Serviços Públicos Constitucionais: Gestão, Princípios e Direitos do Utilizador

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Orçamentos de Serviços Públicos Constitucionais

A Constituição prevê uma ampla cobertura para os benefícios sociais da atividade da Administração, que aparece mais como um mandato do que uma mera possibilidade. No entanto, a Constituição não permite um desempenho abrangente da administração pública que exclua ou marginalize o setor privado. Ela exige uma declaração expressa de uma lei formal para a reserva de serviços ao setor público.

Para que um serviço seja qualificado como público, deve apresentar a consideração essencial. Essa consideração é uma característica de valor essencial que corresponde ao legislador, mas como um conceito encontrado na própria Constituição, a sua interpretação final e definitiva corresponde ao Tribunal Constitucional.

A reserva de um serviço ao setor público não implica, portanto, necessariamente, um monopólio. O monopólio ocorre se a própria Administração decide gerir o serviço sozinha, sem o envolvimento de outros agentes. Há também um monopólio se a gestão do serviço for confiada, exclusivamente, a uma empresa privada.

Monopólios em favor da Administração são admissíveis quando um conjunto de circunstâncias os justifique, tais como a necessidade de assegurar uma gestão unificada e sob um controlo público estrito.

E no caso de monopólios privados que gerem um serviço público, muitas vezes se tenta justificar a necessidade de compensar o concessionário quando este tem de realizar muitos investimentos, é o que originalmente aconteceu com o serviço público de iluminação.

Serviços Económicos de Interesse Geral

Os Princípios Orientadores do Serviço Público

a) Princípio da Continuidade

Uma atividade é considerada serviço público por servir a um interesse social, cuja eficácia deve ser garantida de forma permanente. O exercício de certas atividades não pode estar, a todo momento, ao critério dos agentes de mercado, pautado apenas pelo critério da eficiência económica.

A Continuidade não se confunde necessariamente com a posse, mas com a regularidade: o serviço deve ser garantido com uma regularidade que satisfaça suficientemente as necessidades específicas que serve (por exemplo, não é preciso permanecer no mercado de alimentos aberto 24 horas, mas não se pode dizer o mesmo de uma sala de emergência de hospital ou do serviço público de energia elétrica).

O princípio da continuidade aplica-se tanto quando o serviço público é fornecido pela própria Administração, como quando é prestado por um contratado. Neste último caso, o concessionário deve garantir a continuidade do serviço acordado.

A prevalência do interesse público é tal que, mesmo durante a greve, justifica o estabelecimento de serviços mínimos, independentemente de a gestão do serviço estar em mãos públicas ou privadas.

b) Princípio da Igualdade

O princípio da igualdade resulta em um princípio de não discriminação nas condições de acesso e de tratamento para o utilizador. Isto não deve ser lido de forma formal (mesmas condições para todos), mas material (a cada um segundo as suas necessidades), de modo que os acordos podem prever diferentes condições de acesso e prestação, desde que sejam razoáveis e proporcionais. Estas diferenças podem ser devido a fins sociais, caso em que se configura discriminação positiva (por exemplo, taxas reduzidas por causa da idade), ou a estratégias de negócio, no caso dos serviços económicos de interesse geral (preços especiais para grandes utilizadores), desde que obedeçam aos princípios da transparência e não discriminação.

c) Princípio da Universalidade

A cobertura do serviço deve abranger e ser acessível a todos os destinatários.

d) Princípio da Mutabilidade

Sob esse princípio, o titular ou a gestão responsável pelo serviço pode alterar as suas condições de prestação, quando ocorrem circunstâncias que o justifiquem.

e) Princípio da Qualidade

Este é um princípio de nova geração, com origem no direito comunitário europeu. A verdadeira virtualidade deste princípio reside na atribuição à Administração de poderes de regulação, planeamento, implementação, adaptação e controlo que assegurem e, se necessário, melhorem os níveis e padrões de desempenho.

No entanto, para alguns serviços de interesse económico geral, as diretivas da UE definem níveis específicos de qualidade na prestação, mesmo contemplando o direito do utilizador de aceder ao serviço com um nível mínimo de qualidade pré-determinado.

f) Princípio da Acessibilidade

Este princípio visa fornecer serviços públicos em condições economicamente acessíveis. A acessibilidade não significa, no entanto, que sejam gratuitos. Alguns serviços são gratuitos por imperativo constitucional, como o ensino primário obrigatório, mas não existe um princípio geral de gratuidade.

É comum que a Administração possa impor aos utilizadores o ónus de financiar parcialmente o serviço através de uma taxa ou de uma tarifa fixa pela Administração. O preço é determinado pelo mercado, mas a Administração reserva-se o poder de fixar preços máximos, e pode até impor a prestação de determinados benefícios de forma gratuita.

A regra geral é que esses preços devem cobrir o custo do serviço. No entanto, uma vez que os preços devem ser acessíveis, a lei permite que sejam inferiores ao custo do serviço, sendo o défice orçamental coberto.

Modos de Gestão

Existem duas opções principais: gestão direta, pela Administração Pública, e gestão indireta, por meio de particulares. Cada uma dessas opções, por sua vez, comporta uma variedade de modalidades.

Existem também fórmulas que combinam a presença pública e privada, o que permite falar de uma terceira opção: a gestão conjunta.

A Gestão Direta pela Administração Pública

A gestão direta é realizada pela própria Administração Pública. Pode assumir diferentes formas de organização, cuja diversidade reside no grau de autonomia jurídica de que a entidade prestadora do serviço desfruta:

  • Gestão independente e minimamente indispensável, com simples especialização orgânica dentro da própria Administração.
  • Criação de um organismo público que gere o serviço.
  • Criação de uma empresa com capital público para gerir o serviço.

A gestão é desenvolvida com total submissão ao direito privado e levanta problemas comuns e sensíveis de gestão, com as vantagens de flexibilidade e liberdade que o direito privado permite, mas sem a prestação de contas e os sistemas de controlo fiscal que, a longo prazo, derivam do risco da empresa e do capital investido.

Gestão Indireta

A Concessão de Serviços Públicos

A concessão de serviços públicos é a fórmula mais generalizada e característica de gestão indireta dos serviços públicos.

O concessionário é uma entidade privada e toda a sua organização interna está sujeita ao direito privado. Geralmente é uma corporação. Importante, a gestão do serviço é feita por conta e risco do concessionário, devendo obter a sua margem de lucro de acordo com o contrato de concessão, que estabelece:

  • a) Por um lado, as taxas de serviço estabelecidas pela Administração e outras remunerações previstas.
  • b) Por outro lado, os custos do serviço, a serem assumidos.

Essas duas referências – receita e custo – definem o alcance dos seus benefícios. No entanto, é preciso ter em mente que este é um contrato de gestão, que presta atenção prioritária à prestação adequada do serviço, e que qualquer alteração imprevisível nos custos não deve levar à aplicação rigorosa do princípio de risco e ventura: Se não houve má gestão por parte do concessionário, e a alteração, portanto, tem uma fonte externa e imprevisível, a Administração deve auxiliar o concessionário para que o serviço possa ser mantido.

O regime jurídico de direito privado que rege grande parte da atividade do concessionário é excecional, em grande parte devido aos meios que o serviço exige: para garantir e manter a ordem e proporcionar a igualdade, o concessionário pode ter poderes de polícia delegados e ser beneficiário do exercício de certos poderes públicos (por exemplo, de expropriação).

Da perspetiva do utilizador, o exercício dos poderes de polícia delegados exercido pelo concessionário implica que todos os atos que executa em relação ao serviço podem ser objeto de recurso para a Administração titular. A decisão da Administração, naturalmente, pode ser objeto de recurso, se necessário, para a jurisdição administrativa.

As obrigações do concessionário têm duas fontes:

  • a) Algumas derivam estritamente do contrato com a Administração.
  • b) Outras são as que a Administração, como titular do serviço, pode impor.

A partir desta segunda posição, a Administração, através de ordens ou regulamentos, pode especificar as obrigações do concessionário, podendo inclusive modificar o contrato, o que resultará em compensação, se necessário, para o contratado e a recomposição da cláusula económico-financeira.

Aqui se pode observar, em última instância, a dualidade de posição da administração pública nos contratos administrativos:

  • a) Por um lado, é parte de um contrato.
  • b) Ao mesmo tempo, por outro lado, está situada num patamar superior ao do contrato, responsável por obras públicas ou serviços que exijam decisões e intervenções que não se limitem ao estipulado no contrato.

Esta dualidade explica a mutabilidade dos contratos administrativos para atender ao interesse público que a Administração tutela, se necessário compensar o contratado.

Em casos extremos, a Administração tem mesmo o poder de resgatar a concessão. O resgate é uma fórmula específica para encerrar a concessão – as outras são comuns, como o cumprimento do prazo de validade, etc. – e é uma decisão da Administração. Normalmente, terá de se compensar o concessionário pelo tempo de operação que restava, embora muitas vezes não seja uma forma de salvar o serviço do défice que, por várias razões, se possa encontrar. Nestes casos, muitas vezes não há uma compensação apropriada.

Outras Formas de Gestão Indireta e Mista

Nessas outras fórmulas, que envolvem uma determinada particularidade, há também uma presença importante da gestão, embora não exclusivamente pela Administração.

O concerto é apresentado como uma forma adequada quando um particular possui a infraestrutura e as instalações adequadas para a prestação de um serviço público.

Um pressuposto oposto caracteriza a fórmula conhecida como **gestão interessada**: a Administração fornece as instalações, mas as necessidades de pessoal ou de gestão, em troca de uma taxa geralmente determinada, são fornecidas pelo setor privado.

Finalmente, a chamada **economia mista** é o epítome do caráter destas fórmulas: trata-se da gestão de serviços através de uma parceria com capitais públicos e privados, uma relação que comporta, obviamente, muitas variações.

A Prestação de Serviços: Normas Gerais e Estatuto do Utilizador

A Relação Jurídica entre o Utilizador e o Prestador de Serviços

  • a) É uma relação de natureza predominantemente "objetiva", pois a parte principal do seu conteúdo é excluída da autonomia das partes e determinada por normas jurídicas de caráter imperativo.
  • b) É uma relação de natureza predominantemente "pública", embora também existam elementos jurídicos privados.
  • c) O estabelecimento dessa relação pode ocorrer tanto através de atos técnico-formais públicos (ato administrativo unilateral de admissão) quanto privados (contrato).
  • d) O utilizador encontra-se numa posição de sujeito particular, submetendo-se aos poderes de gestão e disciplina da agência ou empresa prestadora do serviço.

Direitos do Utilizador

Os direitos do utilizador são definidos de forma particular pelas regras específicas que regem cada serviço. Geralmente podem ser identificados como segue:

  • a) O "direito de acesso ao serviço", que por vezes pode ser condicionado.
  • b) O "direito de desfrutar do serviço em termos de qualidade e quantidade pré-determinadas pelas regras que o regem".
  • c) Em alguns serviços, têm surgido "direitos de participação" dos utilizadores na configuração do serviço.

Obrigações e Deveres do Utilizador

As principais obrigações e deveres dos utilizadores são:

  1. Cumprimento das regras de serviço estabelecidas nas suas normas regulamentares. O incumprimento destas inicia o poder disciplinar da Administração, o que poderia privar o utilizador da utilização temporária do serviço ou impor qualquer sanção.
  2. O pagamento da contraprestação devida pela utilização.

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