A Terapia Gestalt de Fritz Perls: Conceitos e Aplicações

O Ciclo de Contato na Terapia Gestalt de Fritz Perls (1893-1970)

Perls nasceu em 1893, em Berlim. Seu pai vendia vinho e "ideais". Seus pais tinham grandes conflitos, incluindo violência física. Sua mãe era muito ambiciosa e forjou grandes projetos para os filhos, mas suas relações não eram muito suaves. Em certo momento, a mãe conseguiu despertar e promover o interesse da criança pela arte, especialmente pelo teatro. Com Max Reinhardt, ele aprendeu sobre o trabalho de voz, comportamento e mimetismo. Esses aspectos colaboraram diretamente para um dos componentes mais importantes da Terapia Gestalt.

Ele estudou medicina, mas a Primeira Guerra Mundial interrompeu seus estudos. Em 1916, alistou-se no exército e perdeu seu melhor amigo. Após a guerra, ele continuou seus estudos e, depois do exame de Estado, estabeleceu-se como psiquiatra em Berlim. Conheceu Salomo Friedlander e ficou impressionado com sua filosofia de "indiferença criativa". As ideias fundamentais de Friedlander foram importantes para a formulação do conceito de homeostase por Perls.

Em 1926, foi assistente de Kurt Goldstein em uma escola para soldados com lesões cerebrais. Perls, então, confrontou-se com uma nova forma de compreender o corpo e a escuta, para ver, em primeiro lugar, o conceito de self.

Em 1933, sua família fugiu para a Holanda e, de lá, seguiu para a África do Sul (1934), onde fundou o Instituto de Psicanálise de Joanesburgo e recebeu influências positivas, como a de Smuts.

Em 1946, mudou-se para Nova Iorque, onde abriu um novo consultório. Lá, conheceu Paul Goodman e Ralph Hefferline e, juntos, escreveram sua obra seminal em 1951: Terapia Gestalt.

Teoria da Terapia Gestalt

A Terapia Gestalt faz parte das terapias existenciais (Terapia Gestalt, terapia da fala e análise da existência). O pressuposto básico da Terapia Gestalt é que a natureza do ser humano consiste em totalidades, e tais estruturas só podem ser compreendidas e vivenciadas como essas totalidades. O conceito de Gestalt denota uma forma completa e se assemelha ao conceito oriental do Tao, ambos baseados na ideia de figura e fundo para formar um todo completo. Eles não podem ser separados um do outro sem perder seus respectivos significados, ou seja, sem destruir o todo.

Autorregulação do Organismo

O corpo é a forma de existência do ser humano. Ele existe como um organismo biológico e social. Perls baseou-se na ideia de que toda a vida orgânica é regida pelo princípio da homeostase. Para a homeostase, um processo durante o qual o organismo atende às suas necessidades através de um intercâmbio permanente de equilíbrio e desequilíbrio. Perls acreditava que não são os instintos (isto é, formas de comportamento pré-determinadas especificamente pela informação genética) os criadores do nosso comportamento, mas sim as necessidades que surgem como reações individuais a este processo homeostático ou de ajustamento.

Perls descreveu a tendência do corpo a se mover para equilibrar seus desejos e necessidades conflitantes. O "centro de opostos zero" manifesta-se através da luta constante entre a autopreservação (isolamento, segurança, tranquilidade, etc.) de um lado e o crescimento (isto é, mudança, movimento, risco, desenvolvimento, etc.) do outro. Qualquer desequilíbrio é experienciado como uma necessidade de correção.

Perls relacionou este processo de homeostase com a formação da Gestalt, ou seja, o aparecimento de figuras a partir de fundos. Isso significa que a necessidade atual mais forte emerge do fundo dos vários requisitos estabelecidos, e todo o corpo – cada órgão, sentido, movimento, pensamento – é organizado sob as "necessidades emergentes". Se a necessidade é satisfeita, ela se dilui imediatamente no fundo, e uma nova necessidade surge como uma figura. Em tal processo, nunca se chega a um estado final, pois o fechamento da Gestalt, ao mesmo tempo que causa satisfação, produz a reabertura e a frustração.

Na psicologia de orientação científica, estes dois sistemas são claramente separados como unidades independentes um do outro. Perls propôs-se contra este paralelismo psicofísico total e o conceito holístico. A doutrina holística permite uma interpretação conjunta destes dois sistemas do organismo e acredita que os pensamentos, sentimentos e padrões de comportamento são formados "pelo mesmo assunto", o que implica a consequência de que podemos passar e transferir de um plano para outro.

Teoria do Self

Em sua teoria do self, Perls, Hefferline e Goodman (PHG) subdividem-no em três subsistemas: o ego, o id e a personalidade.

Estágios do Contato (PHG)

Pré-contato

Após a deficiência ou o princípio homeostático interno excessivo (do organismo) e externo, influenciado pelo contato ativo no campo de limite, isso é verdadeiro para todas as funções corporais. É por isso que a respiração tem uma importância significativa para a psicoterapia, pois em nenhum outro lugar se pode ver tão claramente como um ser vivo é um campo e como o ambiente está nele. Esses estados de deficiência ou excesso são classificados como "situações não resolvidas".

Contato Pleno

Esses estímulos permitem que o corpo forme contornos mais nítidos de objetos-figuras no campo circundante, permitindo a integração de situações não resolvidas e a assimilação de novas ou a remoção do superficial.

Contato Final

É um momento, um ponto alto do processo de contato, em que a necessidade ou o interesse se fundem com o self, que é a figura. "Por um tempo, não há praticamente nenhum fundo que seja." A autoavaliação, que normalmente não pode existir sem o fundo (sem fundo, ambiente ou corpo), só é possível porque é uma forma de autoavaliação na realização do contato em que:

• Cada uma das partes do todo é experienciada com todas as outras partes do todo.
• O conjunto compreende apenas as partes que são experienciadas.

Pós-contato

"O efeito produzido pelo contato (com exceção da destruição) é o crescimento", que se condensa no corpo psicologicamente. Pode-se imaginar o seguinte: o contato é um influxo de energia que se estende além da energia do corpo para os elementos que foram assimilados na consumação do contato.

A Neurose como Interrupção do Contato

A neurose é também um produto da adaptação criativa e é assimilada como comer ou sexo. PHG explica o aparecimento da neurose a partir da interrupção do processo de contato que descrevemos. Os tipos de alterações neuróticas ocorrem no ponto onde a interrupção do processo de contato aconteceu.

A vida de um neurótico não está em um fluxo de equilíbrio, mas é determinada por constantes interrupções. O desequilíbrio torna-se sua característica: o prazer da vida é substituído pelo esforço de sobrevivência. O neurótico não consegue explorar os impulsos para o seu próprio desenvolvimento, o que o leva, em última análise, a agir contra si mesmo e contra os outros.

A PHG chama de "evasão" o mecanismo de interrupção permanente do contato, enquanto a psicanálise o chama de "resistência". Freud acreditava que o mecanismo de evasão que recebemos de nossos pais. Para PHG, a cabeça é o próprio corpo, ou seja, não faz parte das questões não resolvidas (correspondentes em psicanálise a "fixações") que excedem o ser humano, mas contribui ativamente para elas. Filosoficamente falando, os conceitos de resistência e o estabelecimento do princípio da causalidade da filosofia da ciência orientada para a natureza. No entanto, os conceitos de evasão e questões não resolvidas são uma expressão da atitude existencial.

Tipos de Distúrbios Neuróticos (PHG)

• Confluência: interrupção do contato antes do estímulo primário.
• Introjeção: interrupção do contato durante o estímulo.
• Projeção: interrupção do contato no confronto com o ambiente.
• Retroflexão: interrupção do contato durante o conflito na destruição.
• Egotismo: interrupção do contato durante a realização do contato.

Prática da Terapia Gestalt

Durante a terapia, deve ser apurado:

1. Em qual fase do processo de contato o indivíduo interrompeu.
2. Como a interrupção do contato ocorre. Ao contrário da psicanálise, o principal não é por que, mas como a interrupção acontece.

Princípios da Terapia Gestalt

Para apoiar os clientes, a terapia enfatiza os seguintes princípios:

• Aqui e Agora: Trazer o cliente para o presente, seus pensamentos e sentimentos.
• Autoconsciência: O "agora" e o "como" são os dois pilares da teoria. O "agora" compreende tudo o que existe, e ao "como" adiciona-se o "o quê" (existência óbvia). Na Terapia Gestalt, começamos com o "o quê" é e observamos as abstrações, o contexto ou as situações que podem ser encontradas, e anexamos a figura, a experiência do primeiro termo, o fundo, o conteúdo, a perspectiva, a situação, e estes, juntos, formam a Gestalt.
• Confronto: Esta tomada de consciência do aqui e agora é o próximo passo no confronto, ou seja, a autoconfrontação. O principal objetivo da Terapia Gestalt não é resolver problemas, mas apresentá-los de modo que sejam digeridos do ambiente e novos materiais possam ser integrados, mesmo que isso possa levar a uma crise.
• Relação Terapeuta-Cliente: O terapeuta atua no "agora" e "como" como um veículo, como parte do ambiente. A tarefa essencial do terapeuta é acompanhar o cliente para que ele não perca a consciência e não quebre o contato consigo mesmo ou com o ambiente através de um desvio para o futuro e o passado.

Fundamentação Filosófica e Compreensão Científica

A Terapia Gestalt inclui essencialmente o pensamento da filosofia existencialista. Perls mostra a influência do budismo Zen na disponibilidade para aceitar o ser humano como ele é, concebendo e percebendo suas possibilidades e limitações, ao viver no presente, aqui e agora, e abrir mão de uma autoridade suprema. A Terapia Gestalt é um princípio existencial, o que significa que não tratamos apenas os sintomas, mas lidamos com estruturas e caráter, cuidando de toda a existência humana.

Contribuições de Perls para a Psicologia Humanista

A Expressão de uma Maneira de Ser Existencialista

A experiência pessoal tornou Perls aberto às ideias da filosofia existencialista: o ser humano neste mundo é confrontado, a princípio, com os dois lados da vida. Quando se tenta evitar essa realidade, contradiz-se a essência.

A Teoria do Ciclo de Contato

O indivíduo em contato e em relação com o ambiente está sujeito ao princípio da homeostase. Perls entendia isso como um processo durante o qual o organismo atende às suas necessidades com uma troca constante de equilíbrio e desequilíbrio. A característica deste processo de contato é que ele nunca está terminado.