O Século XIX: Transformações Sociais, Económicas e Políticas
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Liberalismo e a Defesa dos Direitos Individuais
O liberalismo opõe-se ao absolutismo. Defende a igualdade de direitos, a liberdade de expressão, o direito à propriedade, o direito a um julgamento livre e justo como direitos naturais, mas também a liberdade de comércio e de culto religioso. Este quadro de direitos, que deve assegurar a dignidade da pessoa humana, pretende ainda dotar o sujeito de instrumentos que lhe assegurem a participação no governo da sua própria sociedade. Assim, a sua condição de cidadão permitir-lhe-á dispor de direitos políticos, como o direito de voto e de participação em associações ou instituições em que exprima a sua vontade e lhe permita contribuir para o progresso social e partilhado por todos.
A Expansão da Revolução Industrial no Século XIX
Ciência e Técnica na Industrialização
O desenvolvimento da indústria e da investigação, a partir de meados do século XIX, resultou num ciclo de desenvolvimento económico acelerado, apoiado em descobertas científicas, avanços técnicos e novas tecnologias:
- Aceleração do ritmo das inovações;
- As empresas investem na investigação, laboratórios e técnicos;
- Os engenheiros assumem importância crescente na empresa pela ligação que estabelecem entre ciência e técnica;
- A invenção é produto de uma equipa e não apenas de um sujeito inventor;
- Progressos cumulativos;
- Novas formas de energia, novas indústrias, novos meios de transporte e uma dinâmica inovadora impulsionada pela concorrência;
- Novas fontes de energia;
- Novas indústrias;
- Desenvolvimento acelerado das comunicações.
Os transportes, elemento essencial da industrialização, tornaram-se fundamentais para movimentar de forma rápida e barata grandes quantidades de mercadorias a longa distância. Caminhos de ferro, navegação transatlântica e canais marítimos tornaram-se meios cruciais de comunicação.
Concentração Industrial e Bancária
No aspeto económico, a livre concorrência e a concentração empresarial foram marcantes. As oficinas dão lugar às grandes empresas, e a concentração industrial acelera-se no fim do século XIX. As empresas tornam-se cada vez maiores e concentram diversos tipos de atividades, surgindo as concentrações verticais e horizontais. Surgem o Fordismo, ou produção em cadeia, que articula a estandardização no fabrico com a divisão do trabalho na linha de montagem, e o Taylorismo. Os sindicatos criticaram a valorização excessiva, por impor um ritmo automatizado e alienante de produção, com prejuízos para os empregados. As fábricas procuraram aumentar os salários para compensar os inconvenientes.
Também os bancos seguiram a mesma tendência de concentração. A necessidade de capitais para grandes obras e empreendimentos, nomeadamente nos transportes, exigiu a concentração de somas de capitais muito elevadas em bancos de depósito, mas principalmente de investimento. Outros aspetos importantes foram:
- Otimização de recursos;
- Desenvolvimento das trocas internacionais e do comércio interno sob o impulso de meios de comunicação mais rápidos que asseguravam já a ubiquidade;
- Capitalismo industrial e financeiro.
Racionalização do Trabalho e Eficácia Produtiva
As exigências de produção obrigaram à reformulação dos processos e da organização do fabrico. Surgiram as grandes linhas de produção e adotou-se a organização padronizada da produção com a instalação de grandes linhas de montagem. O Fordismo pretendia aumentar a produção e diminuir os tempos mortos da produção aplicando dois métodos de trabalho novos à linha de produção:
- Taylorismo: segundo o qual o operário realiza apenas uma fase do processo de produção, especializando-se num conjunto restrito de operações que executa de forma automática e com grande destreza;
- Estandardização: segundo a qual são utilizados componentes iguais em vários dos itens fabricados, no sentido de reduzir os custos de produção, mantendo a diversidade de artigos produzidos, mas utilizando alguns componentes iguais.
O Fordismo foi fortemente criticado na sua época, porquanto lhe foram atribuídos grandes inconvenientes para o operário e trabalhador. Assim, procurou-se compensar tais inconvenientes com o aumento do salário, correspondente aos ganhos de produtividade e ao aumento de lucros resultantes deste novo sistema de produção.
Expansão Geográfica da Industrialização Mundial
Novas potências industrializadas surgiram a partir de finais do século XIX. França, Alemanha, Estados Unidos e Japão iniciaram percursos de industrialização com sucesso diferenciado, apoiando-se em vantagens competitivas das respetivas economias. Acesso a mercados, abundância de matérias-primas, desenvolvimento de novas indústrias e apoios do Estado possibilitaram a estes países iniciarem percursos de sucesso. No entanto, tal conduziu o mundo a bloqueios de caráter político, derivados de ações imperialistas praticadas pelos estados com maiores necessidades de expansão territorial, resultando no colonialismo intenso e em guerras. Formas tradicionais de produção e a persistência de técnicas e rotinas de produção fizeram com que o antigo coexistisse com o novo, tanto em países altamente industrializados como em estados com grandes dificuldades no arranque industrial, como Portugal.
Dinâmicas Económicas do Capitalismo Liberal
Livre-Cambismo e o Comércio Internacional
Agudização das Diferenças: Livre-Cambismo vs. Protecionismo
Numa época em que a maioria dos países desenvolvia políticas protecionistas das suas indústrias domésticas, na sequência das doutrinas económicas tradicionais, os países mais industrializados propunham a liberalização económica e a adoção generalizada de políticas comerciais menos fechadas e mais liberais, na sequência do que era proposto por Smith ou Ricardo. Para este último, seria a liberdade de comércio que asseguraria a riqueza de todas as nações.
Depois de adotada pela Inglaterra, tal política foi aceite progressivamente pelas nações mais industrializadas a partir de meados do século XIX, apesar da resistência dos países mais moderados e atrasados que hesitavam entre a abertura alfandegária e a proteção às suas indústrias. Tal foi o caso de Portugal, como veremos.
As Crises Cíclicas do Capitalismo
Uma das desvantagens do livre-cambismo foi a ocorrência das crises cíclicas que passaram a afetar os países mais industrializados e os seus dependentes periodicamente, de 6 em 6 ou 10 em 10 anos. Manifestavam-se por vários sintomas:
- Excesso de capacidade produtiva;
- Baixa de preços e destruição de stocks;
- Suspensão de pagamentos a bancos e Estados;
- Desemprego e redução de salários;
- Falência de bancos e empresas;
- Redução do consumo.
A frequência excessiva destas crises, entre 1810 e 1929, levou a que, a partir desta última data, os estados tenham abandonado o liberalismo económico excessivo, adotando políticas intervencionistas.
Transformações Demográficas e Sociais no Século XIX
A Explosão Populacional Oitocentista
Processo acelerado de crescimento de população no século XIX:
- Duplicação da população mundial;
- A Europa teve o maior crescimento relativo no século XIX, tornando-se o continente mais povoado;
- Brancos europeus colonizaram todos os continentes, excetuando a Ásia, ao longo do século.
Os motivos de tão célere desenvolvimento demográfico foram a redução da mortalidade infantil e o aumento da esperança de vida, devido a:
- Avanços na saúde;
- Recuo de pestes e epidemias;
- Melhores condições de higiene das populações europeias;
- Melhor alimentação;
- Melhores salários e nível de vida.
Expansão Urbana e Seus Desafios
Ocorreu um urbanismo intenso nos países mais industrializados. As cidades concentraram a maioria da população europeia como resultado de:
- Expansão demográfica;
- Industrialização;
- Êxodo rural;
- Imigração.
A população rural decresceu nos países da Europa na razão inversa do crescimento industrial. Houve um aumento do setor secundário e terciário da economia. Problemas de miséria, promiscuidade e anomia social puseram em causa a coesão das populações urbanas e geraram delinquência e decadência dos valores e da identidade.
O Fenómeno Emigratório Europeu
Entre 1850 e 1914, os fluxos migratórios multiplicaram-se entre zonas do mesmo país, diversos países do mesmo continente e países em diferentes continentes. Fatores favoráveis, como a rapidez das comunicações e os estímulos institucionais de sindicatos e governos, impulsionaram a emigração. Houve migrações internas, como as sazonais por razões profissionais, e os êxodos rurais, provocados pelo grande atraso do mundo rural face às perspetivas do mundo urbano. A emigração ocorreu da Ásia para a América do Norte e da Europa para a América do Norte, Sul e Oceânia. Os motivos eram económicos, demográficos, políticos e religiosos.
As Classes Sociais Oitocentistas
Uma Sociedade de Classes
Na sociedade liberal, a diferenciação social era baseada em:
- Riqueza;
- Profissão;
- Cultura e instrução.
A sociedade era marcada pela mobilidade social. Duas grandes classes opunham-se: a burguesia e o proletariado. Uma terceira classe desenvolveu-se com o crescimento da vida urbana e o desenvolvimento dos estados: a classe média.
A Burguesia
A burguesia era marcada pela estratificação e heterogeneidade. A alta burguesia empresarial e financeira dominava a sociedade oitocentista e contemporânea. O poder económico, político e a influência social atribuíam-lhe grande importância na tomada de decisões políticas. Muito influente nos países mais modernizados e industrializados, encontrava dificuldades em se impor nos países mais tradicionalistas e da periferia europeia. Os seus valores incluíam: família, trabalho, respeitabilidade, êxito individual e persistência. Incluía empresários e comerciantes. Houve um grande desenvolvimento dos setores secundário e terciário e das profissões urbanas.
As Classes Médias
As classes médias, geralmente conservadoras, tiveram o seu desenvolvimento ligado ao grande crescimento do setor terciário. Apostando na permeabilidade social, possível nesta sociedade liberal, as classes médias eram geralmente de origem humilde (muitas vezes rural) e aspiravam à promoção social. Eram heterogéneas, incluindo empregados de loja, armazéns, funcionários dos serviços e do Estado, advogados, farmacêuticos, médicos, oficiais militares, engenheiros, intelectuais e artistas. A sua autoridade e estatuto derivavam da sua preparação académica e técnica. A sua importância política derivava do seu número e relevância em termos eleitorais. Geralmente mais esclarecidas que a maioria da população, o seu voto era importante dado o seu pendor conservador, sendo uma classe decisiva na contagem de votos para determinar vencedores nos países onde o sufrágio universal se implantou. A vocação conservadora das classes médias manifestava-se no sentido da ordem, estatuto, hierarquias e rejeição do estilo reivindicativo do operariado. Os seus valores incluíam família, religião e respeitabilidade.
O Operariado
O operariado nasceu com a Revolução Industrial. Designado de proletariado, o operariado dispunha apenas da sua força de trabalho para sobreviver numa época em que todos os bens eram permutados por dinheiro e os trabalhadores dependiam do trabalho para o obterem. O operariado, surgido na Inglaterra, acorria às cidades em busca de trabalho após se ver sem saídas no mundo rural, procurando meios de subsistência e estando sujeito à exploração dos donos das fábricas. Eram sujeitos a péssimas condições de trabalho: salários baixos, longos horários de trabalho (12 a 16 horas), sem feriados, férias ou descanso. No mundo do liberalismo económico, o trabalho e o salário eram precários, dependendo apenas da força de trabalho e da oferta. Além dos homens, também as crianças e as mulheres entraram no mundo industrial, devido ao facto de lhes serem pagos salários menores em trabalhos que não requeriam grande força física.