Reologia e Tensoativos: Conceitos, Tipos e Aplicações

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1. Conceitos Fundamentais de Reologia

Cisalhamento é uma deformação que, ao ser submetida à tensão, provoca o escorregamento das camadas de líquido entre si.

Taxa de Cisalhamento

A taxa de cisalhamento pode ser definida como a variação de velocidade de fluxo com a variação da altura (distância da superfície que provoca o cisalhamento).

Tensão de Cisalhamento

É definida como a força F que, aplicada a uma área A da interface entre a superfície móvel e o líquido abaixo, provoca um fluxo na primeira camada de líquido e esta, na segunda, e assim sucessivamente. Esta superfície pode ser um plano, a parede de um tubo ou outras. A velocidade do fluxo que pode ser mantida por esta força é controlada pela resistência interna do líquido, ou seja, pela viscosidade.

A correlação entre tensão de cisalhamento e taxa de cisalhamento define o comportamento reológico de um fluido, que pode ser expresso graficamente em um diagrama (curva de fluxo) com tensão de cisalhamento na ordenada e taxa de cisalhamento na abcissa.

Viscosidade

Viscosidade é a resistência contrária à tensão de cisalhamento.

2. Comportamentos Reológicos Não Dependentes do Tempo

Estes comportamentos são definidos pela relação entre viscosidade e taxa de cisalhamento.

Líquido Newtoniano

  • A viscosidade se mantém constante com a variação da taxa de cisalhamento.
  • Exemplo: Água.

Líquido Pseudoplástico (ou Cisalhamento por Diminuição)

  • A viscosidade diminui com o aumento da taxa de cisalhamento.
  • A tensão de cisalhamento inicial é maior que a necessária para manter o fluxo.
  • A organização das partículas/moléculas no alinhamento com a direção do fluxo provoca a diminuição do atrito entre as camadas, resultando em baixa viscosidade.
  • É desejável onde a viscosidade em fluxo deve ser menor que a em repouso.
  • Exemplos: Pasta de dente, pomadas (em tubos), tintas (durante a aplicação).

Líquido Dilatante (ou Cisalhamento por Aumento)

  • A viscosidade é aumentada com o aumento da taxa de cisalhamento.
  • Ocorre tipicamente em suspensões altamente concentradas.
  • O aumento da taxa de cisalhamento aumenta o volume dos interstícios, fazendo com que o fluido não lubrifique mais as partículas, aumentando a viscosidade.
  • Exemplo: Amido de milho com água.

Líquido Plástico (ou Plástico de Bingham)

  • A viscosidade diminui com o aumento da taxa de cisalhamento.
  • Apresentam curvas que não interceptam a ordenada na origem, mas sim na tensão limite.
  • Em descanso, podem construir uma rede de forças interpartículas que restringe a troca de posições, conferindo à substância características de sólido com alta viscosidade.
  • Exemplos: Gorduras, batons, sorvetes.

3. Comportamentos Reológicos Dependentes do Tempo

Estes comportamentos envolvem a mudança de viscosidade do fluido em função do tempo em que se mantém uma taxa de cisalhamento constante aplicada.

Tixotrópico

  • A viscosidade diminui com o tempo de cisalhamento.
  • Ocorre devido a uma complexa interação entre as partículas/moléculas.
  • O fluido tem potencial de se reorganizar quando é deixado em repouso, recuperando sua viscosidade original.
  • Exemplo: Ketchup.

Reopéxico

  • A viscosidade aumenta com o tempo de cisalhamento.
  • Reopexia e tixotropia são propriedades opostas do fluxo.
  • Nos fluidos reopéxicos, a histerese da curva de fluxo é inversa à dos fluidos tixotrópicos, com a curva de volta acima da curva de ida.
  • É um comportamento raro.

Diferença Básica

A diferença básica entre os comportamentos reológicos dependentes da taxa de cisalhamento (Newtoniano, Pseudoplástico, Dilatante, Plástico) e os dependentes do tempo de cisalhamento (Tixotrópico e Reopéxico) reside no fator que causa a mudança de viscosidade: a velocidade de deformação (taxa) ou a duração da deformação (tempo).

4. Comportamento Viscoelástico

O comportamento viscoelástico é intermediário entre o comportamento elástico (sólidos rígidos) e o comportamento viscoso (líquidos).

  • Comportamento Elástico: A energia usada para causar a deformação é estocada como energia potencial e liberada no retorno à situação original assim que a força externa é retirada. O tempo necessário para este retorno é chamado de tempo de relaxação.
  • Comportamento Viscoso: A matéria flui devido à tensão aplicada e o fluxo cessa assim que a força externa é retirada (sem efeito de retorno). A energia é dissipada como calor.

5. Avaliações Reológicas e Condições Restritivas

As leis da reologia só são válidas nas seguintes condições, que são necessárias para garantir a precisão e a reprodutibilidade das medidas:

  1. Fluxo laminar (sem troca de elementos entre as camadas).
  2. Fluxo estável (uma taxa de cisalhamento deve corresponder a uma tensão de cisalhamento).
  3. Não haver escorregamento preferencial (a tensão aplicada deve ser transmitida para todas as camadas da amostra).
  4. Amostras totalmente homogêneas (cisalhamento uniforme).
  5. Não haver mudanças físicas ou químicas na amostra durante o teste.
  6. Não apresentar comportamento elástico predominante.

Tipos de Viscosímetros

  • Rotacionais (Disco Rotativo, De Pás)
  • Capilares
  • Esfera

6. Efeitos Eletroviscosos em Fluidos

Existem três tipos de efeitos eletroviscosos que podem explicar comportamentos de viscosidade em fluidos que contenham micelas de tensoativos.

Efeito Eletroviscoso Primário

É a diminuição da viscosidade com o cisalhamento de amostras. É consequência da perda de esfericidade da dupla camada elétrica, facilitando o fluxo de cisalhamento. Em repouso, as amostras tendem a retornar à sua viscosidade original com a restauração da esfericidade das duplas camadas elétricas.

Efeito Eletroviscoso Secundário

A repulsão entre duas duplas camadas elétricas em camadas de fluxo com velocidades diferentes aumenta seus efetivos diâmetros de colisão, provocando a distorção da trajetória destas partículas. Este efeito provoca o aumento da viscosidade do meio, pois dificulta o cisalhamento das camadas de fluxo vizinhas.

O aumento da viscosidade, neste caso, depende do tamanho da dupla camada elétrica formada, da concentração e da força de atração entre as partículas carregadas.

7. Tensoativos (Surfactantes)

Tensoativos são substâncias que possuem uma parte apolar (que dissolve gorduras) ligada a outra parte polar (que arrasta).

Polaridade e Força de Ligação

  • Polaridade: Os elétrons se deslocam na direção do átomo mais eletronegativo, criando ligações polares e apolares.
  • Forças de Ligação:
    • Entre moléculas apolares: Ligações de Van der Waals e dipolo induzido (fracas).
    • Entre moléculas polares: Ligações de Dipolo forte e Solubilidade.

Tensão Superficial e Molhabilidade

  • Tensão Superficial: Moléculas superficiais de água estão desbalanceadas, resultando em maiores forças de atração intermoleculares e maior tensão superficial, o que leva à formação de gotas.
  • Molhabilidade: O quanto uma gota de líquido se espalha sobre uma superfície.
  • Umectação: Molhabilidade em superfícies complexas (ex: tecido), frequentemente utilizando solventes apolares (baixa tensão superficial), como na lavagem a seco.

Tipos de Tensoativos

  • Aniônico: Mais comum.
  • Catiônico.
  • Não Iônicos: Sem cargas verdadeiras. Possuem cadeia etoxilada (óxido de eteno). Quanto maior a cadeia etoxilada, maior a polaridade.
  • Anfóteros: Dependem do pH.
    • Aniônicos em meio alcalino (OH- neutraliza as cargas +).
    • Catiônicos em meio ácido (H+ neutraliza as cargas -).

Comportamento em Solução e Micelas

A instabilidade dos tensoativos deve-se ao seu caráter hidrofílico e lipofílico simultâneo (ativo na tensão). Nas micelas, ocorre o aumento da concentração do tensoativo, atingindo a Concentração Micelar Crítica (CMC), que gera um efeito instantâneo.

Efeito Menisco

O desequilíbrio das forças de atração resulta em uma força resultante para o centro menor, provocando a elevação das moléculas da superfície em contato com o sólido e diminuindo a tensão superficial.

8. Aplicações dos Tensoativos

As principais aplicações dos tensoativos são a preparação de emulsões e a detergência. No entanto, estas duas funções também provocam a formação de espuma.

Emulsões

  • Sob agitação, o tensoativo se desloca para as novas superfícies água-óleo.
  • Tensoativo aniônico: A camada de cátions impede a aproximação das gotículas (repulsão).
  • Tensoativos não iônicos: Estabilização por impedimento estérico (partes polares longas).
  • Melhoria na Estabilidade da Emulsão:
    • Reduzindo a mobilidade do tensoativo (ramificados na parte apolar – âncora).
    • Reduzindo os espaços entre as moléculas de tensoativo: uso de tensoativos não iônicos ou anfóteros.
    • Emulsões estáveis geralmente utilizam pelo menos dois tensoativos de classes diferentes.
  • Nota: Suspensão é um sólido estabilizado em líquido. Sob alta agitação, pode ocorrer coalescência.

Detergência

  • O tensoativo deve adsorver na superfície da sujidade durante o efeito cunha (pouco solúvel em água).
  • Após o efeito cunha, deve estabilizar as gotículas de sujidade e ser solúvel em água para arrastá-las.
  • Para uma boa detergência, o tensoativo deve ser pouco solúvel em água durante a adsorção e muito solúvel em água durante a etapa de emulsão.
  • Em tensoativos não iônicos, o aumento da temperatura reduz a solubilidade pela perda de moléculas de água (efeito névoa).

Espuma

  • Em processos industriais, a espuma é prejudicial; em cosméticos, é desejável para dar a impressão de limpeza.
  • Bolhas de ar formam novas superfícies água-ar (semelhante à emulsão).
  • A estabilidade depende da espessura da camada de água que mantém o ar preso na bolha.
  • Melhores tensoativos para espuma: Aniônicos (p. ex., sulfatados), como o Lauril Éter Sulfato de Sódio, pois seguram a água.
  • Desestabilização da Espuma:
    • Antiespumantes (p. ex., emulsões de silicone) impedem que o tensoativo se posicione na superfície água-ar.
    • A repulsão eletrostática entre as camadas externa e interna das bolhas mantém a separação entre elas. Quanto mais carga tiver o tensoativo, mais espessa é a camada de líquido da bolha.

9. Aplicações Práticas da Reologia

Tintas

  • A tinta, quando aplicada, sofre um cisalhamento.
  • Para que ocorra escoamento, as tintas precisam ser formuladas de forma que sua viscosidade seja baixa a altas taxas de cisalhamento (~5000 s⁻¹) e alta a baixas taxas de cisalhamento (0,54 s⁻¹).
  • O estudo reológico das tintas é importante nas faixas de cisalhamento durante a aplicação e no instante subsequente à aplicação.

Óleos para Motores

  • Lubrificantes diminuem o atrito do cilindro com o pistão em movimento.
  • Durante o funcionamento, o óleo não pode escorrer para dentro da câmara de combustão.
  • Com o tempo, o óleo pode perder as propriedades reológicas e ficar mais espesso, não penetrando entre os anéis do pistão e o cilindro, o que provoca atrito.

Caneta Esferográfica

  • Para escrever, a tinta deve passar pela lateral da esfera (baixa viscosidade durante alto cisalhamento).
  • É necessário um curto tempo de recuperação da viscosidade original a fim de evitar o espalhamento da tinta por capilaridade no papel poroso.

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