Revoluções Liberais: Causas e Consequências

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As Condições de Sucesso para a Revolução Industrial Inglesa

A Inglaterra foi o primeiro país a reunir condições para a industrialização. Estas condições pautaram-se, primeiramente, por uma revolução agrícola, segundo por condições propícias no mercado interno, terceiro por existência de abundância de matéria-prima no Império colonial britânico. As mudanças foram irreversíveis, do ponto de vista social, económico e até vivencial. A industrialização seguiu-se em vários outros países, cada qual com a sua velocidade.

Graças ao apoio do Parlamento, os grandes proprietários de terras (landlords) puderam introduzir na agricultura uma série de inovações importantes:

  • Sistema de rotação quadrienal de culturas (afolhamento quadrienal): o cultivo, de maneira rotativa, das quatro parcelas (ou folhas) de um campo, ao longo de quatro anos, permitia resolver, por fim, o secular problema do esgotamento dos solos e, assim, prescindir do pousio (terra deixada em descanso).
  • Articulação entre a agricultura e a criação de gado: o cultivo de plantas forrageiras (que alimentavam os animais, por exemplo, o trevo) possibilitava, por um lado, assegurar o necessário estrume e, por outro lado, incentivar o melhoramento das raças animais.
  • Vedação dos campos comunitários (enclosures): os campos cercados substituíram o anterior sistema de uso comunitário das terras (open field), desencadeando a aplicação sistemática, pelos landlords, das inovações agrícolas (selecção das sementes, melhoramento dos utensílios, apuramento das raças animais).
  • Inovações técnicas: a introdução de máquinas nos campos, por exemplo a primeira semeadora mecânica (1703), a charrua triangular (1731) e a primeira máquina debulhadora (cerca de 1780) retirava um maior rendimento da terra.

As inovações agrícolas resultaram num aumento da produtividade, o qual, por sua vez, estimulou o crescimento demográfico e canalizou a mão-de-obra excedentária para as cidades.

Portugal – Dificuldades e Crescimento Económico

Relacionar a adopção de medidas mercantilistas em Portugal com a crise comercial

Entre 1670 e 1692, Portugal enfrentou uma grave crise comercial provocada:

  • pela concorrência de Franceses, Ingleses e Holandeses, que competiam com os Portugueses na produção de açúcar e tabaco;
  • pelos efeitos da politica proteccionista de Colbert;
  • pelos efeitos da crise espanhola de 1670-1680 (redução do afluxo de prata da América espanhola, com a qual os Holandeses compravam o sal português).

Uma vez que os stocks nacionais se iam acumulando, sem comprador, apesar dos preços cada vez mais baixos, a política do reino orientou-se, de acordo com as tendências mercantilistas da época, para a criação de manufacturas e a implantação de medidas proteccionistas.

Integrar estas medidas no modelo francês

As ideias mercantilistas já haviam chegado a Portugal através da obra de Duarte Ribeiro de Macedo (embaixador em Paris). No entanto, foi o conde da Ericeira (vedor da Fazenda de D. Pedro II, a partir de 1675) quem, actuando como um “Colbert português”, impôs, na prática, a adopção do mercantilismo. De acordo com o modelo francês, deu um forte impulso às manufacturas para atingir uma balança comercial positiva. As principais medidas do conde da Ericeira foram:

  • Estabelecimento de fábricas com privilégios (por exemplo, de panos – sedas e lanifícios – de vidro e de papel);
  • Protecção da produção nacional através das pragmáticas (leis que proibiam o uso de produtos de luxo estrangeiros);
  • Contratação de artífices estrangeiros que introduziram em Portugal novas técnicas de produção;
  • Desvalorização monetária (para tornar os produtos nacionais mais baratos em relação aos estrangeiros);
  • Criação de companhias monopolistas (por exemplo, a Companhia do Maranhão, para o comércio brasileiro).

Explicar o retrocesso da política industrializadora portuguesa

A decadência do esforço industrializante deveu-se, acima de tudo, à descoberta de minas de ouro (1690) e de diamantes (1729) no Brasil. A entrada de toneladas de metal precioso em Portugal, ao longo do século XVIII, levou a que, no reinado de D. João V, se cunhasse moeda em abundância, respirando-se um clima de prosperidade sem o esforço do investimento manufactureiro.

As leis pragmáticas já não eram respeitadas e o país voltou-se para o comércio como actividade prioritária. A procura do ouro do Brasil era feita (já desde o século XVI) pelas bandeiras, expedições armadas que, empunhando um estandarte – a bandeira – partiam, geralmente da pobre vila de São Paulo, e se aventuravam no interior brasileiro para capturar índios e descobrir jazidas. O movimento dos bandeirantes, apesar do seu carácter desumano, que lhe valeu forte oposição dos jesuítas (devido ao apresamento e escravização dos índios), teve o mérito de proporcionar o alargamento e desbravamento do território brasileiro, cujas fronteiras foram então definidas segundo limites mais amplos do que aqueles inicialmente previstos no Tratado de Tordesilhas na época de D. João II.

Avaliar a dependência da economia portuguesa face à Inglaterra

Segundo o tratado de Methuen (1703), a Inglaterra comprava os vinhos portugueses com vantagem competitiva em relação aos vinhos franceses, enquanto Portugal comprava os lanifícios ingleses sem restrições. Este tratado gerou uma situação de dependência de Portugal em relação a Inglaterra pois, não só contribuía para o abandono das manufacturas de panos em Portugal, como conduzia ao escoamento do ouro brasileiro para pagar as importações inglesas. Além disso, no terceiro quartel do século XVIII, 94% do vinho português exportado tinha como destino a Inglaterra, reforçando a dependência face a este país.

Contextualizar a política económica pombalina

Face à nova crise de meados do século XVIII, o rei D. José I tentou uma estratégia de mudança em relação à política de seu pai (D. João V). O ministro Sebastião José de Carvalho e Melo (Marquês de Pombal) delineou a recuperação económica com base nos pressupostos mercantilistas. As principais medidas económicas (do tipo mercantilista) que tomou foram:

  • a concessão de privilégios (subsídios, isenção de impostos) às indústrias existentes;
  • a criação de manufacturas da Covilhã e de Portalegre para desenvolver a indústria de lanifícios; a introdução dos têxteis de algodão;
  • o desenvolvimento da indústria de vidro da Marinha Grande;
  • o fomento de vários sectores da indústria (nomeadamente, a fundição do ferro, a cerâmica, a saboaria, a construção naval); a contratação de empresários estrangeiros com o objectivo de diminuir as importações; a reorganização da Real Fábrica da Seda (criada no reinado de D. João V e reestruturada com operários e mestres de várias artes de origem francesa).

Além da actividade industrial, também o comércio foi reorganizado no intuito de reduzir o défice e de colocar as trocas na mão da burguesia portuguesa. O Marquês de Pombal conseguiu atingir estes objectivos graças às seguintes medidas:

  • criação de companhias monopolistas que aliavam os capitais privados aos do Estado (por exemplo, a Companhia da Ásia, para o comércio com o Oriente; a Companhia do Grão-Pará e Maranhão, para o comércio com o Brasil; a Companhia Geral das Reais Pescas do Reino do Algarve; a Companhia para a Agricultura das Vinhas do Alto Douro, criada para a reorganização e controlo do comércio dos vinhos do Douro, então dependente dos ingleses);
  • atribuição do estatuto nobre aos grandes burgueses accionistas das companhias monopolistas;
  • instituição da Aula do Comércio, escola comercial para os filhos dos burgueses;
  • criação da Junta do Comércio, órgão que controlava a actividade comercial do reino.

Em consequência desta política económica, o final do século XVIII foi, para Portugal, um período de prosperidade, com uma balança comercial positiva e a resolução do problema do défice comercial com a Inglaterra.

A Revolução Americana: Uma Revolução Fundadora

Reconhecer a diversidade e a unidade das colónias inglesas da América do Norte

No século XVIII, a Inglaterra possuía 13 colónias na costa oriental da América do Norte. Estas colónias estavam unidas:

  • por uma mesma língua – o inglês;
  • pela religião – predominantemente protestante;
  • pela luta contra os índios e Franceses;
  • pela submissão à coroa britânica (rei Jorge III) e ao Parlamento inglês.

Porém, também existiam factores de diversidade:

  • as colónias do Norte e do Centro tinham como base económica a agricultura complementada pela pesca, criação de gado, comércio e indústria. Eram, também, constituídas por comunidades mais tolerantes;
  • as colónias do Sul especializaram-se na plantação de tabaco e do algodão assente na exploração de mão-de-obra escrava.

Se, por um lado, os factores de união podem ter favorecido a criação, em 1776, de um país novo e independente (os Estados Unidos da América), por outro lado, os factores de diversidade podem ajudar-nos a compreender as hesitações na escolha de um modelo político após a independência: dever-se-ia escolher um governo central forte ou uma federação descentralizada? A formação, ainda que lenta, de uma consciência nacional levaria os Americanos a optar pela existência de um governo geral.

Explicar o conflito económico surgido entre a Inglaterra e as suas colónias da América após 1763

Os principais motivos de descontentamento dos colonos americanos prendiam-se com questões económicas:

  1. A Guerra dos Sete Anos, que estendera ao território americano os conflitos entre Franceses e Ingleses, terminou com a vitória inglesa (Tratado de Paris). No entanto, em troca da protecção concedida aos colonos, a Inglaterra sobrecarregou-os com impostos, de maneira a recuperar do esforço de guerra. Entre 1764 e 1767, o Parlamento britânico decretou taxas aduaneiras sobre a importação de certos produtos (papel, vidro, chumbo, melaço, chá) e criou um imposto de selo.
  2. A região que os colonos reivindicavam, a oeste, para se expandirem territorial e economicamente, foi considerada propriedade dos índios pelo governo britânico.
  3. Os colonos americanos tinham falta de liberdade comercial: só podiam exportar os seus produtos para Inglaterra ou para outras colónias inglesas e só podiam importar mercadorias europeias por intermédio de Londres (teoria do exclusivo comercial).

Mostrar como esse conflito adquiriu um carácter político

O conflito económico ganhou contornos políticos quando os colonos americanos tomaram consciência de que, apesar de serem cidadãos britânicos, não estavam representados no Parlamento de Londres. Como tal, não consideravam legais os impostos votados. Os acontecimentos que se seguiram agravaram a controvérsia entre as colónias e a metrópole.

  • defende o direito à igualdade e à independência como “Lei da Natureza”;
  • proclama, como direitos “inalienáveis” (isto é, que não se podem retirar nem transmitir a outrem) e concedidos por Deus, “a Vida, a Liberdade e a procura da Felicidade”;
  • institui a soberania popular com base em “governos, cujo justo poder emana do consentimento dos governados”;
  • prevê o direito de os povos deporem um governo que não os represente e de “instituir um novo governo”;
  • rejeita o “despotismo absoluto”.

Em 1787, a Constituição definiu o modelo político do novo estado independente: foi instituída a República dos Estados Unidos da América, um conjunto de Estados federados com alguma autonomia mas obedientes a um Estado Central forte. Neste diploma foram aplicados, na prática, pela primeira vez, as ideais iluministas:

  • a divisão tripartida dos poderes, pensada pelo filósofo iluminista Montesquieu, foi aplicada da seguinte forma: o poder legislativo foi entregue ao Congresso, composto pela Câmara dos Representantes e pelo Senado (que reúnem no edifício do Capitólio, em Washington); o poder executivo coube ao Presidente dos EUA (residente da Casa Branca, em Washington, desde 1800) e o poder judicial passou a pertencer a um Tribunal Supremo e a tribunais inferiores;
  • foram consignadas as liberdades e garantias dos cidadãos;
  • foi consagrada a soberania nacional, nomeadamente pela possibilidade de exercer o direito de voto.

Em resumo, a Revolução Americana deu início a uma vaga de revoluções liberais que ocorreram entre os séculos XVIII e XIX e que puseram fim ao sistema de Antigo Regime baseado no absolutismo e na sociedade de ordens. Estes movimentos instituíram a soberania popular, a separação de poderes, a livre iniciativa económica, a tolerância religiosa e a descolonização.

A Revolução Francesa – Paradigma das Revoluções Liberais e Burguesas

Mostrar o anacronismo das estruturas sociais francesas nas vésperas da Revolução

Estamos perante um anacronismo quando, numa determinada época, existem características que deveriam pertencer a outra: era o caso da sociedade francesa do século XVIII, ainda muito ligada às estruturas de Antigo Regime.

Persistiam, assim, as seguintes características sociais:

  • a alta burguesia era superior às ordens tradicionalmente privilegiadas (clero e nobreza) em riqueza e instrução, contudo, não tinha acesso aos altos cargos da administração pública, do exército e da hierarquia religiosa, para os quais se exigia prova de nobreza;
  • os camponeses, apesar de constituírem a maioria da população (cerca de 80%) continuavam na miséria, pois não eram detentores das terras que trabalhavam e ainda tinham de pagar impostos;
  • os trabalhadores das cidades recebiam baixos salários;
  • a nobreza mantinha um estilo de vida ocioso e frívolo; porém, detinha a maior parte da propriedade fundiária, os postos mais importantes e estava isenta do pagamento de impostos;
  • o clero possuía terras, recebia rendas e a dízima (1/10 de toda a produção agrícola), no entanto, tal como a nobreza, não pagava impostos.

Esta situação de profunda injustiça social foi, então, uma das causas das Revolução Francesa.

Analisar a crise económico-financeira

Nas vésperas da Revolução, a França era afectada por uma crise económica motivada pelos seguintes factores:

  • o aumento do preço do pão, em virtude de maus anos agrícolas;
  • a quebra de produção têxtil, não só devido ao aumento do preço do pão (que limitava a capacidade de aquisição de outros produtos pelas famílias), mas também por causa do Tratado de Eden, de 1786 (que previa a livre-troca do vinho francês pelos têxteis ingleses);
  • as despesas do Estado com o exército, as obras públicas, a dívida pública e o luxo da corte, que originavam um défice constante, já que o clero e a nobreza não contribuíam para as receitas do Estado (pois não pagavam impostos).

Podemos considerar a crise económico-financeira como o segundo factor que conduziu à Revolução.

Explicar o fracasso das tentativas políticas de reforma

Perante a crise económico-financeira, o poder político tinha de agir. O rei Luís XVI, monarca absoluto, rodeou-se de ministros para o auxiliarem: Turgot, Necker, Calonne e Brienne propuseram, sucessivamente, reformas no intuito de solucionar a crise. Porém, a conclusão a que chegavam era sempre a mesma: a única maneira de obter mais receitas para o Estado passaria por fazer com que as ordens privilegiadas também pagassem impostos. Ora, o clero e a nobreza, opuseram-se terminantemente às tentativas de redução dos seus privilégios.

A própria rainha Marie Antoinette, chamada pelo povo de “Madame Défice” devido às suas despesas com a corte, contribuiu para que os ministros fossem despedidos. Foi num clima de agitação popular e de oposição política das ordens privilegiadas que Luís XVI resolveu convocar os Estados Gerais (reunião dos representantes das diversas ordens sociais), enquanto se elaboravam os Cadernos de Queixas (registo dos anseios da sociedade francesa).

Interpretar a transformação dos Estados Gerais em Assembleia Nacional Constituinte

A reunião dos Estados Gerais, em Maio de 1789, iniciou-se, desde logo, com uma questão controversa: a votação das propostas deveria fazer-se por cabeça (cada deputado, um voto) ou por ordem (cada grupo social, um voto)? Se a votação por cabeça ganhasse, os deputados do Terceiro Estado, maioritários, fariam valer as suas propostas; porém, se a votação se fizesse por ordem, as duas ordens privilegiadas (clero e nobreza) poderiam unir-se, dado que tinham interesses convergentes, na defesa do seu estatuto. Perante este impasse e a indecisão de Luís XVI, os deputados do Terceiro Estado (juntamente com alguns deputados do clero e da nobreza que partilhavam as mesmas ideias) reuniram-se à parte, na sala do Jogo da Péla, onde juraram, em Julho de 1789, não se separarem até que tivesse pronta uma Constituição. Devido a este acto revolucionário (conhecido por “Juramento da sala do Jogo da Péla”), os Estado Gerais transformaram-se em Assembleia Nacional Constituinte (uma assembleia destinada a redigir uma Constituição): era o fim do absolutismo e o início da Nação soberana.

Relacionar a abolição dos direitos feudais com a destruição da sociedade de Antigo Regime

Entretanto, nas ruas, o povo realizava a sua revolução: a 14 de Julho de 1789, em Paris, a Bastilha (fortaleza para presos políticos do absolutismo) foi destruída pelo povo e pela Guarda Nacional (milícia composta por burgueses). A tomada da Bastilha, ficaria, para sempre, conhecida como símbolo máximo da Revolução Francesa, acontecimento comemorado todos os anos, em França, no dia 14 de Julho. Por toda a França, os camponeses revoltaram-se violentamente contra os senhores das terras e contra os encargos feudais (movimento denominado por “Grande Medo”).

Face ao descontentamento popular, a Assembleia Nacional Constituinte produziu, em Agosto de 1789, diplomas legais que aboliam os direitos feudais (como a dízima à Igreja e o trabalho gratuito – corveias – prestado aos nobres) “aclamando o povo” para atingir a “tranquilidade pública”, como dizia, então, o presidente da Assembleia. Ao instaurarem a igualdade de todos perante a lei, nomeadamente o livre acesso aos empregos públicos, estes decretos destruíram a sociedade de ordens, assente nos privilégios da nobreza e do clero.

No ano seguinte (1790) a Assembleia aprovou um documento polémico – a Constituição Civil do Clero – que transformava os membros do clero secular em funcionários do Estado, extinguia o clero regular e procurava salvar a economia francesa com os bens confiscados à Igreja, que constituíam a garantia dos novos títulos de papel-moeda (os assinados).

Sublinhar o significado da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão

Ainda durante a etapa da Assembleia Constituinte (1789-1791), os deputados elaboraram a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, um documento de inspiração iluminista, fundamental, não só para a Revolução Francesa mas também para todos os movimentos revolucionários que esta inspirou. Os aspectos mais importantes da Declaração são:

  • a proclamação do fim da sociedade de ordens (“Os homens nascem e são livre e iguais em direitos”);
  • a salvaguarda dos direitos naturais do homem (“A liberdade, a propriedade, a segurança e a resistência à opressão”);
  • a defesa da soberania popular contra o absolutismo (“O princípio de toda a soberania reside essencialmente na Nação”);
  • a protecção dos cidadãos pela lei (“Tudo aquilo que não é proibido pela lei não pode ser impedido […]. Ninguém pode ser acusado, preso ou detido senão nos casos determinados pela lei”);
  • a tolerância religiosa (“Ninguém pode ser inquietado pelas suas opiniões, incluindo opiniões religiosas”);
  • a liberdade de expressão (“Todo o cidadão pode, portanto, falar, escrever, imprimir livremente”);
  • a defesa da burguesia e do direito à propriedade privada (“A propriedade é um direito inviolável e sagrado”).

Pela alteração profunda que este documento provocou nas estruturas sociais e políticas de Antigo Regime, podemos relacioná-lo com o início de um novo período histórico: a Época Contemporânea.

Caracterizar a monarquia constitucional

Em Setembro de 1791 foi aprovada a Constituição. O rei tinha de obedecer a este documento fundamental, pelo que designamos a nova etapa (1791-92) por monarquia constitucional. Esta caracterizou-se por:

  • separação de poderes: o poder legislativo era entregue à Assembleia Nacional Legislativa (composta por 745 deputados), o poder executivo pertencia ao rei (que podia vetar as leis durante dois anos: veto suspensivo) e o poder judicial cabia a juízes eleitos e a um Tribunal Superior;
  • instituição da soberania nacional (é a Nação quem escolhe os governantes, através do voto – sistema representativo);
  • consagração dos Direitos do Homem e do Cidadão;
  • manutenção da distinção pela riqueza (o processo de eleição de deputados da Assembleia Legislativa era indirecto e realizado através do sufrágio censitário: apenas os homens mais ricos, que pagavam um imposto – ou censo – igual ou superior a três dias de trabalho, podiam votar; eram estes cidadãos activos quem podia escolher os verdadeiros eleitores, os quais, por sua vez, eram aqueles que tinham riqueza suficiente para pagar um imposto igual ou superior a dez dias de trabalho).

A queda da monarquia

As opções legislativas e constitucionais da Assembleia não foram pacíficas, causando agitação social e política. Além do mais, o monarca revelou-se hesitante perante o novo modelo de governação. As suas indecisões culminaram na tentativa de fuga falhada do rei Luís XVI e da família real em junho de 1791. Estas atitudes conduziram a um sentimento de generalizado de desconfiança popular, num contexto de degradação das condições de vida, das más colheitas desse ano e da inflação crescente. Além do mais, as tentativas contrarrevolucionárias provenientes do exterior, por parte dos emigrados franceses que tinham fugido do ambiente revolucionário e que, segundo se dizia, conspiravam, intensificaram as tensões no interior de França e levaram a contestação da própria monarquia. Luís XVI contava com o apoio dos monarcas estrangeiros, sobretudo o imperador Leopoldo II da Áustria e o rei da Prússia, Frederico Guilherme I, que começavam a ver a situação revolucionária em França como sendo perigosa para as outras monarquias europeias.

O manifesto de Brunswick, de 25 de julho de 1792, declarava que, caso a família real fosse de algum modo atacada, então a população de Paris também o seria, o que fez inflamar os ânimos do povo parisiense, por acreditarem que o rei estava, de algum modo, ligado aos contrarrevolucionários. Nesse contexto, a França confrontava-se com quatro preocupações que dividiam a opinião pública e as diferentes fações políticas:

Por um lado, o receio de uma insubordinação social popular geral, devido ao descontentamento em consequência da fome, provocada por más colheitas entre o inverno de 1792 e a primavera de 1793; o crescente descontentamento gerado pelo recrutamento de homens, tirados à sorte, para integrarem o exército que devia combater o inimigo externo e que originou a revolta da Vendeia; por outro lado, o perigo da contrarrevolução liderada pela aristocracia que, a partir do estrangeiro ou no interior do país, conspirava de modo a travar o processo revolucionário; finalmente, o perigo externo devido à guerra que as potências monárquicas europeias (Áustria e Prússia) coligadas haviam iniciado contra a França revolucionária.

A pátria estava em perigo, declaração feita em julho de 1792, pela Assembleia Legislativa, criou um ambiente mobilizador contra as ameaças à revolução, fossem no exterior, fossem internas.

A 10 de agosto de 1792, um movimento insurrecional popular, dirigiu-se à residência real das Tulherias, obrigando o rei a procurar refúgio na Assembleia Legislativa que, no entanto, fazendo valer as posições mais radicais e pressionada pelos sans-culottes suspendeu as funções do rei, decidindo que a família real fosse encarcerada. Sem o poder executivo representado no rei, deixou de ser possível a governação e a monarquia constitucional foi abolida.

Com efeito, o rei Luís XVI foi destituído dos seus poderes e tornou-se um cidadão como todos os outros, Luís Capeto. A 11 de dezembro de 1792 teve início o seu julgamento, foi condenado como traidor e a sua execução, que ocorreu a 21 de janeiro de 1793 foi uma decisão que provocou a divisão definitiva entre os girondinos e os montanheses, as forças políticas representadas na anterior Assembleia Legislativa (substituída por uma nova assembleia, designada Convenção), sobretudo quanto ao destino a dar ao rei-prisioneiro, face à pressão social que se fazia sentir na Comuna insurrecional de Paris.

Os girondinos, liderados por Brissot (1754-1793), apoiados pela rica burguesia dos negócios, mais moderados, e politicamente divergentes da Comuna de Paris, defendiam as liberdades de 1789, opondo-se a quaisquer medidas de exceção, recusando a atribuição da pena capital ao rei, antes defendendo o exílio do monarca. Os girondinos foram progressivamente afastados, e os montanheses vão dominar a Convenção, entretanto formada.

Os montanheses, ligados predominantemente ao clube dos jacobinos, liderados por Maximilien Robespierre (1758-1794), mas também com a influência de outros republicanos, como Danton (1759-1794) e Marat (1743-1793), defendiam o caráter mais popular da revolução, e concordavam em pedir a morte em nome da salvação pública e das necessidades da revolução). Os montanheses respondiam, assim, à pressão exercida pelos sans-culottes), que se haviam tornado a base social de apoio da revolução e que, já desde 1789, vinham revelando um papel ativo, em momentos decisivos. A nova Convenção republicana teve a sua primeira sessão em 20 de setembro de 1792, no mesmo dia em que os exércitos franceses obtiveram uma vitória em Valmy. Foi a derrota ali infligida aos prussianos pelas tropas francesas que contribuiu não só para a difusão dos ideais revolucionários fora da França (pois os franceses ocuparam a Bélgica), como reforçou a intervenção dos revolucionários da Comuna de Paris e da Convenção contra os vestígios do absolutismo e da monarquia, contra as ameaças externas e internas que punham em causa a revolução.

A obra da Convenção

A deposição do rei e a radicalização revolucionária conduziu, como já foi referido, à formação de uma nova assembleia – a Convenção republicana – eleita por sufrágio universal masculino, que devia dar à França uma nova Constituição. A Convenção eleita reuniu, pela primeira vez, em 20 de setembro de 1792 e decidiu, por unanimidade, a abolição da monarquia constitucional. Os montanheses, apoiados pelos sans-culottes afastaram os girondinos da Convenção, em junho de 1793, e implementaram a ditadura jacobina assente num governo revolucionário, liderado pela Comuna Insurrecional de Paris e pelo Comité de Salvação Pública, correspondendo aos anseios do povo miúdo de Paris que defendia uma república mais igualitária, e uma democracia direta.

A 25 de setembro, uma das primeiras medidas tomadas foi a declaração da República “una e indivisível” face à continuação das ameaças da guerra com a Europa e às revoltas dos realistas da Vendeia. Entretanto, cumprindo as suas funções, a Convenção elaborou uma nova Constituição republicana, proclamada a 21 de setembro de 1793.

O período da Convenção republicana vigorou até 1795, e ficou marcado pela fase do “Terror”, entre 1793 e 1794, associado, sobretudo, à figura de Maximilien Robespierre, deputado da Convenção e, a partir de 27 de julho de 1793, um dos principais líderes do Comité de Salvação Pública, onde interveio com vista à instauração de um governo revolucionário. Na verdade, para garantir o êxito da obra revolucionária a que a Convenção se propunha, a 10 de outubro de 1793, foi decretado que o governo da França seria revolucionário até à paz, o que implicava a adoção de medidas de exceção e a não aplicação da Constituição de 1793, aprovada em setembro.

A instituição do regime do “Terror” contava com a existência, já desde finais de 1792, de um Comité de Segurança que supervisionava as prisões e procedia ao envio dos réus para os tribunais. Este foi reforçado, a 10 de março de 1793, com a criação do Tribunal Revolucionário com vista a julgar todos os crimes contrarrevolucionários. A partir de 6 de abril de 1793, o Comité de Salvação Pública tornou-se o órgão central do governo, responsável pela execução da política da Convenção. A ação revolucionária da Convenção estendeu-se por toda a França, através de organizações revolucionárias jacobinas que atuavam em nome do Estado revolucionário, de modo a controlar os suspeitos, a proceder a prisões e a reprimir insurreições.

Um dos meios do regime do “Terror” foi a adoção, em 17 de setembro de 1793, da Lei dos Suspeitos (que criou na sociedade francesa um clima de suspeição e de perseguição, acompanhado pelo confisco de bens dos que eram considerados inimigos da República que seriam redistribuídos de modo a criar uma classe de pequenos proprietários. Foram instituídos tribunais revolucionários por toda a França, marcados, essencialmente, pelo julgamento sumário daqueles que eram acusados e declarados como inimigos da República, não só nobres, como padres refratários, emigrados e os que, de alguma forma, tinham comportamentos considerados antirrevolucionários e que, por isso, eram condenados à morte. A guilhotina tornou-se o símbolo deste período.

O regime da Convenção montanhesa, para marcar o início de uma nova época da França, adotou oficialmente o calendário revolucionário a partir de 5 de outubro de 1793. A contagem do tempo iniciava-se em 1792, o ano I do calendário republicano, e atribuíu novos nomes a todos os meses e dias do ano, o que revelava, igualmente, um corte com o calendário cristão. Ao nível económico, perante o agravamento da inflação e das condições de vida, e em resposta às reivindicações das massas populares, foi promulgada a Lei do Máximo, no sentido de fixar o valor dos salários e o preço máximo dos produtos considerados essenciais, como forma de evitar o açambarcamento e para fazer frente à desvalorização da moeda e à falta de alimentos. Foi também adotado um sistema de uniformização dos pesos e das medidas. Em termos sociais, a Convenção pôs fim ao que restava dos direitos feudais e decretou, no ano de 1794, a abolição da escravatura nas colónias.

Durante este período do “Terror” viveu-se também uma descristianização for

çada , em que se assistiu, para além da adoção do calendário republicano já referido, ao encerramento de igrejas, à laicização do casamento, que se tornou um ato civil, e à legalização do divórcio.

A 9 do Termidor, segundo o calendário republicano (27 de julho de 1794), Robespierre, principal líder do período do “Terror”, foi preso e guilhotinado no dia seguinte, colocando-se fim a este regime na França revolucionária. A Convenção voltou a ser dominada pelos girondinos e foi redigida uma nova Consti- tuição, em 1795, votada a 29 do Messidor (17 de agosto de 1795) que foi ratificada por plebiscito e deu origem a um novo período político da Revolução – o Diretório .

O Diretório

 Depois do fim do “Terror” e da Convenção, instaurou-se, em França, o Diretório , uma forma de governo constitucional que vigorou entre 26 de outubro de 1795 e 9 de novembro de 1799. Em termos sociais e políticos, o Diretório foi marcado pelo afastamento das fações mais radicais, bem como das camadas populares, ligadas à Convenção. Ascenderam os setores moderados, apoiados pela burguesia que tinha como objetivo firmar as conquistas políticas e sociais alcançadas com a Revolução e garantir o controlo do poder.  


A Constituição do Ano III , aprovada em outubro de 1795, teve como principal preocupação evitar a concentração de poderes. Neste sentido, o poder legislativo foi entregue a duas assembleias – o Conselho dos Quinhentos, composto por 500 deputados, ao qual cabia a iniciativa das leis, e o Conselho dos Anciãos, formado por 250 deputados, que votava as leis propostas pelo Conselho dos Quinhentos.

O poder executivo foi entregue a cinco diretores, eleitos pelo Conselho dos Anciãos. Aos diretores cabia a nomeação de ministros, de altos funcionários e de generais, e ainda a condução da política externa. A Constituição de 1795 restabeleceu o voto censitário masculino.

O período do Diretório coincidiu com um tempo de crise económica , mas também de especulação e corrupção, assistindo-se à ascensão de uma classe de burgueses enriquecidos, o que acentuou os contrastes socioeconómicos entre os franceses Além destas dificuldades, este período foi marcado por forte instabilidade política , resultante de rivalidades entre fações opostas e das tentativas contrarrevolucionárias realistas e até jacobinas. Os jacobinos desencadearam a “Conjura dos Iguais” (1796), liderada por Gracchus Babeuf, que preconizava a Revolução coletivista e uma igualdade perfeita. Estas tentativas de conquista do poder foram sempre reprimidas com a inter- venção do exército, de modo a restaurar a ordem.

O Consulado

 Foi em resultado do golpe de 9 de novembro de 1799, e da procura de ordem, que surgiu o Consulado . Este regime político vigorou na França entre 9 de novembro de 1799 e 18 de maio de 1804 . Numa França cansada de revoluções, períodos de medo e terror, instabilidade económica, social e política, o Consulado, dirigido por três cônsules, entre os quais se destacou Napoleão Bonaparte , pretendeu garantir a pacificação e estabeleceu uma nova ordem jurídica e institucional. Iniciou-se, assim, um novo regime com a aprovação da nova Constituição, a 26 de dezembro de 1799, que marcou uma rutura com as anteriores, baseando-se no princípio orientador de que a confiança deve vir debaixo, mas a autoridade tem de vir de cima e não fazendo qualquer referência quer aos direitos do Homem, quer à defesa das liberdades.


A Constituição do ano VIII (1799), promulgada por Napoleão, institucionalizou o Consulado e centrava-se, essencialmente, nos poderes executivo e militar que ficaram nas mãos de Napoleão, a figura cimeira deste novo regime. Com esta nova Constituição, as eleições para os diferentes órgãos de poder eram indiretas. O Senado, órgão de cariz conservador, tinha como função principal a designação, a partir da lista de confiança, daqueles que iriam desempenhar os cargos legislativos e os titulares de altos cargos; cabia-lhe ainda a escolha dos três cônsules que, durante dez anos, detinham o poder.

Ao primeiro cônsul , Napoleão Bonaparte , cabia o poder executivo, tinha poderes ao nível militar e das relações externas e era, ainda, da sua responsabilidade a nomeação de ministros, pelo que os outros dois cônsules acabavam por exercer apenas uma função consultiva. Aos cônsules cabia propor as leis ao Conselho de Estado. Este era formado por 50 membros, nomeados pelo primeiro cônsul, e tinha o poder de redigir os projetos de lei, que eram discutidos pelo Tribunato e, depois, votados pelo Corpo Legislativo.

 No ano de 1802, Napoleão Bonaparte foi declarado cônsul vitalício , tendo a Constituição sofrido algumas alterações. Era ao primeiro cônsul que cabia propor ao Senado os nomes dos outros dois cônsules, com possibilidade de designar o seu sucessor. O Senado passou a ter poder legislativo e podia dissolver o Tribunato e o Corpo legislativo, estando, todavia, subordinado à vontade do primeiro cônsul vitalício, Napoleão Bonaparte.

Durante o Consulado, sob a direção de Napoleão, retomou-se a paz interna e o espírito de reconciliação entre as diferentes fações foi alcançado . A liberdade de culto foi concedida, os emigrados foram autorizados a regressar à França, mediante uma am- nistia, e foi suprimida a lei que autorizava a prisão dos familiares dos emigrados. O clima de pacificação fez-se sentir também no exterior, na medida em que pôs fim à guerra com a Áustria, que acabou por ceder a Itália do Norte e do Centro à França, procedeu ao estabelecimento da paz com o Reino Unido.


No entanto, esta pacificação, interna e externa, não foi suficiente, havendo necessidade de consolidar e modernizar o poder do Estado. Uma das principais iniciativas do Consulado napoleónico , para o estabelecimento de uma nova ordem institucional e política, foi a codificação das leis , ou seja, a fixação, em código, das leis escritas. Publicadas em 1804, no final do Consulado de Napoleão. Com estes instrumentos legais e jurídicos consagrou-se uma maior uniformização da França e a igualdade dos cidadãos perante a lei . Especial destaque teve o Código Civil, que garantia as liberdades individuais e a laicização da Igreja, pois regulamentava a família, o matrimónio, o divórcio, a autoridade paternal sobre os filhos, ainda que a mulher continuasse a ter um papel social de menoridade, limitando-se o seu poder sobre a propriedade e sobre os filhos menores, situação comum em toda a Europa da época.

O aparelho de Estado , sob o Consulado, foi modernizado, mas também burocratizado, e assumiu-se claramente a função pública ao serviço do Estado , com salários, sem compra e venda de cargos, com carreiras abertas ao talento e não ao nascimento. Valorizou-se a instrução com a criação de liceus e escolas superiores , de modo a formar os cidadãos chamados a ter um papel ativo e competente na sociedade e no Estado.

Outra das iniciativas deste período foi a reforma administrativa e fiscal para obter o equilíbrio financeiro. Deste modo, no ano de 1802, o orçamento de Estado estava equilibrado. Foi criado o Banco de França, no ano de 1800, e, em 1803, assistiu-se a uma reforma monetária que se traduziu no surgimento de uma nova moeda – o franco germinal.

Napoleão procurou a paci- ficação religiosa , tendo assinado a Concordata em 1801, sendo possível, a partir de então, reorganizar a Igreja de França, colocando fim às divergências com a Santa Sé.

No plano social , a sociedade napoleónica organizava-se de forma hierárquica, distinguindo-se os cidadãos mais ricos, que compunham uma elite, de entre a população, em geral. Procu- rou-se ainda a eliminação das fações políticas opositoras – os realistas e os jacobinos – bem como dos liberais, assumindo-se o regime como mais autoritário.A escravatura, que fora abolida nas colónias no ano de 1794 pela Convenção, foi reintroduzida.


A vigência do Consulado foi a afirmação do poder pessoal e autoritário de Napoleão Bonaparte, que fez tudo para a Constituição do Ano X o tornar cônsul vitalício.

A 28 do Floreal do Ano X (18 de maio de 1804), o Senado e o Tribunado tornaram-no imperador hereditário.

AS VAGAS REVOLUCIONÁRIAS LIBERAIS E NACIONAIS

 A França, durante o período napoleónico, conheceu uma fase de conquista territorial que se estendeu da Península Ibérica à Rússia. Não obstante, o sonho expansionista de Napoleão Bonaparte teve o seu fim devido às derrotas sucessivas dos seus exércitos, em especial na campanha da Rússia (1812) e na batalha de Waterloo (1815). Terminado esse período de expansão, os ideais da Revolução Francesa permaneceram vivos , pois tinham sido propagados por toda a Europa, desde os finais do século XVIII. Para além da sua difusão através de livros, de panfletos e da imprensa, também as guerras (quer as do período revolucionário, a partir de 1792, quer as napoleónicas, após 1800) tiveram um papel determinante na expansão dos ideais revolucionários. De facto, a presença dos exércitos franceses contribuiu para que os povos, por um lado, valorizassem os ideais de liberdade, de igualdade e de fraternidade, proclamados após 1789, e, por outro lado, se unissem contra o domínio exercido pelos franceses, possibilitando o despertar de sentimentos nacionalistas.

A derrota de Napoleão Bonaparte permitiu que as potências vencedoras, Áustria, Rússia, Prússia e Inglaterra, restaurassem a antiga ordem que regulava a Europa, de modo a garantir a legitimidade e a autoridade das monarquias (baseadas na hereditariedade da Coroa), bem como o equilíbrio entre as potências. Foi com este objetivo que, em 1814-1815, se reuniu o Congresso de Viena, onde estiveram representadas as nações vencedoras, e também a França.

Segundo o entendimento dos representantes no Congresso de Viena, havia que restabelecer as antigas fronteiras e pôr fim às ameaças que a revolução representava para a Europa monárquica, absolutista, legitimista, aristocrática e clerical.


As potências vencedoras pretendiam não só traçar um novo mapa da Europa, como também engrandecer o poder dos seus Estados e ainda pôr termo aos ideais revolucionários, como forma de evitar o ressurgimento do radicalismo que tinha marcado a França a partir de 1792 e que culminara com a execução do rei Luís XVI.

 Foi neste contexto que, para combater o perigo revolucionário, surgiu a Santa Aliança (setembro de 1815) assinada entre a Rússia, a Áustria e a Prússia, ficando a Inglaterra deliberada- mente à margem, por um lado, pelo facto de não se rever numa aliança marcadamente absolutista e, por outro, porque o pragmatismo político afastaram-na das invocações de cariz religioso, constantes do texto do tratado. Mas, apesar desse afastamento inicial, em novembro do mesmo ano, a Inglaterra associou-se às potências vencedoras que, deste modo, formaram a Quádrupla Aliança , com vista a congregar esforços para impedir o regresso de Napoleão Bonaparte e a vigiar os perigos revolucionários. Todavia, apesar dos esforços das monarquias europeias, representadas no Congresso de Viena, os ideais da Revolução Francesa mantinham-se acesos na Europa . Entre os princípios divulgados destacam-se: a ideia de criar uma república una e indivisível; os princípios da soberania popular; a vontade de pôr fim às instituições do Antigo Regime; a defesa da separação dos poderes políticos; a valorização dos direitos e liberdades do indivíduo e a soberania da nação.

Foi, portanto, com base nestes princípios que se criaram con- dições políticas e sociais na Europa para que surgissem ondas revolucionárias de tipo liberal ou de tipo nacionalista . Enquanto as revoluções liberais procuravam alterar o regime político, do- tando os países de instituições representativas e de Constituições, as revoluções nacionalistas pretendiam libertar os povos do domínio imperial, valorizando a consciência e a identidade nacionais, inspirada nos seus valores históricos particulares (nacionais) e na afirmação da sua identidade e diversidade face ao poder imperial dominador. Assim, na primeira metade do século XIX, foram três as ondas revolucionária s, de natureza liberal e nacionalista, que ocorreram na Europa e na América Latina: 1820, 1830 e 1848.

A primeira vaga revolucionária compreendeu a década de 1820 . Na Europa, os movimentos revolucionários de cariz liberal tiveram lugar em vários reinos : em Espanha (1820) onde o rei Fernando VII foi obrigado a adotar a constituição de 1812 (que havia sido revogada em 1814); em Nápoles (1820); no Piemonte (1821) e em Portugal (1820), e traduziram-se na adoção de constituições. No entanto, estes movimentos liberais acabaram, posteriormente, por ser reprimidos pelos poderes absolutistas. Na Rússia, em 1825, assistiu-se a uma tentativa fracassada de substituir o regime autocrático do czar Nicolau I (1796-1855). Na Grécia, em 1821, surgiu uma revolta de cariz nacionalista : os gregos revoltaram-se contra o domínio otomano e, com o auxílio da França, da Inglaterra e da Rússia, conseguiram a sua independência .

2ª 1829-1839: atingiu a França (revolução de 1830, que consistiu numa tentativa de reposicao do poder absoluto por parte de Carlos X, resultando na sua substituicao por Luís Filipe de Orleães, defensor das ideias liberais; A onda revolucionária difundiu-se para a Alemanha e Itália cujas revoltas foram esmagadas pelo absolutismo austríaco. • As revoltas nacionalistas aconteceram igualmente na Bélgica (1831) e na Polónia (1830-1831).

 A terceira e última vaga revolucionária, em 1848, foi o movimento conhecido como “Primavera dos Povos”. • Em França, a monarquia constitucional de Luís Filipe I foi abolida. A segunda República francesa foi instaurada com Luís Napoleão. • Na Itália, a insurreição sucumbiu devido à intervenção austríaca que repôs o absolutismo. • Em Viena, surgiram também revoltas que clamavam por um governo mais liberal. O imperador Francisco José continuou a governar de forma autocrática. Os húngaros e os checos, povos submetidos ao domínio do Império Austríaco, reclamavam a autonomia. • Na Alemanha, surgiram levantamentos que foram dominados pela Prússia. • Um pouco por toda a Europa, as potências do Congresso acabaram por sufocar as tentativas revolucionárias liberais e nacionalistas. • Apesar do insucesso das ondas revolucionárias, iniciadas na década de 1820, o sentimento de liberdade, o desejo de construção de nações independentes e livres do jugo imperial a que estavam submetidas, continuou a alastrar.3ª 1848: ocorreu na França (implantação da Segunda República), no Império Austro-Húngaro, na Alemanha e na Itália (revoltas liberais e nacionalistas).


Antecedentes e conjuntura (1807-1820)

No início do século XIX, Portugal encontrava-se perante a encruzilhada dos interesses político-militares das duas maiores potências da Europa : a França e a Inglaterra, cuja rivalidade veio a culminar quando Napoleão Bonaparte, como forma de derrotar a Inglaterra, decretou, a 21 de novembro de 1806, o Bloqueio Continental . Com esta medida, estabelecia que todos os países do continente europeu fechassem os seus portos ao comércio e navegação britânicos, para obter a capitulação da potência rival, pela via do isolamento económico. Portugal procurou manter uma situação de neutralidade neste conflito , de modo a não comprometer a histórica aliança luso-britânica, o que se tornou progressivamente insustentável, em consequência da forte pressão exercida pelos franceses para que Portugal cortasse relações com a Inglaterra.

Mediante a hesitação e os sucessivos adiamentos da Coroa portuguesa em fazer cumprir o Bloqueio Continental, Napoleão Bonaparte , cujos exércitos já tinham conquistado a Espanha, na campanha da Guerra Peninsular, ordenou a invasão do reino de Portugal, que ocorreu entre 1807 e 1811, em três invasões.

Os antecedentes da revolucao liberal portuguesa situam-se em 1807, altura em que sucedem Portugal, a primeira invasao francesa (Junot) levando o ainda regente D.Joao, futuro rei d.joao VI e a corte, a abandonar o reino, de modo a proteger a independencia do reino, e a verter o poder politico e militar para um conselho de regencia com chefia britanica. De 1807-1811, Portugal será invadido 3 vezes, causando, descontentamento, destruicaao e morte, mas simultaneamente, levando a um choque cultural entre os ideais da revolucao francesa e uma especie de um antigo regime tardio que se vivia em portugal.


Deste choque cultural, Portugal toma nocao de alguns dos ideais da revolucao liberal francesa e a litratura que circula entre os mais letrados da sociedade portuguesa acabará por influenciar os futuros agentes da revolucao. Expulsas as tropas napoleonicas permanece o regimento militar britanico, liderado por William Beresford que terá como objetivo tornar Portugal uma presa fácil para as aspiracoes comerciais de Inglaterra e submeter o povo aos interesses dos regentes, acabando por desinformar o rei sobre o verdadeiro estado das coisas. Ao acumular do descontentamento e das injusticas do tratado de comercio de 1810 e da abertura dos portos do brasil juntasse a repressao total de qualquer tipo de jacobinismo e a execucao vergonhosa do general Gomes Freire de Andrade. Por essa razao, membros da maconaria, simultaneamente, da alta burguesia portuguesa, fundaram o Sinedrio no Porto em 1817, uma associacao secreta que era liderada por Fernandes Tomás e tinha como objectivo preparar uma revolução. A 24 de Agosto de 1820,  aproveitando a ausência de Beresford (general inglês nomeado por D. João VI como marechal do exército português, a quem foram concedidos grandes poderes para acabar com qualquer tipo de conspirações liberais), o Sinédrio fez despoletar (deu início), no Porto, à Revolução Liberal. Rapidamente, a revolução se estendeu a Lisboa e ao resto do país. Os ingleses foram afastados do governo e os revolucionários criaram um governo provisório (Junta Provisional de Governo do Reino) que, de imediato, tomou medidas para resolver os problemas do reino.

As medidas mais importantes tomadas pelo governo provisório da revolução de 1820 são:

Exigência do regresso do rei D. João VI a Portugal, no qual acabou por decidir o regresso ao reino, deixando no Brasil, como regente, o infante D. Pedro; Realização de eleições com o objectivo de escolher deputados às Cortes Constituintes, para elaborar uma Constituição (documento que contem as Leis fundamentais de um país).

Constituicao de 1822

 Esta foi elaborada pelas Cortes Gerais Extraordinárias e Constituintes da Nação Portuguesa, que redigiu o mais antigo texto constitucional, promulgado pelo rei a 1 de outubro de 1822. É um documento longo, inspirado nos modelos francês e espanhol, que: Reconhece os direitos e deveres;Garante a liberdade, segurança, propriedade e igualdade perante a lei do indivíduo;Chama os varões, maiores de 25 anos a eleger os deputados;Aceita a independência dos poderes: legislativo, executivo e judicial;Não reconhece qualquer privilégio à nobreza ou clero;Submete o poder real às Cortes Legislativas.

Estas ideias progressistas surgiram da ala mais radical dos deputados das cortes, cuja ação é conhecida por vintismo. Mas existia também uma ala mais conservadora, respeitadora da monarquia, do catolicismo. Esta considerava que a religião devia ser o catolicismo e mais nenhuma, e que todos os escritos sobre a igreja e religião deviam ter censura prévia.Os radicais declararam por fim a liberdade de culto apenas para os estrangeiros, que permitiu a existência de mais religiões no reino.Quanto às Cortes Legislativas, os deputados conservadores defendiam a existência da Câmara do Povo e a Alta, mas a solução imposta pela ala radical foi uma Câmara Única.


A 24 de Agosto de 1820,  aproveitando a ausência de Beresford (general inglês nomeado por D. João VI como marechal do exército português, a quem foram concedidos grandes poderes para acabar com qualquer tipo de conspirações liberais), o Sinédrio fez despoletar (deu início), no Porto, à Revolução Liberal. Rapidamente, a revolução se estendeu a Lisboa e ao resto do país. Os ingleses foram afastados do governo e os revolucionários criaram um governo provisório (Junta Provisional de Governo do Reino) que, de imediato, tomou medidas para resolver os problemas do reino.

Constituicao de 1822

 Esta foi elaborada pelas Cortes Gerais Extraordinárias e Constituintes da Nação Portuguesa, que redigiu o mais antigo texto constitucional, promulgado pelo rei a 1 de outubro de 1822. É um documento longo, inspirado nos modelos francês e espanhol, que: Reconhece os direitos e deveres;Garante a liberdade, segurança, propriedade e igualdade perante a lei do indivíduo;Chama os varões, maiores de 25 anos a eleger os deputados;Aceita a independência dos poderes: legislativo, executivo e judicial;Não reconhece qualquer privilégio à nobreza ou clero;Submete o poder real às Cortes Legislativas.

Estas ideias progressistas surgiram da ala mais radical dos deputados das cortes, cuja ação é conhecida por vintismo. Mas existia também uma ala mais conservadora, respeitadora da monarquia, do catolicismo. Esta considerava que a religião devia ser o catolicismo e mais nenhuma, e que todos os escritos sobre a igreja e religião deviam ter censura prévia.Os radicais declararam por fim a liberdade de culto apenas para os estrangeiros, que permitiu a existência de mais religiões no reino.


Quanto às Cortes Legislativas, os deputados conservadores defendiam a existência da Câmara do Povo e a Alta, mas a solução imposta pela ala radical foi uma Câmara Única.

As medidas mais importantes tomadas pelo governo provisório da revolução de 1820 são: Exigência do regresso do rei D. João VI a Portugal, no qual acabou por decidir o regresso ao reino, deixando no Brasil, como regente, o infante D. Pedro; Realização de eleições com o objectivo de escolher deputados às Cortes Constituintes, para elaborar uma Constituição (documento que contem as Leis fundamentais de um país).

Quanto ao veto, este poderiam ser remetido de novo para as Cortes pelo rei, mas seria apenas uma vez, depois seria obrigatoriamente aceite.O retiro de todos os privilégios e tradições à nobreza e clero veio a criar grandes movimentos de oposição a estas políticas. A constituiçao de 1822 apresentava um texto demasiado progressista para a época, sendo fruto do trabalho dos deputados mais radicais, do que se veio a dar o nome de vintismo.  Entre 24 de agosto de 1820 e abril de 1823, a principal tarefa foi a elaboração de uma Constituição que legitimasse o regime político de monarquia constitucional, estabelecesse a soberania nacional e consagrasse os direitos e as liberdades individuais. Assim, foi neste período que se constituiu uma das tendências ideológicas do liberalismo: o vintismo , que marcou o panorama político do liberalismo português. Foi defensor dos ideais da revolução de 1820 e da Constituição de 1822, também conhecida como Constituição Vintista. D. João VI jurou fidelidade às bases da Constituição de 1822, depois de regressar do Brasil, aceitando os princípios aprovados pelas Cortes. Pelo contrário, sua mulher, D. Carlota Joaquina, não fez o juramento, tendo a partir daí assumido, juntamente com o seu filho mais novo, D. Miguel, um papel de oposição ao liberalismo, apoiando as tentativas contrarrevolucionárias de cariz absolutista.

Foi a partir de 1823 que ocorreram os golpes antiliberais. D.Miguel assumiu claramente a oposição absolutista e lutou abertamente contra o regime iniciado em 1820 com tentativas de sedição: a Vila-Francada (em março de 1823),  D. Miguel proclamou a restauração do absolutismo que pôs fim ao vintismo, a primeira experiência liberal em Portugal. Contudo, face a este golpe, o rei D. João VI procurou uma solução de compromisso indefinido, e prometeu, por um lado, uma Constituição mais moderada mas, por outro, dissolveu as Cortes, suspendendo a Constituição de 1822;A partir da Vila-Francada , vigorou um regime absolutista moderado que, mesmo assim, não agradou aos absolutistas. A 30 abril de 1824, desencadearam outro golpe , a Abrilada , liderado por D. Miguel e apoiado pela sua mãe, D. Carlota Joaquina. A Abrilada instaurou um clima de terror, com inúmeras prisões de liberais , chegando-se a isolar, no seu palácio, o monarca que procurou refúgio num navio inglês, de onde ordenou a libertação dos presos políticos e a prisão dos implicados, retirando a D.Miguel o comando das tropas e impondo-lhe o exílio em Viena.

Em março de 1826, morria em Lisboa D. João VI, e foi designada regente a Infanta D. Isabel Maria, que reconheceu seu irmão, D. Pedro, como rei de Portugal, com o título de D. Pedro IV. No entanto, D. Pedro , que era imperador do Brasil , tornado independente em 1822, não podia ser , simultaneamente, rei de Portugal . Num esforço de conciliação política, em 29 de abril de 1826, outorgou uma nova lei constitucional , designada Carta Constitucional (Documento regulador da vida política de um Estado, cuja iniciativa pertence aos governantes, que a outorgam à Nação.), e abdicou da Coroa portuguesa a favor da sua filha, então com sete anos, D. Maria da Glória. Esta deveria casar com seu tio, D. Miguel, devendo este jurar a Carta de 1826, outorgada por D. Pedro, assumindo o cargo de regente, enquanto D. Maria não atingisse a maioridade. De Viena, D.Miguel regressou a Portugal no ano de 1828, depois de jurar fidelidade.

No entanto, D. Miguel não respeitou os compromissos e , em março , procedeu à dissolução das Cortes . Em maio de 1828, convocou Cortes à maneira antiga, isto é, por ordens (com representantes da nobreza, do clero e Terceiro Estado), tendo por objetivo a sua aclamação como rei de Portugal. Como reação, os liberais fizeram um levantamento militar no Porto, violentamente reprimido, provocando a fuga de liberais para o estrangeiro. Durante seis anos (1828-1834) instaurou-se no reino um governo absolutista liderado por D.Miguel , marcado por perseguições, prisões e execuções. Viveu-se uma guerra civil entre absolutistas e liberais que durou até 1834.

Apenas os Açores não reconheceram o governo miguelista e a ilha Terceira tornou-se centro de reunião dos exilados que organizaram a resistência ao absolutismo. Em resultado do golpe absolutista de D. Miguel, travou-se, a 11 de agosto de 1829, ao largo da ilha Terceira, a batalha da Praia da Vitória entre forças miguelistas e liberais, da qual saíram vitoriosos os liberais. Em Angra, a partir de 1830, organizou-se a sede da regência liberal . Em 1832, D. Pedro chegou aos Açores, depois de ter abdicado do trono do Brasil a favor do seu filho, passando a liderar a causa liberal, recolhendo apoios e voluntários em várias ilhas dos Açores para se juntarem à expedição, constituída por uma esquadra de que levou as tropas liberais em direção ao reino, para retomar o trono usurpado. Em julho de 1832, deu-se o desembarque do Mindelo (Arnosa de Pampelido) sem resistência das tropas miguelistas, e os liberais entraram na cidade do Porto. No entanto, após uma reorganização das tropas realistas, fiéis a D. Miguel, os liberais ficaram cercados pelos absolutistas, entre julho de 1832 e agosto de 1833, no que ficou conhecido como o cerco do Porto



Na guerra civil, as forças liberais foram reforçadas com o apoio da Inglaterra e da França e, por isso, a guerra sofreu um volte-face em 1833 quando uma armada liberal desembarcou no Algarve e, apoiada pela esquadra comandada pelo inglês Napier (1786-1860), derrotou a frota miguelista. Em 24 de julho de 1833, os liberais tomaram Lisboa que, entretanto, havia sido abandonada pelo governo de D. Miguel. O cerco do Porto foi levantado e as tropas miguelistas rumaram para o Sul, em direção a Lisboa, mas foram derrotadas nas batalhas de Almoster (fevereiro de 1834) e de Asseiceira (maio de 1834) .Chegava ao fim a guerra civil em Portugal. A 26 de maio de 1834 foi assinada a Convenção de Évora-Monte , segundo a qual D. Miguel foi obrigado ao exílio, sob promessa de não mais voltar a Portugal. Triunfava então o liberalismo que se instaurava definitivamente em Portugal.

Reconhecer no processo de independência do Brasil uma das razões do fracasso do Vintismo

O Vintismo fracassou por vários motivos:

1.Pela oposição constante das ordens privilegiadas, que não queriam perder os seus direitos;

2. Pelo descontentamento das classes populares, as quais pretendiam uma reforma socioeconómica mais profunda, que anulasse as estruturas de Antigo Regime,sendo que, a actuação vintista defendeu os interesses da burguesia rural em detrimento do pequeno campesinato, pois os deputados das Cortes eram, também, proprietários de terras. A Lei dos Forais, nomeadamente, não surtiu o efeito desejado porque não se aplicava a todas as terras e porque convertia as rendas (habitualmente pagas em géneros) em prestações pagas em dinheiro, sem um critério de conversão uniforme ;


3. Pela actuação antibrasileira das Cortes; apesar de o Brasil ter o estatuto de reino desde 1815, toda a actuação das Cortes se orientou no sentido de lhe retirar autonomia e de refrear o progresso económico:

- o regresso de D. João VI a Portugal em 1821, onde veio assinar a constituição de 1822, interrompeu a obra de desenvolvimento que este monarca havia iniciado no Brasil (por exemplo, permitindo a criação de indústrias, ordenando a criação de um banco, de uma biblioteca, de um teatro, de uma imprensa local). Ficou no Brasil, como regente, o seu filho Pedro.

- as Cortes, compostas por deputados que dependiam do comércio colonial, aprovaram várias leis que tornavam o Brasil directamente dependente de Lisboa (por exemplo, os poderes judicial e militar eram submetidos directamente a Lisboa) e que retiravam a liberdade de comércio à colónia (nomeadamente, só os navios portugueses podiam fazer o comércio do porto em porto em todas as possessões do Império).

- o príncipe regente D. Pedro foi chamado a Portugal com o argumento (pouco convincente) de ser educado na Europa. Esta tentativa, por parte das Cortes, de retirar direitos que os colonos sentiam como adquiridos resultou, em 1822, na independência do Brasil proclamada pelo próprio D. Pedro, coroado Imperador do Brasil (foi D. Pedro I do Brasil, entre 1822 e 1831, e D. Pedro IV de Portugal, durante uma semana apenas, em 1826 antes de abdicar do trono português em favor da sua filha).

A perda da colónia americana foi um dos factores de fracasso do Vintismo, pois retirou importantes fontes de rendimento a Portugal, o que provocou o descontentamento social. A independência do Brasil só viria a ser reconhecida pela metrópole portuguesa em 1825


 Relacionar a guerra civil de 1832-34 com a resistência ao Liberalismo

 O Liberalismo português sofreu várias ameaças:

 - as primeiras reacções absolutistas lideradas pelo infante D. Miguel foram apoiadas pela sua mãe, a rainha D. Carlota Joaquina, pela nobreza e pelo clero. Beneficiando de uma conjuntura externa favorável ao retorno das monarquias absolutas, D. Miguel pôs em prática dois movimentos militares: a Vilafrancada, em 1823 e a Abrilada, em 1824. Apesar de fracassados (D. Miguel é exilado em Viena de Áustria) puseram termo ao projecto progressista do Vintismo. D. João VI remodelou o governo, que passou a integrar liberais moderados, e muitos dos liberais  fugiram do país; 

- em 1828, Portugal tornou-se, de novo, um país absolutista. Perante o problema da sucessão ao trono após a morte de D. João VI, D. Pedro, então imperador do Brasil, confirmou a regência de Portugal pela sua irmã, a infanta D. Isabel Maria e abdicou dos seus direitos à Coroa em favor da filha D. Maria da Glória (rainha D. Maria II). Porém, como a sua filha tinha apenas sete anos, ficaria como regente D. Miguel, o qual casaria com a sobrinha e juraria a Carta Constitucional. O casamento não se chegaria a realizar pois D. Miguel, após ter regressado do exílio, convocou Cortes onde se fez aclamar rei absoluto. Assim, entre 1828 e 1834, Portugal viveu sob o regime absolutista, o que conduziu à fuga de um grande número de liberais;

 - entre 1832 e 1834 desenrolou-se a guerra civil entre os liberais (chefiados por D. Pedro desde 1831) e os absolutistas (liderados por D. Miguel). A implantação definitiva do Liberalismo revelou-se muito difícil, pois D. Pedro apenas dispunha de um pequeno exercito (de cerca de 7500 homens). Foi a partir da ilha Terceira dos Açores (que já se havia insurgido militarmente contra o absolutismo em 1828 e em 1829) que D. Pedro organizou a resistência. Em 1832 desembarcou em Pampelido (Mindelo), dirigindo-se para a cidade do Porto, onde foi cercado, durante dois anos, pelas forças absolutistas (Cerco do Porto). A vitória liberal só aconteceu em 1834, e foi selada pela convenção de Évora-Monte. D. Pedro morreu, pouco tempo depois, de tuberculose, enquanto o seu irmão D. Miguel foi exilado para o resto da sua vida. D. Maria II, rainha desde os sete anos de idade, só então, com quinze anos, pôde sentar-se no trono português.

A Civilização industrial – economia e sociedade; nacionalismos e choques imperialistas

Situar, no tempo e no espaço, a expansão da Revolução Industria

l A expansão da Revolução Industrial, também designada por segunda revolução industrial, aconteceu na segunda metade do século XIX, na Europa, nos EUA e no Japão. No entanto, é necessário atender aos diferentes ritmos de industrialização de cada região ou país.

Justificar a ligação entre a ciência e a técnica

A ciência e a técnica influenciaram-se mutuamente. Por um lado, os conhecimentos teóricos (a ciência) permitiram a criação de novos inventos (desenvolvimento técnico), pois as empresas criaram laboratórios e convidaram engenheiros para trabalhar, em equipa, nas novas descobertas. Foi o caso das indústrias de corantes sintéticos, que investiram grandes quantias em pesquisa laboratorial e obtiveram lucros ainda maiores da aplicação prática das pesquisas. Por outro lado, a indústria (técnica), ao criar produtos e máquinas cada vez mais complexos, exigiu da ciência uma constante pesquisa (progresso cientifico). Desta interacção entre a ciência e a técnica resultou uma série de inovações que se foram acumulando (em quantidade) e sobrepondo (em qualidade) – (progressos cumulativos).

Caracterizar a segunda revolução industrial

 Em sentido restrito, a segunda revolução industrial corresponde a um conjunto de transformações rápidas que beneficiaram o sector industrial, de que se destacam as novas fontes de energia (petróleo e electricidade), novos sectores de ponta (siderurgia, química) e novos inventos (por exemplo, o motor de explosão e a lâmpada). Num sentido mais amplo, a segunda revolução industrial ultrapassa os aspectos técnico e produtivo para abranger a expansão do capitalismo industrial com consequências ao nível de toda a vida em sociedade.

Referir os principais progressos técnicos

Relembremos: o século XVIII (primeira revolução industrial) foi marcado pela revolução industrial do ferro, graças aos seguintes progressos: 1. A utilização do carvão de coque (obtido a partir de carvão mineral) como combustível. 2. O aperfeiçoamento dos foles. 3. A técnica da pudelagem (que permitia transformar o ferro de primeira fundição, não purificado, em ferro ou em aço).


Já a segunda metade do século XIX (segunda revolução industrial) é o período de afirmação do aço: 1. Em 1856, Bessemer inventou um conversor que transformava o ferro em aço segundo um processo muito mais rápido que o da pudelagem. 2. Em 1867, o processo Siemens-Martin recuperava ferragens, permitindo produzir grandes quantidades de aço. 3. Em 1878, o método de Thomas e Gilchrist permitia eliminar o fósforo, aproveitando maiores quantidades de minério.

A partir de 1880, o aço, mais moldável e resistente, substitui o ferro na construção de máquinas para a indústria, de meios e vias de transporte e na construção civil, conferindo à siderurgia o papel de sector de ponta da segunda revolução industrial. Outro sector que registou um grande avanço foi o da indústria química: 1. Os corantes artificiais foram utilizados na indústria têxtil graças aos trabalhos de Perkin, em 1856. 2. Criaram-se novos medicamentos, por exemplo, a aspirina, criada pela empresa Bayer, em 1899. 3. Os insecticidas e os fertilizantes foram produtos de sucesso deste ramo da indústria. 4. O processo de vulcanização da borracha (Goodyear, 1884) deu origem à indústria de pneus para automóveis e bicicletas.

Enquanto a primeira revolução industrial é indissociável da energia a vapor, alimentada pela hulha (carvão mineral), a segunda revolução industrial introduziu novas fontes de energia que produziram uma ruptura tecnológica: o petróleo e a electricidade. A indústria petroquímica (relativa aos derivados do petróleo) beneficiou dos seguintes progressos técnicos: 1. 1859: exploração do primeiro poço de petróleo (Pensilvânia, EUA). 2. 1886: invenção do motor de explosão (por Daimler) que funcionava a petróleo; 3. 1897: invenção do motor movido a óleo pesado (gás oil).

Na mesma época, a energia eléctrica foi aplicada a uma serie de progressos técnicos que deslumbraram os seus contemporâneos: 1. A lâmpada eléctrica (grande invento de Edison) substituiu a iluminação a gás nas ruas e casas, com franca vantagem: ao contrário do sistema anterior, a lâmpada não libertava calor, não sofria explosões nem intermitências e o consumo era de fácil contagem; 2. A electricidade, aplicada aos mais diversos maquinismos, revolucionou a vida do cidadão comum.


Surgiram, nomeadamente: - o comboio eléctrico (criado por Siemens em 1879, embora continuassem plenamente activos os comboios a vapor); - o telefone (invenção de Bell, em 1876); - o cinema (com origem no cinematógrafo de Lumière, em 1895); - a radiofonia (fruto da aplicação da teoria das ondas hertzianas, em 1887); - os metropolitanos e os carros eléctricos. Nos transportes, registaram-se os seguintes progressos: 1. A aplicação da energia a vapor ao comboio (por Stephenson que, em 1830, inaugurou a linha Liverpool - Manchester) e ao navio (a partir de 1860) ditou uma nova era nos transportes, facilitando a circulação das matérias-primas, dos produtos industriais e das pessoas. 2. A utilização do motor de explosão nos automóveis e aviões alterou, para sempre, as noções de distância. 3. A bicicleta tornou-se, não só, um meio de transporte bem acolhido por todas as classes sociais, mas também uma modalidade desportiva de grande êxito.

Justificar a concentração monopolista

A partir de cerca de 1870, a pequena oficina cede lugar à empresa concentrada, ou seja, a produção é realizada em grandes fábricas (concentração geográfica) que reúnem avultados capitais por acções (concentração financeira), onde trabalham numerosos operários (concentração da mãode-obra) os quais vigiam numerosas máquinas (concentração técnica). Este gigantismo explica-se, por um lado, pela própria natureza de alguns sectores económicos (como, por exemplo, o da siderurgia) que exigiam máquinas volumosas e um grande número de operários e, por outro lado, por imperativos económicos que tornavam mais rentável a grande fábrica, abolindo, assim, a concorrência das pequenas empresas através da criação de monopólios de produção (por exemplo, a empresa alemã Krupp detinha um verdadeiro monopólio da produção de aço). Em suma, a tentativa de criação de monopólios justifica-se pelo sistema económico do capitalismo industrial que caracterizou a segunda metade do século XIX.

Distinguir concentrações verticais e horizontais

Concentrações verticais – consistem no controlo, por uma empresa, das várias etapas de fabrico de um produto industrial (por exemplo, da exploração da borracha à sua transformação em pneus de automóvel e, por último, à comercialização do produto acabado).

 Controlando todo o processo de produção, a empresa consegue diminuir o grau de imprevisibilidade do negócio e obter as melhores condições financeiras em cada uma das fases de produção. Assim se formaram alguns dos monopólios do século XIX.

Concentrações horizontais – consistem no agrupamento de empresas de um mesmo ramo (por exemplo, têxtil) que combinam, entre si, as condições de produção que consideram melhores, de maneira a vencer a concorrência (quer interna, por parte de empresas que não integram essa concentração, quer externa, de outros países produtores). Também os bancos se envolveram no processo de concentração: os bancos mais pequenos foram sendo absorvidos pelos mais poderosos (por exemplo, os bancos da família Rockefeller) os quais se expandiram em número de sucursais e em volume de operações financeiras. Os bancos alimentaram a expansão industrial, oferecendo os seus serviços às operações comerciais e o crédito à indústria e, por sua vez, lucraram com o desenvolvimento industrial, muitas das vezes investindo directamente em companhias industriais (eram, por isso, chamados “bancos de negócios”).

Explicar os métodos de racionalização do trabalho

O engenheiro Frederick Taylor expôs o método de transformar a produção num processo racional, isto é, pensado de maneira a tornar-se o mais rentável possível. A racionalização, descrita na sua obra Princípios de Direcção Cientifica da Empresa, foi chamada de taylorismo e assentava nos seguintes procedimentos: 1. Dividir a produção de um objecto numa série de “movimentos essenciais que cada um dos operários tem de executar”. 2. Pré-definir o tempo mínimo necessário para a realização de cada um desses gestos simples. 3. Produção de objectos todos iguais – estandardização.

Henry Ford aplicou o taylorismo à produção de automóveis, introduzindo a linha de montagem nas suas fábricas para (nas palavras do próprio Ford) “levar o trabalho ao operário, em vez de levar o operário ao trabalho”. Desta maneira poupavam-se todos os gestos inúteis ou lentos, o que resultou num extraordinário aumento da produtividade. Ainda de acordo com as ideias de Taylor, Ford aumentou os salários dos seus operários, conseguindo com essa medida motivá-los para o trabalho e até vender-lhes automóveis. A racionalização aplicada às fábricas tomou o nome de fordismo.

Embora eficaz do ponto de vista do patrão, o fordismo foi considerado desumano para os operários: o capitalismo industrial transformou o antigo artesão, orgulhoso do seu trabalho criativo, que desenvolvia do início ao fim, num proletário, elemento substituível de uma cadeia de montagem que, de seu, apenas tinha um salário e a sua prole. Estava, assim, consumada a divisão entre o capital (patrão) e o trabalho (operário).

A Geografia da Industrialização 

Evidenciar a hegemonia britânica

Em meados do século XIX, a Inglaterra detinha a hegemonia sobre os restantes países. Tendo sido pioneira da primeira revolução industrial, mantinha a preponderância que adquirira no século XVIII, o qual era evidente em vários factores: - era a primeira potência na produção têxtil (algodão) e metalúrgica (ferro); - utilizava a energia a vapor em larga escala; - possuía a maior extensão de caminhos-de-ferro; - controlava o comércio internacional graças à vasta frota mercante e ao sistema financeiro avançado; - registava o maior crescimento demográfico e urbano; - exibia, perante todo o Mundo, que estava “à frente do pelotão”, nomeadamente através da realização da Exposição Universal de 1851.

A Inglaterra apenas perdeu a posição de comando no final do século XIX, quando foi ultrapassada pelos Estados Unidos da América por não ter acompanhado a modernização tecnológica.

Referir, em traços gerais, a geografia industrial no século XIX

No século XIX, para além do caso particular da Inglaterra, os países mais industrializados da Europa eram: a França, a Alemanha, a Suíça e a Bélgica. A nível mundial salientavam-se: os Estados Unidos da América e o Japão. Certos países tiveram uma industrialização mais lenta, tais como; a Rússia, a Áustria-Hungria, a Itália, Portugal e Espanha.

Mostrar os particularismos do processo de industrialização das principais potências industriais 

A industrialização de cada país obedeceu a condicionantes próprias:

  • França – Apesar de ter sido o segundo país (após a Inglaterra) a industrializar-se, apenas alcançou a etapa da maturidade (segundo a teoria do economista Rostow) na primeira década do século XX,


, pois carecia de matéria-prima – carvão – e a sua economia dependia ainda, largamente, de uma agricultura de subsistência. A industrialização da França assentou, nomeadamente, na electricidade e na produção automóvel.

  • Alemanha – a etapa de arranque industrial (take-off) deu-se em meados do século XX, nomeadamente com a construção dos caminhos-de-ferro pela fábrica Krupp (a Alemanha ocupava o segundo lugar, a seguir à Inglaterra, em extensão de rede ferroviária). No final do século XIX, a Alemanha, então já unificada, conseguiu competir com a industria inglesa, suplantando-a na produção de aço a partir de inícios do século XX. Ao contrário da França, a Alemanha dispunha de carvão em abundância; aumentou as suas reservas de minério após ter conquistado à França a região de Alsácia-Lorena, na guerra franco-prussiana de 1870-1871.
  •  EUA – a abundância de matérias-primas (algodão, lã, carvão, petróleo, entre outras), juntamente com a concentração empresarial (por exemplo, de empresas siderúrgicas, dando origem à United States Steel Corporation – U.S.S.) e a energia eléctrica fornecida pelas quedas de água deram um forte impulso à industrialização dos EUA, país que, arrancando industrialmente cerca de 1830, veio destronar a hegemonia inglesa a partir de finais do século XIX. Basta lembrar, por exemplo, o sucesso na indústria automóvel, com a marca Ford. Japão – caso único no continente asiático, o
  • Japão industrializou-se na segunda metade do século XIX devido a intervenção do imperador Mutsu-Hito, o qual apoiou a produção industrial (construção naval, seda, siderurgia) seguindo os modelos ocidentais e abriu o país ao comércio com o exterior. Na mesma época, o Japão beneficiou de um crescimento demográfico intenso, o qual forneceu mão-de-obra e consumidores à indústria.


 Reconhecer, no mundo industrializado, a persistência de formas de economia tradicional

Um dos aspectos que mais fortemente marcou o século XIX (a partir de cerca de 1840) foi o triunfo do capitalismo industrial. Ao contrário do que previa Thomas Malthus no século XVIII, a produção de bens de consumo conseguiu acompanhar o crescimento demográfico e, no mundo industrializado, uma franja crescente da população beneficiava de uma melhor qualidade de vida.

Porém, a par deste mundo industrializado, que os historiadores colocam em relevo pela novidade que apresenta em relação ao passado, não devemos esquecer que a maior parte do planeta era, ainda, um mundo “atrasado” (na expressão de Pierre Léon), onde o tempo parecia “imóvel”. Alguns países tiveram o seu arranque industrial tardiamente: foi o caso do Império Austro-Húngaro, do Império Russo, da Europa meridional (Portugal, Espanha, Itália, Grécia). Outros não puderam desenvolver-se porque eram colónias, dependentes das estratégias de mercado impostas pelas respectivas metrópoles: neste caso temos, por exemplo, os países da América Latina e do continente Africano. Por último, temos de salientar, no interior dos países desenvolvidos, os redutos de tradicionalismo, onde uma agricultura de subsistência, avessa ao campo fechado, coexistia, no mesmo país, com a agricultura mecanizada e o artesão trabalhava, em casa, perto de uma grande fábrica.

 Concluímos, assim, que a industrialização se processou a diferentes “ritmos”, como se o tempo passasse mais depressa ou mais lentamente conforme as condicionantes ditadas por cada região. 

A agudização das diferenças 

Contrapor proteccionismo e livre-cambismo

 Nos séculos XVI, XVII e XVIII, vários países europeus adoptaram um sistema económico proteccionista, o qual servia de apoio ao mercantilismo vigente. O proteccionismo baseava-se na protecção à indústria e ao comércio nacionais: para conseguir uma balança comercial positiva, o Estado intervinha na economia, decidindo quais as manufacturas a implementar, o montante das tarifas aduaneiras a aplicar aos produtos importados, o preço dos produtos internos, as regras a impor ao comércio com o exterior.


Em contraposição, no século XIX, a expansão da Revolução Industrial foi sustentada por um sistema económico livre-cambista que substituiu o anterior proteccionismo. Ao contrário do proteccionismo, o livre-cambismo opunha-se à intervenção do Estado na economia; reunia defensores desde o século XVIII, em especial Adam Smith, economista escocês que advogava a total liberdade da iniciativa privada (liberalismo económico), uma vez que a economia se auto-regularia pela lei da oferta e da procura e pela livre concorrência.

As ideias de Adam Smith foram desenvolvidas, ainda no século XVIII, por Thomas Malthus, David Ricardo e Jean Baptiste Saly e foram aplicadas no século XIX, um pouco por toda a Europa industrial que se revia no exemplo da Inglaterra e do seu primeiro-ministro Robert Peel. Este aboliu as chamadas Corn Laws, leis que protegiam a produção de pão nacional através de taxas aplicadas sobre a importação de trigo.

Caracterizar as crises do capitalismo

 Apesar de ser um sistema económico favorável ao capitalismo industrial, o livre-cambismo padecia de um problema intrínseco: de tempos a tempos (em intervalos de tempo de 6 a 10 anos), o sistema de livre concorrência (livre procura de lucro) originava crises económicas para se autoregular. Estes ciclos de curta duração, estudados por Clément Juglar (e por isso denominados, correntemente, por ciclos de Juglar) caracterizam-se por três etapas: 1. Uma fase de crescimento económico, durante a qual a produção aumenta e as actividades financeiras (banca, bolsa) se expandem, de modo a corresponder à procura dos consumidores. 2. Uma etapa de crise, isto é, de rápida diminuição da produção e descida dos preços, numa tentativa de escoar o excesso de produção acumulada (crise de superprodução). A tendência de baixa da economia conduz rapidamente a falência de empresas e de bancos e à quebra de investimento na bolsa (crash); a população desempregada não tem meios para consumir em abundância, o que retira o estímulo à produção. Em virtude do livrecambismo, a crise expande-se, a breve trecho, pelo mundo industrializado e respectivas áreas coloniais, originando uma contracção do comércio internacional. 3. Uma etapa de recuperação, em que a oferta e a procura se reajustam e as actividades económicas são relançadas (até que uma nova crise venha abalar a economia).


 Estas crises – que se distinguem das crises do Antigo Regime por serem crises de superprodução industrial e não crises de escassez devido a maus anos agrícolas – eram inerentes ao próprio sistema capitalista, em que o Estado não intervinha na economia; porém, os elevados custos, não só económicos mas também (e sobretudo) sociais, levaram os governos a admitir, no final do século XIX, medidas de retorno ao proteccionismo.

No século XX, devido à Grande Depressão dos anos 30, despoletada pela crise de 1929 nos EUA, tornou-se evidente que o liberalismo económico puro tinha de ser refreado pela intervenção do Estado.

Explicar os fundamentos da divisão internacional do trabalho

 Entende-se por divisão internacional do trabalho a parte de produção e de comercialização que cabe a cada país: na linha da frente, e com o maior número de investimentos no Mundo e a respectiva compensação em lucros, encontravam-se a Inglaterra, a França, a Alemanha e os EUA.

Este protagonismo fundamenta-se na rápida industrialização que estes quatro países tiveram, a qual lhes permitiu explorarem economicamente os países mais atrasados e as colónias. O capitalismo industrial contribuiu para criar um mundo económico desigual, no qual um punhado de países detém o controlo das correntes de comércio internacional.

A Sociedade industrial e urbana: A explosão populacional; a expansão urbana e o novo urbanismo; migrações internas e imigração 

Interpretar a explosão populacional do século XIX

No século XIX, verificou-se um crescimento muito rápido e acentuado da população mundial e, em especial, da Europa industrializada, falando-se, por isso, de uma explosão demográfica.

No entanto, o fenómeno de crescimento populacional não era novo: a ruptura com o modelo demográfico antigo data de meados do século XVIII. No século XIX impôs-se o modelo demográfico moderno, cujas características eram: 1. O recuo da mortalidade (geral e, em especial infantil); 2. O declínio da elevada natalidade (a partir de cerca de 1870); 3. A descida da idade do casamento (invertendo a tendência para o casamento tardio, típica do modelo demográfico do Antigo Regime);


4. O aumento da esperança média de vida para ambos os sexos. 5. O aumento da densidade populacional.

 Estas características revelaram-se mais precocemente nos países industrializados da Europa (Inglaterra, Alemanha, França) e mais tardiamente na Europa do leste e do sul, pois a expansão da Revolução Industrial correspondeu a uma expansão da população.

Assim, os demógrafos e historiadores, na tentativa de interpretar a explosão populacional do século XIX, apontam um conjunto de factores: - os melhores cuidados médicos (difusão da vacina contra a varíola, inventada no século XVIII por Jenner e criação de novas vacinas; prática de desinfecção); - a maior abundância de bens alimentares (produzidos em larga escala pela agricultura mecanizada e fornecidos pela revolução dos transportes); - o investimento social e afectivo da criança, tornada o centro da família burguesa; - os progressos na higiene (uso do sabão e do vestuário de algodão; substituição da madeira pelo tijolo nos edifícios; construção de redes de esgotos e de abastecimento de água potável).

No século XVIII, Thomas Malthus havia alertado, no seu Ensaio sobre o Principio da População, para a necessidade de “um controlo forte e constantemente activo da população, em

virtude da dificuldade de subsistência”. Por isso, no século XIX e inícios do século XX, face à explosão populacional, os neo-mathulsianos lutaram pela contenção da natalidade, em especial juntos dos proletários. Porém, foi nos meios mais abastados, onde a satisfação das necessidades básicas permitia o surgimento do sentimento de paternidade, que começou a difundir-se a limitação voluntária dos nascimentos.

Justificar a expansão urbana

O crescimento das cidades oitocentistas explica-se pela atracção que estas exercem sobre uma população em franco crescimento. . Entre os principais factores de expansão urbana, contam-se: - o êxodo rural: as alterações na produção agrícola, ao dispensarem parte da mão-de-obra, levam a que o habitante da província procure a cidade (sobretudo a partir de 1850, a população urbana da Grã-Bretanha, da França e da Alemanha regista um crescimento substancial, enquanto a população rural desses países estagna ou decresce);


- a emigração: a população europeia foi responsável por diversas vagas de partida para as colónias dos continentes africano, americano e oceânico, destacando-se, em especial, o crescimento urbano nos EUA (em consonância com a sua supremacia económica, Nova Iorque tornou-se a segunda cidade mundial, em 1900); - o crescimento dos sectores secundário e terciário: a indústria, o comércio, as profissões liberais concentram-se nas cidades e requerem cada vez mais efectivos; é o caso, por exemplo, da cidade de Essen, onde estava sediada a fábrica Krupp e que passou de 2000 habitantes, em 1800, para 443 mil habitantes em 1900. Simultaneamente, a população activa dedicada ao sector primário (agricultura, pesca, silvicultura) diminui acentuadamente (por exemplo, na Alemanha passou de 42,5% em 1882 para 28,6% em 1907).

Caracterizar o novo urbanismo oitocentista

 O crescimento muito rápido de algumas cidades (por exemplo, Londres, Paris, Nova Iorque) originou novos problemas que se tornaram um desafio para as chefias municipais e para arquitectos, urbanistas e filantropos.

O novo urbanismo tinha, essencialmente, duas preocupações: - criar espaços para a burguesia, “entregando” a cidade àqueles que a tinham criado; - proporcionar condições de vida mais dignas para os proletários, em geral provincianos desenraizados, cujos filhos trabalhavam arduamente para aumentar o rendimento doméstico: 1. No âmbito da afirmação burguesa, destacam-se as grandes intervenções urbanas nas principais cidades europeias: as antigas muralhas são destruídas, rasgam-se avenidas, criam-se infraestruturas (abastecimento de água e iluminação, rede de esgotos), projectam-se espaços para o lazer (óperas, teatros, jardins…), criam-se redes de transportes públicos (eléctricos, metropolitanos….).

 Neste processo, a cidade expande-se em extensão (ou em altura, como nos EUA, com os primeiros arranha-céus), relegando as “classes perigosas” para a periferia. Os “grands travaux” (grandes obras públicas), encomendados ao barão Haussmann por Napoleão III em meados de Oitocentos, alteraram profundamente a fisionomia de Paris e serviram de exemplo a outras cidades em renovação nos séculos XIX e XX.


A “Paris de Haussmann” celebra as conquistas da burguesia. 2. No século XIX, vários urbanistas, preocupados com os problemas sociais que atribuíam à deficiente habitação operária (alcoolismo, criminalidade, promiscuidade, epidemias, prostituição, mendicidade), procuraram soluções ideais para integrar harmoniosamente o operário no espaço  industrial. Ficaram conhecidos por urbanistas utópicos: Charles Fourier lançou a ideia de um falanstério – edifício para a habitação e o trabalho dos operários – e Godin criou o familistério ou palácio social, onde as famílias operárias dispunham de alojamento cómodo.

Distinguir a origem e o destino das migrações internas

       O fenómeno urbano esta intimamente ligado ao das correntes migratórias: no século XIX, a      principal origem das migrações internas (dentro do mesmo país) era o campo -  fosse porque uma agricultura mecanizada dispensava mão-de-obra para as fábricas, fosse porque uma agricultura de subsistência fornecia insuficientes rendimentos – e o principal destino era a cidade. A partir de 1850, o êxodo rural foi responsável pelo acentuado crescimento da população urbana da Europa (sobretudo da Grã-Bretanha e Alemanha). Para as raparigas do campo, o destino profissional era, na maioria das vezes, o serviço doméstico.

Porém, um outro tipo de migrações internas era frequente: as deslocações sazonais (realizadas apenas em certas alturas do ano) para locais onde era necessário, pontualmente, um acréscimo de mão-de-obra.

 Explicar o fenómeno emigratório

A partir de 1840, os Europeus espalharam-se pelo Mundo em sucessivas vagas de emigração. Na origem deste fluxo emigratório terão estado os seguintes factores: 1. A pressão populacional: os governos e sindicatos apoiavam políticas migratórias no intuito de contornar os problemas decorrentes da explosão populacional europeia (necessidade de mais empregos, contestação social). 2. Os problemas do mundo rural: enquanto nos países desenvolvidos as transformações na agricultura libertavam mão-de-obra, nas regiões menos industrializadas persistiam as fomes provocadas por maus anos agrícolas (foi o caso da vaga de emigrantes irlandeses, durante a “potatoe famine” – fome de batatas - da década de 1840).


3. Os problemas ligados à industrialização: uma industrialização muita rápida (por exemplo, na Grã-Bretanha) produzia desemprego tecnológico (os homens eram substituídos por máquinas), e uma industrialização lenta (caso de Portugal), não oferecia empregos suficientes para a população em crescimento. Ambas as situações podiam, portanto, levar à emigração para países com carência de mão-de-obra. 4. A revolução dos transportes, que embarateceu o preço das passagens, nomeadamente de barco a vapor. 5. A idealização dos países de destino (nomeadamente os EUA, que receberam metade da imigração europeia, e o Brasil, principal destino da emigração portuguesa no século XIX), os quais eram vistos como terra das oportunidades, da promoção social e da tolerância moral. Os EUA receberam perto de 34 milhões de pessoas entre 1821 e 1920, sendo a forte imigração apontada como um dos factores que explicam a sua pujança económica. 6. A fuga a perseguições politicas e religiosas (por exemplo, aquando da instauração da 2ª república, em 1848, em França).

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