desabou após um confronto com as tropas governamentais em Vicálvaro, a Vicalvarada. Mas as declarações públicas do Manifesto de Manzanares, escrito por Antonio Cánovas del Castillo, mudaram o cenário. Prometia uma adesão estrita à Constituição, mudanças na Lei Eleitoral e de Imprensa, redução de impostos e a restauração da Milícia Nacional. Com o apoio dos generais Serrano, Dulce e San Miguel, e da população, o golpe triunfou. Isabel II encarregou, a 26 de julho, o general O'Donnell de formar um governo, com o velho Espartero como Ministro da Guerra.
Reformas e a Constituição de 1856
Como primeiras medidas, o governo recuperou a Lei da Milícia de 1822, a Lei Municipal de 1823 e convocou as Cortes Constituintes. Nestas eleições, surgiu uma nova força política: a União Liberal. Era um partido de centro, composto pelos moderados mais progressistas e pelos progressistas mais moderados, como Joaquín María López, Herrera Posada, Cánovas ou o próprio O'Donnell. A coligação de unionistas e progressistas passou a dominar a maioria esmagadora das câmaras. Democratas e republicanos opuseram-se, com Castelar e Pi i Maragall como figuras proeminentes.
Além da Constituição que substituiria a de 1845 (e que nunca entrou em vigor), as principais reformas foram:
- A Desamortização de Madoz (1855).
- A Lei Ferroviária.
- As Leis de Bancos e Sociedades de Crédito (1856).
A Constituição de 1856
A Constituição de 1856 era a imagem do pensamento progressista. Os seus princípios incluíam:
- Soberania nacional.
- Uma declaração detalhada e precisa dos direitos individuais e liberdade de imprensa e religiosa.
- Limitação dos poderes da Coroa e do Governo.
- Municípios e conselhos eleitos.
- Restauração do Serviço Nacional Militar.
- Senado eleito.
- Extensão dos direitos de voto para 700.000 eleitores (sufrágio censitário).
Desamortização de Madoz e Desenvolvimento Económico
A Lei de Desamortização Geral foi promulgada em 1 de maio de 1855, sob o ministro das Finanças Pascual Madoz. Foi uma continuação da desamortização de Mendizábal de 1836, leiloando todos os tipos de propriedades urbanas e rurais pertencentes aos municípios, ao Estado, à Igreja e a vagas próprias. Parte dos recursos foi utilizada para lançar a Lei Ferroviária de 1855. O número de quilómetros de vias férreas cresceu de 200 km em 1853 para mais de 5.000 km em 1866, e grandes fortunas foram acumuladas especulando na bolsa de valores com ações de empresas ferroviárias. A Lei de Sociedades Anónimas, Bancos e Crédito de 1856 permitiu o surgimento de um mercado financeiro moderno.
Instabilidade Social e Fim do Biénio
Uma chave para o fracasso do Biénio foi o persistente clima de instabilidade social. Em 1854, houve uma epidemia de cólera; o país experimentou um aumento dos preços do trigo, como resultado da Guerra da Crimeia e das más colheitas; e as tensões entre empregadores e trabalhadores aumentaram, especialmente devido ao incumprimento das promessas governamentais feitas no início do período. Em Barcelona, houve uma greve geral no verão de 1855, após a implementação de medidas pelo líder trabalhista José Barceló. Em outubro, o governo aprovou uma lei trabalhista que reduziu o trabalho infantil para "apenas" 12 horas, não autorizou associações de trabalhadores com mais de 500 membros e estabeleceu júris de patrões. Nos primeiros meses de 1856, violentos distúrbios ocorreram no campo castelhano e nas grandes cidades. O governo perdeu o apoio das Cortes e, em julho, a Rainha aceitou a renúncia de Espartero, ordenando a O'Donnell que formasse um novo governo. O protesto da Milícia foi duramente reprimido por Serrano, que chegou a bombardear o recém-construído Congresso dos Deputados.
O Governo da União Liberal (1856-1868)
A União Liberal (1856-1868) seria o partido que dominaria a vida política durante este período. Incluía militares como O'Donnell e Serrano, e membros dos antigos partidos como Alonso Martínez, Ríos Rosas ou Cánovas. Enquanto o período se manteve de verdadeira prosperidade até 1863, a União Liberal conseguiu exercer o poder sem problemas graves. A partir de então, a crise económica levou o governo a uma atitude cada vez mais intransigente.
Retorno de Narváez e Novas Reformas
Após o governo de O'Donnell, Isabel II, em outubro, ordenou a formação de um novo gabinete ao general Narváez. Este governo parou a desamortização, anulou todas as disposições sobre a liberdade de imprensa e as que se opunham à Concordata, e restaurou o imposto de consumo. 1856 e 1857 foram anos de más colheitas, e os protestos foram duramente reprimidos. Em questões jurídicas, desenvolveu uma importante legislação financeira, multiplicou a moeda em circulação e continuou a política de obras públicas e construção ferroviária. Em 1857, realizou-se o primeiro recenseamento da população e foi aprovada a Lei do Ensino Público, vulgarmente conhecida como Lei Moyano.
O "Governo Longo" de O'Donnell e Estabilidade
Em julho de 1858, a Rainha pediu a O'Donnell que formasse governo, iniciando o seu "governo longo", que, embora mais aberto que o de Narváez, não deixou de ter traços de autoritarismo. Outra figura de destaque foi Posada Herrera, o "Grande Eleitor", que, a partir do Ministério do Interior, assegurava a maioria do seu partido no Parlamento. Até 1863, houve estabilidade política, sendo um período áureo para a especulação e construção de ferrovias, o surgimento e crescimento de empresas de crédito e bancos, uma nova expansão da indústria têxtil catalã e o surgimento dos primeiros altos-fornos na Biscaia e Astúrias. Apenas se notaram dois problemas: primeiro, em 1860, a tentativa de golpe do Conde de Montemolín em San Carlos de la Rápita, que foi preso. Em junho de 1861, houve uma revolta camponesa, reprimida com a habitual dureza.
Política Externa da União Liberal
Ao longo do século XIX, a Espanha não tinha tido uma política externa clara, o que levou a uma dependência de Londres e Paris, visível na interferência das duas potências nos casamentos de Isabel II e da sua irmã Luísa Fernanda entre 1845 e 1846. No entanto, o Governo da União Liberal desenvolveu uma política externa ativa e agressiva para evidenciar a consciência patriótica e desviar a atenção dos problemas internos. As intervenções incluíram:
- A expedição franco-espanhola à Indochina (1858-1863).
- A Guerra contra Marrocos (1859-1860). Após as vitórias de Castillejos e Wad-Ras, a paz foi assinada com a mediação britânica.
- A intervenção no México, em 1862, contra Juárez, que terminou com a retirada espanhola.
- O restabelecimento de Santo Domingo em 1861.
- A Guerra do Pacífico em 1866.
A Crise Final do Reinado (1863-1868)
A União Liberal decompôs-se na ausência de objetivos políticos e pelo desgaste produzido pelo exercício do poder. Militares como Prim e políticos como Sagasta alinharam-se abertamente com a oposição ao sistema.
Crise Económica e Descontentamento Político
A primeira crise ocorreu em 1864, com a paralisação da construção de ferrovias, a falta de investimento estrangeiro, a queda dos preços e a escassez de algodão. Em 1866, um crash do mercado de ações em toda a Europa levou à ruína de muitos pequenos investidores. A tudo isto, deve-se adicionar o clima de descontentamento político.
Em 1864, o clima académico começou a rarear. Alguns professores krausistas, como Sanz del Río ou Canalejas, defendiam a abertura de ideias. Em outubro de 1864, o ministro do Fomento, Alcalá Galiano, emitiu uma ordem régia que proibia a divulgação, nas cátedras, de ideias contrárias à religião católica, à monarquia ou à Constituição. A imprensa, através de Castelar, protestou contra a saída das Cortes da liberdade académica. Mas quando se vendeu parte do património nacional para cobrir o défice e compensar a Rainha com 25% das vendas, Castelar publicou um artigo criticando a legalidade da operação. O Governo ordenou ao reitor Montalbán o afastamento de Castelar. Ele recusou e demitiu-se. Os estudantes procuraram permissão para uma serenata de despedida.
Levantes e o Fim da Monarquia Isabelina
A 22 de junho de 1866, ocorreu o Levante do Quartel de San Gil, onde 1200 artilheiros se revoltaram e tentaram tomar o controlo de Madrid. A base foi tomada de assalto, resultando em 60 mortos, aos quais se somaram 66 executados. Outra tentativa foi esmagada por Narváez em Gerona. Após o fracasso, muitos foram exilados. Narváez suspendeu as Cortes, fechou todos os jornais e perseguiu todos os que criticavam o governo.
Em 1866, progressistas e democratas assinaram o Pacto de Ostende. O'Donnell morreu em 1867 e Narváez em 1868. Quando Serrano e a própria União Liberal aderiram ao pacto, ficou claro que o fim da monarquia isabelina ocorreria em setembro de 1868, após a Revolução Gloriosa.