Relação Jurídica, Boa-Fé Objetiva e Contratos Coligados

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Elementos da Relação Jurídica

Para falar sobre **boa-fé**, antes se deve abordar a relação negocial complexa. Ao tratar de relação jurídica, devem-se verificar os elementos, ou seja, o que compõe uma relação jurídica. Toda relação jurídica tem quatro elementos, quais sejam:

  • **Sujeito**;
  • **Objeto**;
  • **Fato Jurídico** (os três compõem a parte geral do Código Civil: pessoa, bens e fato/negócio jurídico); e
  • **Garantia** (instituída no sistema).

Por isso, existe uma teoria geral para cada elemento.

Sujeito

O sujeito da relação jurídica, sem exceção, será uma pessoa no sentido jurídico, ou seja, técnico (natural ou jurídica). **Não há relação jurídica entre pessoa e coisa/animais**. Portanto, deve-se ter mais de uma pessoa para configurar uma relação jurídica.

Objeto

O objeto está presente em toda relação jurídica, sem exceção, podendo ser:

  1. **Uma obrigação**;
  2. **Uma coisa**; ou
  3. **Um direito da personalidade**.

Se o objeto for uma obrigação, como nos contratos, esta relação jurídica é chamada de **obrigacional** ou **pessoal**, pois sua eficácia interna somente produz efeitos entre aqueles que a compõem, o chamado *princípio da relatividade dos efeitos*. O descumprimento dessa obrigação será um ilícito relativo e, segundo a doutrina clássica, gera a chamada **responsabilidade contratual**, pois decorre do descumprimento de uma relação jurídica pré-existente, como, por exemplo, o não pagamento do aluguel.

Para que se configure o ilícito, devem-se ter dois elementos (no Brasil): o primeiro, o elemento objetivo, é a **contrariedade ao direito**; e o segundo, a **imputabilidade**. Se não houver nenhum destes elementos, não há ilícito. Exemplo: caso fortuito/força maior, quando uma árvore cai em cima do carro. Há contrariedade ao direito, porém, não há imputabilidade, pois são eventos inevitáveis, sem um agente responsável.

Se o objeto for uma coisa, como no direito de propriedade/posse (Ressalva: toda relação jurídica é entre pessoas. Quando se fala em uma relação jurídica real – direitos reais: efeito *erga omnes* – que é chamada de relação de direito absoluto, os autores da teoria clássica dizem que a relação é entre pessoa e coisa. Ou seja, todos têm o dever jurídico de respeitar e não danificar ou se abster da propriedade alheia, e por isso a eficácia *erga omnes* e o direito absoluto). Quando há um ilícito, é o **ilícito absoluto**, com o regime de responsabilidade clássica, chamado **extracontratual** (o mesmo se aplica ao direito da personalidade).

O direito da personalidade ocorre nos direitos da personalidade, quais sejam: direito à vida, à honra, à integridade física, entre outros. A vida é objeto ativo da relação e o sujeito passivo são todas as pessoas. Embora o direito seja pessoal, a eficácia é *erga omnes* e, portanto, absoluta, pois todos têm o dever de respeitar.

Fato Jurídico

O fato jurídico é a somatória de vários elementos. Fato é tudo aquilo que acontece no mundo. O que acontece na nossa vida está dentro do mundo dos fatos. Neste caso, o fato deve ter interesse para o direito. (Pontes de Miranda diz que dentro do mundo dos fatos há o mundo jurídico, que é composto de fatos que interessam para o direito, ou seja, fatos colorizados, que são os fatos destacados para o mundo do direito, chamado de *jurisdicização*). O problema é saber o que efetivamente interessa para o direito (diferença entre moral e legal).

O Código Civil vigente, entre os seus três princípios, que são: a **socialidade**, a **operacionalidade** e a **eticidade**, ao dizer que a eticidade deve nortear as relações jurídicas, quis integrar as relações, pois a ética interessa ao direito. Isso significa que o mundo jurídico está crescendo, fazendo com que uma relação social se torne uma relação jurídica, como no caso da união estável. Ou seja, o direito está cada vez mais complexo. Portanto, o fato jurídico é o interesse do direito para com as relações sociais.

Garantia

A garantia está presente nas relações jurídicas, com exceções. Toda relação jurídica tem uma garantia genérica, porém, nem toda terá uma garantia específica. A garantia genérica tem dois aspectos:

  • **O acesso à justiça** – *princípio da inafastabilidade do controle social* – assim, qualquer ameaça ou lesão do direito pode ter a intervenção da justiça;
  • **O patrimônio**, dito penhorável, que possa responder por obrigações.

Algumas relações jurídicas (obrigacionais, reais ou pessoais) podem ter a garantia específica, ou seja, uma garantia adicional, específica para aquela relação jurídica, que pode ser de dois tipos:

  • **Fidejussória**: baseada na confiança, que se baseia em uma garantia genérica do patrimônio de um terceiro, como, por exemplo, o aval e a fiança; ou
  • **Real**: quando o patrimônio do devedor é destacado ou o patrimônio do terceiro, o que configura os negócios jurídicos reais, como a hipoteca, penhor, anticrese e alienação fiduciária.

Quando se tem uma garantia real, pode haver uma diferença entre devedor e responsável, ou seja, alguém pode ser responsável sem ser devedor, pois o direito adota a teoria dúplice da obrigação que faz esta distinção.

Distinção entre Obrigações e Direitos Potestativos

As obrigações são de dar, fazer e não fazer. Quando se exige uma dessas obrigações, baseia-se em um dever jurídico pré-existente. Se este dever jurídico pré-existente for cumprido, não há ilícito e, portanto, o direito subjetivo é preservado. Quando não for cumprida, há um ilícito, com a contrariedade do direito, a violação do direito e a pretensão, sujeitando-se ao prazo de prescrição, gerando o direito ao credor de exigir o cumprimento da obrigação, com uma tutela condenatória, que nasce após a violação do direito. Assim, o cumprimento natural das obrigações impede que o credor possa exigir o cumprimento. Por exemplo, não se pode cobrar uma dívida que não venceu.

Isto ocorre com a maioria dos direitos, mas alguns direitos não estão sujeitos à pretensão e podem ser cobrados a partir do momento em que se adquirem os chamados **direitos potestativos**, que são atos de poder, ligados a um direito que o titular de uma relação jurídica tem e que não está ligado ao cumprimento do outro, independendo da prática de um ilícito.

Portanto, os **direitos potestativos** (*Manuel Antonio Domingues de Andrade*) são o **poder** (ou seja, não há uma relação de igualdade e quem não tem este poder está em um estado de sujeição) **conferido ao respectivo titular de, mediante uma declaração de vontade, *só de per si*** (basta a declaração de vontade), **com ou sem formalidades ou integrada por uma ulterior declaração judicial** (pois às vezes não basta a declaração de vontade, como no caso da ação de despejo), **constituir, modificar ou extinguir uma relação jurídica pré-existente**.

Exemplo: em uma relação de emprego, tanto o empregador quanto o empregado podem dar fim à relação, com ou sem justa causa, que é o exercício de um direito subjetivo, pois para mandar um empregado embora por justa causa, o empregado deve incidir em uma das hipóteses previstas na CLT, e vice-versa, quando o empregador não paga o empregado.

Isso tudo é relevante, pois às vezes o exercício da pretensão pode se confundir, ou seja, entre exercitar o direito e exigir o cumprimento de uma obrigação, o credor pode variar na escolha. Por exemplo, em um consórcio – alguém foi sorteado e o carro tem uma alienação fiduciária e atrasou no pagamento. O credor pode dar fim ao contrato e entrar com uma ação de busca e apreensão (direito potestativo, que decorreu de um descumprimento), ou exigir a obrigação, sem dar fim ao contrato. Por isso, o prazo é decadencial, visto que os direitos potestativos estão ligados às ações (des)constitutivas (ou constitutivas negativas) ou declaratórias.

Tudo isso serve para explicar as relações jurídicas **simples** (que deve ser vista como totalizada e não individualizada) e **complexas**.

Toda **relação jurídica obrigacional** (na teoria clássica dizia que tinha o sujeito ativo e o passivo, ou seja, o credor e o devedor, que estava ligado a um comportamento ativo por parte do credor e uma obrigação a cumprir por parte do devedor, mas nos contratos bilaterais, o sujeito ativo/passivo também o é, pois as duas partes têm direitos e deveres, exemplo, comprador e vendedor, pois se particulariza, ou seja, se atomiza) compreende três deveres:

  • **Principais**;
  • **Secundários**; e
  • **Laterais**.

Na relação obrigacional complexa, ao lado dos deveres principais e secundários, há os **deveres laterais** que sofrem a intervenção da boa-fé objetiva, com o dever de cooperação, inerente à boa-fé.

Boa-Fé Objetiva

A boa-fé objetiva é um princípio que foi relembrado a partir da vigência do Código de Defesa do Consumidor, princípio este ratificado no Código Civil, em seu art. 422.

Os chamados **deveres anexos** (laterais) são relevantes, pois, pela aplicação destes deveres, percebe-se a extensão da relação contratual, que possui aquilo chamado pelo Prof. Carlyle de **“itinerário”**, percurso este que vai desde o contato social até após a extinção do contrato.

Antes de explicar este **“itinerário contratual”**, é importante relembrar que esta boa-fé é a **objetiva** (boa-fé comportamento), que se difere da **boa-fé subjetiva** (chamada de boa-fé crença). A boa-fé subjetiva é algo tradicional no ordenamento jurídico pátrio, desde o CC de 1916, com questões ligadas à propriedade, sendo importante para se estabelecer efeitos do direito de construir. A ideia de boa ou má-fé se ligava à crença, ou seja, expectativa, em relação à circunstância, sendo alvo um terceiro, que nada tem com as questões sofridas. A outra ponta da boa-fé objetiva era a má-fé e por isso se diz que a boa-fé se presume, enquanto a má-fé se prova.

A boa-fé objetiva é a chamada **comportamento**, que deve sempre ser demonstrada, pois cada uma das partes deve ter uma preocupação com a outra, tendo raiz no *princípio da solidariedade* e da dignidade da pessoa humana.

Funções da Boa-Fé Objetiva

Esta boa-fé comportamento, ou seja, objetiva, tem três funções, quais sejam:

  1. *A boa-fé como regra de interpretação* – prevista no art. 113 do CC, o que significa dizer que o comportamento das partes é relevante para estabelecer a eficácia da obrigação ou do dever;
  2. *A boa-fé enquanto dever de conduta*;
  3. *A boa-fé enquanto limitação de direitos subjetivos* – art. 187 do CC, ou seja, codifica o que a doutrina chama de **abuso do direito**, que é **objetivo**, o que significa dizer que não há a necessidade do desejo de prejudicar pelo titular do direito, diferentemente do que se estabelece no âmbito do direito de propriedade, previsto no art. 1228, § 2º do CC, que versa sobre o abuso de direito exercido na propriedade, sendo que o CC adota que deve ter o direito subjetivo, ou seja, o direito de prejudicar do titular da propriedade, o que não está expressamente declarado no art. 187, mas entende-se o mesmo.

Há três exemplos ilustrativos de limitação de direitos subjetivos:

1ª Hipótese: *Tu Quoque*

Quando alguém descumpre uma norma, não poderá utilizá-la em seu proveito quando a outra parte também descumprir, como, por exemplo, nas relações de condomínio, ou em um contrato que ambas as partes descumprem.

2ª Hipótese: *Venire Contra Factum Proprium* (Agir contra um comportamento anterior)

Quando alguém sinaliza que tomará uma decisão, não pode agir contrário ao sinal dado, como, por exemplo, quando uma parte não permite ou permite que a outra parte faça investimento e depois pede resilição do contrato, como previsto no art. 473 do CC. Exemplo: uma distribuidora de bebidas e o contrato em curso. A distribuidora pede que o distribuidor faça novos investimentos, como a compra de caminhões, e o distribuidor faz tudo. Posteriormente, a distribuidora diz que não tem mais interesse. Isto é vedado. O Prof. Carlyle entende que não se pode pedir uvas pela locação, pois viola a boa-fé objetiva.

3ª Hipótese: *Adimplemento Substancial* (Substantial Performance)

O credor tem a possibilidade de, alternativamente, em regra, exigir o cumprimento da obrigação ou exercer o direito de resolução tácita do contrato. A teoria do *Adimplemento Substancial* impede que o credor peça a resolução do contrato, quando o devedor, mesmo que inadimplente, já o cumpriu em grande parte. Por exemplo, em uma alienação fiduciária, o devedor venceu as últimas cinco parcelas, podendo o credor entrar com pedido de busca e apreensão. Esta teoria impede isto, podendo o credor entrar com uma ação de execução, pois seria contrária à boa-fé se o credor entrasse com o pedido de busca e apreensão, devido ao excessivo ônus do devedor.

Deveres Anexos (Laterais)

Os deveres anexos decorrentes da boa-fé objetiva incluem:

a) Dever de Informação

Inclui recomendação e conselho, que são espécies do dever de informar, ligados a atividades de profissionais, como é o caso dos advogados e médicos. Este dever significa que cada uma das partes (em todas as fases contratuais) tem o dever de informar à outra tudo aquilo que for relevante para o cumprimento do contrato, e está previsto no art. 46 do Código de Defesa do Consumidor.

b) Dever de Proteção

Como informar sobre “piso molhado”, pois se acontecer algum acidente, há o direito de indenização. Vale também para a norma de que o credor deve informar ao devedor que seu nome será inserido nos bancos de créditos.

c) Dever de Guarda e Restituição

Ligado àquelas relações jurídicas, na fase de tratativas, em que uma parte recebe da outra bens, como documentos, para exame, o que significa dizer que há uma necessidade de guardá-los e restituí-los à posse. Este tipo de relação se dá nos casos de advogados, médicos, arquitetos, entre outros.

d) Dever de Segredo

Presente na fase de negociações e em toda relação contratual (eficácia interna) e seu conteúdo interessa apenas para as partes e, portanto, presume-se. Em alguns casos, este dever é próprio à profissão, como no caso de advogado e psicólogos, sendo este dever ligado à boa-fé, de forma mais clara, ligado à ética e à moral.

e) Dever de Clareza

Ligado ao entendimento. O CC adota o *princípio da confiança*, o qual não privilegia nem a declaração de vontade ou a vontade interna, mas o que é relevante é a maneira pela qual a declaração de vontade é recebida pelo destinatário, ou seja, é eficaz quando seu destinatário sabia ou poderia saber que não corresponde à verdade, pois, por vezes, uma declaração de vontade irreal, em razão de suas circunstâncias, pode ser recebida pelo destinatário como verdadeira e, portanto, eficaz. Assim, quem se comporta deve fazê-lo de forma clara, que não gere interpretações equivocadas na outra parte. É um dever próprio da boa-fé.

f) Dever de Lealdade e Probidade

É o que mais decorre da ideia de boa-fé, pois é a preocupação com o outro, agindo de acordo com os bons costumes, de acordo com o padrão médio da sociedade. O art. 422 do CC fala de boa-fé e probidade, que é um conceito jurídico pré-determinado, mas a ideia é um conceito em mutação, na medida em que seu conteúdo se altera de tempos em tempos. Por exemplo, a roupa. Antigamente, quem ia à igreja de terno e chapéu, tirando o chapéu na igreja, e, naquele tempo, se não fosse com estas vestes, fugia do padrão médio da sociedade. A ideia de probidade está ligada à ideia de lealdade, ou seja, de alguém que honra a sua palavra e é importante no ramo empresarial, onde a ética deve ser levada em conta, como no caso dos advogados.

O Itinerário Contratual

Voltando ao quadro, chamado de **“Itinerário”**, tem-se:

  • **1º momento**: o “contato social”, que se dá quando de alguma forma as partes principiam algo que se possa conduzir às tratativas do contrato;
  • **2º momento**: o de formação, no qual o contrato, ou seja, o negócio jurídico se formou, com a aceitação;
  • **3º momento**: a extinção.

Entre a **formação** e a **extinção** se tem a fase do **cumprimento contratual**. Estas duas se dão quase no mesmo momento, como no caso de contratos instantâneos, por exemplo, a compra de um livro. Porém, antes da formação e após a extinção, pode haver circunstâncias que interessem ao estudo do contrato (negócio jurídico).

Quando se fala de problemas que surjam no decorrer do contrato, tem-se a **responsabilidade contratual**, pois existe contrato formado e regras estabelecidas. Quando existem inadimplementos ou descumprimentos antes do contrato, tem-se a **responsabilidade pré-contratual** (*culpa in contrahendo*). Se ocorre após a extinção do contrato, tem-se a **responsabilidade pós-contratual** (*culpa post pactum finitum*). Estas são hipóteses ligadas à ideia de boa-fé, pois não há contrato em vigor para que se diga sobre sua responsabilidade, pois o contrato não iniciou ou já se extinguiu. Se a violação é contra os deveres laterais, tem-se a **violação positiva do contrato**.

Responsabilidade

1) Responsabilidade Pré-Contratual

Não é própria dos contratos, ocorrendo nos negócios jurídicos, como o casamento, por exemplo. A extensão desta responsabilidade é tripla:

a) Ocorre quando o contrato não se formou

Ou seja, há um rompimento das tratativas (o que não é obrigatório, pois ninguém é obrigado a contratar). Quando as partes entram em tratativa, ambas têm em proteção o chamado **interesse negativo**, que é o interesse da confiança. Isso significa que quando pessoas estão negociando um contrato, elas têm o direito de ter sua confiança não violada. As negociações são divididas em fases, sendo que a intensidade da confiança varia:

  • **Fase inicial**: as partes estão se conhecendo.
  • **Fase intermediária**: as partes começam a estudar a possibilidade de celebrar o contrato, havendo despesas no interesse das partes. Nesta fase, há maior possibilidade de o contrato ser fechado, pois já pode haver um contrato interino para regulamentar esta fase de tratativas.
  • **Fase final**: ambas as partes já explicitaram o interesse na celebração do contrato, ou seja, a confiança já está mais forte de que a relação possa vingar.

Normalmente, a partir da fase intermediária, o rompimento de uma tratativa pode gerar responsabilidade, em decorrência da violação da confiança. Mas na parte final, se uma das partes se desentender quanto ao preço do negócio, por exemplo, este rompimento é legítimo, ao contrário de se houver despesas, as quais deverão ser rateadas, sendo elas do interesse particular e comum (do contrato), sendo a particular não indenizável. Quanto mais a confiança atinge o final, mais próximo do **Interesse Positivo do Contrato**. Se houver a responsabilidade pré-contratual, deve-se haver o contrato entre as partes, com as tratativas e o consentimento nas tratativas, com o rompimento destas negociações. Mas pode haver responsabilidade pré-contratual superveniente, que são as negociações que não se realizaram, mas posteriormente a empresa que tiver acesso a estas informações as utiliza, violando o sigilo, aproveitando-se das informações recebidas em razão das tratativas.

b) O contrato se formou com um vício

Ou seja, uma invalidade ou ainda, uma ineficácia, o que é comum e gera perdas e danos (atos nulos, ou com coação física, etc.).

c) O contrato se formou, mas em piores condições.

O primeiro momento é o da responsabilidade pré-contratual, quando não existiu o direito, ou seja, a partir do contato social, com a *culpa in contrahendo*.

2) Violação Positiva do Contrato

Em um segundo momento, há a fase contratual, com a parte geral dos contratos, parte geral dos negócios jurídicos e a parte especial do contrato específico e, além disso, as cláusulas do contrato, ou seja, as condições contratuais. Quem celebra um contrato passa a ter deveres pré-constituídos, que deverão ser cumpridos e, se descumpridos, ocorrerá o inadimplemento contratual. Ocorre que, além destes deveres contratuais chamados de obrigações principais e secundárias (decorrentes dos elementos naturais do contrato), existem aqueles decorrentes da boa-fé, os quais não estão expressos no contrato realizado, mas que decorrem dos deveres anexos. Havendo descumprimento destes deveres anexos, ocorre a **violação positiva do contrato**.

Exemplo: uma parte, em uma relação contratual, toma conhecimento sobre documentos que contenham o custo contratual e outras especificidades. Neste contrato, o dever de sigilo não é algo decorrente da lei ou do contrato, mas é decorrência natural do princípio da boa-fé que uma das partes não repasse informações. Então, quando ocorrer um descumprimento direto com o da boa-fé, que não estiver ligado a uma obrigação contratual primária ou secundária do contrato, ocorrerá a violação positiva do contrato. A violação positiva é a violação de um dever lateral, da própria boa-fé, desde a formação até a extinção.

Exemplo: o construtor convenciona formalmente que realizará reparos na empresa em determinados dias, sem constar no contrato, sendo que em um dos períodos que ele realizaria o reparo, a empresa estava fechada. Ou seja, houve uma violação no dever da boa-fé, não prejudicando o contrato, mas tornando oneroso o seu cumprimento, pelo descumprimento do dever de informar, em decorrência da boa-fé.

3) Responsabilidade Pós-Contratual

Na terceira hipótese, tem-se a responsabilidade pós-contratual (*culpa post pactum finitum*), que ocorre após a extinção do contrato. A despeito de ocorrer após, há uma relação direta com o contrato extinto, ou seja, implica em uma quebra do direito da boa-fé, decorrente da relação contratual.

Exemplos de responsabilidade pós-contratual:

  • Um empregado que trabalha como gerente de uma empresa que administra imóveis, ficando por muito tempo no local, adquirindo contatos de clientes, etc. Após um tempo de empresa, resolve abrir sua empresa e angariar seus antigos clientes, sendo que isto, em princípio, seria uma concorrência ou entendido como um benefício, pois tinha acesso aos contatos dos clientes, devido ao seu cargo.
  • Uma construtora constrói um prédio de frente para o mar, ao lado de um terreno baldio, tendo feito toda a publicidade, cobrando mais caro pelos apartamentos. Após ter vendido todos os apartamentos, comprou o terreno baldio e construiu outro prédio, tapando os apartamentos de frente para o mar, descumprindo o contrato depois de extinto, tendo em vista que se tratava da mesma empresa.

Ou seja, a responsabilidade pós-contratual é aquela que emana do contrato depois que cumprido, tornando-se ineficaz.

Seja em qualquer uma das hipóteses, haverá sempre a violação do direito ligado à boa-fé. A dificuldade do tema é entender qual é a extensão deste dever, ou seja, qual o alcance das obrigações assumidas, exatamente porque os princípios, sobretudo o da boa-fé, são cláusulas gerais que somente serão examinadas diante do caso concreto.

Contratos Coligados

Conceito

Contratos que visam a mesma operação econômica. É uma mitigação do *princípio da relatividade dos efeitos*, em que outras relações contratuais passam a ser regidas por uma relação em comum.

Hipóteses de Coligação

Mercado Imobiliário

Contrato de financiamento imobiliário. Quando um agente financeiro financia um imóvel, que posteriormente tem problemas na estrutura. Há precedentes que o agente financeiro tem responsabilidade junto à construtora.

Exemplo 1: X, comprador. Y, vendedor. Z, agente financeiro. X escolhe imóvel. Y constrói. Z financia X, que dá o dinheiro para Y. Passado um tempo da compra, o imóvel começa a dar defeitos de construção. Tribunais têm entendido que Z (instituição financeira) é solidariamente responsável com Y (imobiliária) pelos danos físicos no imóvel. Por quê? Porque entendem que essa é uma única operação econômica, na qual o banco, por também ter interesse econômico nela, é responsabilizado; o banco deveria ter sido mais diligente ao emprestar o dinheiro.

Exemplo 2: caso julgado pelo TJRS: X comprou PC. Financiou esse PC na Losango. Deu o dinheiro para o vendedor Y e X assumiu o financiamento. X pagou cinco parcelas e não recebeu o PC. Entrou então com ação contra Y e a Losango para resolver o financiamento e a Losango devolver as parcelas já pagas. O TJRS deu razão a X porque a operação econômica é uma só; é uma operação econômica funcionalizada. X teve o contrato finalizado, e parcelas devolvidas com mais perdas e danos.

Planos de Saúde

Exemplo: Unimed e usuário. A Unimed promete disponibilizar rede de conveniados (médicos, hospitais, clínicas, laboratórios, etc.) ao usuário. Tribunais já praticamente pacificaram que o plano de saúde é solidariamente responsável por danos causados pelos profissionais conveniados contra seus usuários. Por quê? **Coligação!** A função de todas as operações econômicas que decorrem desse contrato é a mesma.

Contrato Bancário

Pode ter coligações nos cartões de crédito e também nas contas correntes, ou seja, são vários contratos coligados entre uma mesma relação econômica do banco com a pessoa. Não se pode confundir com os contratos complexos ou atípicos, como nos contratos de *leasing* ou franquia, onde há uma única relação contratual.

Cartões de Crédito

O cartão de crédito só tem razão de ser em função de seu uso em inúmeros sistemas e no mundo inteiro. Por isso, o usuário sempre estará sujeito a riscos como clonagem do cartão, débito em valor diverso, ter que devolver a mercadoria comprada, mercadoria não entregue, etc. Exemplo: X compra TV com cartão Y. A TV quebra. O cartão e o fabricante são solidariamente responsáveis.

Redes de Distribuição

Pode ocorrer entre franquias, como o McDonald’s, onde a operadora nem sempre é igual, ou seja, a operadora da marca não realiza a franquia, havendo um certo relacionamento de igualdade, como, por exemplo, comprar um sapato em uma loja e trocá-lo em outra loja, da mesma marca. A distribuidora tem um dever, como a igualdade, satisfazendo a garantia econômica do dono da marca. Distribuidoras têm uma rede de operações e contratos uniformes entre os postos que atendem.

Exemplo: o McDonald’s. Todas as lojas que têm franquia Mc ou são de propriedade do Mc ou são propriedades em que o Mc é locador e subloca ao locatário. Neste caso, faz-se um contrato de sublocação e um contrato de franquia. Se for rompido o contrato de franquia, o Mc vai retomar o imóvel e impedir que o franqueado utilize o imóvel para outra finalidade. Normalmente, o Mc cobra mais pela sublocação do que pela locação. Isso, porém, segundo a Lei do Inquilinato, é vedado. Diante disso, decidiram pela manutenção da locação, impedindo que com o rompimento do contrato de franquia o Mc automaticamente retomasse o imóvel sublocado. **Coligamento Negocial!**

Shoppings Centers

Há uma coligação contratual, pois são vários contratos, ou seja, de locação, *res sperata* (cessão de uso), cessão do lojista, etc. Todos eles têm que ser interpretados em harmonia.

Exemplo: Shopping X propôs ação de despejo contra lojista Y pelo fato de ele não ter pagado os valores atinentes à cessão de uso do espaço (com o aluguel, entretanto, Y estava em dia). Sob a tese de que a cessão de uso é contrato principal, do qual a locação é contrato acessório, também ingressou com ação de despejo por falta de pagamento. O Tribunal decidiu que o contrato de cessão é o contrato acessório e a locação é o contrato principal. Logo, não caberia despejo.

Interpretação e Eficácia

Interpretação

A interpretação deve estar ligada a toda a rede, ou seja, à luz de todos os contratos firmados.

Legislação Aplicável

Uma relação que pode ser meramente ou aparentemente empresarial ou comercial, pode ter a aplicação do CDC, ou seja, alguém que pode estar fora da relação de consumo, pode ser por ela atingida.

Contratos Gratuitos

Pode ser atingido quando este está embutido em um contrato oneroso. “*Não há almoço de graça*”, ou seja, se vai fazer determinado negócio, por uma coligação contratual, onde se ganha “presentes” pela instituição (normalmente pequenas) para realizar o negócio, sendo que se o “presente” não funcionar, pode ser atingido pelo CDC, assim como no caso da transportadora, que deve cumprir com o contrato. Se o contrato de transporte é interessado, somente se dá mediante a culpa, contrário se for contrato de transporte desinteressado.

Utilidade/Eficácia

Terão reflexos nos contratos coligados. A nulidade que atinge um contrato do qual outros são dependentes, estes serão extintos também (acessório segue o principal). Exemplo: Se o plano de saúde é cancelado, todas as empresas e serviços que se poderiam usar através deste, não mais poderão ser usados. Então, o cumprimento de um contrato coligado tem relevância para todos os contratos coligados. A nulidade parcial pode não atingir todo o contrato, mas quando a relevância é no contrato principal, por exemplo, extinguem-se pelo inadimplemento, todos os coligados são ineficazes (o sentido perde o objeto).

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