Virologia: Perguntas e Respostas Essenciais sobre Vírus

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1) Fale sobre as principais formas de internalização do genoma viral na célula:

O genoma viral pode ser internalizado de três modos:

  1. Endocitose: Processo que acontece por uma sinalização mediada pelo receptor utilizado na adsorção. Após a endocitose, ocorre uma fusão entre o envelope viral e a vesícula de endocitose, mediada por pH (a queda do pH induz uma alteração conformacional no envelope do vírus que permite esse processo), permitindo assim que o capsídeo viral penetre na célula. Para vírus envelopados, esse processo se dá por meio da fusão, enquanto para vírus não envelopados, pode ocorrer a lise da vesícula endocítica.
  2. Fusão de Membrana Plasmática: Também mediada pela sinalização deflagrada pelos receptores usados na adsorção. Esse processo somente acontece em vírus envelopados, os quais sofrem um estímulo para a exposição de partículas hidrofóbicas (aminoácidos do seu envelope) que irão se fundir com a membrana plasmática, permitindo a entrada do capsídeo viral.
  3. Penetração Direta: Processo que se desenvolve por meio de vetores. Ocorrem mudanças conformacionais na célula que levam à formação de um poro na sua membrana plasmática, sendo esse o caminho para a penetração do genoma.

2) Diferencie vírus RNA de polaridade positiva e de polaridade negativa:

Os vírus RNA de polaridade positiva são aqueles que chegam à célula e são lidos diretamente como RNAm, realizando, a partir dele, a produção de proteínas pela utilização dos ribossomos da célula infectada. Os vírus RNA de polaridade negativa são aqueles que necessitam carrear consigo uma RNA polimerase (dependente de RNA) para, a partir da sua fita original, sintetizar uma fita de polaridade positiva que será usada como molde para a produção de proteínas com os ribossomos da célula infectada.

3) Defina espículas virais e fale sobre suas funções:

Espículas virais consistem em projeções na superfície dos vírus que são responsáveis pela interação destes com as células que irão infectar. Suas funções incluem:

  • Adsorção dos vírus nas células que têm potencial para serem infectadas.
  • Fusão às membranas das células para posterior internalização dos vírus.
  • Brotamento de novos vírus após a replicação viral em um ciclo lítico.

4) Fale sobre as rotas de entrada de vírus no organismo:

Os vírus podem entrar no organismo pelas seguintes rotas:

  • Mucosas
  • Trato Respiratório
  • Trato Gastrointestinal (GI)
  • Trato Urogenital
  • Mucosa da Conjuntiva
  • Pele

A penetração pelas mucosas decorre do contato com o ambiente externo e é dificultada pela presença de células do sistema imune, por folículos linfoides, pelo ambiente hostil do intestino, pelas tonsilas e pelos adenoides com células M (que são responsáveis pela fagocitose).

A penetração pelo trato respiratório é relativamente comum, principalmente devido a aerossóis; é dificultada pela presença de barreiras mecânicas, tais como as células ciliadas, o muco e os macrófagos. Caso as partículas sejam menores de 5 micrômetros, podem atingir os alvéolos. A infecção proveniente de vírus que infectam por essa via pode ser restrita ou disseminada.

A penetração pelo trato GI é mais difícil, devido ao ambiente extremamente hostil (acidez do estômago, alcalinidade do intestino, sais biliares rompendo o envelope lipídico, enzimas digestivas, muco, IgA e células fagocitárias). Porém, alguns vírus (tais como o Adenovírus, o Rotavírus e o Astrovírus) são capazes de penetrar e infectar as células colunares do intestino. A transcitose mediada por células M permite a chegada dos vírus que infectam o organismo por essa rota a locais mais profundos.

A penetração pelo trato urogenital normalmente está ligada à atividade sexual, causando abrasões no epitélio que serão porta de entrada para esses vírus. Nesse caso, têm-se como barreiras fisiológicas o muco e o baixo pH. Essas infecções podem ser disseminadas ou localizadas.

A penetração pela mucosa conjuntiva, em geral, se deve a procedimentos oftalmológicos ou à contaminação ambiental, sendo que as secreções oculares e o movimento das pálpebras constituem uma barreira a esse tipo de infecção. Nesses casos, a replicação é, usualmente, localizada e a disseminação é rara.

A penetração pela pele pode ser separada em dois tipos: a que se limita à epiderme e a que alcança a derme. No primeiro caso, tem-se a existência de uma barreira rígida e impermeável de queratinócitos, fazendo com que a infecção somente seja possível quando houver um rompimento da integridade dessa; a replicação costuma ser localizada. No segundo caso, que pode ocorrer devido à picada de vetores artrópodes, mordida de animais e utilização de instrumentos perfurocortantes, pode haver replicação sistêmica, devido à facilidade do vírus alcançar a corrente sanguínea, dada a alta vascularização da área.

5) Fale sobre o modelo de infecção do vírus no organismo (viremia primária, secundária, etc.):

A infecção sistêmica do organismo, em geral, se dá pela corrente sanguínea, podendo também ocorrer por meio de barreiras físicas e imunológicas que falharam, por células polarizadas na mucosa, pela linfa, pela superfície do epitélio ou por nervos periféricos. Em se considerando a viremia, tem-se a disseminação pelo sangue. Nesse caso, a replicação vai acontecer em células endoteliais, até as quais o vírus chega por meio de capilares. O vírus terá acesso a todos os tecidos, já que está na corrente sanguínea (podendo se encontrar livre ou associado a leucócitos, plaquetas e eritrócitos).

Em se tratando de viremia, tem-se que:

  • Viremia Ativa: Consiste em replicação viral.
  • Viremia Passiva: Consiste na ausência de replicação viral no sítio de entrada.
  • Viremia Primária: Consiste na liberação de partículas virais após a sua replicação no sítio de entrada.
  • Viremia Secundária: Consiste em uma grande concentração de partículas virais no sangue após a disseminação.

6) Diferencie infecção crônica de latente:

Infecção Crônica é aquela em que o vírus se encontra continuamente replicando, fazendo com que a viremia seja constante. Infecção Latente é aquela em que o vírus persiste sem replicar-se por grandes períodos (ou seja, períodos em que a viremia não existe), com fases de reativação, nas quais acontece a replicação viral (ocorrendo, portanto, aumento e posterior diminuição da viremia).

7) Defina patógeno, patogênese, patogenicidade e virulência:

  • Patógeno: É o agente infeccioso.
  • Patogênese: É o mecanismo da doença causada pelo vírus.
  • Patogenicidade: É a capacidade do agente infeccioso (patógeno) causar doença.
  • Virulência: É a classificação ou grau de capacidade do patógeno de causar a doença (patologia), sendo uma medida da sua patogenicidade.

8) O que é “estado antiviral” de uma célula em contato com o interferon?

O estado antiviral da célula em contato com o Interferon (IFN) consiste em uma resposta contra patógenos. Para esse tipo de resposta, as citocinas mais específicas são o IFN-α e o IFN-β. No início de uma infecção por patógenos, as células que iniciam a produção dessas citocinas acabam por morrer, já que somente serão induzidas a essa produção quando em contato com a partícula viral. As outras células (primings) receberão essas citocinas e serão estimuladas no sentido de produzir muito mais IFN, que vai agir na modulação dessas células, tornando-as não permissíveis à infecção. Esse processo age no sentido de atrasar um pouco a replicação dos vírus, permitindo que a resposta imune seja montada.

9) Por que os Linfócitos T CD8+ são geralmente mais importantes na resposta às infecções virais?

Os Linfócitos T CD8+ são, geralmente, mais importantes por serem capazes de reconhecer proteínas virais que estão no seu citoplasma e as processar, apresentando-as via MHC I. Em se considerando que os vírus estão obrigatoriamente localizados no interior das células para que possam estar metabolicamente ativos, a probabilidade de que os LT CD8+ consigam capturar a proteína viral para apresentação é muito maior do que a de que os LT CD4+ consigam fagocitar uma partícula viral e a apresentar via MHC II.

10) Diferencie vacina atenuada de inativada, com vantagens e desvantagens de cada uma:

Vacina Atenuada

É aquela que possui o antígeno modificado, mas ainda vivo, sendo necessária uma menor concentração desse, já que o mesmo ainda possui capacidade de replicação.

  • Vantagens: Mimetiza a infecção natural, induz uma resposta duradoura, o vírus é reconhecido tanto por MHC I como por MHC II (tornando a resposta imune mais completa), aumenta as taxas de soroconversão e induz uma efetiva resposta celular.
  • Desvantagens: É lábil (facilmente destruída, perde facilmente as suas características) e é passível de reversão da atenuação, o que pode ser um risco tanto para imunodeprimidos como para grávidas.

Vacina Inativada

É aquela em que o patógeno está morto (inativação por meio de aquecimento – autoclavação ou calor a seco –, por métodos químicos – pH, proteases, clorofórmio, solventes orgânicos ou detergentes – e métodos físicos – alta pressão, radiação UV e raios gama), sendo necessária, portanto, uma maior concentração dessa para induzir a resposta, já que o vírus não terá a capacidade de replicar.

  • Vantagens: É estável e segura.
  • Desvantagens: Induz uma resposta de curta duração e não tão completa, por ter somente seus vírus reconhecidos por MHC II e necessitar de dose de reforço (boost).

11) Liste 5 diferentes tipos de vírus, identificados por sorologia ou PCR, considerados como respiratórios. Apresente resumidamente como eles causam doenças no trato respiratório superior e inferior:

Em se tratando de vírus respiratórios, temos dois grupos principais:

  • Grupo 1 (Mais frequentes e graves): Influenza, Parainfluenza, Vírus Sincicial Respiratório, Metapneumovírus e Adenovírus.
  • Grupo 2 (Menos frequentes e graves): Coronavírus, Rinovírus, Bocavírus, Poliovírus e Mimivírus.

Sobre o modo de infecção no trato respiratório superior e inferior, tem-se o seguinte: os vírus, em meio a aerossóis, penetram pelo trato respiratório superior, gerando gripes e resfriados. Caso esses vírus repliquem-se no epitélio ciliado, a infecção pode seguir dois caminhos:

  1. Acontece uma replicação nos gânglios linfáticos, o que acabará por causar viremia e a posterior infecção do trato respiratório inferior.
  2. Ocorre a disseminação célula-célula, que pode causar sinusite, tonsilite, faringite e laringite, podendo inclusive chegar até o trato respiratório inferior, como no primeiro caso.

Em ambos os casos, pode-se ter quadros de traqueíte, laringotraqueobronquite, pleurite, bronquite, bronquiolite e pneumonia.

12) Esquematize o ciclo de replicação do vírus Influenza, indicando os alvos e mecanismo de ação do Tamiflu e da Amantadina:

O ciclo de replicação do Influenza se inicia por um choque ocasional do vírus presente na matriz extracelular com a célula. Esse choque causa uma adsorção por uma interação com relativa especificidade entre a hemaglutinina (HA) viral e o receptor do ácido siálico na célula. Tal processo vai estimular uma endocitose.

Dentro do endossoma, devido ao baixo pH, ocorre clivagem mediada por proteases celulares ou bacterianas na hemaglutinina, expondo o seu peptídeo de fusão, o que vai possibilitar a sua interação e posterior fusão (do endossoma com o envelope viral) com a membrana do endossoma, o que acaba por expulsar o capsídeo viral para o citoplasma. Para que a fusão ocorra, também é necessário que o pH esteja baixo no interior do vírus (processo mediado pela proteína M2, por meio de bombeamento de íons), para que M1 seja deslocada do mesmo e a exposição do peptídeo de fusão realmente ocorra.

O capsídeo viral entra no núcleo pelas importinas da célula através do poro nuclear. O RNA (-) origina, por meio do complexo polimerase (formado pelas proteínas PB1, PB2 e PA), o RNAm (+) – que vai formar proteínas anti-terminação (NP), que vão permitir a formação do (+) full – e o RNA (+) full, que será modelado para os outros RNA (-) que originarão os novos vírus. O RNA (-) formado se conjuga – no núcleo – com as proteínas formadas no citoplasma (RNA (-) + complexo polimerase + NP + M1 + NEP – transporta o vírus para fora do núcleo pelo poro nuclear).

Esse complexo migra em direção à membrana da célula; M1 se une à membrana celular devido à presença de espículas virais (HA, NA – que cliva o ácido siálico para permitir que a infecção se espalhe ao longo dos tecidos – e M2), levando ao brotamento (membrana envolvendo M1 e o capsídeo), sem lisar a célula.

Mecanismo de Ação dos Antivirais:

  • Tamiflu (Oseltamivir): É um análogo do ácido siálico. Age sobre a Neuraminidase (NA), ligando-se a ela e impedindo que a mesma clive o ácido siálico, o que leva à formação de grandes massas virais agregadas na superfície celular, impedindo a disseminação e restringindo a infecção aos tecidos.
  • Amantadina (e Rimantadina): Age sobre a proteína M2, impedindo que a mesma bombeie íons para o interior do vírus. Isso impede a acidificação necessária, bloqueando a exposição do peptídeo de fusão e o descolamento de M1 do vírus, o que impede o desnudamento viral.

13) Como se constitui a vacina utilizada para profilaxia das infecções por vírus Influenza e como se determina sua composição, ano a ano?

A vacina para o Influenza é inativada, feita por meio da cultura e inoculação em ovos embrionados. A cada ano, é realizada a pesquisa dos três tipos de vírus mais frequentes em cada hemisfério. Pegam-se os três mais circulantes (comuns) e os mesmos são inativados para a constituição do inóculo. A vacina sazonal do hemisfério norte não é a mesma do sul.

14) Com relação ao diagnóstico e acompanhamento para indivíduos com suspeita de Hepatite B, quais as conclusões você obteria a partir dos resultados para os pacientes 1 e 2?

HBsAg

Anti-HBc Total

Anti-HBc IgM

Anti-HBs

HBeAg

Anti-HBe

Paciente 1

-

+

-

+

-

-

Paciente 2

+

+

-

-

+

-

Paciente 1: Considerando que o paciente 1 possui anticorpos Anti-HBc total e Anti-HBs, elimina-se a hipótese dele ter sido imunizado pela vacina, pois, nesse caso, ele somente apresentaria anticorpos Anti-HBs. Considerando também que ele não possui antígenos HBsAg e nem HBeAg, pode-se concluir que os anticorpos encontrados na verdade se tratam de células de memória e que o indivíduo 1 corresponde a alguém com uma infecção antiga resolvida.

Paciente 2: Observa-se que há presença de HBsAg, mas ainda não se tem presença de anticorpos Anti-HBs. Há presença de Anti-HBc total (anticorpos para os antígenos no capsídeo, os primeiros a entrar em contato com as células). A presença de HBeAg é um indício de alta replicação viral e infectividade. O quadro desse paciente é típico de final de uma fase aguda, por já ocorrer presença de alguns anticorpos, ou de uma Hepatite B crônica, onde a viremia persiste mesmo com a presença de anticorpos e também pela presença de HBeAg.

15) Dentre as hepatites virais, qual você julga mais preocupante para o profissional da área de saúde? Justifique:

É a Hepatite C, pois não existe vacina para a mesma e o risco de cronificação nesse tipo de hepatite é muito elevado (aproximadamente 70%). Além disso, não existe tratamento para essa doença na fase aguda e o tratamento existente para a fase crônica com drogas antivirais só tem sucesso em 50% dos casos.

16) Fale sobre a importância de HBeAg no diagnóstico e acompanhamento do paciente com Hepatite B crônica:

O antígeno HBeAg é importante, pois é um marcador de alta replicação viral e infectividade, sendo encontrado em níveis elevados em pacientes cronificados. No teste para avaliar a eficácia do tratamento, atesta-se como um tratamento bem-sucedido aqueles que apresentam valores sorológicos para HBeAg negativos (soroconversão).

17) O que é superinfecção e co-infecção na patogênese da Hepatite D?

  • Superinfecção: Corresponde à infecção pelo HDV (Vírus da Hepatite D) de um indivíduo que já era infectado pelo HBV (Vírus da Hepatite B).
  • Co-infecção: Corresponde à infecção de um indivíduo ao mesmo tempo por HBV e HDV.

18) Quais são as hepatites epidêmicas? Justifique:

As hepatites epidêmicas são a Hepatite A e a Hepatite E, por serem aquelas que são veiculadas pela água ou alimentos contaminados (transmissão fecal-oral).

19) Quanto à cronificação das hepatites virais, quais os vírus que são importantes? Qual o mais importante? Justifique:

Os vírus mais importantes em relação à cronificação da hepatite são os dos tipos B e C, já que são os únicos que podem sofrer esse processo. O vírus tipo C se torna o mais importante que o do tipo B por não possuir vacina e por ter uma chance maior de cronificação do que o outro.

20) Quais são as principais medidas de prevenção que devem ser adotadas pelo dentista no atendimento ao paciente portador de HIV?

O dentista deve tomar as mesmas precauções para todos os seus pacientes, já que ele não tem como saber se algum deles tem algum vírus infeccioso e que pode acabar sendo transmitido para outros pacientes. Todos os pacientes devem ser encarados como “de risco” pelo profissional, o que faz com que ele deva seguir todas as normas de biossegurança e cumprir corretamente os processos de esterilização (autoclavação) após todas as consultas.

21) Os métodos diagnósticos baseados na detecção de anticorpos frente ao HIV permitem a identificação de indivíduos infectados durante a fase aguda (primária) da doença? Por que?

Não, os métodos não permitirão, pois, nessa fase, a quantidade de anticorpos ainda é muito baixa, o que faz com que, em muitos casos, não haja uma taxa suficiente para detecção em teste sorológico que considera somente anticorpos (período conhecido como janela imunológica).

22) Quais os métodos de diagnóstico podem ser utilizados para detecção do HIV durante a fase primária de infecção ou durante a fase de AIDS?

Durante a fase primária, deve-se fazer a sorologia em busca de anticorpos e antígenos virais (proteína P24, DNA e RNA) – utilizando testes duplos ou de quarta geração – buscando reduzir ao máximo a janela imunológica. Durante a fase de AIDS, tanto os testes para anticorpos como os para antígenos serão eficientes no fornecimento do diagnóstico.

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