Sociologia Jurídica: Conceitos e Aplicações

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1. Sociologia e Sociologia Jurídica: Conceitos

A Sociologia conquistou sua autonomia ao fundamentar sua abordagem em uma metodologia clara, construir conceitos específicos e criar teorias sociais. Suas descobertas, baseadas no rigor reflexivo, auxiliaram na criação de instituições sociais e no assessoramento de indivíduos que buscam atender aos interesses da população. A sociologia também orientou ações de grupos em busca de autonomia e direitos sociais. É a “sociologia das populações e instituições”, criada com a perspectiva de resolver problemas. Basicamente, é uma ciência que estuda as relações sociais e busca compreender as ligações entre os indivíduos que compõem a sociedade.

A Sociologia Jurídica analisa a realidade social que envolve o Direito, as normas, as leis e as estruturas jurídicas. Estuda as crenças e descrenças dos grupos na validade do Direito e mostra como este orienta as condutas humanas. Analisa todos os elementos que têm a função de assegurar o controle social: Estado Judiciário, Ministério Público, burocracia, leis, prisões, etc.

2. Importância da Sociologia Jurídica para o Direito

É no Direito que se percebem as relações sociais constituidoras da sociedade. Nele, há sempre referências às relações sociais que se desenvolvem em sociedade e, da mesma forma, onde existem relações sociais, pode-se encontrar o Direito. A Sociologia consolidou métodos que contribuíram para que a própria ciência jurídica se tornasse um estudo sistematizado e autônomo, contribuindo para o rigor nas compreensões sobre o social. Os estudos sociojurídicos têm caráter interdisciplinar, com um equilíbrio entre juristas e sociólogos que compreendem não apenas o Direito em sentido estrito, mas também os modos de regulação de conflitos que dele se aproximam ou com ele se relacionam.

3. Judicialização das Relações Sociais na Modernidade

A judicialização das relações sociais na cultura jurídica moderna tem base no mundo da produção e se estendeu ao desenvolvimento da vida urbana, do tráfego comercial (nacional e internacional), da produção manufatureira, da atividade bancária, entre outros. Nos centros europeus, o saber econômico ganha destaque, passando de uma técnica de gestão de patrimônios familiares ou de reinos para as ciências complexas que medem, provêm e preveem os atos de produção, circulação e consumo em espaços territoriais agora chamados de nação – a economia política. A sociedade moderna consiste na crescente submissão das mais diversas esferas da vida pública e privada à calculabilidade, à impessoalidade e à uniformidade, características do formalismo burocrático sob o regime de dominação tipicamente racional-legal, como afirma Weber. A modernidade se define a partir de dois componentes: o primeiro é a crença na razão e na ação racional (a ciência e a tecnologia, o cálculo e a precisão, a aplicação dos resultados da ciência a campos cada vez mais diversos de nossa vida e da sociedade passam a ser componentes necessários, e quase evidentes, da civilização moderna); o segundo é o reconhecimento dos direitos do indivíduo, isto é, a afirmação de um universalismo que dá a todos os indivíduos os mesmos direitos. A ação racional e o reconhecimento de direitos universais a todos.

4. Estruturas Sociais, Estruturas Mentais e "Estruturas Estruturantes"

Segundo o autor, a Sociologia é uma ciência que estuda as relações sociais, que são, ao mesmo tempo, produtoras e produtos da sociedade. É a forma pela qual o homem passa de uma estrutura estruturada para uma estrutura estruturante, tratando das condições que produzem os lugares sociais ocupados por ele. O ser humano se distingue das demais espécies porque nem tudo o que ele faz surge de sua estrutura genética, nem se desenvolve automaticamente em sua relação com a natureza. A construção desse aprendizado se faz por meio da relação com outros seres humanos. A Sociologia compreende-se, então, pelos objetivos pelos quais a ela se recorre: procurar potenciais reflexivos capazes de alargar a compreensão dos processos humanos e adquirir uma base de conhecimentos que leve ao entendimento das forças que compelem o homem, dando-lhes significados e orientando-as para a construção da vida individual e coletiva, justa e solidária.

5. "As Ideias Iluminarão o Mundo": Racionalismo e Iluminismo

A dinâmica da Sociologia está ligada ao contexto de seu surgimento: emergiu do interior do pensamento social da modernidade, chamado de racionalismo, iluminismo, jusnaturalismo, evolucionismo, contratualismo, constitucionalismo, idealismo, etc. Esse pensamento partia do pressuposto de que o homem é o centro de todas as coisas e o principal ser natural capaz de pensar, falar, agir e usar seu corpo do modo que mais lhe convier. Assim, para essa compreensão, bastava criarmos forças capazes de ordenar essas potências naturais para criar outra potência artificial – positivar o existente que o submeteria (o social submeteria o natural). Ou seja, a principal potência que deveria ser bem preparada seria o pensamento, pois este coordenaria as outras, as palavras e a ação (diziam os racionalistas, iluministas e idealistas – as ideias iluminarão o mundo). Essa compreensão levou à recuperação de outra potência histórica necessária para ordenar o mundo: a quarta potência se tornou imprescindível, a potência da escrita. Ou seja, não basta saber pensar, saber falar ou saber agir ordenadamente (racionalmente), era preciso colocar tudo isso por escrito no papel, para que todos possam seguir as melhores orientações (afirmavam os contratualistas, os constitucionalistas, os jusnaturalistas).

6. Positivação como Expressão da Modernidade Jurídica

O fenômeno da positivação é expressão da modernidade jurídica, permitindo a compreensão do Direito como um conjunto de normas postas. Ocorrido, em larga medida, a partir do século XIX, corresponde à legitimidade legal-burocrática preconizada por Max Weber, porquanto fundada em ritos e mecanismos de natureza formal. A positivação desponta como um novo processo de filtragem, mediante procedimentos decisórios, das valorações e expectativas comportamentais presentes na sociedade, que são, assim, convertidas em normas dotadas de validade jurídica. A lei, resultado de um conjunto de atos e procedimentos formais (iniciativa, discussão, quórum, deliberação), torna-se a manifestação cristalina do Direito. Daí advém a identificação moderna entre Direito e lei, restringindo o âmbito da experiência jurídica.

7. A "Maioridade" Segundo Auguste Comte

A reforma intelectual desenhada por Comte pode ser assim analisada: o homem nasce numa família e é nela orientado até os 7 anos, conforme a moral afetiva dos pais; dos 7 aos 14 anos, deveria ir para a escola e aprender a se orientar para o mundo do trabalho a partir da interiorização da razão historicamente formada; aos 18 anos, seria preparado pelo Estado. Ou seja, todos os homens deveriam servir à pátria, ir para o quartel e sair de lá só após a maioridade, quando estariam preparados para assumir seus deveres e direitos, constituir sua própria família e orientar os filhos para a ordem. No Estado (simbolicamente representado pelo quartel), o indivíduo é submetido à ordem estabelecida, leva um choque civilizacional, aprende à força a respeitar a ordem, a hierarquia, a autoridade e enraíza seu amor à pátria.

8. Conceito de Sociedade para os Modernos

As sociedades modernas apresentam certos sintomas patológicos, principalmente a insuficiente integração do indivíduo na coletividade, em todos os casos em que se produz um exagero da atividade e uma ampliação das trocas e das rivalidades. Esses fenômenos são inseparáveis das sociedades em que vivemos, mas, a partir de um determinado limiar, tornam-se patológicos.

9. Pressupostos para a Equidade Dialógica (Habermas)

Para garantir a formação democrática, o autor, com base em Habermas, aponta cinco pressupostos de efetivação da equidade dialógica:

  • Direito à maior medida possível de iguais liberdades subjetivas;
  • Direito ao status de membro de uma associação voluntária de parceiros do Direito;
  • Possibilidade de postulação judicial de direitos e da configuração politicamente autônoma da proteção jurídica individual;
  • Direitos fundamentais à participação, em igualdade de chances, em processos de formação de opinião e da vontade, nos quais os civis exercitam sua autonomia política e por meio dos quais eles criam o direito legítimo;
  • Direitos fundamentais a condições de vida garantidas de forma social, técnica e ecológica.

10. Princípios do Estado Democrático (Habermas)

Segundo Habermas, o Estado é o aparelho institucional encarregado de garantir o princípio da democracia, como ampla e livre participação de todos os membros de uma sociedade nos processos comunicativos que levam a acordos normativos, compondo a formação democrática da vontade. Para isso, sugere quatro princípios:

  1. Todo poder deve emanar do “poder comunicativo dos cidadãos”: na prática, este princípio aponta para poderes parlamentares representativos e deliberativos.
  2. Justiça independente: é fundamental, da mesma forma que a necessidade de restrição da instrumentalização do sistema jurídico, a garantia de restrição do sistema administrativo de interferência estratégica nos processos comunicativos de formação da vontade.
  3. Legalidade da administração e controle judicial e parlamentar da administração: a sociedade civil precisa amortecer e neutralizar a divisão desigual de posições sociais de poder.
  4. Separação entre Estado e Sociedade: Estado de Direito fundamentado na vontade surgida no livre fluxo comunicativo e resultado sintético da fusão entre saber institucionalizado jurídico e ação política.

11. "Todo Poder Deve Emanar do Poder Comunicativo dos Cidadãos"

Na prática, este princípio aponta para poderes parlamentares representativos e deliberativos. Uma segunda questão importante, imediatamente ligada à primeira, é o resguardo legal dos direitos do indivíduo à equanimidade argumentativa. Para isso, é necessário que a instância jurídica se resguarde da instrumentalização política.

12. Elementos para a Convivência (Teoria da Ação Comunicativa)

Na Teoria da Ação Comunicativa de Habermas, o autor aponta um conjunto significativo de elementos para a convivência entre indivíduos com interesses distintos. Cinco desses elementos são:

  1. Democratização dos próprios processos de formação de opinião e vontade: todos devem exprimir suas opiniões e vontades distintamente, sem influência de terceiros.
  2. Os argumentos das comunicações devem envolver as questões de valores: toda forma de convivência deve ser baseada em valores e princípios de convivência em comum.
  3. Uma cultura com estímulos para que não seja absorvida por meras necessidades de compensação: uma cultura que seja rica em valores e tradição para ser passada através das gerações com orgulho.
  4. Prática pública de poder comunicativo que estabilize um espaço público político não distorcido para a formação democrática da vontade: expor suas ideias com humildade, honestidade, apreço e sensibilidade com os demais.
  5. Um poder gerado de maneira comunicativa e utilizado administrativamente: atender a todos para agradar a maioria.

13. Valores para a Efetivação da Democracia (Habermas)

Para a efetivação da Democracia, Habermas aponta um conjunto de valores ou regras que deveriam estar presentes no discurso democrático. Seis deles são:

  1. Franqueza: exige transparência das partes, como uma fala sincera e pura.
  2. Face a Face: é o “cara a cara”, o olhar de frente, que oportuniza acompanhar o falar e o sentir do outro.
  3. Validade: a verdade construída deve ter um valor moral e ético dos sujeitos participantes.
  4. Facticidade: mesmo que tenham um tom idealista, as proposições devem ser possíveis de serem praticadas; ser executáveis.
  5. Legitimidade: se houve participantes, então é legítima, porque o modo de proceder foi aberto à participação, sem restrições.
  6. Decisão: o diálogo tem de trazer a solução, a luz final ao tema ou à verdade momentânea, conquistada e consensualmente compartilhada.

14. Capitalismo Desorganizado: Regulação e Emancipação

Ao longo da consolidação do Estado de Direito, duas características identificam o perfil do Estado e do Direito. O autor denomina de “polo de regulação” e “polo de emancipação”. No período atual, o autor denomina de capitalismo desorganizado. As características que levam a tal situação são:

Polo da regulação: predominância total do princípio do mercado, crescimento do mercado por multinacionais, aumento do autoritarismo, precarização das relações de trabalho, flexibilização e automatização dos processos produtivos, expansão do mercado, privatizações, retração das políticas sociais.

Polo da emancipação: promessa inconclusa, racionalidade cognitivo-instrumental, catástrofe ecológica, agravamento das injustiças sociais, paralelamente ao crescimento econômico, a regulação jurídica da vida social alimenta-se de si própria; ética individualista, esgotamento da alta cultura modernista, crítica radical do cânone modernista.

15. Direito como Sistema Autopoiético (Luhmann)

Autopoiesis ou auto-organização é uma qualidade interna do sistema, intocável de fora. O termo denomina a unidade que um elemento, um processo, um sistema é para si próprio, isto é, independentemente da interpretação ou observação por outros. Por meio de auto-organização, o sistema constitui seus próprios elementos como unidades funcionais.

16. Democracia e o Movimento de Atores

A democracia só é rigorosa na medida em que é alimentada por um desejo de libertação que, de forma permanente, apresenta novas fronteiras, ao mesmo tempo longínquas e próximas, porque se volta contra as formas de autoridade e repressão que atingem a experiência mais pessoal. Assim definindo, o espírito democrático pode responder a duas exigências que, à primeira vista, pareciam ser contraditórias: limitar o poder e responder às demandas da maioria.

17. Direito como Sistema e Subsistema (Luhmann)

Enquanto Sistema, o Direito é autopoiético, autorreferencial, e tem em si mesmo a capacidade de determinar a sua própria evolução a partir da interação dos elementos que o formam, que são produzidos e maturados por essa interação circular e recursiva que lhe dá existência. Em suma, se auto-organiza, se autoproduz e tem sua autorreferência.

Enquanto Subsistema, o Direito seria um subsistema que se movimenta constantemente para existir em um ambiente muito diverso e, para existir como tal, precisa fechar-se (“fechamento operacional”) e se diferenciar de outras instâncias sociais. Ao mesmo tempo, para existir, o Direito necessita do ambiente e busca, nele, elementos necessários à existência (“acoplamento estrutural”).

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