O Sexênio Democrático Espanhol (1868-1874)
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O Sexênio Democrático é o período entre a Revolução Gloriosa, que levou à queda de Isabel II, e a restauração da monarquia Bourbon, na pessoa de Afonso XII. Durante esses seis anos, sucederam-se diferentes regimes e governos.
1. A Revolução de 1868
1.1. Desenvolvimento da Revolução
a) O Pronunciamento Militar
A fórmula escolhida para realizar a revolução foi o pronunciamento da frota comandada pelo almirante Topete, na Baía de Cádiz. Pouco mais tarde, juntaram-se a ela Prim, Serrano e Dulce. Juntos, assinaram um manifesto explicando os motivos para a insurreição, e outras cidades na Espanha se juntaram à causa revolucionária. Tropas leais ao Governo de Isabel II, sob o comando do Marquês de Novaliches, foram enviadas para esmagar a revolta liderada pelos rebeldes andaluzes de Serrano. As forças reais foram derrotadas, e as autoridades locais deram lugar a juntas revolucionárias. A revolução surpreendeu Isabel II na fronteira com a França. Triunfou, sendo também conhecida como a Revolução Gloriosa.
b) O Apoio Popular: As Juntas
Durante os primeiros meses da revolução, até a convocação da Assembleia Constituinte, o poder político foi exercido pelas Juntas. Essas juntas organizaram a vida civil da população, armando o povo através dos Voluntários da Liberdade. E entraram em conflito político com as figuras que estavam a assumir o poder.
1.2. O Governo Provisório
A reunião de Madrid encarregou o General Serrano da formação do governo interino, que incluiu Figuerola, Ruiz Zorrilla, Topete, Sagasta e Prim. As primeiras medidas do governo provisório incluíram:
- A dissolução dos conselhos locais.
- A exigência de que os Voluntários da Liberdade devolvessem as armas.
- A solicitação para que os governantes seculares se mantivessem firmes para garantir a ordem social.
- A nomeação de novos conselhos e membros.
- A garantia do controlo político do país.
O governo também introduziu as liberdades básicas: de expressão, de educação e religiosa. Medidas económicas decretaram o livre comércio, aboliram o imposto sobre o consumo, mas não conseguiram a abolição do serviço militar obrigatório devido ao conflito que surgiu em Cuba na época.
No início de dezembro, a normalidade institucional estava completa, e o governo pôde convocar as eleições de janeiro para as Cortes Constituintes, que seriam eleitas por sufrágio universal. Progressistas, Unionistas e simpatizantes da monarquia, os democratas assinaram um manifesto pró-monarquia, o Manifesto dos Cimbrios, a favor de uma Coroa popular e sufrágio universal democrático. A outra facção democrata decidiu apoiar a alternativa. Muitos democratas, que haviam sido excluídos do novo governo interino, eram a favor da república e do federalismo, como o Partido Republicano Democrático Federal, liderado por Francesc Pi y Maragall.
2. A Constituição de 1869
Os recém-eleitos deputados aprovaram a Constituição em junho de 1869. Foi a mais liberal desenvolvida até então na Espanha, garantindo o sufrágio universal masculino e a soberania nacional, estabelecendo a monarquia democrática e aceitando a liberdade religiosa. Além disso, desenvolveu um projeto de lei de direitos de forma muito mais abrangente do que outras constituições:
- Organização do Sistema: Duas câmaras, com poderes iguais. Congresso eleito por sufrágio direto.
- Monarquia: O rei exercia o poder executivo por meio de seus ministros, tendo a capacidade de convocar e dissolver as Câmaras.
- Júri: O julgamento por júri para todos os crimes políticos e comuns.
- Administração Local: Reconhecia o princípio de autogoverno dos municípios.
Discordaram dessa Constituição tanto os carlistas quanto os republicanos. O General Serrano assumiu a regência e Prim foi nomeado chefe do governo.
3. O Reinado de Amadeu I de Saboia (1871-1873)
3.1. A Regência de Serrano e o Governo de Prim
No plano legislativo, o Governo empreendeu as seguintes medidas:
- Lei Eleitoral: Desenvolveu os princípios adotados pelas Cortes.
- Lei do Casamento Civil: Permitiu casamentos não religiosos.
- Lei Judiciária: Estabeleceu a justiça leiga.
- Reforma do Código Penal.
Na esfera económica, incluiu medidas de livre comércio. O problema mais grave da Fazenda Pública obrigou a utilizar uma parte do património mineiro, através de venda ou de concessão de longo prazo. Também estabeleceu a peseta como a nova moeda nacional. No campo social, houve continuidade das ações de mobilização, rebeliões urbanas e camponesas, motins e movimentos revolucionários.
A nível político, o governo teve de enfrentar muitos problemas:
- Tumultos de setembro de 1869, de federalistas e republicanos.
- Revolta em Cuba.
- Insatisfação geral das massas.
- Busca por um novo rei.
3.2. Desafios: Cuba, Agitação Social e Insurreição Carlista
No segundo ano do reinado de Amadeu I de Saboia, uma série de problemas levaria à ruína da monarquia:
- Agravamento da Guerra de Cuba.
- Eclosão de uma insurreição carlista.
- Ao mesmo tempo, ocorreu uma nova tentativa de surto republicano em El Ferrol.
- A ascensão do movimento operário, aumentando o medo entre as classes média e alta do país.
- Confronto no Congresso sobre a abolição da escravatura.
3.3. A Abdicação de Amadeu I
Amadeu I esperava apenas o momento adequado para abdicar. Quando o chefe de governo nomeou o General Hidalgo de Quintana Capitão-General da Catalunha, os oficiais ameaçaram chamar a massa para o apoio. Ruiz Zorrilla respondeu pedindo ao rei a dissolução do corpo, para deixar clara a autoridade civil sobre os militares. O rei recusou, e Ruiz Zorrilla apresentou uma moção de confiança no Parlamento. Ao vencer, o rei foi forçado a assinar o decreto, mas logo em seguida apresentou a abdicação aos deputados.
4. A Primeira República
A Primeira República foi proclamada naquela noite. A proclamação foi feita em violação da Constituição, pois nem as Cortes poderiam assumir todos os poderes, nem poderiam proclamar a República por si mesmas. A opção monárquica havia sido esgotada. O estabelecimento da República em 1873 foi o resultado do compromisso da maioria dos membros radicais e de uma minoria republicana. A Assembleia Nacional nomeou um primeiro Governo da República, liderado por Estanislao Figueras. O novo regime só foi reconhecido pelos Estados Unidos e pela Suíça. Nenhuma outra potência reconheceu a República Espanhola, que era vista como um regime revolucionário que poderia comprometer a estabilidade de muitos países europeus burgueses e conservadores. O advento do novo regime não teve o apoio social e político necessário para a sua sustentabilidade ao longo do tempo.
- No aspeto social, o apoio à República era escasso e também com interesses conflitantes.
- Para piorar as coisas, no horizonte económico, a República entrou numa situação caótica.
- Politicamente, não havia um programa de governo consistente e homogéneo.
Pode-se dizer que os graves problemas que a República teve de enfrentar foram:
- A divisão nas fileiras republicanas, gerando instabilidade política.
- A escalada do conflito cubano.
- A Terceira Guerra Carlista.
- A insurreição Cantonalista.
- O crescimento do movimento operário.
4.1. Estanislao Figueras: A Unidade da República
Figueras nomeou um governo de republicanos e radicais. Mas rapidamente o confronto entre os dois grupos tornou-se inevitável.
4.2. Francisco Pi y Maragall: A República Federal
Em 11 de junho, Francisco Pi y Maragall foi nomeado presidente. As câmaras legislativas produziram um projeto de constituição, mas este não foi aprovado. Não chegou a ser a Constituição de 1873. O projeto incluía:
- A organização territorial baseada em 17 estados da federação.
- A separação entre a Igreja Católica e o Estado.
- A extensão do direito de associação.
O regime republicano teve de enfrentar diversos conflitos e dificuldades:
a) Crise Económica, Conflitos Sociais e Operários
Os ataques multiplicaram-se, a falência do Estado aprofundou-se, forçando o governo a suspender o pagamento das suas dívidas. As dívidas das empresas na Bolsa caíram de forma contínua, e o medo levou muitos correntistas a sacar os depósitos dos bancos. Os trabalhadores na Andaluzia, animados porque esperavam que a República iniciasse a distribuição de terras, ocuparam fazendas pela força. O Internacionalismo teve seu auge durante a Primeira República, quando vários grupos de anarquistas assumiram uma posição insurrecional com a esperança de levar à revolução e ao colapso do Estado. Após o fracasso destas revoltas, a Internacional começou a perder força, mas o seu declínio final viria a partir de 1874, quando o novo regime a declarou ilegal, obrigando-a a organizar-se na clandestinidade.
b) A Insurreição Cantonalista
Pi y Maragall teve de lidar com a insurreição cantonalista, que visava organizar a República Federal a partir dos municípios que se associavam de forma voluntária. Este processo envolveu forças políticas de natureza diferente, dependendo do cantão, desde opções conservadoras até forças internacionalistas. O movimento cantonalista realizou um projeto que envolvia profundas mudanças sociais e económicas. Não devemos confundir a natureza do movimento cantonalista, que não era especificamente anarquista, mas sim pequeno-burguês, embora o movimento sindical tenha tido um papel especial em alguns episódios, como o levantamento de Alcoy. Pi y Maragall, ao contrário do fim da revolta cantonalista, demitiu-se em 18 de julho. Outras consequências de curto prazo do movimento cantonalista foram: as autoridades republicanas adotaram posições mais conservadoras; a médio prazo, houve a destruição total da ideia federal e o fracasso da experiência democrática de seis anos.
c) A Terceira Guerra Carlista
Desenvolveu-se em Espanha entre 1872 e 1876 entre os partidários de Carlos, Duque de Madrid, o pretendente carlista com o nome de Carlos VII, e os governos de Amadeu I, da Primeira República e de Afonso XII. A Guerra Carlista desenvolveu-se principalmente nas províncias do País Basco e Navarra. Após a proclamação da Primeira República Espanhola, muitos monárquicos isabelinos passaram para o lado carlista.
d) A Longa Guerra em Cuba (1868-1878)
Conhecida como a Guerra dos Dez Anos, foi a primeira guerra de independência cubana contra as forças reais espanholas. A guerra começou com o Grito de Yara e, dez anos mais tarde, terminou com o Pacto de Paz de Zanjón. Este acordo não garantiu um dos principais objetivos desta guerra: a independência de Cuba e a abolição da escravatura.
e) As Conspirações Afonsinas
A ex-rainha Isabel II tinha cedido os direitos de sucessão ao trono ao seu filho Afonso, e ambos viviam no exílio no estrangeiro. Mas, no país, a maioria da burguesia, da aristocracia, dos generais do Exército e vários funcionários queriam a restauração da monarquia Bourbon e, para isso, começaram a preparar e planear ações para derrubar a República.
4.3. Nicolás Salmerón
Nicolás Salmerón, substituto de Pi y Maragall, eleito pelo Parlamento, foi apoiado pelo exército para restaurar a ordem constitucional. O novo presidente centrou a sua ação política na remoção das secções da Primeira Internacional em Espanha, no encerramento de lojas e na detenção de militares, e também na repressão carlista. A sua recusa em assinar uma sentença de morte levou-o a demitir-se, abrindo caminho para a presidência de Castelar.
4.4. Emilio Castelar
A fome estava a impulsionar uma mudança conservadora na república. Praticou uma política para restaurar a unidade nacional e a ordem social pretendida pela burguesia e pela nobreza. As Cortes concederam-lhe poderes extraordinários para lidar com a situação. A sua política visava intervir na solução do problema cubano, remover os últimos vestígios do movimento cantonalista e resolver o conflito carlista, para finalmente alcançar a paz social no país. Na madrugada de 3 de janeiro de 1874, as Cortes observaram com espanto a chegada das forças do General Manuel Pavía, que dissolveu o Congresso dos Deputados.
4.5. Governo Provisório de Serrano e a Restauração
Manuel Pavía, que se havia revoltado com a cumplicidade de muitos outros generais, não tinha nenhum desejo pessoal de ficar com o poder e imediatamente convocou uma reunião dos principais comandantes militares e líderes seniores de todas as partes. Após o golpe do General Pavía, Serrano assumiu o poder executivo, com alguma incerteza quanto ao modelo do sistema. O governo do republicano unitário Serrano logo empreendeu uma tarefa legislativa destinada a restaurar a ordem social e dar garantias aos conservadores. Para lidar com a situação de falência causada pelas guerras carlistas e em Cuba, o Banco de Espanha transformou-se no Banco Nacional, assegurando assim a existência de um banco que emprestasse dinheiro ao governo. A restauração da monarquia Bourbon foi consumada quando o General Arsenio Martínez Campos proclamou o rei Afonso XII. O General Serrano e Sagasta tomaram o caminho do exílio. Ambos se opuseram ao regresso dos Bourbons. Em Madrid, formou-se um governo regencial liderado por Cánovas del Castillo, com o apoio da antiga União Liberal e do Partido Progressista.