Ressonância Magnética (RM): Conceito e Princípios Físicos
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Os princípios da Ressonância Nuclear Magnética (RNM) são bastante complexos e envolvem conhecimentos em diversas áreas das ciências exatas.
A grande vantagem da RNM reside na sua segurança, já que não usa radiação ionizante, nas diversas capacidades em promover cortes tomográficos em muitos e diferentes planos, dando uma visão panorâmica da área do corpo de interesse e, finalmente, na capacidade de mostrar características dos diferentes tecidos do corpo.
A Estrutura do Átomo
Da estrutura básica do átomo, é sabido que uma nuvem de elétrons (partículas negativamente carregadas) orbita em torno de uma massa nuclear, formada de prótons (positivamente carregados) e nêutrons (eletricamente neutros).
Diferentemente das imagens de Raios-X, relacionadas com elétrons orbitais, o sinal da RNM surge a partir do centro do átomo, ou núcleo. Embora as propriedades químicas de um átomo dependam da estrutura de seus elétrons, as propriedades físicas dependem largamente do seu núcleo, que é responsável por quase a totalidade da massa do átomo. Embora prótons nucleares e elétrons orbitais possuam cargas opostas e de mesma intensidade, a fim de manter a neutralidade elétrica do átomo, o número de prótons e nêutrons é frequentemente desigual.
Esse princípio de desigualdade no núcleo do átomo invoca uma definição em física, chamada de "momento angular" do núcleo. Se o núcleo contém número desigual de prótons e nêutrons, então, ele possui um momento angular ou uma resultante angular. Se não existe desigualdade entre o número de prótons e nêutrons, o momento é zero. Qualquer outra combinação terá uma resultante diferente de zero.
Somente aqueles átomos que possuem número ímpar de prótons e/ou nêutrons serão capazes de produzir um sinal em RNM. Embora uma variedade de mais de 300 diferentes tipos de núcleos possuam momento angular, apenas um seleto grupo tem utilidade em medicina. Dentre esses:
- Hidrogênio
- Carbono
- Sódio
- Fósforo
- Flúor
De todos os átomos, o Hidrogênio é o mais simples, pois ele possui apenas um próton. Ele é o mais importante átomo para a RNM, sobretudo porque em humanos, ele corresponde a mais de dois terços do número de átomos encontrados em nosso corpo. Além de sua abundância nos sistemas biológicos, o hidrogênio é altamente magnético, o que o torna extremamente sensível à RNM. Outros núcleos também podem gerar imagens em RM, porém possuem imagens mais pobres comparadas às do Hidrogênio.
Propriedades Magnéticas do Átomo
O núcleo do átomo de Hidrogênio é formado por um próton, que é uma pequena partícula positivamente carregada associada a um momento angular (ou "spin"). A situação representada leva à formação de uma estrutura imaginária semelhante a uma barra magnética com dois polos orientados (norte e sul). Todos os núcleos têm essa propriedade. Pensemos nos átomos como setas apontando em uma direção. Na ausência de um campo magnético, as setas estarão apontando aleatoriamente no espaço.
A fim de produzir uma imagem em RNM, o paciente é exposto a um poderoso e uniforme campo magnético. Os campos magnéticos são medidos em unidades de Tesla (T). Na maioria dos sistemas médicos em uso atualmente, esses campos variam de 0,2 T a 2,0 T de intensidade. Para comparar, o campo magnético do planeta Terra é de aproximadamente 0,00005 T, com pequenas variações em torno da Linha do Equador e dos Polos Glaciais.
Quando submetidos a um campo magnético, esses prótons (setas) tendem a alinhar-se contra ou a favor desse campo. Na verdade, aproximadamente metade desses prótons alinha-se contra e metade a favor do campo magnético, com discreta predominância de prótons na mesma direção do campo. A diferença depende do campo magnético aplicado, mas é mínima em qualquer circunstância. Embora incrivelmente pequena, essa diferença é suficiente para produzir um sinal em RNM.
Deveremos sempre ter em mente o número de prótons existentes, que é da ordem de bilhões e bilhões, 10 elevado à 23ª potência em um cm3 de água, para ser mais exato. A somatória de todos esses momentos (setas) resultará em uma única seta, também chamada de vetor resultante.
Como a discreta maioria da população de prótons submetidos a um campo magnético tende a seguir a direção do campo aplicado, o vetor resultante também estará com essa orientação.
Ressonância do Núcleo e a Frequência de Larmor
A ressonância é um fenômeno comum na natureza. Para entendê-la, é necessário discutir uma outra característica dos prótons. Além de terem um momento, também chamado de "spin", esses prótons transladam em torno do eixo do campo magnético, seja o do campo magnético da Terra no nosso dia a dia, seja o do campo magnético aplicado para produzir uma imagem, como ocorre com a lua em volta da Terra, como a Terra em volta do sol. A ressonância, na verdade, é a frequência com que o próton gira em torno desse eixo, e foi matematicamente definida por um físico britânico chamado Joseph Larmor.
A frequência, segundo Larmor, é proporcional ao campo aplicado e a cada núcleo usado.
Cada aparelho de RM terá, dessa forma, uma frequência característica, baseada apenas na intensidade de seu campo magnético, já que praticamente usamos sempre o mesmo núcleo (Hidrogênio).
No espectro eletromagnético temos radiações ionizantes de alta energia e alta frequência, que incluem Raios-X e várias outras formas, usados para imagem médica, pois podem atravessar o organismo. A desvantagem desse tipo de radiação está no dano que pode causar às células do corpo por seus efeitos ionizantes. Segue-se no espectro, radiações de baixa frequência e baixa energia, que incluem a luz visível, a luz infravermelha e a ultravioleta. São potencialmente mais seguras que as radiações ionizantes, mas não têm muita utilidade em medicina, já que o corpo humano não é transparente a elas. Finalmente, com mais baixa frequência e mais baixa energia, na variação das ondas de rádio, por exemplo, o corpo humano uma vez mais se torna transparente e é essa janela no espectro eletromagnético que é usada em RNM.
Para se produzir um sinal em RNM e, então, uma imagem, o vetor resultante, orientado de acordo com o campo magnético aplicado, deverá ser deslocado dessa posição e induzir a formação de uma corrente elétrica em uma bobina especialmente preparada para perceber a mudança de posição. Em outras palavras, seria como atingir uma bola de sinuca em movimento com uma outra bola e então registrar a mudança que ocorre na orientação da primeira. Para mudar a direção do vetor resultante de sua orientação básica usa-se uma onda de Radiofrequência (RF) da janela do espectro eletromagnético. A RF deverá estar em sintonia com a frequência de ressonância do sistema.
A amplitude e a duração da RF poderão ser controladas para se produzir uma variedade de angulações e mudanças do vetor resultante. Para tradicionais imagens de RNM usa-se uma RF que varia o ângulo de 90 a 180 graus. Existem muitas outras variações com ângulos menores e que são usados em condições especiais, como para diminuir o tempo de aquisição das imagens, por exemplo.
Após cada pulso de RF aplicado, o sistema representado pelo vetor resultante inicia o que se chama "relaxamento", retornando ao equilíbrio anterior à RF após um determinado lapso de tempo, chamado de "tempo de relaxamento".
Em RNM, esse tempo de relaxamento depende de vários fatores, como a intensidade da RF e do campo magnético usados, da uniformidade desses campos magnéticos, do tipo de tecido orgânico, da interação entre prótons, entre outros.
Primeiro, após a RF, o vetor resultante tende a perder a orientação no plano para o qual fora desviado. Isso resulta da falta de homogeneidade do campo magnético (supondo que apenas Deus seja perfeito, até mesmo um campo magnético pode ter pequenas variações em seu curso). Essa perda natural que ocorre com todos os aparelhos de RM é chamada de Tempo 2* de relaxamento ou T2* (leia-se tempo 2 asterisco ou tempo 2 estrela). Esse tipo de relaxamento é danoso e deve ser corrigido para que não interfira na produção da imagem. Para isso, a cada determinado intervalo de tempo, outro pulso de RF é aplicado e novamente os prótons tendem a alinhar-se no plano desviado. Esse tempo decorrente chama-se de "echo time" (do inglês echo=eco; time=tempo), ou ET.
Cada próton tem seu próprio campo magnético, que começa a se desorganizar e a afetar núcleos vizinhos em uma reação simultânea, após cada pulso de RF, transferindo energia entre si e consequentemente saindo de fase. Essa relação próton-próton (ou spin-spin) é também chamada de Tempo 2 de relaxamento ou simplesmente T2.
A aplicação de pulsos de RF adiciona energia ao sistema e faz com que os prótons mudem para um estado de maior excitação ou de maior energia. O processo de dissipação dessa energia, no ambiente magnético desses prótons, e o seu retorno ao estado de mais baixa energia, é chamado de Tempo 1 de relaxamento ou T1. Como para se formar uma imagem em RNM vários pulsos de RF são necessários, é imperativo que se aguarde um certo tempo de relaxamento para que o próximo pulso de RF seja eficiente, ou seja, deve-se aguardar um determinado T1.
A Imagem em Ressonância Magnética (RM)
O contraste da imagem em RNM é baseado nas diferenças de sinal entre distintas áreas ou estruturas que comporão a imagem. A RNM tem um contraste superior à Tomografia Computadorizada (TC) na resolução de tecidos ou partes moles. Na TC, a atenuação de Raios-X pelo paciente é a maior fonte de contraste. Desta forma, a quantidade de atenuação reflete a densidade do elétron do paciente. Por outro lado, o contraste em RNM é o resultado da interação de diferentes fatores, incluindo a densidade dos prótons, T1, T2, a suscetibilidade magnética e o fluxo dos líquidos corporais.
Se apenas a densidade dos prótons fosse a fonte de contraste em RNM, talvez, então, ela não fosse melhor que a TC em termos de resolução e contraste. A RNM tem vantagens em outras áreas, mas com respeito às partes moles, a relação entre a densidade de prótons e a densidade de elétrons varia da ordem de apenas 10%, o que não seria vantajoso. Felizmente, existem outras e melhores fontes de contraste em RNM.
T1 e T2 oferecem contraste em RNM definitivamente superior à TC. Isso ocorre porque muitas substâncias com similar densidade de prótons e elétrons resultarão em diferentes sinais na RNM devido a diferentes tempos de relaxamento em T1 e T2.
Uma outra forma de contraste em RNM baseia-se na suscetibilidade magnética de várias substâncias, ou seja, a maneira como elas respondem a um campo magnético. Essa suscetibilidade é o resultado de propriedades químicas e físicas de cada substância, e é largamente explorada na produção de materiais de contraste usados nos exames de RNM. Como exemplo temos substâncias ditas diamagnéticas (efeito oposto sobre o campo magnético), paramagnéticas (efeito positivo, potencializando os efeitos do campo e melhorando a eficiência de T1 e T2) e, finalmente, substâncias superparamagnéticas e ferromagnéticas (metais, por exemplo) que também possuem efeitos positivos no campo magnético aplicado.
O programa de computador do equipamento realiza o armazenamento dos sinais emitidos pelos vários tecidos do corpo, sejam eles em T1, T2 ou qualquer outra sequência e, através de uma operação algorítmica, os transforma em imagens digitais.
Desvantagens da Ressonância Magnética
O campo magnético de altíssima magnitude é potencialmente perigoso para aqueles pacientes que possuem implantes metálicos em seus organismos, sejam marca-passos, pinos ósseos de sustentação, clipes vasculares, etc. Esses pacientes devem ser minuciosamente interrogados e advertidos dos riscos de aproximarem-se de um magneto e apenas alguns casos, com muita observação, podem ser permitidos.
A RNM possui pouca definição na imagem de tecidos ósseos normais, se comparada à TC, pois esses emitem pouco sinal. Na verdade, essa é uma desvantagem relativa, já que a falta de sinal pode ser delineada em RNM como áreas negras, e assim sendo, seria possível observar todo o curso de partes ósseas. Além disso, alterações na densidade de prótons desses ossos, promovido por patologias como câncer seriam prontamente acusados pela RNM.