Responsabilidade do Comitente e o Problema da Causa Virtual
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Responsabilidade do Comitente (Artigo 500.º)
Atuação de pessoa em proveito alheio.
Definição de Comitente
O Comitente, referido no n.º 1 do Artigo 500.º, é “aquele que encarregue outrem de qualquer comissão”.
O n.º 2 esclarece que a responsabilidade do comitente só existe se o facto danoso praticado pelo comissário (mesmo que contra as instruções deste) ocorrer no âmbito do exercício da função que lhe estava confiada.
Requisitos da Responsabilidade do Comitente
- Uma relação de comissão: Tarefa ou serviço realizada no interesse e sob a direção de outrem. Exige-se que haja uma subordinação do comissário ao comitente (como, por exemplo, num Contrato de Trabalho - CT), em que a função praticada pelo comissário pode ser imputada ao comitente, por ser no seu interesse e conta sua. É exigida a liberdade de escolha do comissário pelo comitente (n.º 1).
- Prática de factos danosos pelo comissário no exercício da sua função: Que haja um nexo etiológico entre a função e os danos. Os danos devem ser originados no exercício da função. A responsabilidade do comitente não deve extravasar da função que efetivamente confiou, delimitando a zona de riscos a cargo do comitente (n.º 2). (Nota: Não é necessário que o exercício seja a causa direta do dano, ex.: deixar cair um cigarro e causar um incêndio.)
Responsabilidade do Comissário e Direito de Regresso
O Comissário também tem a obrigação de indemnizar, desde que se reúnam os pressupostos da responsabilidade subjetiva.
O Artigo 500.º, n.º 1, estabelece que o comitente responde objetivamente pelos danos que o comissário causar, a título de responsabilidade pelo risco, numa espécie de culpa presumida, de forma a garantir o pagamento da indemnização.
O n.º 3 do Artigo 500.º esclarece que o comitente tem direito de regresso integral (reembolso de tudo o que haja pago) sobre o comissário, salvo se houver concurso de culpas (neste caso, aplica-se a responsabilidade solidária, Artigo 492.º, n.º 2).
Tipos de Culpa do Comitente (Não Excludentes)
O comitente pode ter:
- Culpa in eligendo: Culpa na escolha do comissário.
- Culpa in instruendo: Culpa nas instruções que deu.
- Culpa in vigilando: Não fiscalizou devidamente a atividade do comissário.
Esta responsabilidade tem por função específica garantir o pagamento da indemnização ao lesado, dada a circunstância de os comissários serem pessoas normalmente desprovidas de património suscetível de suportar o pagamento de elevadas indemnizações. Atuando estes por conta e no interesse dos comitentes, cabe a estes garantir a indemnização ao lesado. Por isso, a lei atribui ao lesado a pretensão direta contra o comitente em ordem a obter o ressarcimento dos danos.
O Problema da Causa Virtual
E se o dano resultante da causa real se tivesse igualmente verificado na ausência desta, por via de outra forma, denominada a causa virtual?
Exemplo: Alguém envenena um cão, no objetivo de prejudicar o seu proprietário, mas antes de este vir a morrer devido ao veneno, alguém lhe dá um tiro. Se o cão não tivesse morrido do tiro, morreria do veneno, e vice-versa. Ambos os factos são causa adequada do dano, mas um é a causa real (tiro) e outro a causa virtual (veneno).
Soluções Jurídicas
- Relevância Positiva da Causa Virtual: O autor da causa virtual seria responsável pelo dano nos mesmos termos que o autor da causa real. Prescindiria do nexo causal, já que este é interrompido pela causa real. Seria, por isso, responsabilizado por danos que não resultaram do seu comportamento, o que é inconcebível à luz do Artigo 483.º.
- Relevância Negativa da Causa Virtual: O autor da causa virtual não responderia, mas esta serviria para afastar a responsabilidade do autor da causa real. Admite-se que a responsabilidade do agente pode não ocorrer se demonstrar que o dano seria igualmente causado. É expressamente admitida pela lei em situações específicas de responsabilidade agravada, como uma causa suplementar da responsabilidade:
- Artigo 491.º: Exclui a responsabilidade do obrigado à vigilância de menor ou incapaz caso prove que, mesmo não omitindo o seu dever, o dano teria ocorrido.
- Artigo 492.º: O proprietário/possuidor exclui a sua responsabilidade se provar que não houve culpa da sua parte.
- Artigo 493.º: Quem tem em seu poder coisa móvel ou imóvel (animal, explosivos) com o dever de vigilar exclui a sua responsabilidade se provar que os danos se teriam igualmente produzido.
- Irrelevância da Causa Virtual (Regra Geral): A responsabilidade do autor do dano não seria minimamente afetada pela existência de uma causa virtual.